Day: dezembro 18, 2021

Governo desmantelado de Bolsonaro é 'pedra no caminho do Brasil'

João Vitor*, da equipe da FAP

Professor da Universidade de Pernambuco (UPE), o economista Sérgio Cavalcanti Buarque lamenta a falta de perspectiva de melhoria na economia do Brasil em 2022 por causa “do governo desmantelado, incompetente e demolidor de Jair Bolsonaro (PL)”, que, segundo ele, é “uma enorme e perigosa pedra no caminho”. A avaliação dele foi publicada em artigo na revista Política Democrática online de dezembro (38ª edição).

A revista é produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e que disponibiliza todo o conteúdo para o público, por meio da versão flip, gratuitamente. No artigo, o professor destaca que o ano de 2021 terminará com recessão técnica e aceleração da inflação.

Clique aqui e veja a versão flip da revista Política Democrática online de dezembro

O fator Bolsonaro, de acordo com Buarque, cria um clima de incerteza e desconfiança dos agentes econômicos e dos investidores externos, que se reflete na desvalorização cambial e na contenção dos investimentos indispensáveis para a dinamização da economia. “Será muito difícil recuperar a confiança dos agentes econômicos”, ressalta.

Ele diz que a incerteza e a instabilidade política tendem a se ampliar porque “a pedra no caminho” vai estar em plena campanha eleitoral, ameaçada por baixa aprovação do eleitorado e agarrada ao Centrão, ávida pelo aumento dos gastos públicos para conquistar o eleitorado.

O economista afirma que o medidor de dívidas Risco Brasil aumentou em 33%. “Mesmo com alguns sinais positivos na economia, o Risco Brasil – que mede a percepção dos investidores em relação ao desempenho saltou de 150 para 200 pontos – aumentou em 33%”, observa.

Clique aqui e veja o PDF de todas as edições da revista Política Democrática online

Na avaliação de Buarque, a principal aposta de Bolsonaro para 2022 será o programa social Auxílio Brasil. “Bolsonaro pretende disputar com Lula a paternidade do Bolsa Família, como alardeava o ex-presidente e propagandeou o Partido Liberal no ato de filiação do presidente”, diz.

“O Auxílio Brasil quase dobra o valor do Bolsa Família, em termos nominais, injeta de mais de 50 bilhões de reais em transferência de renda”, compara, para acrescentar: “O Brasil precisa mesmo é de uma política econômica que impulsione a recuperação da economia, gerando emprego e renda, todo o contrário do imediatismo da campanha eleitoral e da mediocridade política do presidente da República e de grande parte do Congresso Nacional.”

Buarque analisa que, se tudo der certo, em 2022, a economia brasileira poderá crescer em torno de 1%. No entanto, ele lembra, também, que o PIB encolheu 4,1% em 2021. “O Brasil vai iniciar ano que vem com a cara amarga de estagflação, o pior dos mundos para os brasileiros e um grande dilema para os formuladores de política econômica”, afirma.

Veja lista de autores da revista Política Democrática online de dezembro

 O autor do artigo, publicado na revista da FAP, vê três fatores que sinalizam para a melhoria da economia brasileira em 2022. Um deles é a recuperação da produção de petróleo. O outro são chuvas abundantes no sul e sudeste que aumentam os níveis dos reservatórios. O terceiro fator positivo, na percepção do economista, é que o Brasil vai virar o ano com quase 70% da população totalmente vacinada, o que permitirá o funcionamento normal da economia.

A íntegra do artigo de Sérgio C. Buarque pode ser conferida na versão flip da revista, disponível no portal da FAP, gratuitamente.

A nova edição da revista da FAP também tem reportagem especial sobre a variante Ômicron da covid-19entrevista especial com Hussein Kalout, além de artigos sobre política, economia e cultura.

Compõem o conselho editorial da revista o diretor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo, o jornalista e escritor Francisco Almeida e o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques. A Política Democrática online é dirigida pelo embaixador aposentado André Amado.

*Integrante do programa de estágios da FAP, sob supervisão do jornalista e editor de conteúdo Cleomar Almeida

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Eleição no Chile: Decisão entre extremos amplia polarização

Thaís Ferraz / Enviada Especial / O Estado de S.Paulo

SANTIAGO - A sucessão presidencial do Chile, que se definirá amanhã, em segundo turno, entre o conservador José Antonio Kast e o esquerdista Gabriel Boric, ampliou a polarização no país. Palco da onda de protestos de 2019, a Plaza Dignidad (antiga Plaza Italia) ainda guarda resquícios dos distúrbios. Há mensagens políticas em quase todos os prédios à volta, seja em cartazes ou em pichações. 

Ontem, a praça, no centro de Santiago, amanheceu dividida. Apoiadores de Kast se reuniram para restaurar o setor da rotatória que dá acesso ao Morro San Cristóbal, plantando flores e pintando a base onde ficava o monumento ao general Manuel Baquedano. Na noite anterior, eleitores de Boric haviam se reunido no local para celebrar a morte de Lucía Hiriart, viúva de Augusto Pinochet

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Para os conservadores, a restauração da praça é um retrato de dois Chiles. “Ontem, na Plaza Italia, eles (manifestantes de esquerda) cantaram e dançaram com um nível de ódio impressionante. Nossos jovens estão em uma posição diferente, querem mostrar o que queremos do Chile”, afirmou Mario Desbordes, ex-presidente da Renovação Nacional, em entrevista à Rádio Universo. 

“Grama, flores e paz em uma metade da Plaza Baquedano e na outra metade a destruição, ódio e divisão representada por uma bandeira negra chilena. Decida qual Chile você quer”, escreveu o vereador de Lo Barnechea, Cristián Daly, em suas redes sociais. 

Hábito

Todas as sextas-feiras, segundo os comerciantes locais, já acostumados com os tumultos, a praça se torna palco de manifestações de diferentes grupos políticos. Por muito tempo, os protestos tiveram apoio da sociedade, afirma a analista Pamela Figueroa. “Isso se refletiu no acordo para a mudança constitucional e o apoio à constituinte”, afirma.

Com os protestos cada vez mais violentos, o apoio diminuiu. “De modo geral, havia rechaço à violência. Além disso, depois que se elegeu a Constituinte, as pessoas passaram a preferir o caminho institucional”, afirma Figueroa. 

Segundo turno, entre o conservador José Antonio Kast (E) e o esquerdista Gabriel Boric, ampliou a polarização no país. .Foto: Martin Bennet/AFP

As cenas de destruição deixadas em alguns pontos e as críticas aos Carabineros, como é conhecida a polícia do Chile, se tornaram armas na mão da direita, que passou a utilizar jargões como “ordem” e “paz” para atrair eleitores incomodados com os protestos. 

Mas polarização parece ter fracassado na mobilização dos eleitores. Kast e Boric não foram capazes de entusiasmar parte importante dos chilenos – cerca de 20% ainda se diz indeciso e mais de metade sequer votou no primeiro turno. “Não estamos polarizados como no Brasil ou nos EUA”, afirma Claudia Heiss, cientista política do Instituto de Assuntos Públicos da Universidade do Chile. “A polarização que existe é incentivada pela política institucional, produzida muito mais de cima para baixo do que ao contrário.”

Divisão

Os dois grupos mais tradicionais da política do Chile – a centro-esquerda, de Michelle Bachelet, e a centro-direita, de Sebastián Piñera – ficaram de fora do segundo turno. Mas essa ausência, acredita Claudia, não se deve à polarização. “A maioria dos chilenos se identifica como de centro”, disse. “Mas os moderados não encontram a expressão de seus ideais e de suas posições nos grupos tradicionais.”

Ao contrário do que os protestos insinuam, a sociedade chilena está menos politizada, afirma Claudia. “Houve uma mudança grande nos últimos anos. O país tinha uma sociedade muito mais engajada, que se informava sobre política e tinha tradição de participação popular. Hoje, as pesquisas mostram que as pessoas cada vez menos falam de política.”

Para o analista Patricio Navia, uma das chaves pode estar na identificação ideológica dos chilenos. “De modo geral, o que vemos em pesquisas é que cada vez menos as pessoas se identificam com a esquerda e com a direita. Elas se definem como centristas.”

Para ele, existem semelhanças entre o que acontece no Chile e no Brasil, como os discursos populistas de direita, bandeiras anti-imigração e posições conservadoras nos costumes. Mas há também diferenças. “Se compararmos Kast e Jair Bolsonaro, veremos que Kast é um conservador de verdade. Ele só esteve casado uma vez, tem 9 filhos”, afirma. 

Outra diferença, segundo Navia, é que populistas de direita, como Bolsonaro e Donald Trump, eram candidatos da mudança. “No Chile, Kast é o status quo, contra a esquerda, que pretende mudar o modelo econômico do país.”  

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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,eleicao-no-chile-decisao-entre-extremos-amplia-polarizacao,70003929670


'Marqueteiros anônimos' devem dominar Eleições 2022. Fake news é desafio

Luiz Antônio Araujo / BBC Brasil

A eleição de 2022 será marcada por algumas novidades: horário de Brasília para todo o país no dia da votação, federações partidárias e até mesmo fone de ouvido descartável para deficientes auditivos nas seções. Mas há algo que, segundo especialistas, deve ser de fato o mais marcante do processo: a presença maciça de um agente que pode ser definido como "cidadão marqueteiro".

"É o sujeito comum que simultaneamente vai à rua com camiseta, que participa de grupos de WhatsApp e que contribui circulando memes sobre um candidato. Trata-se de um militante, organizado, coordenado, mas também espontâneo.

É muito mais difícil impor sanções a esse indivíduo", alerta Viktor Chagas, professor do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (UFF) e doutor em História, Política e Bens Culturais.

De acordo com Chagas, esse híbrido de eleitor anônimo e superativista digital será o principal agente dos próximos ciclos eleitorais não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro.

A expressão "cidadão marqueteiro" (citizen marketer) foi cunhada por Joel Penney, professor da Escola de Comunicação e Mídia da Montclair State University, de New Jersey, Estados Unidos. Num livro publicado em 2017 e intitulado The Citizen Marketer: Promoting Political Opinion in the Social Media Age (O Cidadão Marqueteiro: Promovendo Opinião Política na Era das Mídias Sociais, em tradução livre, ainda inédito no Brasil), ele descreve casos de indivíduos comuns que, muitas vezes involuntariamente, alcançam por meio das redes sociais um amplo impacto com gestos políticos pouco espetaculares, mas significativos.

Um dos exemplos de cidadã marqueteira citada por Penney é Krystal Lake, afroamericana de 22 anos que, no início de 2016, tornou-se viral nas redes sociais ao usar um boné branco com a inscrição "Os Estados Unidos nunca foram grandes" (America was never great, em inglês).

Viktor Chagas, professor da UFF
Segundo Viktor Chagas, o marqueteiro anônimo 'é o sujeito comum que simultaneamente vai à rua com camiseta, que participa de grupos de WhatsApp e que contribui circulando memes sobre um candidato'.

A mensagem era um contraponto ao slogan do então candidato republicano à presidência dos EUA, Donald Trump, "Faça os Estados Unidos grandes outra vez" (Make America great again). A nova-iorquina foi alvo de manifestações de ódio e de solidariedade nas redes, e o episódio virou notícia no jornal The New York Times.

Para Penney, personalidades poderosas como Trump sempre puderam contar com uma parafernália midiática para se dirigir ao público - jornais, reality shows, publicidade. Fora dos estreitos limites da elite, porém, essas formas de expressão eram inacessíveis - até o aparecimento das redes sociais.

"Em gerações anteriores, esse expressivo agitar de bandeiras e repetição de slogans pode ter sido desprezado como mero blablablá - um curioso espetáculo lateral da democracia popular. Em nossa era contemporânea, porém, ele se tornou virtualmente impossível de ignorar", escreve Penney em seu livro.

Para Chagas, o grande problema posto pelo aparecimento do cidadão marqueteiro em países como o Brasil, onde a expressão política do indivíduo comum é severamente limitada, é a dificuldade de diferenciar manifestações espontâneas e ações orquestradas.

"Há um limite entre a livre opinião do cidadão comum que faz circular esses conteúdos e as operações coordenadas, que dissimuladamente se apresentam como coletivas quando são, no fundo, patrocinadas estrategicamente por um candidato ou um partido. Essas, sim, precisam ser absolutamente proibidas", afirma o pesquisador.

A legislação eleitoral brasileira impõe um conjunto de restrições a quem deseja fazer campanha em favor de um candidato ou de um partido. Entre outras disposições, é proibida a divulgação de peças publicitárias com finalidade de carrear votos a aspirantes a cargos eletivos fora do chamado período oficial de campanha previsto no calendário eleitoral definido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Nesses e em outros casos, as penalidades recaem sobre candidatos e partidos, que podem chegar a perder o registro e a elegibilidade, além de arcar com multas pesadas. Se a ameaça de punição inibe os principais beneficiários da chamada campanha antecipada, porém, não tem o mesmo efeito sobre a massa de indivíduos que não precisam de permissão da Justiça Eleitoral para portar um celular ou criar um perfil em rede social.

Em 2022, um dos focos de atenção do TSE será o combate à desinformação - as chamadas fake news, que se tornaram alvo de uma CPI do Senado e de um inquérito no STF. Para o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, a desinformação nas redes sociais caminha de braço dado com o racismo e outras formas de intolerância.

"Os governos de todos os países devem lutar e fornecer mecanismos de combate a esse discurso de ódio. Além disso, devemos promover a educação digital, principalmente dos jovens, para que essas informações não se disseminem", afirmou no último dia 7 em encontro internacional online sobre o tema Eleições e a Transformação Digital.

Para o analista sênior de big data Rafa Bandeira, que trabalhou na recente campanha do governador gaúcho Eduardo Leite nas prévias presidenciais do PSDB, o cidadão comum ocupa um novo papel político no Brasil desde, pelo menos, o movimento que desembocou nas manifestações de junho de 2013.


TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
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TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
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TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
TSE apresenta novas urnas eletrônicas. Foto: Abdias Pinheiro/SECOM/TSE
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Ilusão de empoderamento

Uma boa parte do trabalho das campanhas atuais, especialmente para mandatos no Executivo, segundo Bandeira, começa na forma do que chama de "prospecção de talentos": a busca de apoiadores voluntários que façam reverberar a mensagem do candidato. Ele identifica, porém, um limite para esse fenômeno.

"O ativista voluntário sempre acaba, num certo momento, abduzido pelo imenso sistema partidário organizado", explica. "Nas redes, em razão dos padrões estabelecidos pelos algoritmos, ele acaba procurando nichos identitários onde possa se acomodar e organizar."

Para Céli Pinto, professora emérita do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a ideia de cidadãos comuns empoderados pelas redes sociais é falsa.

"As redes sociais chegam às pessoas de formas muito distintas conforme sua condição social. O conjunto da população não está empoderado por nenhuma tecnologia", argumenta. De acordo com a pesquisadora, a maioria dos brasileiros tem mais acesso à informação por meio de programas televisivos como Fantástico, da TV Globo, do que pelas redes sociais. "As pessoas veem muita bobagem nessas redes", afirma.

De acordo com a pesquisadora, a tecnologia tem papel limitado na dinâmica política do país. Ela discorda, por exemplo, da presunção muito difundida de que Jair Bolsonaro tenha vencido a eleição presidencial de 2018 em razão de uma utilização mais hábil dos meios digitais. "Bolsonaro foi a consequência da desestruturação da política a partir do golpe de 2016 (o impeachment da presidente Dilma Rousseff) e, antes disso, da ruptura do pacto político que permitiu a redemocratização", afirma.

O fenômeno central do pleito, de acordo com Céli, será uma dupla polarização. "De um lado, parece que Lula será o candidato e estará no segundo turno, salvo se for preso ou morto. De outro, haverá uma guerra de vida ou morte no campo da direita entre Bolsonaro e Moro (o ex-ministro da Justiça Sergio Moro). O tema central da eleição será, porém, inflação, dólar alto e desemprego", enumera. A professora prevê, no entanto, que as fake news voltarão à cena, assim como ocorreu em 2018.

Para Chagas, os chamados disparos em massa, que teriam sido utilizados em 2018 e estão na mira da Justiça Eleitoral, devem ser coibidos, mas, nesse caso, a fiscalização do poder público é mais fácil. O verdadeiro problema, segundo o professor, é a campanha "dissimulada e opaca" que ocorre abaixo do radar das autoridades no ambiente digital.

"Precisamos observar de que forma a campanha política sai das mãos dos candidatos e do seu entorno político e passa para as mãos do cidadão comum ou daquilo que nós acreditamos ser o cidadão comum", alerta.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-59640270


Adriana Fernandes: Lula tem dado poucas pistas de como será programa econômico

Adriana Fernandes / O Estado de S. Paulo

A possibilidade de o ex-governador Geraldo Alckmin ser o candidato a vice na chapa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem feito muitos se perguntarem se essa eventual aliança política para as eleições de 2022 pode se estender ao campo econômico ou ficaria restrita aos acordos para a formação dos palanques regionais.

Líder nas pesquisas com uma distância grande do presidente Jair Bolsonaro, Lula tem dado poucas pistas de como será o seu programa econômico. Em 2003, ele montou uma equipe econômica que passou por cima de muitas das ideias defendidas pelos economistas mais influentes do partido. 

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A estratégia agora do PT está sendo a de seguir com o debate interno (muito acalorado e disputado) em torno do programa e deixar para bem mais tarde posicionamentos sobre o que pretende fazer em 2023 na economia, caso confirme o atual favoritismo e ganhe as eleições.

“Na campanha paralela dos economistas, temos neoliberalismo selvagem de discurso: Guedes neoliberalismo progressista de planilha: MeirellesPastoreArminio e Cia (C’est là même chose) novo desenvolvimentismo fiscalista: Marconi e Benevides e no PT o debate segue”, postou essa semana o ex-ministro da Fazenda do PT Nelson Barbosa, numa mensagem quase subliminar para dizer o seguinte: não é agora.


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Foto: Fernando Bizerra Jr./EFE
Lula participa do Festival “Democracia Para Siempre” na Argentina. Foto: Ricardo Stuckert
Lula participa do Festival “Democracia Para Siempre” na Argentina. Foto: Ricardo Stuckert
Lula participa do Festival “Democracia Para Siempre” na Argentina. Foto: Ricardo Stuckert
Lula participa do Festival “Democracia Para Siempre” na Argentina. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
Viagem Lula à Europa. Foto: Ricardo Stuckert
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Por enquanto, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, diz que o partido não pretende divulgar plano econômico e que Lula é o seu próprio porta-voz na área com um histórico a mostrar.

O PT não tem ainda um programa, mas conta com um documento – o Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil – que contém propostas, embora seja claro ao dizer de antemão que todas as sugestões podem ser revisitadas.

Durante a pandemia, o PT fez várias sugestões e apresentou uma PEC para aumentar os investimentos com um orçamento específico. Já dá para ter uma ideia que aumentar os investimentos públicos será prioridade para ativar o crescimento. O oposto do que tem feito a equipe de Bolsonaro com Paulo Guedes.

É compreensível que agora Lula não queira cair na armadilha dos que cobram uma fala sua para diminuir incertezas fiscais. Ele não é governo, e os problemas atuais são de responsabilidade de Bolsonaro.

Mas se iludem os que acham que, como ele está muito à frente nas pesquisas, vai ganhar as eleições sem fazer nenhuma sinalização econômica. Para quem quer ter uma ideia do que Lula pretende fazer, é melhor prestar atenção com quem ele não está conversando, mais do que com quem conversa.

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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,adriana-fernandes-lula-eleicoes-presidenciais-economia,70003929742


Marcus Pestana: Anastasia e Pacheco recuperam protagonismo de Minas

Marcus Pestana / Congresso em Foco

Minas Gerais sempre ocupou papel central nas grandes decisões políticas nacionais. A aliança com Vargas na revolução de 1930, o desenvolvimentismo de JK, a presença de Aureliano Chaves na vice-presidência, a liderança de Tancredo Neves na crise de 1961 e na transição democrática, a atuação destacada dos parlamentares mineiros em toda a história republicana são provas inequívocas disso: Itamar Franco e o Plano Real. Minas sempre foi uma espécie de síntese do Brasil, sinônimo de equilíbrio, serenidade, diálogo e compromisso com o interesse público e nacional.

Em tempos de polarização radical e estéril, onde adversários são tratados como inimigos e os espaços de diálogo se encurtam perigosamente, Minas tem feito falta ao Brasil.

A eleição do senador Rodrigo Pacheco para a presidência do Senado Federal, em 2021, resgatou, em parte, as melhores tradições mineiras. Com atuação serena e conciliadora, tem sido um pacificador em tempos de alta temperatura na política nacional. Não esqueçamos nunca a frase histórica de Tancredo Neves, da sacada do Palácio da Liberdade, em sua posse como Governador: “O primeiro compromisso de Minas é com a liberdade. Liberdade é o outro nome de Minas”.

Quem conhece os bastidores da política sabe que a atuação, às vezes silenciosa, do senador tem sido fundamental para amenizar os efeitos dos impasses recorrentes entre o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Poder Judiciário. Cabe a ele, agora, em 2022, fixar sua participação na sucessão presidencial.

A nova configuração no Congresso Nacional produziu outro fato marcante que homenageia Minas, suas tradições e estabelece novos espaços de cooperação com o desenvolvimento do país. Com 52 votos entre os 81 senadores da República, o senador Antônio Anastasia foi eleito ministro no Tribunal de Contas da União. Poucas escolhas poderiam ser tão felizes e justas como essa. A votação consagradora é fruto da sua capacidade inegável e do seu estilo mineiro de conviver com os demais senadores, mesmo nas mais calorosas polêmicas. Na vida pública não conheci ninguém tão talhado para o cargo.

Antônio Anastasia reúne uma rara combinação de talentos nas áreas acadêmica, legislativa e da gestão pública que certamente frutificará em sua atuação no TCU. Ainda jovem foi um dos principais assessores do relator da Constituição mineira, deputado Bonifácio Mourão. Ocupou diversas secretarias e cargos no Governo de Minas, chegando depois ao ápice de sua trajetória como Vice-Governador e Governador. Foi ainda Secretário-Executivo e Ministro interino dos Ministérios do Trabalho e da Justiça. Como Senador aprovou diversas iniciativas correlatas à órbita de atuação do TCU. Soma-se a isso a formação intelectual que o transformou numa das vozes mais respeitadas no campo do direito constitucional e administrativo, o que ficou evidenciado em seu discurso antes da votação. Certamente, dará uma contribuição inestimável à modernização da administração pública brasileira e ajudará em muito a separação do joio e do trigo na gestão pública, defendendo os bons e honestos gestores.

Perde o Senado, ganha o TCU. Assumirá seu suplente, Alexandre da Silveira, que com sua experiência política e administrativa e sua energia de trabalho, saberá honrar a trajetória de seu antecessor e manter alta a participação de Minas no cenário nacional.

*Marcus Pestana, Presidente do Conselho Curador ITV – Instituto Teotônio Vilela (PSDB)

Fonte: Congresso em Foco
https://congressoemfoco.uol.com.br/blogs-e-opiniao/colunistas/anastasia-e-rodrigo-pacheco-recuperam-o-protagonismo-de-minas/


Oscar Vilhena Vieira: O Supremo não tem dono

Oscar Vilhena Vieira / Folha de S. Paulo

O Supremo é uma criatura da Constituição, tal como o Congresso, as Forças Armadas ou o SUS. Suas atribuições não estão à disposição de quem quer que seja. Guardar a Constituição é sua missão precípua.

O presidente da República oferece reiteradas demonstrações de não se conformar com isso. Não bastassem os ataques e ameaças, a cada momento em que o tribunal impugna um de seus atos arbitrários ou contraria os interesses de seus acólitos, o presidente passou a se gabar, com a nomeação de um segundo ministro, de possuir 20% do tribunal, deixando claro a empresários embevecidos na Fiesp que, se reeleito, dobraria sua quota no tribunal.

Não se trata apenas de uma tosca manifestação de um arruaceiro. Bolsonaro segue fielmente a nova cartilha dos populistas autoritários, que determina a captura das instituições democráticas, especialmente aquelas responsáveis pela aplicação da lei.

Nesse contexto, muitos têm questionado a nomeação de um ministro "terrivelmente evangélico" para o tribunal. A religião de qualquer ministro me parece um dado absolutamente irrelevante. O mais preocupante foram suas demonstrações de deslealdade constitucional ao exercer a autoridade pública, permitindo da elaboração de dossiês contra adversários do governo ao emprego da extinta lei de segurança nacional para intimidar jornalistas e opositores.

O desafio de qualquer um que chegue a um tribunal numa democracia é demonstrar que suas preferências pessoais, ideologia, vínculos políticos e mesmo a mais arraigada fé religiosa, não interferirão no exercício da tarefa de defender os direitos e as instituições estabelecidas pela Constituição, mesmo quando entrarem em confronto com suas mais profundas crenças e valores pessoais.


Posse de André Luiz de Almeida Mendonça no STF. Foto: Foto: Isac Nóbrega/PR
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Posse de André Luiz de Almeida Mendonça no STF. Foto: Foto: Isac Nóbrega/PR
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Posse de André Luiz de Almeida Mendonça no STF. Foto: Foto: Isac Nóbrega/PR
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Não se trata de tarefa fácil. O caso da revista Realidade, julgado num dos períodos mais duros do regime militar, no entanto, deveria servir de exemplo de como juízas e juízes deveriam se comportar quando seu valores entram em choque com as regras da Constituição.

A revista havia sido censurada por um juiz de menores que a julgou obscena, por trazer uma ampla reportagem generosa com mães solteiras, inclusive com fotos de um parto.

Instalou-se no Supremo um debate sobre ser ou não a revista obscena. Foi quando o ministro Aliomar Beleeiro, nomeado por Castelo Branco, católico, ex-deputado da UDN, que apoiou o golpe militar, mudou o rumo do debate.

O julgamento sobre a obscenidade, de acordo com Baleeiro, não poderia ser entregue "ao arbítrio do juiz... conforme lhe der na cabeça, segundo sua concepção pessoal ou visão religiosa...". As pessoas "têm concepções de vida diferentes das nossas. Não podemos impor os nossos padrões" às demais pessoas, argumentava Baleeiro com seus colegas da segunda turma do Supremo Tribunal Federal, a mesma que será ocupada por André Mendonça.

Magistrados, como as demais pessoas, são fortemente influenciados por seus valores, visões de mundo, preconceitos, muitas vezes escondidos no íntimo de seus inconscientes, quando tomam decisões. Bons magistrados são aqueles que, através de um processo reflexivo e muita disciplina profissional, não submetem os seus jurisdicionados se não àquilo que determina a lei, como o fez Aliomar Baleeiro, no caso da revista Realidade.

Bolsonaro cravou na testa de Kassio Nunes e André Mendonça de que eles são seus ministros. Mais, que Mendonça foi para o tribunal por ser "terrivelmente evangélico". Caberá a eles, no dia a dia da judicatura, deixar claro que não têm dono. Que servem apenas à Constituição.

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/oscarvilhenavieira/2021/12/o-supremo-nao-tem-dono.shtml


Marco Antonio Villa: Os piores anos das nossas vidas

Marco Antonio Villa / Revista IstoÉ

É difícil supor que alguém tenha previsto, em 1º de janeiro de 2019, que teríamos três anos terríveis, os piores da história republicana. Imaginava-se que o Bolsonaro faria um governo ruim. Afinal, seria um milagre se aquele deputado do baixo clero, que, em momento algum (e foram 28 anos!), tinha se destacado pelo entendimento das complexas questões de Estado tivesse subitamente se convertido em um bom governante. Mas o pesadelo que estamos vivendo, com acontecimentos diários que nos envergonham no concerto das nações, ah, com a mais absoluta certeza nem o mais pessimista dos analistas poderia supor.

Os anos da presidência Bolsonaro serão eternamente lembrados como o ponto mais baixo, mais vil, da nossa história. Porque além do presidente da República ter desempenhado o papel de inimigo da Constituição e dos valores humanistas da nossa civilização, teve a companhia de milhares de brasileiros que o apoiaram na faina que espalhou a barbárie por todo o território nacional. E, vale destacar, não somente aqueles com precária formação escolar ou oportunistas políticos. Não! Teve a companhia de brasileiros com educação universitária que tiveram a possibilidade de externar seu ódio de classe, seu desprezo pelo povo brasileiro, pela nossa formação histórica. O que estava engasgado durante décadas foi expelido com satisfação, como um momento de gozo, uma espécie de libertação dos valores civilizatórios. Ao assumir a barbárie como visão de mundo, os bolsonaristas se reencontraram com os valores mais reacionários da história do Brasil.

O pesadelo que estamos vivendo é produto da nossa história política. Não é um acidente, um acaso ou uma manifestação de algum fenômeno da natureza como uma erupção vulcânica ou um tsunami. Teremos de fazer uma autocrítica do processo de redemocratização e, especialmente, dos 21 anos do condomínio PSDB-PT. Algo de errado — de muito errado — aconteceu.

A opção pela conciliação com o velho regime, concedendo aos egressos do passado antidemocrático posições de força no aparelho de Estado, acabou petrificando o processo de transição para a democracia. O novo foi impedido de nascer pelo velho, mais uma vez os fatores de conservação se sobrepujaram frente aos fatores de transformação.

A tarefa democrática e civilizatória para 2022 é de varrer o reacionarismo bolsonarista. A derrota dos extremistas nazifascistas é condição sine qua non para a preservação da democracia e dos valões consubstanciados na Constituição.

Fonte: IstoÉ
https://istoe.com.br/os-piores-anos-das-nossas-vidas/


Podcast analisa riscos e benefícios do homeschooling

João Rodrigues, da equipe da FAP

O homeschooling, que é uma modalidade de ensino onde crianças e adolescentes podem ser educados em casa, pelos pais ou tutor, em vez de ir às escolas, tem grande ganhado cada vez mais espaço no debate público brasileiro. Há um projeto de lei adiantado no Congresso Nacional sobre o tema, mas o consenso na sociedade está distante.

Para analisar os riscos e eventuais benefícios da educação domiciliar no Brasil, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) desta semana bate um papo com Andréa Marinho, ex-subsecretária de Gestão de Ensino do Rio de Janeiro. Ela é graduada em pedagogia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), com especialização em orientação educacional e mestrado em Sistemas de Gestão pela Universidade Federal Fluminense (UFF).



A falta de preparação do Estado brasileiro para fiscalizar o homeschooling, a importância da formação continuada dos professores e os desafios para o futuro da educação no Brasil estão entre os temas do programa. O episódio conta com áudios da TV Câmara dos Deputados, Profissão Repórter, da TV Globo, NSC Notícias, RecordTV e Estadão.

O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google Podcasts, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues. A edição-executiva é de Renato Ferraz.




“Formação política é fundamental”, afirma Luciano Rezende

Cleomar Almeida, da equipe FAP

Presidente do Conselho Curador da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) e ex-prefeito de Vitória (ES) por dois mandatos, Luciano Rezende destacou na quarta-feira (15/12) que a “formação política é fundamental” para o Brasil. Durante a formatura do curso Jornada Cidadã 2022, realizado pela entidade em parceria com o Cidadania, ele também agradeceu a participação dos alunos dos 26 estados e do Distrito Federal (DF).

https://www.youtube.com/watch?v=U8P-s_NA7IA

Rezende, que é coordenador-geral da Jornada Cidadã 2022, lembrou que o curso teve 611 inscritos, com média de 253 visualizações de aula. No total, 91 alunos já concluíram o curso e podem emitir o certificado por meio da plataforma Somos Cidadania, onde as aulas continuam disponíveis, na íntegra, para todas as pessoas interessadas. Os vídeos também podem ser vistos no canal da FAP no Youtube.

https://youtu.be/Hhb3K41I8u4

Todos os concluintes receberão, via Correios, um kit com agenda executiva e caneta, além de dois livros: Gramsci no seu tempo, do historiador Alberto Aggio, e Os nove de 22, do historiador Ivan Alves Filho.

“A formação política é fundamental por que junta o talento político à técnica que vai fazer a boa política e os bons gestores dos quais o Brasil tanto precisa. É a contribuição da FAP e do Cidadania para melhorar o nível da política e da representação política brasileira”, acrescentou o coordenador da FAP.

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O presidente do Conselho Curador da FAP agradeceu, ainda, a participação de líderes de todos os estados brasileiros e do Distrito Federal no curso. “É um curso específico para quem é pré-candidato ou pré-candidata e suas assessorias. Ter mais de 600 pessoas do Cidadania inscritas nessa atividade é um sucesso muito grande”, afirmou.

Na avaliação de Rezende, “as aulas foram de altíssimo nível”. “Agora nós estamos encerrando o curso, no ano de 2021, com chave de ouro, tendo passado pela FAP quase mais de 1.500 alunos nos dois cursos realizados este ano”, afirmou.

"Boa política"

O curso foi pensando e planejado conforme a crescente necessidade de interação das pessoas no mundo digital. Os alunos tiveram aulas exclusivas sobre liderança, engajamento e mobilização, estratégias de uso das redes sociais, marketing e comunicação política. Eles também discutiram, de forma prática, objetiva e assertiva, a conjuntura das eleições 2022.

O coordenador do curso destacou que o curso de formação dá continuidade à missão da entidade de formar líderes comprometidos com a “boa política”.

“A aliança da boa técnica de gestão com o talento político é igual à boa política, de que o Brasil precisa. O país precisa de bons líderes, boas ideias, pessoal envolvido com política e preparado para gestão”, afirmou ele, ressaltando o histórico da fundação na realização de cursos de formação.

O presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire, que na última aula do curso discutiu perspectivas do cenário político nacional para 2022, parabenizou a FAP pelo bom trabalho realizado na formação de quadros políticos.

Nas redes

“Um processo que, ainda, nem todos os partidos fazem, mas que cresce na sociedade brasileira. São processos de formação e participação na política que tem proliferado, inclusive, nas redes. São alguns movimentos interessantes que têm feito esse trabalho. Dentre eles, destacam-se, pelo nível, pela qualidade e pela dimensão, os cursos realizados pela FAP”, afirmou.

Palestrantes do curso Jornada Cidadã 2022
Palestrantes do curso Jornada Cidadã 2022

Direitor-geral da FAP, sociólogo e consultor do Senado, Caetano Araújo também parabenizou os alunos do curso. “Cada curso feito pela FAP é uma satisfação muito grande para nós, por causa do produto que a gente entrega e que é uma contribuição para a política democrática deste país sobre temas relevantes e de interesse público. O curso de formação é uma das atividades que estão previstas na legislação como fundamentais às entidades partidárias”, disse.

Veja vídeos do curso



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Dom Paulo Evaristo Arns: o arcebispo que enfrentou a ditadura

André Bernardo / BBC News Brasil

São Paulo, 30 de março de 1973. A missa em memória do estudante universitário Alexandre Vannucchi Leme (1950-1973), preso, torturado e assassinado pelo regime militar, estava marcada para as 18h30 na Catedral da Sé. Mas, desde as 16h, PMs armados em camburões ou a cavalo já patrulhavam a Praça da Sé.

Cerca de 3 mil pessoas, a maioria delas estudantes da USP, onde Alexandre cursava o quarto ano de Geologia, participaram da cerimônia, presidida pelo bispo de Sorocaba, Dom José Melhado Campos (1909-1996), e concelebrada pelo cardeal-arcebispo de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016).

Os estudantes queriam que a missa fosse rezada no campus da universidade, mas Dom Paulo não aprovou a ideia. Mais do que isso: convenceu-os a participar da cerimônia na catedral. Ali, argumentou, estariam seguros. Em sinal de protesto pela morte do colega, os alunos espalharam faixas de luto pela USP e paralisaram as aulas. A censura proibiu os jornais de noticiar a missa.

Dom Paulo Evaristo Arns celebra missa diante de uma multidão
'Dom Paulo era intransigente na defesa dos direitos humanos. As pessoas, dizia, têm que ter liberdade para lutar pelo que acreditam'. Foto: Arquidiocese de São Paulo

Na tarde do dia 30, o carro de dom Paulo foi seguido, desde a residência do Sumaré até a Catedral da Sé. "Não foi a primeira nem a última vez", observou ele na autobiografia Da Esperança à Utopia - Testemunho de Uma Vida (2001).

A certa altura, um cinegrafista da TV Globo começou a registrar imagens para o telejornal da noite. Com medo de represálias, os estudantes cobriram os rostos com os folhetos de cânticos.

Quem participou do ato religioso foi o cantor e compositor Sérgio Ricardo (1932-2020). Durante a comunhão, ele cantou a música Calabouço, composta em homenagem a outro estudante, Edson Luís de Lima Souto (1950-1968), morto durante confronto com a PM em um restaurante do Rio.

Terminada a missa, Dom Paulo cumprimentou a mãe de Alexandre, Egle Maria Vannucchi Leme, sentada na primeira fila, e pediu a todos que saíssem de braços dados, em grupos de quatro ou cinco, "para evitar qualquer problema aí fora".

Como canto final, a multidão entoou Pra Não Dizer que Não Falei das Flores, de Geraldo Vandré. "Vem, vamos embora, que esperar não é saber / Quem sabe faz a hora, não espera acontecer", diz o refrão.

O ato religioso em memória de Alexandre Vannucchi Leme é considerado o primeiro grande ato público contra a ditadura militar a ser realizado depois do AI-5.

Foto em preto e branco de Alexandre Vannucchi Leme
Alexandre foi torturado por 13 agentes sob comando do então major Carlos Alberto Brilhante Ustra. Foto: Acervo de família

'Não se pune um crime, se existiu, com um crime ainda maior'

Dom Paulo costumava conversar com o então ministro da Educação do governo Médici, Jarbas Passarinho (1920-2016), por carta. Um padre da confiança do cardeal levava e trazia a correspondência. Mas, daquela vez, o religioso preferiu usar o telefone para cobrar explicações.

"Te dou uma resposta daqui a pouco", respondeu o ministro.

Passados alguns minutos, confirmou a versão dada pelo Secretário de Segurança Pública, o general Sérvulo Mota Lima, de que Alexandre morrera atropelado durante uma tentativa de fuga. Dom Paulo não acreditou na história.

"Não se pune um crime, se existiu, com um crime ainda maior", rebateu, em carta. "Houve um tempo em que ter um filho na universidade era motivo de orgulho e tranquilidade. Hoje, é de ansiedade e medo."

Jarbas Passarinho retrucou: "Alexandre era estudante terrorista. Não foi atingido enquanto estudante, mas enquanto terrorista". E prosseguiu: "Essa missa, Senhor Cardeal, poderia ter provocado um rio de sangue! Graças à prudência das autoridades, felizmente, não aconteceu".

"Dom Paulo teve uma briga feia com Jarbas Passarinho. Não eram amigos, mas tinham uma relação cordial", explica a jornalista Evanize Sydow, coautora da biografia Dom Paulo Evaristo Arns - Um Homem Amado e Perseguido (1999). "Dom Paulo era intransigente na defesa dos direitos humanos. As pessoas, dizia, têm que ter liberdade para lutar pelo que acreditam".

Evanize Sydow e Dom Paulo
Evanize Sydow e Dom Paulo: missa celebrada em março de 73 é considerado primeiro grande ato público contra a ditadura. Foto: Acervo de família

'Éramos felizes e não sabíamos'

Filho de professores, Alexandre Vannucchi Leme nasceu no dia 5 de outubro de 1950 em uma família católica de Sorocaba (SP), a 87 quilômetros da capital. Sua mãe, Egle, tinha um irmão padre e três irmãs religiosas.

Alexandre era o mais velho de seis irmãos: Maria Regina, Maria Cristina, Miriam, José Augusto e Beatriz. Aluno exemplar, foi aprovado em primeiro lugar no vestibular da USP.

"Foi meu calouro na universidade. Tinha uma inteligência acima da média", elogia o geólogo Adriano Diogo, amigo de Alexandre. "Se estivesse vivo, seria um grande cientista ou professor".

Por ser franzino e gostar de terra, ganhou logo um apelido na USP: "Minhoca". Mas, em casa, todos o chamavam de "Lê".

"A lembrança dele, mesmo depois de tantos anos, ainda é muito forte", afirma a funcionária pública Maria Cristina, sua irmã.

"Lembro-me vivamente do nosso último Natal, em 1972. Estávamos na casa da nossa tia Afra, a matriarca da família. Ele não queria ser fotografado, mas a namorada Lisete e minha mãe o seguraram na poltrona. Éramos felizes e não sabíamos."

Acusado de pertencer ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), o tio padre de Alexandre chegou a ser detido no dia 5 de abril de 1964, apenas quatro dias depois do golpe militar.

"Passei uma noite na cadeia e nove dias em prisão domiciliar no seminário", recorda Aldo que, em 1974, largou a batina e, 40 anos depois, publicou o livro Alexandre Vannucchi Leme - Jovem, Estudante, Morto pela Ditadura.

"Quando soube o que fizeram com ele, senti como se meu coração tivesse sido estraçalhado de dor."

Capturado no dia 16 de março de 1973, por volta das 11h, Alexandre não teve a mesma sorte do tio. Levado por agentes do Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), o estudante de 22 anos foi torturado até a morte, um dia depois.

Era integrante da Ação Libertadora Nacional (ALN), fundada por Carlos Marighella (1911-1969), e teria sido entregue por um agente infiltrado conhecido como Jota.

"A família não sabia da ligação do Alexandre com a ALN. Mas, os pais pediam para que ele tomasse cuidado. 'Estão caçando gente da oposição', alertava a mãe", recorda Aldo.

"Tempos depois, conversando com minha mãe, ela contou que tinha certeza de que ele havia sido preso", completa Maria Cristina.

Na sede da Operação Bandeirante (Oban), situada na rua Tutóia, Alexandre não delatou ninguém. Era acusado, entre outros crimes, de participar de dois assaltos e de fornecer informações que resultaram no roubo de quatro carros e na morte de um comerciante.

"No dia e horário de um dos supostos assaltos, Alexandre estava numa mesa de cirurgia", explica o jornalista Paulo de Tarso Vannucchi, primo de Alexandre. "Ia operar apendicite."

Alexandre Vannucchi Leme (ao centro, de branco), comemorando o Natal de 1972 com a família em Sorocaba
Alexandre (ao centro, de branco) e a família no Natal de 1972 em Sorocaba: 'Éramos felizes e não sabíamos'. Foto: Acervo de família

'Quero estourar seus miolos!'

A certa altura do interrogatório, segundo relatos de nove presos políticos que estavam em celas vizinhas do DOI-Codi, o rapaz teria gritado: "Meu nome é Alexandre Vannucchi Leme. Sou estudante de Geologia. Me acusam de ser da ALN. Eu só disse o meu nome".

Sob o comando do então major Carlos Alberto Brilhante Ustra (1932-2015), Alexandre foi torturado por 13 agentes, entre tenentes, delegados e soldados. Eles se revezaram em dois turnos: uma equipe à noite, a A, e outra de dia, a C.

No dia 17, por volta das 17h, um carcereiro conhecido como Peninha foi buscá-lo na cela para mais uma sessão de tortura, mas já o encontrou morto numa poça de sangue.

"Em janeiro de 1973, Alexandre foi submetido a uma cirurgia de apendicite no Hospital Santa Lucinda, de Sorocaba. A tortura que sofreu, muito provavelmente, resultou na ruptura dos pontos e em hemorragia interna", lamenta Paulo de Tarso.

Os militares, então, forjaram duas versões: numa, Alexandre teria cometido suicídio, cortando a própria garganta com uma lâmina de barbear no interior da cela; noutra, teria sido atropelado por um caminhão, no cruzamento da rua Bresser com a avenida Celso Garcia, no Brás, enquanto fugia da polícia.

Na manhã do dia 17, Adriano, o amigo de Alexandre, foi levado à Operação Bandeirante para ser interrogado. Foi recebido, conta, por um Ustra "visivelmente transtornado".

"Acabei de matar o Minhoca!", gabou-se o militar, bradando uma pistola Magnum 45.

"Mandei-o para a Vanguarda Popular Celestial!", completou, fazendo alusão à Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), um dos muitos grupos de esquerda que lutavam contra a ditadura.

"As novas gerações não fazem ideia de quem foi Brilhante Ustra", garante Adriano.

"Era um assassino sanguinário. Um sádico perverso", descreve. "Quando me viu, avisou: 'Quero estourar seus miolos!'."

No período em que esteve preso na rua Tutóia, Adriano foi submetido aos mais variados tipos de tortura, do pau de arara à cadeira do dragão. Em ambos, o prisioneiro, nu, sofria choques elétricos em diferentes partes do corpo, incluindo os órgãos genitais.

Alexandre (braços abertos) com os colegas do curso de Geologia em Bertioga em 1971
Alexandre (braços abertos) com os colegas do curso de Geologia em Bertioga em 1971. Foto: Acervo de família

'Por que vocês mataram meu filho?'

No dia 20 de março, por volta das 10h, a família de Alexandre recebeu um telefonema anônimo: "O Alexandre está aqui no DOPS. Venham buscá-lo!".

Na mesma hora, o pai do rapaz, José de Oliveira Leme, acompanhado do tio dele, Aldo Vannucchi, viajaram para São Paulo.

Na Delegacia de Ordem Política Social (DOPS), o pai de Alexandre confrontou o delegado Sérgio Paranhos Fleury (1933-1979): "Por que vocês mataram meu filho?".

Enquanto Fleury sustentava a versão de atropelamento, outro delegado do DOPS, Edsel Magnotti, defendia a tese de suicídio.

Diante das versões desencontradas, José de Oliveira deu continuidade às buscas. Procurava pelo filho em órgãos do governo. Já Aldo buscava informações em hospitais. A resposta era sempre a mesma: ninguém sabia de nada. Sem notícias, voltaram para Sorocaba.

Na manhã do dia 23, reiniciaram a busca. Foi quando, na rodoviária de Sorocaba, José leu, na Folha de S. Paulo: "Terrorista morre atropelado no Brás".

No Instituto Médico Legal (IML/SP), descobriu que Alexandre já tinha sido enterrado, como indigente, no Cemitério Dom Bosco, em Perus, onde os órgãos de repressão do governo militar escondiam as ossadas de suas vítimas. Para agilizar a decomposição do cadáver e esconder as marcas de tortura, cobriram o corpo do rapaz com cal.

Segundo o laudo assinado pelos legistas Isaac Abramovitch e Orlando Brandão, Alexandre teria morrido em decorrência de "lesões traumáticas crânio-encefálicas". Sua ossada, porém, só foi resgatada dez anos depois, em 24 de março de 1983.

"A identificação só foi possível porque, em dezembro de 1972, ele me deu, de presente, um molde em gesso de sua arcada dentária", recorda Maria Cristina.

"Estava fazendo tratamento na época."

Alexandre aos 17 anos dançando com a irmã
Alexandre aos 17 anos dançando com a irmã. Foto: Acervo de família

Seus restos mortais foram exumados e, então, trasladados para Sorocaba, onde descansam no Cemitério da Saudade.

No dia 16 de dezembro de 2013, exatos 40 anos depois, a juíza Renata Mota Maciel Dezem, da 2ª Vara de Registros Públicos da Capital, retificou sua causa mortis: Alexandre Vannucchi Leme morreu de lesões provocadas por tortura e maus-tratos sofridos nas dependências do DOI-Codi, e não por suposto atropelamento em via pública.

"Como Alexandre estaria hoje, aos 71 anos? Já nos fizemos essa pergunta várias vezes", reflete Maria Cristina.

"Temos quase certeza de que continuaria amoroso e brincalhão conosco. Mas, por outro lado, estaria indignado com o aumento da desigualdade social e com os milhões de famintos no país do 'agro é pop'. Tenho absoluta certeza de que estaria na linha de frente, lutando contra a escalada do fascismo no Brasil."

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-59705123


2021: o ano em que o Brasil "descobriu" a arte indígena

Edison Veiga / DW Brasil

Seja na Bienal de Arte de São Paulo, na Pinacoteca, no Sesc, na Flip, no Masp… Sob a ótica não indígena, pode-se dizer que nunca a arte feita pelos povos originários esteve tão em evidência como no Brasil de 2021. Para especialistas no assunto, obras contemporâneas de artistas indígenas têm sua potência por não poderem se desvincular do engajamento na defesa da natureza e da vida no planeta.

"A arte indígena sempre existiu e é também um processo de resistência, com suas transformações, hibridações, por ser também um veículo de luta nesse momento", analisa a artista, ativista e pesquisadora Naine Terena, professora na Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat).

"Do ponto de vista da visibilidade e inserção no universo da arte, talvez seja algo mais recente, já que, como muitos dizem, ela estava delegada ao universo da etnografia. O crescente interesse na arte indígena, a partir da perspectiva da produção artística, e dos artistas e coletivos, penso eu, não deve ser visto com o olhar dessa história da arte que conhecemos, que pautou o entendimento dos momentos da arte no mundo. Precisamos ouvir os artistas, anciãos, lideranças indígenas, para entender a complexidade de sua existência, que não é desconectada da complexidade que é ser indígena", diz.

Quando 2021 começou, já estava em cartaz na Pinacoteca de São Paulo a mostra "Véxoa: Nós Sabemos" – da qual Terena foi curadora. Com pinturas, esculturas, objetos, vídeos, fotografias e instalações assinadas por 23 artistas e coletivos de diversas partes do país, foi a primeira vez que o prestigiado museu paulista dedicou uma exposição à produção indígena contemporânea.


Obra de Ailton Krenak na Pinacoteca de São Paulo. Foto: Pinacoteca/Isabella Matheus/Divulgação
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Obra de Ailton Krenak na Pinacoteca de São Paulo. Foto: Pinacoteca/Isabella Matheus/Divulgação
Obra de Ailton Krenak na Pinacoteca de São Paulo. Foto: Pinacoteca/Isabella Matheus/Divulgação
Morto em novembro, o artista e ativista Jaider Esbell, da etnia macuxi, estava no auge de sua carreiraFoto: Malu Dias/Fotoarena/Imago Images
Bienal de São Paulo destacou pela primeira vez de modo considerável a arte indígena contemporâneaFoto: Bienal de SP/Karina Bacci/Divulgação
Bienal de São Paulo destacou pela primeira vez de modo considerável a arte indígena contemporâneaFoto: Bienal de SP/Karina Bacci/Divulgação
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Espaço digital para arte indígena

Mais recentemente, o Sesc São Paulo reservou um espaço privilegiado do já tradicional evento Ocupação Mirada – Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas para promover a arte indígena. No final de novembro, foi lançada ali a plataforma TePI –Teatro e os Povos Indígenas (www.tepi.digital), primeiro espaço digital exclusivamente dedicado a promover as artes cênicas dos povos originários.

"Depois de tantas reflexões, para além da ideia de um teatro estabelecido apenas no palco, é interessante observar outras formas de fazer teatro, entender o teatro como expressão do corpo, algo que produz estética, política e comunica de forma a iluminar novas ideias de estar no mundo", explica uma das idealizadoras do projeto, a atriz, curadora e diretora artística Andreia Duarte.

"A arte indígena contemporânea sempre foi contemporânea porque é do nosso tempo. E a arte sempre existiu no mundo indígena, das narrativas às arquiteturas, passando pelas expressões corporais e pelo canto."

Mais importante festival literário brasileiro, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) também decidiu reconhecer a importância dos indígenas. Em vez de eleger um escritor homenageado, como é tradição, desta vez os celebrados foram "todos(as) os(as) pensadores(as), conhecedores(as) e mestres(as) indígenas que tiveram suas vidas interrompidas pela covid-19", segundo o texto de apresentação. Entre os participantes da Flip estiveram o cineasta e líder indígena Carlos Papá, a educadora Cristine Takuá, e o filósofo, escritor e ambientalista Ailton Krenak.

Considerada uma das mais icônicas instituições de arte brasileiras, o Museu de Arte de São Paulo (Masp) também incluiu a temática em sua programação. Antecipando o fato de que em 2023 o museu deverá dedicar-se ao tema da história e da cultura indígenas, houve em novembro um seminário on-line sobre o assunto. A inclusão também se faz presente no acervo: em setembro, a artista visual Duhigó se tornou a primeira indígena amazonense a expor no Masp.

Mas sem dúvida o ponto alto do reconhecimento do segmento artístico foi a Bienal Internacional de São Paulo. Em sua 34ª edição, encerrada no início de dezembro, o evento destacou pela primeira vez de modo considerável a arte indígena contemporânea. Foram nove representantes de culturas dos povos originários, cinco deles brasileiros — Daiara Tukano, Gustavo Caboco, Sueli Maxacali, Uýra e Jaider Esbell. Por conta disso, muitos chamaram esta de "a bienal dos indígenas".

Nem tudo foram boas notícias, contudo. O ano também ficará marcado pela morte precoce de Esbell, em 5 de novembro, aos 42 anos. Artista, arte-educador, geógrafo, escritor, curador e ativista, o indígena macuxi estava no auge de sua carreira.


Ato contra o Marco Temporal - 26/08/21. Foto: Gabriel Paiva/Fotos Públicas
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Ato contra o Marco Temporal - 26/08/21. Foto: Gabriel Paiva/Fotos Públicas
Ato contra o Marco Temporal - 26/08/21. Foto: Gabriel Paiva/Fotos Públicas
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Meio ambiente e defesa dos territórios

O reconhecimento da importância artística dos povos indígenas tem a ver com um mergulho nas próprias origens, mas também com as preocupações mais urgentes dos tempos atuais — ou seja: as questões ambientais. Para o artista visual Denilson Baniwa, "é impossível que a produção de uma pessoa indígena se distancie de quem ela é ou da luta que ela representa".

Nesse sentido, as obras desses expoentes têm em comum discursos em defesa de seus territórios e da valorização de suas historiografias e temas ligados à preservação do meio ambiente.

No primeiro grupo, enquadra-se a obra da cineasta Glicéria Tupinambá, que ao longo dos últimos anos conseguiu resgatar a tradição dos mantos tupinambás, graças à descoberta de uma peça na reserva técnica do museu do Quai Branly, em Paris. "A partir de sua pesquisa e observação, ela reconstruiu um manto que hoje serve de aval para a construção de outros, propiciando um resgate da antiga tradição tupinambá", exemplifica Baniwa.

Terena concorda que "muitos artistas têm a consciência" de que suas produções são "uma maneira de falar sobre os povos indígenas e suas demandas".

"Não há arte indígena contemporânea não ligada à causa deles", acrescenta Duarte. "Ela em si é engajada, vejo uma epistemologia, uma forma de pensar e praticar essas artes que traz o pensamento originário, totalmente conectado à vida, ao ar, à natureza. Não é algo imaginário, abstrato. É conectado. Está nas origens de suas narrativas."

Para o escritor e ambientalista Kaká Werá, tapuia, as manifestações artísticas consideradas contemporâneas de representantes dos povos originários são a nova roupagem da arte ancestral a partir de formatos compatíveis com a sociedade de hoje.

"A arte indígena é milenar enquanto expressão de suas tradições nos corpos, nas cerâmicas, na arquitetura comunitária, nos entalhes em madeira, nos colares, nos grafismos. Torna-se contemporânea quando seus símbolos e modos de expressão se utilizam de recursos e ferramentas contemporâneas como quadros, telas, livros, espaços culturais", explica. "Quando acolhe influências de outras artes e se adequa a linguagens diversas."

Nesse sentido, Werá aponta que essas expressões artísticas colaboram "para um engajamento de causa" porque revelam "os arquétipos das culturas ancestrais com seus sentidos e propósitos".

Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/2021-o-ano-em-que-o-brasil-descobriu-a-arte-ind%C3%ADgena/a-60144439