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O Globo: Por 30 minutos, comando do Exército 'relembra momento cívico-militar' de 64
29 de março de 2019Bolsonaro,O Globo,1964,POLÍTICA HOJE,Militares,golpe militarcomando do planalto
Cerimônia no pátio do Comando Militar do Planalto contou com 350 oficiais; no Palácio da Alvorada, Bolsonaro participou de cerimônia
Vinicius Sassine, O Globo
BRASÍLIA - Atendendo à determinação do presidente Jair Bolsonaro, o Exército realizou nesta sexta-feira cerimônia para "rememorar" os 55 anos do golpe militar de 31 de março de 1964. O ato realizado no pátio do Comando Militar do Planalto começou às 8 horas e durou exatos 30 minutos. O golpe , nas palavras do mestre de cerimônias do evento, virou um “momento cívico-militar”. O aniversário do 31 de março foi “relembrado”, segundo as palavras usadas no evento.
O comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, e outras autoridades da Força participaram do ato, que contou com cerca de 350 militares, das mais diferentes unidades do Comando Militar do Planalto. Estavam representados o Batalhão da Guarda Presidencial, os Dragões da Independência, o Grupo de Artilharia de Campanha e o Batalhão de Polícia do Exército, entre outros.
Também na manhã desta sexta-feira, antes de cumprir agenda oficial, o presidente Jair Bolsonaro participou de uma cerimônia de hasteamento da bandeira no Palácio da Alvorada. O ato não consta na agenda do presidente.
No Comando Militar do Planalto, depois de receber Pujol para “relembrar o 55º aniversário do movimento cívico-militar de 31 de março de 1964”, os militares cantaram o hino nacional. Em seguida, foi feita a leitura, por uma mulher, da chamada ordem do dia, o texto escrito pelo ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, para relembrar o golpe de 64. O ministro não participou da cerimônia.
As tropas, então, entoaram a canção do Comando Militar do Planalto e desfilaram no pátio da unidade, acompanhados sempre de uma banda. A cerimônia foi encerrada ao fim do desfile.
O ato foi realizado mesmo com as recomendações do Ministério Público Federal (MPF) para que o golpe de 1964 não fosse comemorado. Pujol e os comandantes das outras Forças, Aeronáutica e Marinha, foram oficiados para que deixassem de comemorar ou homenagear o golpe. O mesmo ocorreu com os líderes de comandos e quartéis país afora. Depois da recomendação, Pujol alterou o termo escrito em sua agenda pública: saiu “solenidade comemorativa” e entrou “solenidade alusiva” a 64.
O texto do ministro da Defesa está publicado no site do ministério desde as 17 horas de quarta-feira. É assinado pelo ministro e pelos comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica. No documento, destinado aos comandantes de quartéis, a cúpula das Forças Armadas fala em "transição para uma democracia" no fim da ditadura, contrariando o tom adotado pelo próprio presidente em relação ao período de regime militar, entre 1964 e 1985.
"Em 1979, um pacto de pacificação foi configurado na Lei da Anistia e viabilizou a transição para uma democracia que se estabeleceu definitiva e enriquecida com os aprendizados daqueles tempos difíceis", cita a chamada ordem do dia prevista para esta sexta-feira, quando se completam 55 anos do golpe militar. "As lições aprendidas com a História foram transformadas em ensinamentos para as novas gerações. Como todo processo histórico, o período que se seguiu experimentou avanços", prossegue o texto.
Tom de "revanchismo"
Generais que receberam o texto assinado pelo ministro da Defesa e pelos comandantes das três Forças afirmam que o documento é marcado pela "sobriedade", por ter uma perspectiva "histórica" e por inexistir um tom de "revanchismo".
"As Forças Armadas participam da história da nossa gente, sempre alinhadas com as suas legítimas aspirações. O 31 de Março de 1964 foi um episódio simbólico dessa identificação, dando ensejo ao cumprimento da Constituição Federal de 1946, quando o Congresso Nacional, em 2 de abril, declarou a vacância do cargo de presidente da República e realizou, no dia 11, a eleição indireta do presidente Castello Branco, que tomou posse no dia 15", afirmam ministro e comandantes das Forças no primeiro parágrafo do texto, sem citar a movimentação de militares para derrubar o presidente João Goulart, que precedeu os atos do Congresso. "Enxergar o Brasil daquela época em perspectiva histórica nos oferece a oportunidade de constatar a verdade e, principalmente, de exercitar o maior ativo humano - a capacidade de aprender."
O texto faz um apanhado da "formação da nacionalidade" brasileira e cita a existência de "avanço de ideologias totalitárias" no mundo, no contexto das Guerras Mundiais. "Como faces de uma mesma moeda, tanto o comunismo quanto o nazifascismo passaram a constituir as principais ameaças à liberdade e à democracia. Contra esses radicalismos, o povo brasileiro teve que defender a democracia com seus cidadãos fardados", afirma a ordem do dia a ser lida na cerimônia pelo golpe de 64.
"A polarização provocada pela Guerra Fria, entre as democracias e o bloco comunista, afetou todas as regiões do globo, provocando conflitos de natureza revolucionária no continente americano, a partir da década de 1950", prossegue o documento. "O 31 de março de 1964 estava inserido no ambiente da Guerra Fria, que se refletia pelo mundo e penetrava no País. As famílias no Brasil estavam alarmadas e colocaram-se em marcha. Diante de um cenário de graves convulsões, foi interrompida a escalada em direção ao totalitarismo. As Forças Armadas, atendendo ao clamor da ampla maioria da população e da imprensa brasileira, assumiram o papel de estabilização daquele processo."
Depois de ocorrer uma "transição para uma democracia", a partir da Lei de Anistia, as Forças Armadas passaram a "acompanhar" as mudanças em curso, segundo o texto do ministro e dos comandantes. "Em estrita observância ao regramento democrático, vêm mantendo o foco na sua missão constitucional e subordinadas ao poder constitucional, com o propósito de manter a paz e a estabilidade, para que as pessoas possam construir suas vidas."
Exército, Marinha e Aeronáutica reconhecem, 55 anos depois, o papel de quem agiu "conforme os anseios da Nação Brasileira", afirma o texto. "Mais que isso, reafirmam o compromisso com a liberdade e a democracia, pelas quais têm lutado ao longo da História", conclui.
'Gravidade constitucional'
A determinação de Bolsonaro para que as Forças Armadas comemorem o golpe, o que depois o presidente chamou de “relembrar” , foi duramente criticada por MPF, Defensoria Pública da União e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Numa nota pública , a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), vinculada à Procuradoria-Geral da República (PGR), afirma que a defesa de crimes constitucionais e internacionais – como um golpe militar – pode se caracterizar um ato de improbidade administrativa.
Os procuradores federais dos Direitos do Cidadão afirmam "confiar" que as Forças Armadas e "demais autoridades militares e civis" deixarão de celebrar o golpe militar de 1964 e cumprirão seus "papéis constitucionais" na defesa do Estado Democrático de Direito. "Seria incompatível com a celebração de um golpe de Estado e de um regime marcado por gravíssimas violações aos direitos humanos."
Se a recomendação de Bolsonaro para que se comemore o golpe tem sentido de "festejar", trata-se de um ato de "enorme gravidade constitucional", conforme a PFDC. "O golpe de Estado de 1964, sem nenhuma possibilidade de dúvida ou de revisionismo histórico, foi um rompimento violento e antidemocrático da ordem constitucional. Se repetida nos tempos atuais, a conduta das forças militares e civis que promoveram o golpe seria caracterizada como crime inafiançável e imprescritível de atentado contra a ordem constitucional e o Estado Democrático previsto na Constituição."
O colegiado vinculado à PGR lembra que a Comissão Nacional da Verdade foi instituída por lei e seu relatório final, concluído no fim de 2014, é a versão oficial do Estado sobre o que aconteceu nos 21 anos de ditadura militar. "Nenhuma autoridade pública, sem fundamentos sólidos e transparentes, pode investir contra as conclusões da comissão, dado o seu caráter oficial", diz a nota da PFDC.
Agentes da ditadura mataram ou fizeram desaparecer 434 opositores do regime e 8 mil indígenas, como cita a PFDC. Entre 30 mil e 50 mil pessoas foram presas ilicitamente e torturadas, afirma o colegiado. "Esses crimes bárbaros (execução sumária, desaparecimento forçado de pessoas, extermínio de povos indígenas, torturas e violações sexuais) foram perpetrados de modo sistemático e como meio de perseguição social. Não foram excessos ou abusos cometidos por alguns insubordinados, mas sim uma política de governo, decidida nos mais altos escalões militares, inclusive com a participação dos presidentes da República.”
Elena Landau: O Santo Guerreiro contra o Dragão da Maldade
29 de março de 2019O Estado de S. Paulo,Bolsonaro,POLÍTICA HOJE,elena landaugoverno bolsonaro
Este governo escolheu o confronto: nós os virtuosos, contra eles, os corruptos
Uma briga que começou sem ninguém entender bem o porquê escalou para uma grave crise entre Executivo e Congresso. Antes disso a expectativa era de aprovação da reforma da Previdência ainda este semestre e a Bolsa chegou aos 100 mil pontos refletindo o otimismo.
Nem mesmo a pesquisa Ibope quebrou o clima do mercado. Mas deve ter mexido com o núcleo próximo ao presidente. Só a tentativa de reverter os baixos índices de aprovação, radicalizando na pauta que o elegeu, poderia explicar a operação política que se seguiu.
Bolsonaro elegeu Maia como inimigo público número 1, o representante da velha política, e se negou a fazer uma articulação política para a aprovação da reforma. Sua missão teria se encerrado com a ida ao Parlamento para a entrega da PEC 06/2019. De fato, esse gesto do presidente foi simbólico e importante. O erro é imaginar que seu papel acaba ali. Formar uma base parlamentar é parte do jogo democrático, não há governo possível sem o Congresso, na velha ou na nova política. A forma de se obter essa base, e apoio para suas reformas, pode, e deve, ser diferente do presidencialismo de cooptação. O resultado das urnas já havia revelado o esgotamento das práticas do passado com forte votação contra os partidos que governaram o País desde a redemocratização.
Este governo escolheu o confronto: nós os virtuosos, contra eles, os corruptos. Já vimos isso antes, nada de novo na Nova Política. Bolsonaro não tem o monopólio da virtude como ele quer fazer crer. Tem também seus telhados de vidro; em casa e no ministério.
O Olavo, o guru, e seguidores fanáticos contribuíram para acirrar os ânimos, partindo para a defesa de uma democracia direta. Esquecem que, por aqui, quem tentou governar sem o Congresso não terminou o mandato.
Com um contorcionismo narrativo, os bolsonaristas tentam dar racionalidade a essa trajetória desastrosa. Alegam que é uma legítima estratégia para acabar com o toma lá dá cá que, segundo o presidente, é a única forma de negociação que o Congresso aceita fazer.
Seus anos na Câmara provavelmente dão suporte a essa visão. Mas assim como deve ter visto muitas dessas transações, sem denunciá-las, com certeza presenciou articulações políticas legítimas para aprovação de projetos essenciais para o País, como aconteceu no Plano Real 25 anos atrás. O economista Edmar Bacha, até ganhou o apelido de senador de tanto frequentar o Congresso atendendo a pedidos de esclarecimentos dos parlamentares sobre a transição para a nova moeda. Governar numa democracia dá trabalho mesmo.
O confronto não é a resposta aos equívocos do passado. Ao ignorar a grande renovação ocorrida no Congresso, tratando todos como chantagistas, Bolsonaro apenas reafirma seu desprezo pela política. Nem seu partido recebe alguma consideração. Nem mesmo os jovens que chegam merecem o benefício da dúvida. São todos mal-intencionados.
O astrólogo, sem cargo no governo, tem mais influência que o Parlamento. Sobrou até para os militares, que surpreendentemente dão o tom de ponderação. Nem sequer a convocação para a celebração do dia 31 de março, quando o golpe completa 55 anos, encontrou apoio entre eles. Alguma coisa está fora de ordem. O tiro saiu pela culatra e a sociedade reagiu revivendo tenebrosas histórias de tortura e provocando atos de repúdio. A inabilidade lembra muito a chamada de Collor para que a população saísse às ruas de verde e amarelo. A pá de cal de seu governo. Por que Bolsonaro resolveu reviver um tema tão sensível só ele sabe. Mas não surpreende vindo de alguém que faz elogios a Stroessner e Pinochet.
O currículo de Bolsonaro sugere que não se trata de algo calculado, mas que é despreparo mesmo. Foram 27 anos de apagada vida parlamentar, cujos destaques foram homenagens ao torturador Brilhante Ustra e a briguinha pessoal com Jean Wyllis. O Messias liberou um grito conservador da sociedade e se qualificou para a corrida presidencial. Ninguém estava interessado em sua pauta econômica, nem ele. Bolsonaro nunca prometeu nada diferente do que está fazendo hoje. Não há razão para perplexidade com seu governo.
A resposta da Câmara também não foi boa. A irresponsabilidade em recuperar pautas que podem agravar ainda mais a crise fiscal, acaba reforçando o discurso do presidente. Enquanto isso, a sociedade fica espremida no meio da luta do rochedo contra o mar. Sem reformas, a conta vai sobrar para todos nós.
Em tempo: quando terminei a coluna ontem, os bombeiros haviam entrado em campo, mas com esse governo nunca se sabe o dia de amanhã. Não se trata de uma crise conjuntural.
*Economista e advogada
Monica De Bolle: O golpe
29 de março de 2019Bolsonaro,1964,POLÍTICA HOJE,Monica de Bolle,Militaresgolpe militar
Quem constituía as principais ameaças aos valores tradicionais e conservadores do país nos anos 60? Ora, os sindicatos, os intelectuais, os estudantes universitários e seus professores, alguns jornalistas.
O Golpe “Durante o fim de semana os urubus enfiaram-se pelas varandas da casa presidencial, desfizeram à bicada as redes de arame das janelas e remexeram com as asas o tempo estancado no interior e na madrugada de segunda-feira a cidade acordou do seu letargo de séculos com uma morna e mole brisa de morto grande e de apodrecida grandeza.”
Tinha o ditador sem nome de Gabriel García Márquez algo entre 107 e 232 anos, era doente e analfabeto e vivia em meio à decrepitude. Seus ministros, não os consultava para nada — à exceção do ministro da Saúde, por ser seu médico pessoal. A narrativa desvela um dos temas mais caros ao escritor colombiano: a solidão — em especial, a solidão do poder. Desvela também traições e vinganças, fraudes e mentiras, numa alegoria do autoritarismo na América Latina.
O outono do patriarca é obra lírica e densa, além de rico retrato das ditaduras latino-americanas. Eu pretendia utilizar o livro como gancho para um artigo sobre a Colômbia e a Venezuela, mais eis que vejo o presidente do Brasil exortar o ocorrido em 1964 e o ministro das Relações Exteriores declarar que não houve golpe naquele ano fatídico, mas sim um “movimento necessário para que o Brasil não se tornasse uma ditadura”. Ou seja, o ministro Ernesto não tem a menor dúvida de que uma ditadura se instalou no Brasil justamente para evitar uma ditadura. Fui atrás do ano em que nasceu o ministro — 1967, um ano antes do AI-5 e das atrocidades que seriam cometidas pela ditadura em nome de evitar a ditadura. Entendo que era Ernesto um bebê, uma criança, durante os Anos de Chumbo que marcaram o fim dos anos 60 e o início dos anos 70. Contudo, isso não o redime. Eu não era nascida em 1968 e considero o que ocorreu no Brasil em 1964 um golpe, gravíssimo atentado contra a democracia, derrocada dos direitos humanos. Estou bem longe de ser a única.
Resolvi reler a obra clássica de Thomas Skidmore, The politics of military rule in Brazil, 1964-1985. Para início de conversa — como muitos sabem —, o golpe ocorreu em 1º de abril, não em 31 de março. Antes tivesse sido mesmo mentira, como Bolsonaro e seu séquito de devotos alienados tentam empurrar goela abaixo do povo brasileiro. O fato é que, em 1963, estavam os militares e partes da sociedade civil convencidos de que o país caminhava para o socialismo que liquidaria os valores tradicionais da população.
Qualquer eco de marxismo cultural e ideologia de gênero — as modernidades introduzidas para refletir as velhas ideias de mais de cinco décadas atrás — não é mera coincidência. Bolsonaro e seu ministro das Relações Exteriores antiglobalista; Bolsonaro e seu ministro da Educação que quer expurgar o tal do marxismo cultural; Bolsonaro e sua ministra dos Direitos Humanos que ataca os movimentos feministas. Todos esses são exemplos do atavismo que tem o atual governo em relação a muito do que se passou no Brasil nos anos 60.
Em 1961, militares e partes da sociedade civil depositaram suas esperanças em Jânio Quadros, que com seu varre, varre, vassourinha representava a cruzada moral contra políticos inescrupulosos e corruptos — a corrupção não foi inventada pelo PT, que surpresa. Quadros, entretanto, era sujeito instável e dado a excentricidades. Não demorou para que perdesse prestígio, sobretudo ao decidir enfrentar o Congresso e acusá-lo de obstruir sua agenda legislativa. Não soa familiar por acaso.
Jânio Quadros renunciou, permitindo a ascensão de seu vice, João Goulart, do PTB, tratado com escárnio e desconfiança pela UDN de Carlos Lacerda e pelos próprios militares. A visita de João Goulart à China não ajudou a eliminar as teorias conspiratórias que acometiam os militares e seus apoiadores. Goulart foi acusado de ter cedido posições estratégicas no governo a “agentes do comunismo internacional”, e temia-se que ele pudesse infiltrar nas Forças Armadas “milícias comunistas”. Convencidos de que o Brasil caminhava inexoravelmente para um regime destrutivo em todos os aspectos, os militares entraram em ação. Houve o golpe. Golpe. Não movimento ou revolução.
Comemorar o golpe é uma afronta, uma obscenidade. Negar o golpe é, nas palavras de García Márquez, entrar “no automóvel fúnebre do progresso dentro da ordem, a limusina sonâmbula do primeiro século de paz, todos em bom estado sob a teia de aranha poeirenta e todos pintados com as cores da bandeira”. Vivemos o outono do Brasil.
*Monica De Bolle é diretora de estudos latino-americanos e mercados emergentes da Johns Hopkins University e pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics
Os comunistas e o golpe de 1964 / Declaração de maio 1965 do PCB
29 de março de 2019fap,democracia,política,PCB,POLÍTICA HOJE100 anos PCB
A defesa das liberdades democráticas constitui o elo principal dessa luta. Inseparável de todas as demais reivindicações constitui, por isso mesmo, a mais ampla e mobilizadora, capaz de unificar e canalizar todos os movimentos reivindicatórios para a ampla frente de combate à ditadura
Declaração de maio 1965 do PCB
(Voz Operária, Suplemento Especial, Resolução Política do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro, maio de 1965)
Resolução Política do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro
O CC do Partido Comunista Brasileiro se reuniu no corrente mês de maio e, tomando por base o informe apresentado pela CE, fez uma análise da situação internacional, da situação nacional e da atividade do Partido, no período decorrido desde sua ultima reunião.
Assinala-se nesse período, com o acontecimento marcante, o golpe militar reacionário de 1 de abril do ano passado, com a conseqüente deposição do presidente João Goulart e a instauração, no País, de uma ditadura reacionária e entreguista. Interrompeu-se assim, o processo democrático em desenvolvimento. As forças patrióticas e democráticas e, em particular, o movimento operário e sua vanguarda – nosso Partido - sofreram sério revés. Modificou-se profundamente a situação política nacional.
As conclusões a que chegou o CC, após os debates, estão contidas na seguinte resolução:
1. As lutas do povo brasileiro desenvolvem-se num quadro de uma situação internacional caracterizada pelo fortalecimento das posições do socialismo, pelo Ascenso do movimento nacional-libertador e do movimento operário internacional, pelo crescimento das forças empenhadas na preservação e consolidação da paz mundial.
A política de paz realizada pela União Soviética e demais países socialistas, apoiada em seu avanço econômico, técnico e científico e inspirada no princípio da coexistência pacífica, penetra cada vez mais fundo na consciência de todos os povos. Desenvolve-se com vigor o movimento de emancipação nacional da Ásia, África e América Latina.
A conjuntura econômica dos países capitalistas mais desenvolvidos mantém-se, em geral, em ascenso. Aumenta o interesse, no campo capitalista, pela intensificação das relações econômicas com os países do campo socialista, o que amplia as condições objetivas da política de coexistência pacífica. Mas, simultaneamente, e em conseqüência também do continuado agravamento da crise geral do capitalismo, aguçam-se as contradições interimperialistas, que se manifestam especialmente na disputa de mercado e se refletem, com maior destaque, em posições assumidas pelo governo francês em sua política externa.
É nessa situação que o imperialismo, particularmente o norte-americano, intensifica suas atividades em diferentes regiões do mundo, empreendendo atos de agressão contra os povos que lutam pela libertação nacional. A situação internacional se agrava sensivelmente.
A intervenção no Congo por parte das forças ianques e belgas; a repressão da ditadura portuguesa às lutas do povo de Angola; a intervenção da Grã-Bretanha na Guiana Inglesa; as provocações da República Federal Alemã em torno de Berlim e a tentativa de organizar a Força Atômica Multilateral e criar um cinturão atômico nas fronteiras dos países socialistas – todas essas medidas constituem não apenas violações dos direitos dos povos, mas também novas ameaças à paz mundial.
Ante a firme resistência do povo do Vietnã do Sul, dirigido pela Frente Nacional de Libertação (Vietmin), o governo de Washington estende a sua agressão ao Laos e ao Camboja, bombardeia o território da República Democrática do Vietnã (Vietnã do Norte), ataca sua marinha mercante e de guerra. Para sufocar a luta do povo dominicano contra a reação e para defender os interesses dos monopólios ianques, desembarca tropas na República de São Domingos, utilizando a OEA para dar cobertura a essa monstruosa agressão.
A intensificação da agressividade do imperialismo norte americano expressa a orientação da chamada “doutrina Johnson” de esmagamento pela força dos movimentos democráticos e de libertação nacional. E tem também o objetivo de provocar guerras locais e limitadas, para impedir a distensão internacional, atendendo aos interesses dos círculos mais agressivos de Wall Stret e do Pentágono. Tais ações despertam, entretanto, os protestos e a revolta dos povos do mundo inteiro, inclusive do povo dos Estados Unidos. Contribuindo, assim, de um lado, para sério agravamento da situação internacional, concorrem de outro lado, para desmascarar cada vez mais o imperialismo norte-americano como opressor e explorador dos povos, como inimigo da paz, despertando novas forças para a luta em defesa dos povos oprimidos e contra as ameaças de nova guerra mundial.
Na América Latina, torna-se cada vez mais evidente o contraste entre a situação do povo cubano que, sob a direção de Fidel Castro, prossegue na construção vitoriosa da sociedade socialista, e a dos demais povos latino-americanos, que padecem sob a crescente exploração dos monopólios ianques.
Aumenta a miséria das massas trabalhadoras, aguça-se a crise de estrutura e crescem as contradições entre as forças progressistas de cada país e os monopólios norte-americanos. Em alguns países como Venezuela, Colômbia, Guatemala e São Domingos, as lutas antiimperialistas tomam a forma de luta armada. Os Estados Unidos, prosseguindo, embora, na política da “Aliança para o Progresso”, que visa em parte à realização de reformas limitadas em benefício das burguesias locais, não vacilam em intervir diretamente pela força, ou provocar golpes reacionários e apoiar governos ditatoriais, para assegurar e consolidar seu domínio espoliador. De março de 1962 para cá em sete países – Argentina, Peru, Guatemala, Equador, São Domingos, Honduras e Bolívia - além do Brasil, foram dados golpes de Estado, sob a orientação e com apoio do governo de Washington.
Nada disso impede, entretanto, que os povos da América Latina continuem avançando no caminho da democracia e da emancipação nacional. Na Argentina, os comunistas reconquistaram o direito de organizar-se e propagar suas idéias. O governo do Chile estabeleceu relações diplomáticas com a União Soviética e outros países socialistas. O México mantém relações com Cuba, apesar da resolução em contrário da OEA. Entre as amplas massas, cresce o ódio ao imperialismo ianque e a determinação de lutar contra a reação interna. Na medida em que se unam e lutem, na medida em que fortaleçam sua solidariedade e sua ação conjunta contra o inimigo comum, os povos latino americanos serão tão invencíveis como o heróico povo irmão de Cuba, glória e exemplo para toda a América Latina.
2 – No Brasil, com de 1 de abril, assenhorearam-se do poder os representantes das forças mais retrógradas e antinacionais: agentes do imperialismo norte-americano, latifúndios e grandes capitalistas ligados aos monopólios ianques. Constituiu-se uma ditadura militar, reacionária e entreguista, sendo o governo de fato exercido por um grupo de generais a serviço da Embaixada dos Estados Unidos.
A submissão do país aos interesses dos monopólios norte-americanos assume proporções jamais vistas. Foi praticamente abolida a lei que limitava a remessa de lucros para o exterior. Realizou-se a negociata da compra do acervo da Bond and Share. Duplicou-se o montante do “Acordo do Trigo” com os Estados Unidos. Facilita-se a importação de produtos agrícolas norte-americanos. Adotou-se uma política de minérios de acordo com as exigências da Hanna Mining Co. Foi assinado o “Acordo sobre Garantias de Investimentos Privados”, que concede privilégios aos interesses norte-americanos e constitui sério atentado à soberania nacional. Missão militar ianque faz o levantamento aerofotogramétrico de nosso território. A política econômica e financeira é ditada pelo FMI.
A ditadura leva à prática uma política de inteira dependência ao governo dos Estados Unidos. Rompe relações com Cuba. Serve de instrumento e porta voz do Departamento de Estado na OEA. Toma posições contra os povos que lutam contra o imperialismo na Ásia e na África. Apóia a tirania de Salazar. Solidariza-se com a agressão ianque à República Democrática do Vietnã e com o brutal atentado à soberania do povo de São Domingos. Permite, sob o pretexto da realização de experiências científicas, a construção de base para foguetes e armas nucleares em território nacional.
Após as violências e arbitrariedades resultantes da aplicação do Ato Institucional, inclusive a mutilação do Congresso Nacional e de Assembléias Estaduais, prosseguem os inquéritos policiais-militares, com o objetivo de perseguir, prender e torturar milhares de cidadãos, desde trabalhadores e jovens estudantes até professores, magistrados, escritores, artistas, jornalistas, militares, padres católicos, parlamentares, pessoas, enfim, de todas as classes e camadas sociais. Sindicatos de trabalhadores continuam sob intervenção. É aprovada uma lei contra o direito de greve. Impede-se o livre funcionamento da Une e demais entidades estudantis.
Maiores sofrimentos e privações são impostos aos trabalhadores e a todo o povo. Elevam-se os impostos indiretos. Libera-se o preço dos produtos essenciais a alimentação popular. Nova lei do inquilinato determina a majoração dos aluguéis. Enquanto a carestia aumenta sem cessar, o reajustamento dos salários dos operários e dos vencimentos do funcionalismo público é contido em nível inferior ao da elevação dos preços. O salário mínimo subiu em apenas 57%, num período em que o custo de vida se elevou em mais de 90%. Aumenta o desemprego.
A política econômico financeira da ditadura também atinge os interesses da burguesia nacional, cada dia mais ameaçada pela concorrência imperialista. Reduzem-se as atividades comerciais e industriais. Acumulam-se os estoques nas fábricas. Cai a produção. As concordatas e falências aumentam em número e valor. Acentua-se o processo de desnacionalização da indústria brasileira.
A política da ditadura torna mais aguda as contradições que dividem a sociedade brasileira. Acentua-se a premência das reformas de estrutura.
Numa tentativa de ludibriar a Nação, a ditadura se mascara de reformista e chega a apresentar-se como revolucionária. Procura impingir como reforma agrária um “Estatuto da Terra” que, com exceção dos dispositivos limitadores da taxa de arrendamento – aliás, de difícil aplicação – não passa de um plano de colonização. Sua “reforma política” possui conteúdo nitidamente reacionário. Os projetos da Lei Eleitoral e de Estatuto dos Partidos Políticos visam de fato reduzir o número e impedir a organização de partidos políticos, transformam os partidos em organizações burocráticas subordinadas ao aparelho de Estado, ameaçam a representação proporcional, tornam praticamente impossível a representação das minorias. A exigência de maioria absoluta nas eleições para presidente da República e governadores de Estado golpeia o voto popular direto, transferindo para o Congresso e as Assembléias estaduais a escolha final dos eleitos.
Os interesses nacionais exigem a concretização de reformas efetivas na estrutura da sociedade brasileira que golpeiem o domínio do imperialismo sobre nossa economia e o domínio da propriedade da terra pelos latifundiários. A ditadura, que representa exatamente os interesses do latifúndio e dos monopólios imperialistas norte-americanos, não realizará essas reformas.
A política da ditadura fere os interesses da Nação. Aprofunda-se a contradição entre nosso povo e a minoria reacionária e entreguista que assaltou o poder. Essa contradição constitui, no momento, a expressão peculiar da contradição principal da sociedade brasileira, define a essência de todos os conflitos políticos, sobre eles atuando como fator determinante.
4. Começam a se ampliar e aprofundar as manifestações de resistência à ditadura e de oposição à sua política reacionária e entreguista.
Lutam os trabalhadores chegando a utilizar a arma da greve, em defesa de direitos conquistados e contra a redução de salários. Reativa-se no campo, embora lentamente, o movimento de sindicalização surge choques com os grileiros e as forças policiais, conflitos entre os assalariados do açúcar e os usineiros do Nordeste. Os estudantes se insurgem contra a lei 4464, em defesa da autonomia do movimento estudantil, na UNE, e das suas demais entidades. Os intelectuais se arregimentam contra o terror cultural e para exigir a restauração das liberdades democráticas e a retomada do desenvolvimento econômico do País. Amplos setores da burguesia nacional, principalmente através de entidades como a Confederação Nacional da Indústria, exigem modificações nos pontos básicos da política econômica e financeira, denunciam a desnacionalização da nossa indústria. Avoluma-se o repúdio da opinião pública às violências e arbitrariedades da polícia e dos encarregados dos inquéritos policiais-militares. Há manifestações do poder judiciário de condenação à essas violências e arbitrariedades, presos políticos são libertados. Partidos e correntes políticas se unem em torno da exigência de restabelecimento das liberdades democráticas e de realização de eleições livres.
Amplos setores sociais, que manifestaram apoio ou simpatia ao golpe, sentem-se ludibriados e prejudicados pela política reacionária e entreguista da ditadura, tendem a unir-se aos que a ela se opõem. Modifica-se, a favor das forças democráticas e patrióticas, a conjuntura que, em abril de 1964, favoreceu a reação e possibilitou a vitória dos golpistas. Estreita-se a base social da ditadura.
Essa situação leva ao aguçamento das contradições entre os golpistas e a instabilidade do governo. Insiste o Sr Castelo Branco em suas medidas de institucionalização da ditadura, procurando oculta-la através da fachada da “democracia representativa”. Mas persiste a pressão dos grupos da extrema direita no sentido da suspensão total dos direitos e garantias constitucionais, pela instauração de uma ditadura sem máscara. Apoiando embora, no essencial, a orientação reacionária e entreguista da ditadura, outros setores golpistas assumem posição de crítica à sua política econômico-financeira, procurando assim, capitalizar em seu benefício, para fins eleitorais o crescente descontentamento popular.
A intensificação da resistência e oposição de nosso povo à ditadura levará a que a sua instabilidade aumente, aprofundará a divisão entre os golpistas. Crises de governo e novos golpes militares podem ocorrer. Nesse caso, só a intervenção ativa das massas nos acontecimentos, levantando suas próprias bandeiras de luta, poderá impedir uma solução reacionária, com a simples substituição de golpistas no poder, e impor a retomada do processo democrático.
5. Desde o início, os comunistas se colocaram em posição e combate à ditadura. Através de entendimentos com partidos, correntes políticas e com personalidades, e, principalmente, através de nossas ações entre as massas, temos procurado participar ativamente do agrupamento das forças que contra ela lutam. Os fatos comprovam que este é o caminho acertado.
O objetivo tático imediato a alcançar, nessa luta, é isolar e derrotar a ditadura e conquistar um governo amplamente representativo das forças antiditatoriais, que assegure as liberdades para o povo e garanta a retomada do processo democrático interrompido pelo golpe reacionário e entreguista. Os comunistas se empenham no sentido de que tal governo seja o mais avançado possível, mas compreendem que a sua composição não poderá deixar de refletir o nível alcançado pelo movimento de massas e a correlação de forças existente no momento em que se constituir.
O êxito dessa luta dependerá fundamentalmente da unidade de ação de todas as forças, correntes e setores políticos que se opõem à ditadura. A formação dessa ampla frente de resistência, oposição e combate à ditadura será possível através da luta pelas liberdades democráticas, em defesa da soberania nacional, pelos direitos e interesses imediatos dos trabalhadores e do povo, pelo desenvolvimento de nossa economia, pelo progresso do País. A defesa das liberdades democráticas constitui o elo principal dessa luta. Inseparável de todas as demais reivindicações constitui, por isso mesmo, a mais ampla e mobilizadora, capaz de unificar e canalizar todos os movimentos reivindicatórios para a ampla frente de combate à ditadura.
6. Nas circunstâncias atuais, a luta por eleições livres e nossa participação ativa em todas as campanhas eleitorais se revestem de enorme importância para fazer avançar as lutas pelas liberdades democráticas e pela conquista de um novo governo. Com essa compreensão é que devemos participar das eleições estaduais deste ano, das eleições estaduais e federais de 1966, além das que se realizam nos municípios. Particular importância possui os pleitos eleitorais em Estados como Guanabara, Minas Gerais, Goiás e Paraná, bem como as eleições municipais de Porto Alegre.
Ao participar ativamente das campanhas eleitorais, devem os comunistas ter em vista que elas se tornem, no processo de sua realização, um meio para aglutinar forças contra a ditadura, desmascará-la diante das massas, conquistar postos que sirvam para combatê-la e, afinal, derrotá-la. É, portanto, do interesse do proletariado e demais forças contrárias à ditadura lutar por eleições efetivamente livres, exigir a livre manifestação de todas as correntes políticas de oposição e o exercício do direito de propaganda sem censura, bem como lutar contra todas as discriminações políticas e ideológicas, oriundas do Ato Institucional ou de novas leis sobre incompatibilidades ou inelegibilidades, por maio das quais pretenda a ditadura riscar arbitrariamente, da lista de possíveis candidatos, todos os cidadãos que não mereçam sua confiança.
Os comunistas devem lançar-se com decisão e entusiasmo à campanha eleitoral do Estado e do município em que atuem, e cogitar, do desde logo do pleito de 1966, para o qual já se movimentam as várias correntes políticas. Devem ser o elemento unificador por excelência, capaz de encontrar, em cada caso concreto, a melhor maneira de unir as mais amplas forças contrárias à ditadura em torno de plataformas unitárias e de candidatos que mereçam a confiança popular.
É essencial dar à campanha eleitoral um caráter de massas, de luta firme pelas liberdades democráticas, de maneira a não permitir à ditadura utilizar-se das eleições para “legalizar” o poder usurpado. Nos casos em que este objetivo se tornar praticamente inviável, podem as forças de oposição à ditadura adotar o voto em branco, como meio de protesto contra a transformação do pleito numa farsa destinada a acobertar com uma espúria “legalidade” o governo do golpe de 1 de abril.
É fazendo da campanha eleitoral uma campanha de massas que será possível assegurar a realização de eleições livres e a posse dos eleitos e criar condições políticas para que possam governar.
7. No desenvolvimento da luta contra a ditadura, devemos utilizar as mais variadas formas. Cabe aos comunistas saber estimular a iniciativa das massas e encorajar a luta por todos os caminhos que favoreçam a retomada do processo democrático. Para tanto, devem ser utilizadas todas possibilidades legais, sem que isso se reduza à “legalidade” concedida pela ditadura. As massas devem ser estimuladas a não aceitar as restrições da ditadura aos seus direitos de reunião, de greve, de manifestação pública, de propaganda, etc. O ascenso das lutas poderá levar a choques violentos com a reação, inclusive a choques armados. É dever do Partido preparar-se e preparar as massas para tais eventualidades.
O esforço principal dos comunistas deve intensificar-se na intensificação do trabalho entre as massas, na defesa do fortalecimento de suas organizações, na organização e desencadeamento das lutas pelos seus direitos e reivindicações.
Seja qual for a forma que a luta contra a ditadura venha a assumir, a ação das massas constituirá sempre um fator decisivo, capaz de assegurar o avanço do processo político de acordo com os interesses do povo. É através da ação que o povo ganhará confiança em suas próprias forças. Através da ação é sempre possível alcançar êxitos parciais, por pior que seja a reação, êxitos que ajudarão a encorajar as próprias massas a reforçar suas organizações, estreitar sua unidade e avançar para ações cada vez mais vigorosas. É deve dos comunistas saber colocar-se no nível de compreensão das massas, para levá-las à ação e ganhá-las para as posições políticas de vanguarda.
A passividade frente à ditadura é o grande perigo que ameaça as forças populares e o nosso Partido. É nosso dever combatê-la, tendo em vista que decorre tanto da superestimação das forças dos golpistas, como das ilusões de que a ditadura caia por si mesma, minada pelas contradições que a dividem. È necessário compreender que nossa intervenção em qualquer crise de governo só poderá ter resultado positivo na medida em que formos capazes de mobilizar massas. Isso significa que devemos ser vigilantes, saber acompanhar os acontecimentos, mas que o mais importante, o premente, o decisivo é o nosso trabalho de massas, nosso esforço constante para nos ligarmos às massas, esclarecê-las, despertá-las, mobilizá-las para a ação, organizá-las e uni-las.
8. A fim de ganhar as massas para a ação, é indispensável saber levantar as reivindicações mais sentidas de cada setor da população. Devemos intensificar as lutas pela revogação do Ato Institucional, a anulação aos atentados aos direitos individuais resultantes de sua aplicação, pela libertação dos presos políticos, pela solidariedade aos perseguidos e suas famílias, pela anistia geral, pela liberdade e autonomia para os sindicatos de trabalhadores, entidades estudantis e demais organizações populares; contra o terror cultural, pela liberdade de cátedra.
Outro elemento mobilizador de massas é a luta contra a política econômico-financeira da ditadura, política de carestia, de elevação de impostos, de desvalorização forçada do cruzeiro em relação ao dólar, de redução do salário real. Devemos ter a maior iniciativa junto a outras forças e lutar por melhores condições de vida para os trabalhadores, contra a carestia e o desemprego, em defesa dos direitos conquistados, a legislação do trabalho e da previdência social. Participar de forma ativa e unitária das eleições sindicais e procurando, ao mesmo tempo, organizar os trabalhadores nos locais de trabalho.
Importância particular tem as lutas das grandes massas trabalhadoras do campo contra a exploração do latifúndio e pela reforma agrária, por suas conquistas e reivindicações imediatas, especialmente pela aplicação do Estatuto do Trabalhador Rural, garantia ao acesso e à posse da terra, regulamentação e baixa da taxa de arrendamento.
Devemos dar maior atenção às reivindicações específicas das mulheres. É de grande valor sua participação na luta em defesa da paz, contra a carestia, pelas liberdades democráticas, pela solidariedade aos presos e perseguidos políticos, pela anistia.
Merece todo apoio a luta do funcionalismo público e autárquico em defesa dos seus direitos e reivindicações, em especial o reajustamento de vencimentos.
A política entreguista da ditadura fere os sentimentos patrióticos das mais amplas camadas do nosso povo, que poderá ser mobilizado para a luta em defesa da soberania nacional, contra as concessões aos monopólios norte –americanos e à submissão do Brasil ao governo de Washington, contra ratificação pelo Congresso do Acordo sobre Garantia dos Investimentos Privados. As sérias ameaças que pesam sobre as empresas estatais, em particular a Petrobrás, possibilitam ampla mobilização de massas em sua defesa.
A luta pelo progresso do País, contra a política econômico-financeira que desnacionaliza a indústria nacional, que leva à estagnação econômica, que nega recursos às obras públicas, ao desenvolvimento econômico do Nordeste (SUDENE) e do Norte (SPEVEA), à instrução do povo e ao desenvolvimento cultural, à pesquisa científica – permitirá a mobilização de amplos setores da população.
Por sua vez, a agressão militar dos Estados Unidos no Vietnam e, agora à República de São Domingos exige que se intensifique a luta pela paz, contra a política de guerra do governo norte-americano, pela autodeterminação dos povos, pela solidariedade aos povos agredidos, contra o envio de soldados brasileiros para o exterior. É dever dos comunistas encontrar formas novas que permitam na atual situação reorganizar e ampliar a luta pela paz em nosso País. A luta permanente pela solidariedade ao povo cubano e pelo restabelecimento com o governo de Cuba deve ser intensificada com a realização do Congresso Latino-Americano de Solidariedade à Cuba e pela libertação dos povos.
9. ´E intensificando nossa atividade entre as massas, nas fábricas, fazendas e escolas, nas grandes concentrações populares, que poderemos forjar a ampla frente única de luta contra a ditadura. Dando especial atenção à formação da frente única pela base, devemos realizar entendimentos com personalidades, correntes e partidos políticos, com todos os que se opõem às forças reacionárias que usurpam o poder.
À medida que aumenta a instabilidade da ditadura, que cresce a ação das massas populares, as várias forças políticas, na defesa de seus interesses, cuidam do futuro imediato e da eventualidade da substituição do governo, procurando o caminho a ser trilhado de acordo com os objetivos de cada um. Como representantes do proletariado, devemos apresentar nossa própria visão tática, buscando ganhar para ela as forças aliadas.
Ao mesmo tempo em que intensificam a luta pela derrota da ditadura e a conquista de um governo representativo das forças que a ela se opõem, têm os comunistas como perspectivas a conquista de um governo nacionalista e democrático, capaz de iniciar e levar adiante as reformas de estrutura, aproximando nosso povo dos objetivos da atual etapa da revolução brasileira. É com essa perspectiva que os comunistas se colocam à frente das massas, indicando o caminho que conduz à solução dos problemas brasileiros e se empenhando para que o proletariado, através do fortalecimento da sua unidade e organização e da aliança com os trabalhadores do campo, passe a exercer papel hegemônico no processo revolucionário.
10 Ao examinar a situação do Partido e os novos problemas que devemos agora enfrentar, o CC coloca em primeiro lugar a necessidade de levar adiante e aprofundar o processo autocrítico em que nos encontramos e que deve ser coroado com a realização do VI Congresso.
O CC saúda a preocupação crítica e autocrítica que se manifestou em todo o Partido em busca dos nossos erros e das causas que contribuíram para o revés sofrido, preocupação em que vê saudável espírito revolucionário de amor ao Partido e de ardente aspiração pela elevação do nível ideológico de suas fileiras.
A fim de estimular esse processo autocrítico, damos conhecimento ao Partido das principais conclusões a que pôde até agora chegar o CC, na análise que fez dos acontecimentos relacionados com a vitória do golpe de 1 de Abril, a respeito das falhas e erros da atividade dos comunistas.
A vitória do golpe militar pôs à descoberto muitas de nossas mais sérias debilidades. Fomos colhidos de surpresa pelo desfecho dos acontecimentos e despreparados não apenas para enfrentá-los, como também para prosseguir com segurança e eficiência em nossa atividade nas novas condições criadas no País. Revelou-se falsa a confiança depositada no “dispositivo militar” de Goulart. Também falsa era a perspectiva, que então apresentávamos ao Partido e às massas, de uma vitória fácil e imediata. Nossas ilusões de classe, nosso reboquismo em relação ao setor da burguesia nacional que estava no Poder, tornaram-se evidentes. Cabe-nos analisar o processo que nos levou à semelhante situação.
Resultado de uma árdua batalha política e ideológica, a linha aprovada pelo V Congresso constituiu-se em poderoso instrumento revolucionário que permitiu ao Partido estreitar suas ligações com as massas e participar ativamente da vida política, contribuindo de tal maneira para o avanço do processo revolucionário que contra nosso Partido se levantaram raivosos os inimigos da revolução. Mas, desde a posse de Goulart, que se deu como resultado de um compromisso da burguesia nacional com as forças reacionárias, preocupados em lutar contra a conciliação começamos a nos afastar da linha política. Esse processo culminou nos últimos meses do governo Goulart, quando de fato abandonamos a luta pela justa aplicação da linha.
Era sem dúvida indispensável combater com firmeza a política de conciliação. Foi justa nossa posição contra o Plano Trienal e contra a negociata de Bond and Share. E foi devido à luta contra a política de conciliação que fracassaram as tentativas reacionárias de abril e outubro de 1963, quando Goulart pretendia, a pretexto de atacar a direita, tomar medidas para conter o avanço do movimento popular. Conduzimos, entretanto, a luta contra a conciliação de forma inadequada.
Nossa atividade em relação ao governo de Goulart era orientada, na prática, como se sua política fosse inteiramente negativa. Desprezávamos seus aspectos positivos de grande importância, como, em sua política externa, a defesa da paz, da autodeterminação dos povos, do princípio de não intervenção, o desenvolvimento das relações diplomáticas e comerciais com os países socialistas, e, sua política interna relativo respeito às liberdades democráticas, o atendimento de reivindicações dos trabalhadores. Nossa oposição ao governo adquiria o sentido de luta contra um governo entreguista, com o objetivo principal de desmascará-lo perante as massas.
Atuávamos considerando a luta contra a conciliação como a forma concreta pela qual devia ser combatido, nas condições então existentes, o maior inimigo do nosso povo – o imperialismo norte-americano. Semelhante posição política só poderia levar ao desvio do golpe principal, transferindo-o para a burguesia nacional. Ao invés de concentrar o fogo da nossa luta contra o imperialismo norte-americano e seus agentes internos, nós dirigíamos nossos ataques fundamentalmente contra a política de conciliação, atingindo o imperialismo quase só em conseqüência desses ataques. Daí a despreocupação em combater agentes descarados do imperialismo norte-americano como Lacerda e Ademar. Daí a despreocupação com as manobras e articulações do próprio imperialismo, com a intensificação de sua agressividade contra os povos por ele dominados. Daí a subestimação do perigo de golpe de direita, considerado mero espantalho para amedrontar as massas. Concentrando nosso fogo no governo, exigíamos medidas cada vez mais avançadas, sem levar em conta nossas próprias debilidades e a fraqueza do movimento nacionalista e democrático, bem como a efetiva correlação de forças sociais que então existia, o que põe a nu a persistente influência do subjetivismo em nossa atividade.
Deixamos de lado o fato de que o próprio avanço do processo democrático ameaçava os privilégios dos monopólios estrangeiros, dos latifundiários e da grande burguesia entreguista, que ainda possuíam fortes posições. Uma falsa avaliação da realidade não nos permite ver que a correlação de forças sociais, nos últimos meses do governo Goulart, tornava-se dia a dia, menos favorável às forças nacionalistas e democráticas. Uniam-se os reacionários e entreguistas, que conseguiam atrair para seu lado amplos setores da burguesia nacional e da pequena burguesia urbana, descontentes com a situação e que não concordavam com as crescentes ameaças ao regime constitucional vigente. As forças da direita armavam-se e preparavam aceleradamente o golpe.
Em princípios de 1964, quando Goulart, movido por seus próprios objetivos políticos, procurou aproximar-se das forças populares, acentuou-se, em nossa atividade, o afastamento da linha política do V Congresso. Subestimamos a importância que tinha para o povo brasileiro a realização das eleições e não cuidamos de aplicar a Resolução Eleitoral aprovada pelo CC, ao mesmo tempo em que estimulávamos o golpismo continuista de Goulart. Ao invés de alertar as massas e convocá-las à luta contra a ameaça de um golpe de direita, claramente revelada na ação de Lacerda, Ademar e seus sustentáculos militares, lançamos a nota da Comissão Executiva de 27-3-64, na qual, ao lado da reivindicação de formação imediata de um novo governo, que “pusesse termo à política de conciliação”, transferimos o centro de ataque para o Parlamento, exigindo a reforma constitucional e ameaçando o Congresso. “O plebiscito – dizia a nota – deverá ser convocado pelo Congresso ou, no caso de omissão, protelação ou recusa deste, pelo próprio Poder Executivo”. Permitíamos, desta forma, que a defesa da legalidade fosse utilizada pelas forças da reação para enganar amplos setores da população e arrastá-los ao golpe reacionário. E na prática abandonávamos a orientação tática contida em nossa linha política.
Na raiz de nossos erros está uma falsa concepção, de fundo pequeno-burguês e golpista, da revolução brasileira, a qual se tem manifestado de maneira predominante nos momentos decisivos de nossa atividade revolucionária, independentemente da linha política, acertada ou não, que tenhamos adotado. É uma concepção que admite a revolução não como um fenômeno de massas, mas como resultado da ação de cúpulas ou, no melhor dos casos, do Partido. Ela imprime à nossa atividade um sentido imediatista, de pressa pequeno-burguesa, desviando-nos da perspectiva de uma luta persistente e continuada pelos nossos objetivos táticos e estratégicos, através do processo de acumulação de forças e da conquista da hegemonia do proletariado.
O exame autocrítico dos nossos erros e a análise de suas causas mais profundas constituem fator decisivo na luta pela justa aplicação de nossa linha política.
10. Com a vitória do golpe militar e a implantação da ditadura reacionária e entreguista, nosso Partido enfrenta uma nova situação e novos problemas. As tarefas de sua construção, sob todos os aspectos, assumem importância decisiva. Devemos dedicar os maiores esforços à recuperação das Organizações de Base e à criação de novas, principalmente nas empresas, fazendas e escolas, e seu fortalecimento político, ideológico e orgânico, capacitando-as a cumprirem suas pesadas tarefas.
É indispensável que todo o Partido adquira a convicção de que cabe aos comunistas um papel de vanguarda na luta para derrotar a ditadura, o que exige espírito revolucionário, desprendimento e capacidade de sacrifício. Se devemos combater o aventurismo, a pressa pequeno-burguesa, precisamos também compreender que a inércia política não é menos prejudicial à causa da Revolução. Nas condições atuais, só cumpriremos nosso dever se formos capazes de fazer de nosso Partido a força organizadora e dirigente do movimento pela reconquista das liberdades democráticas. Isto requer de cada militante grande sentido de responsabilidade e não menor combatividade.
Mais de quarenta anos de atividade já mostraram que só poderemos intervir com êxito nos acontecimentos na medida em que nos mantivermos unidos, procurando aplicar com firmeza a orientação traçada pelo Comitê Central e demais órgãos dirigentes, lutando sem vacilações em defesa do centralismo democrático, pela direção coletiva e pela mais rigorosa disciplina. É na unidade política, orgânica e ideológica do Partido que reside sua força.
Apoiados na ciência do proletariado, na doutrina invencível do marxismo-leninismo, no internacionalismo proletário, nas resoluções do movimento comunista internacional, contidas nas Declarações de Moscou de 1957 e 1960, saberemos dirigir com êxito a luta histórica do nosso povo pela completa emancipação nacional, pela paz, a democracia, o progresso e o socialismo, pela vitória mundial do comunismo.
Maio de 1965
(Voz Operária, Suplemento Especial, Resolução Política do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro, maio de 1965)
Antônio Britto: Ideia de fazer país civilizado sem política fracassa
29 de março de 2019Bolsonaro,Temas & Debates,poder360,governo bolsonaroantonio britto
Jânio, Collor e Bolsonaro são um só. Anti-políticos estão dando vexame
O Brasil democrático e sensato (existe) tem um dever de gratidão com Jair Bolsonaro. Em menos de 3 meses, ele conseguiu, com velocidade e eficiência admiráveis, envergonhar e explodir o maior dos riscos que o Brasil corria —o sucesso de um populismo travestido de ódio à velha política, a demagogia do “eu represento o novo”.
Desde sempre –e especialmente a partir das manifestações de junho de 2013– os brasileiros carentes de quase tudo, mas especialmente carentes de esperança, flertaram com a ideia do “sou contra tudo o que está aí”.
Nāo se lembravam de Jânio nem de Collor. E, talvez no futuro, diga-se que ao elegerem o mais caótico governo da nossa história tenham ajudado a destruir de vez a suicida tendência de votar em alguém em função daquilo a que ele se opõe e não do que defende ou pratica.
Nesses 3 meses, nāo se vive o fracasso de uma pessoa, apenas. É preciso que o Brasil aprenda: quem está fracassando é a ideia simplista, populista e inútil de que se fará um país civilizado sem política.
E política sem gente decente e preparada. Para colocar-se no mínimo à altura de uma Presidência da República. Preparada psicologicamente para entender que as instituições são o campo onde se pratica o que uma nação tem em comum. Não o que lunáticos, daqui ou da Virgínia, querem que pensemos.
Preparada, por último, com experiência e sabedoria para convencer o Brasil que só uma alternativa definitivamente não nos serve: a saída fácil, daquelas que cabem em 140 caracteres.
Tudo que vemos nesses constrangedores 100 dias nasce exatamente daí. Elegeu-se quem caçou os marajás da vez e prometeu varrer a sujeira do momento. No fundo, Jânio, Collor, Bolsonaro –soma de grandes fracassos no exercício da Presidência– sāo 1 só. A tentativa simplista de administrar um país do nosso tamanho e da nossa complexidade com duas ou 3 frases mal pensadas e mal pronunciadas, apesar do teleprompter.
Em respeito às dificuldades de todos, nāo cabe torcer para que o fracasso aumente, ainda que isso seja altamente provável. Mas, sejamos sinceros, terá sido muito bom que tudo isso esteja ocorrendo se diante da 3ª repetição do mesmo filme decidamos buscar roteiros, estes sim, verdadeiramente novos.
A propósito: sabemos onde andam os anti-políticos. Dando verdadeiros vexames na gestão da educação ao Itamaraty, circulando com afoiteza e despreparo pelo Congresso, exibindo egos prepotentes em setores do Judiciário e do Ministério Público.
Mas onde andam os políticos? Seria bom avisá-los para que saiam de onde se esconderam desde o ano passado. A vez deles parece que volta logo. Pedir que a esquerda democrática tenha coragem de romper com o monopólio Curitiba-Caracas.
E que os tucanos parem de fugir, uns com medo do passado, outros sem coragem para descer do longínquo muro onde subiram. A direita liberal? Essa será mais fácil de localizar. Procurem quem aparece de cabeça baixa no meio do bolsonarismo.
Luiz Carlos Azedo: Chumbo trocado não dói
29 de março de 2019Economia,congresso,política,Luiz Carlos Azedo,governo,previdência,Partidos,Memória,POLÍTICA HOJE,Nas entrelinhas,destaqueMilitares
“Bolsonaro disse que a intenção da ordem que deu aos comandantes militares sobre o golpe de 1964 não foi comemorar, mas “rememorar, rever, ver o que está errado, o que está certo. E usar isso para o bem do Brasil no futuro”
O presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), suspenderam o fogo ontem, depois de quase uma semana de tiroteio. A bandeira branca foi hasteada depois de intensas articulações no Congresso dos ministros da Economia, Paulo Guedes, da Casa Civil, Onix Lorenzoni, e da secretaria de Governo, general Santos Cruz, além de conversas no Palácio do Planalto com o próprio presidente da República. As reações do mercado financeiro na Bolsa de Valores e a alta do dólar ajudaram a cair a ficha de que o embate que estava em curso era um jogo de perde-perde para o país.
“Página virada, um abraço, Rodrigo Maia. O Brasil está acima de todos. Acontece, é uma chuva de verão”, disse Bolsonaro, ao suspender o fogo, pela manhã. Entretanto, não foi uma rendição: “Outros problemas acontecerão, com toda certeza. Mas, pode ter certeza, na minha cabeça e na dele, o Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”, acrescentou. Um almoço do ministro da Economia, Paulo Guedes, com Rodrigo Maia, serviu para desanuviar o ambiente e repor a discussão da reforma da Previdência no centro das atenções.
No meio da tarde, o ministro da Casa Civil, Onix Lorenzoni, em visita ao presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Felipe Francischini, negociou a indicação do relator da reforma CCJ: o delegado da Polícia Federal Marcelo Freitas, deputado de primeiro mandato do PSL de Minas Gerais. Um relator indicado pelo partido do presidente da República foi uma boa solução para o impasse que havia sido criado, porque sinalizou mais empenho de Bolsonaro e do PSL para aprovação da reforma.
“O que nós temos hoje é o resultado de muito diálogo que o governo Bolsonaro construiu. Nós estamos vendo aqui um jovem deputado federal, de primeiro mandato, com maturidade. Teve paciência, enfrentou com tranquilidade e esperou o momento aonde a presidência da Câmara, os líderes de todos os partidos chegaram a esse consenso de que seria importante que fosse um nome do PSL. Dentro do PSL, houve uma busca criteriosa e nós temos, como disse o presidente Francischini, um relator que dá tranquilidade ao país. Tem preparo jurídico, tem preparo do exercício da sua atividade profissional”, disse Lorenzoni.
Do outro lado do Congresso, um almoço do ministro da Secretaria de Governo, general Santos Cruz, com o líder do Governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), e seus vice-líderes serviu também para blindar o ministro da Economia, Paulo Guedes, em relação à aprovação da emenda constitucional que torna impositivas as emendas de bancada. Aprovada pela Câmara em processo relâmpago (dois turnos de votação em apenas um dia), por muito pouco não foi referendada pelos senadores, na quarta-feira. A proposta chegou a ser pautada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que acolheu pedido de urgência assinado, entre outros, pelo senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente. Um apelo dramático de Bezerra derrubou a votação.
Rememoração
Bolsonaro também se reposicionou em relação ao golpe militar de 1964. Disse que a intenção da ordem que deu aos comandantes militares não foi comemorar, mas “rememorar, rever, ver o que está errado, o que está certo. E usar isso para o bem do Brasil no futuro”. De certa forma, com sua ótica, o presidente da República invocou o marco que serviu de ponto de partida para a transição à democracia: “A Lei da Anistia está aí e valeu para todos. Inclusive, o governo militar fez com que ela fosse ampla, geral e irrestrita, visto que alguns setores de dentro do parlamento não queriam que certas pessoas voltassem do exíli, porque os atrapalhariam em seus projetos políticos. Lei da Anistia, vamos respeitar para todo mundo, ponto final, não toca mais no assunto”, disse. Maia, em entrevista à Rádio CBN, depois de reiterar sua posição sobre o 31 de março de 1964 (“É óbvio que o Brasil teve um golpe”), elogiou Bolsonaro por esclarecer que não se tratava de uma comemoração.
Maia também se reuniu com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, com quem restabeleceu o diálogo sobre o pacote anticrime e anticorrupção. “Recebi o ministro Moro hoje, mostrei a ele que não havia nenhum problema da presidência da Câmara em relação à tramitação”, disse. Ambos andaram se estranhando. Segundo o presidente da Câmara, quem priorizou a Previdência foi o governo, que não pediu urgência constitucional para o projeto de Moro. Na semana passada, Maia dissera que o projeto repetia propostas apresentado por uma comissão liderada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes em maio do ano passado.
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-chumbo-trocado-nao-doix/
William Waack: Foi ditadura, e daí?
28 de março de 2019O Estado de S. Paulo,POLÍTICA HOJE,destaqueWilliam Waack
Bolsonaro dá a 64 o significado que não tem, e arrisca consequências
O que aconteceu em 31 de março de 1964 foi um golpe, depois veio um golpe dentro do golpe e tudo aquilo foi uma ditadura. Que, ao enfrentar resistência da luta armada de grupos de esquerda antidemocráticos (o termo técnico é terrorismo) e de correntes da sociedade civil organizada (imprensa, sindicatos, universidades, grupos políticos conservadores e liberais) – estas últimas são as que tiraram o País do regime de exceção –, dedicou-se a reprimir, censurar, prender e torturar, contrariando os próprios códigos de conduta das Forças Armadas. E daí?
E daí que o assunto é página virada e, no caso do Brasil, só assume importância política atual por causa da patética dedicação do presidente da República a aspectos secundários da “guerra cultural”. É bem verdade que Bolsonaro não está sozinho nesse empenho em recorrer a algum episódio traumático do passado como forma de moldar o debate político do presente.
Em Israel, o revisionismo do mito de fundação do país influencia também as atuais eleições. Na Rússia, é a interpretação da implosão da União Soviética como uma “catástrofe geopolítica” a ser corrigida que sustenta Vladimir Putin. Na China, o ressurgimento do nacionalismo é uma arma poderosa de legitimação do partido comunista empenhado em desfazer um século de “humilhações impostas por potências estrangeiras”. Nos Estados Unidos, Trump fala de uma “América grande de novo”, como se alguma vez tivesse deixado de ser.
A tentativa de Bolsonaro de dar a 64 uma relevância que também os integrantes do Alto-Comando das Forças Armadas acham que ficou para os historiadores tem pouco a ver com os exemplos acima. É parte do cacoete do palanque digital de campanha eleitoral. E já não se trata de perguntar quando ele vai descer da plataforma da agitação eleitoral e se sentar na cadeira presidencial, pois a resposta está dada: nunca.
O presidente e seus seguidores mais aguerridos nas redes sociais criam e se retroalimentam de “polêmicas” que, na época pré-digital, se chamavam de briga de mesa de boteco. Sobe o volume da gritaria à medida que o tempo avança e as coisas não acontecem como os “revolucionários” esperavam que evoluíssem. E encontram na “velha política”, nas “oligarquias corruptas”, na “mídia”, no “marxismo cultural” as “explicações” para a própria incapacidade de criar uma narrativa abrangente e dotada de clara estratégia de como tirar o País do buraco.
As reações contrárias de diversos setores à “comemoração” de 64 provocam nos militantes dessa franja da direita brasileira um “frisson” de alegria, como se sentissem confirmados em suas piores suspeitas. São a eles que os atuais comandantes militares se referem quando alertam que não estão dispostos a tolerar nenhum tipo de fanatismo, de um lado ou de outro. É o tipo de recado, porém, que provavelmente fará os mesmos militantes se sentirem reconfortados.
Nesse sentido, as agressões verbais por intelectuais que influenciam Bolsonaro e seus entes mais próximos aos generais no governo (xingados de “idiotas”, “cagões” e “comunistas infiltrados”) não são deslizes típicos da mesa do boteco. Na peculiar visão de mundo que move os agressores, trata-se do necessário resgate do espírito da História, no qual a nova “hora zero” de 64 explicaria a razão de o País ser hoje uma democracia aberta e representativa e não uma república popular ou socialista. Por isso, consideram que “comemorar” o distante 64 seria parte da luta de ideias.
Sem dúvida alguma, ideias têm consequências. E ideias malucas e idiotas costumam ter consequências péssimas.
Luiz Carlos Azedo: A nau dos insensatos
28 de março de 2019Economia,congresso,política,Luiz Carlos Azedo,governo,previdência,Literatura,Memória,POLÍTICA HOJE,Nas entrelinhasMilitares
“A escalada do confronto entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), evoca situações que vão da renúncia de Jânio Quadros ao Ato Institucional nº 5”
Vencedora de dois prêmios Pulitzer, a historiadora norte-americana Barbara Tuchman dedicou seu livro mais famoso à insistência dos governos em adotarem políticas contrárias aos próprios interesses. A Marcha da Insensatez é um estudo sobre quatro episódios da História que resultaram de decisões equivocadas das lideranças, com repetição de erros crassos: a Guerra de Troia, a Reforma Protestante, a Independência dos Estados Unidos e a Guerra do Vietnã. A escalada do confronto entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), evoca situações que vão da renúncia de Jânio Quadros, em 21 de agosto de 1961, ao Ato Institucional nº 5, do presidente Costa e Silva, em 13 dezembro de 1968.
Ontem, em entrevista à TV Bandeirantes, depois de um fim de semana com trocas de farpas, Bolsonaro disse não ter problema com o presidente da Câmara, mas afirmou que questões pessoais têm “abalado” Rodrigo Maia. Indagado sobre quais seriam esses problemas, Bolsonaro disse que eram pelo “pelo lado emocional” e que, por essa razão, não procuraria o deputado para conversar.
Era uma alusão à prisão do ex-ministro Moreira Franco, padrasto da mulher de Maia, que se abespinhou: “Abalados estão os brasileiros, que estão esperando desde 1º de janeiro que o governo comece a funcionar. São 12 milhões de desempregados, 15 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha de pobreza, capacidade de investimento do Estado brasileiro diminuindo, 60 mil homicídios e o presidente brincando de presidir o Brasil”, disparou, em entrevista no Salão Verde da Câmara.
Maia ainda arrematou: “Então, vamos parar de brincadeira e vamos tratar de forma séria. O Brasil precisa de um governo funcionando, a gente precisa que o governo do Bolsonaro dê certo. A gente precisa que o governo do Bolsonaro gere emprego, reduza o desemprego. Se a gente continuar perdendo tempo com essas discussões secundárias, nós vamos continuar colocando o Brasil andando para trás. Está na hora de o Brasil andar para a frente”.
Bolsonaro, após encontro com o governador de São Paulo João Doria (PSDB) na União Brasileiro-Israelita do Bem Estar Social (Unibes), na capital paulista, manteve a polêmica: “Não é palavra de uma pessoa que conduz uma casa. Brincar? Se alguém quiser que eu faça o que os presidentes anteriores fizeram, eu não vou fazer. Já dei o recado aqui. A nossa forma de governar é respeitando todo mundo, e acima de tudo, além de respeitar os colegas políticos, respeitar o povo brasileiro que me colocou lá.”
O novo bate-boca ocorreu um dia após a Câmara aprovar uma emenda constitucional transformando em impositivas as emendas de bancada ao Orçamento da União, por maioria inacreditável (em primeiro turno; por 448 votos a 3; no segundo, por 453 votos a 6). Até o filho do presidente da República, deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), votou a favor. A decisão foi uma retaliação ao não comparecimento do ministro da Economia, Paulo Guedes, à Comissão de Constituição e Justiça, responsável pela aprovação da admissibilidade da proposta de reforma da Previdência.
Por decisão do Palácio do Planalto, Guedes cancelou a agenda duas horas antes de a reunião começar, o que gerou grande mal-estar na Câmara. Foi um erro crasso de articulação política do governo, pois Guedes costuma se sair muito bem nas reuniões de que participa, como aconteceu ontem na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, na qual foi sabatinado. Sua passagem pelo Senado impediu que a emenda constitucional aprovada pela Câmara fosse votada e aprovada, ontem mesmo, pelos senadores, engessando ainda mais o Orçamento.
Panos quentes
Mais uma vez, o vice-presidente Hamilton Mourão pôs panos quentes na polêmica: “Acho que houve algum ruído na comunicação entre os dois. Julgo que o deputado Rodrigo Maia é imprescindível no processo que estamos vivendo no Brasil, pelo papel que ele tem dentro da Câmara dos Deputados e pela importância desse papel dele. Ruídos ocorrem”. Nos bastidores do Congresso, porém, há muita irritação da própria base de Bolsonaro com o governo e grande perplexidade da oposição, cuja atuação vem sendo até cautelosa, porque o governo faz oposição a si mesmo. A reforma da Previdência depende do empenho do presidente da República, mas Bolsonaro está terceirizando sua aprovação, o que deixa todos em dúvida sobre suas verdadeiras intenções.
Ontem, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e os comandantes militares divulgaram a ordem do dia a propósito do golpe militar de 1964, um texto que será lido nos quartéis, por recomendação do presidente Jair Bolsonaro. “Em 1979, um pacto de pacificação foi configurado na Lei da Anistia e viabilizou a transição para uma democracia que se estabeleceu definitiva e enriquecida com os aprendizados daqueles tempos difíceis. As lições aprendidas com a História foram transformadas em ensinamentos para as novas gerações (…)”. Será?
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-a-nau-dos-insensatosx/
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Vinicius Torres Freire: Não há governo
27 de março de 2019congresso,Bolsonaro,reforma,Folha de S. Paulo,Câmara,POLÍTICA HOJEvinícius torres freire
Rebelião na Câmara empareda governo, reformas naufragam, há anarquia em ministérios
O Congresso está à deriva, no que diz respeito aos interesses do governo. Alguns ministérios implodem em anarquia vexaminosa. A Câmara aprovou uma pauta-bomba nuclear, que na prática impede o governo de conter déficits —falta apenas a aprovação do Senado. Manter o teto de gastos talvez agora dependa da paralisação de parte da máquina pública.
Sem o serviço de bombeiro em tempo integral de Rodrigo Maia, foram detonadas várias bombas. Nada mais se pode dizer do que será feito da política e, pois, da economia, pois Jair Bolsonaro se omite, quando não agrava a crise.
No Congresso, havia ameaças de derrubar decretos do governo ou de chamar ministros às falas. Tudo isso, porém, virou picuinha, pois à noite a Câmara aprovou emenda constitucional que impede o Executivo de cortar certas despesas (como investimentos e emendas parlamentares).
Em menos de duas horas, maioria massacrante de deputados votou em dois turnos uma PEC que vai emparedar o governo, caso seja aprovada também no Senado.
De manhã, lideranças de partidos que juntam uns 300 dos 513 deputados até propuseram um novo pacto, mas com uma faca no pescoço do Planalto. Podaram da reforma previdenciária as mudanças nos benefícios para idosos muito pobres (BPC) e na aposentadoria rural. É um adeus para o trilhão de reais de economia em uma década, plano do ministro Paulo Guedes (Economia). Mas os deputados disseram ao menos que aceitam conversar, nessas novas bases.
O governo, porém, não tinha ordem ou capacidade nem de reagir a esse manifesto que na prática junta a Câmara inteira, afora oposição, o PSL e uns gatos pingados.
Os deputados não querem levar a fama de esfoladores de idosos, ainda mais porque os atingidos pela barragem da reforma da Previdência andam nas calçadas em que ficam os escritórios regionais dos parlamentares. Querem dividir a conta com o Planalto. O governo não está nem aí.
Ainda nesta terça-feira de naufrágio, Guedes ouviu dos governadoresque a reforma não anda sem que o governo crie um grupo de negociação, bancado por Bolsonaro. O ministro prometeu garantias para empréstimos estaduais, antecipação de receitas de privatizações e dinheiro do petróleo (royalties, participações e parte das concessões). Mas governador tem pouco voto no Congresso.
Vendo o tamanho do desarranjo, Guedes reuniu seu pessoal e o que resta de articuladores governistas a fim de nomear ao menos um relator para a reforma previdenciária. Não vai adiantar muito, pois a Comissão de Constituição e Justiça, onde a reforma tem de começar a tramitar, está em pé de guerra, interna e com o resto da liderança bolsonarista. O governo é omisso.
Deputados governistas faziam troça da desordem. "O cabaré pegou fogo e o Bolsonaro está lá resolvendo os problemas do Carluxo [Carlos, filho do presidente] na Secom [Secretaria de Comunicação] e recebendo o Flávio [o filho senador], que virou um zumbi", dizia um deles.
Um parlamentar próximo de Rodrigo Maia se dizia espantado com a ausência presidencial em assuntos críticos. Falava da anarquia no Ministério da Educação e o "risco" do Ministério do Turismo, "que está para explodir a qualquer momento". O ministro Marcelo Antônio é acusado de montar um esquema de candidatos-laranjas do PSL, na eleição de 2018.
Era difícil de entender se o governo espera um milagre, não entende a gravidade do vácuo ou quer um colapso, de propósito.
Ricardo Noblat: Tiro em Bolsonaro
27 de março de 2019Bolsonaro,Blog do Noblat,POLÍTICA HOJEveja
O grito de independência do Congresso
Poucas vezes se viu algo parecido com o que aconteceu ontem à noite na Câmara dos Deputados. Foi a maior traulitada que um governo levou em poucas horas, e por esmagadora maioria de votos.
Uma vez que o presidente Jair Bolsonaro se recusa a ir atrás de apoio para aprovar os principais projetos do seu governo, a Câmara deu-lhe o troco – e que troco.
Primeiro por 448 votos a 3, e depois por 453 a 6, a Câmara aprovou em dois turnos a proposta de emenda à Constituição que torna impositivo o Orçamento da União.
Pelos próximos quatro anos o governo ficará obrigado a executar o Plano Plurianual e a Lei de Diretrizes Orçamentárias com uma estreita margem de manobra.
Os parlamentares elevaram o percentual de suas emendas ao Orçamento de 0,65 da receita corrente líquida para 1%. Emendas apresentadas por bancadas estaduais deverão ser cumpridas.
Tudo na contramão do que desejava o governo, especialmente o ministro Paulo Guedes, da Economia. Ele queria um Orçamento sem tantas amarras, de modo a que pudesse remanejar despesas.
A decisão da Câmara foi uma resposta aos ataques sofridos pelo presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Maia virou o alvo preferido de Bolsonaro e dos seus garotos nas redes sociais.
O atrito entre eles se deveu ao fato de Bolsonaro ter lavado as mãos quanto ao futuro da reforma da Previdência Social. Maia retaliou declinando da posição de articulador da aprovação da reforma.
O Congresso aprovará, sim, a reforma, mas necessariamente o texto para ali despachado pelo governo. Quer pôr suas impressões digitais na reforma. E, doravante, em tudo mais que o governo lhe proponha.
O Orçamento impositivo aprovado na Câmara será votado em seguida pelo Senado. Só depois entrará em vigor. Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, disse que ali ele também será aprovado.
Bolsonaro poderá vetar no todo ou em parte o que receber do Congresso. Mas o Congresso poderá derrubar o veto de Bolsonaro, impondo sua própria vontade.
Por que o capitão foi ao cinema
O poder é inebriante
O ex-presidente Bill Clinton, que escapou por pouco de perder o cargo de presidente dos Estados Unidos, justificou assim seu envolvimento sexual com Monica Lewinski, estagiária da Casa Branca:
– Fiz porque podia.
Clinton explicou arrependido: seu cargo lhe conferia tantos poderes, mas tantos poderes que ele se deixou encantar por eles, pensou que tudo lhe seria permitido e quase foi ao chão.
Por que o presidente Jair Bolsonaro matou, ontem, parte do expediente da manhã no Palácio do Planalto para ir ao cinema com sua mulher, Michelle?
Ora, simplesmente porque deve ter avaliado que podia fazer isso. Podia por ser quem é, o presidente da República recém-eleito e autor da proeza de ter varrido a esquerda do poder depois de 13 anos.
Não se deu conta que é justamente dele como presidente que se espera o melhor exemplo. E que é sua obrigação dar o melhor exemplo, seja pelo bem do país, seja pelo seu próprio bem.
Se o servidor público número 1 é capaz de faltar ao trabalho para ir ao cinema com a patroa, os demais servidores deverão se sentir à vontade para fazer a mesmo, e também sem o risco de ser punidos.
Tivesse sido esse o único passo em falso dado por Bolsonaro em menos de 90 dias no cargo, a reclamação poderia soar excessiva. Mas não. A cada dia ele dá mais um.