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Especial: Pedro da Luz analisa a arquitetura na Semana de 22

Professor da Universidade Federal Fluminense explica as lições do modernismo para a arquitetura contemporânea

João Rodrigues, da equipe da FAP

A Semana de Arte Moderna, que completa 100 anos em 2022, teve entre os seus marcos a influência para a arquitetura brasileira. O movimento pregava a expressão do nacional de forma autônoma e independente dos ideais europeus. Apesar da pouca importância da arquitetura na Semana, a transformação do modo de entender a arte marcou a nossa arquitetura e segue presente até os dias de hoje.

Para analisar a importância da arquitetura na Semana de 22, conversamos com o professor Pedro da Luz Moreira, docente e vice-coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense. Em 2015, Pedro da Luz assumiu a presidência do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), departamento do Rio de Janeiro, tendo sido reeleito no ano de 2017 para o triênio até 2019. É pesquisador da influência da Semana de 22 na arquitetura brasileira.


Ouça o podcast!




O episódio conta com áudios extraídos do Youtube do canal Toda Matéria, canção de Guiomar Novaes - Chopin: Ballade in F minor, opus 52, n°4, História da Arquitetura com Bruno Perenha e depoimentos de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer para o documentário Arquitetura Moderna no Brasil, realizado pelo IAB e Fundação Bienal de São Paulo, em 1985.


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O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google Podcasts, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues. A edição-executiva é de Renato Ferraz.




Caminho para o Brasil é ‘tirar Bolsonaro da presidência’, diz Marina Silva

Cleomar Almeida, Coordenador de Publicações da FAP

Depois de bater o recorde recente da explosão de desmatamento na Amazônia por dois meses seguidos, o Brasil só tem um caminho para se sustentar como nação, de acordo com a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (Rede): “Tirar Bolsonaro da frente da presidência”. Segundo ela, o país virou “terra arrasada”.

A ex-ministra ressalta que as possibilidades de retirada de Bolsonaro da presidência estão previstas na Constituição. “É a eleição ou o impeachment”, diz, em entrevista ao portal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP). “Ele está inviabilizando o Brasil do ponto de vista de saúde pública, ambiental, econômico e social. Com Bolsonaro, não haverá esperança para o meio ambiente em hipótese alguma”, assevera.

Destruição

Marina Silva vai discutir a política ambiental brasileira e os desafios da sustentabilidade, na segunda-feira (31/5), a partir das 19 horas. Ela e outros ex-ministros do Meio Ambiente têm presença confirmada no primeiro dos dois eventos online do Observatório da Democracia já agendados. Portais e redes sociais da FAP e de outras 10 entidades parceiras farão a transmissão em tempo real (veja a relação de todas ao final desta reportagem).

Em abril, pelo segundo mês seguido, a Amazônia bateu novo recorde recente de desmatamentode acordo com dados do Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Segundo o levantamento, foi também o pior abril da série histórica atual, que tem início em 2015, com dados mais precisos.

Leia também: Bolsonaro vê Amazônia como espaço para ocupação predatória, diz ex-presidente do Ibama

No mês passado, os alertas de desmatamento do Deter superaram 580 km² de destruição na floresta, um salto de quase 43% na devastação em comparação com o mesmo mês em 2020, que registrou cerca de 406 km² de desmate. Até então, o recorde para o mês era de 2018, com 489 km² desmatados. Março já havia registrado recorde, com mais de 367 km² de desmatamento.

Na quarta-feira (26/5), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tirou sigilo de investigação que envolve o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em suposto esquema de contrabando de produtos florestais.

Desmatamento em abril foi o pior da série histórica atual, iniciada em 2015. Foto: Daniel Beltrá / Greenpeace

“Essa é uma agenda, além dos graves problemas, de conivência com contraventores”, critica Marina Silva, ressaltando os trabalhos da Operação Akuanduba, da Polícia Federal, deflagrada no dia 19 de maio.

Na avaliação dela, o cenário brasileiro é um só. “O que existe é um verdadeiro desmonte, uma terra arrasada, de toda a proteção ambiental brasileira, a desconstrução da Política Nacional do Meio Ambiente e do Sistema Nacional do Meio Ambiente”, critica Marina Silva.

Íntegra da entrevista concedida pela ex-ministra ao portal da FAP

Qual a sua avaliação da política ambiental no Brasil hoje?

Na verdade, a minha avaliação é de que não existe uma política ambiental hoje. O que existe é um verdadeiro desmonte, uma terra arrasada, de toda a proteção ambiental brasileira, a desconstrução da Política Nacional de Meio Ambiente e do Sistema Nacional de Meio Ambiente. O governo desmontou a estrutura de proteção ambiental existente no Brasil e agora está tentando bombardear o arcabouço legal no Congresso Nacional, mudando licenciamento, alterando a lei que protege os povos indígenas, como tentaram hoje (26/5) fazer a mudança no Estatuto dos Povos Indígenas para que o governo possa reaver parte das áreas que já foram demarcadas. Nós não temos uma política ambiental. Essa é a verdade.

No início, após o resultado das eleições, houve um grande alvoroço dizendo que o Brasil estava com novo Congresso, uma nova política, uma nova cara, mas esse Congresso, em alguma medida, também tem respaldado essas ações contra o meio ambiente. A senhora concorda com isso?

Infelizmente, no quesito de proteção ambiental, o Congresso tem maioria de parlamentares altamente conservadora e uma parte significativa de pessoas reacionárias, inclusive, que estão espalhadas em diferentes partidos, com raras exceções. São visões que querem desenvolvimento do início do século 20, em prejuízo da proteção das florestas, dos recursos hídricos, das mudanças climáticas, da política de combate aos efeitos do aquecimento global, enfim. Se não fosse a mobilização da sociedade e a resistência da oposição nas pessoas dos parlamentares que fazem essa resistência e a mobilização da sociedade, já teríamos inúmeros retrocessos em vários aspectos da legislação brasileira.

Marina Silva: “O que existe é um verdadeiro desmonte, uma terra arrasada, de toda a proteção ambiental brasileira”. Foto: Divulgação/Rede

A gente assiste, com frequência, ao governo apresentar dados, e essas entidades que se organizam socialmente rebatem com outras informações, acompanhamentos técnicos. A senhora acredita que a existência desses movimentos também representa resistência ao governo e em defesa do meio ambiente?

Os movimentos da sociedade civil, em grande parte, fazem a resistência e têm conseguido algumas vitórias, ainda que temporárias, porque têm que ficar o tempo todo vigilantes para que não se seja surpreendido com o rolo compressor do governo, que toda hora tenta, através de [emendas] jabutis, colocar leis para desmontar todo o arcabouço legal da proteção ambiental do nosso país. Então, a política ambiental é a política que cortou o orçamento do Ibama, tirou o serviço florestal do Ministério e o colocou no Ministério da Agricultura, que tentava tirar a Funai do Ministério da Justiça e colocar no Ministério da Agricultura, que tentou acabar com o próprio Ministério do Meio Ambiente, do ponto de vista institucional. Não acabou, institucionalmente, mas está acabando, na prática. É o governo que promoveu o aumento do desmatamento em 2019 e 2020 em mais de 40%, algo em torno de 47%. Agora, em abril, tivemos um dos maiores desmatamentos do mês de abril registrados nos últimos anos. Então, é terra arrasada. Essa é uma agenda, além dos graves problemas, de conivência com contraventores. Há as investigações que estão sendo feitas pela Polícia Federal, agora a quebra do sigilo do ministro, o afastamento de dez pessoas da confiança do ministro por estarem fazendo, segundo as investigações, aquilo que eles chamam de corrupção institucional e de corrupção em relação à regulamentação, que é mudar as regras para deixar a lei em conformidade com o crime. Eles chamam de corrupção normativa, quando você muda a lei para conformar a lei à ação dos criminosos, como foi o caso a exportação de madeira para os Estados Unidos, que deu origem à operação que fez a busca e apreensão do ministro Ricardo Salles.

Rádio FAP – Podcast Marina Silva

Com um governo como este que o Brasil tem, qual é o desafio tanto para o meio ambiente quanto para nação? Como se busca e se alcança a sustentabilidade de uma nação como o Brasil a partir de agora?

O principal caminho é ir pelos meios previstos na nossa Constituição, que é a eleição ou impeachment, e tirar Bolsonaro da frente da presidência do Brasil. Ele está inviabilizando o Brasil do ponto de vista de saúde pública, ambiental, econômico e social. Com Bolsonaro, não haverá esperança para o meio ambiente, em hipótese alguma. Então, esse é o grande desafio. As pesquisas mostram que mais de 70% [da população] querem ver as florestas e a biodiversidade protegidas, mas o governo promove exatamente o contrário. Agora, com o governo, que tem a noção do que está em jogo, dos prejuízos que estão sendo causados e o próprio interesse econômico do país, em função da política desastrosa, [o desafio] é recuperar as políticas que já vinham dando certo, como era o caso do plano de prevenção e controle do desmatamento; apoiar cada vez mais a agenda de desenvolvimento sustentável, como o programa de agricultura de baixo carbono, que permite que o Brasil dobre sua produção sem precisar mais destruir florestas; investir na bioeconomia para criar alternativas para o novo ciclo de prosperidade; recuperar as instituições que foram enfraquecidas completamente, como é o caso do Ibama, ICMBio e Inpe; além do fortalecimento do serviço florestal, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, e todas as políticas que precisam ser implementadas de forma transversal.

O desafio da sustentabilidade e do desenvolvimento sustentável não é tarefa de um ministério. É tarefa de todas as instituições públicas do governo federal e todos os ministérios. É uma agenda que, no mundo inteiro, é transversal. E fico muito feliz de saber que, em 2003, quando assumi o Ministério do Meio Ambiente, a primeira coisa que falei era que a política ambiental seria pautada pelo controle e participação social, pela transversalidade da política ambiental, pelo fortalecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente e desenvolvimento sustentável. Essas diretrizes são as que o mundo começa a trabalhar. É só ver Estados Unidos, Canadá, Japão, União Europeia, Reino Unido, todos os países ocidentais que compreenderam o desafio que está posto no mundo da grave crise ambiental circunstanciado com problema da mudança climática.

SERVIÇO

Política Ambiental brasileira e os desafios da sustentabilidade

Data:
 31/5/2021
Transmissão: a partir das 19 horas
Onde: portais e redes sociais da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) (Facebook e Youtube) e outras entidades parceiras
Realização: Observatório da Democracia


2º Webinar da Semana do Meio AmbienteCrise climática e a Amazônia brasileira

Data: 7/6//2021
Transmissão: a partir das 19 horas
Onde: portais e redes sociais da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) (Facebook e Youtube) e outras entidades parceiras
Realização: Observatório da Democracia

Entidades participantes:

  • Observatório da Democracia
  • Fundação Astrojildo Pereira (Cidadania);
  • Fundação Lauro Campos/Marielle Franco (PSoL);
  • Fundação Leonel Brisola/Alberto Pasqualini (PDT);
  • Fundação João Mangabeira (PSB);
  • Fundação Maurício Grabois (PCdoB);
  • Fundação Ordem Social (PROS);
  • Fundação Rede Brasil Sustentável (Rede);
  • Fundação Verde Herbert Daniel (PV);
  • Instituto Claudio Campos;
  • Fundação Ulysses Guimarães (MDB);
  • Fundação Teotônio Vilela (PSDB).

 

Fonte:


Maria Cristina Fernandes: Pesquisa desmonta tese de que governos autoritários responderam melhor à pandemia

Se China, Vietnã e Hong Kong propagandearam a eficiência do autoritarismo no combate à pandemia, Coreia do Sul, Nova Zelândia e Noruega contrapuseram a importância da transparência e da prestação de contas da democracia contra o vírus. A uma França que centralizou a resposta ao vírus, se opuseram Estados Unidos e Brasil, onde o federalismo mostrou-se resiliente no contraponto à inoperância de governos centrais de veleidades autoritárias.

Qual desenho institucional, finalmente, responde melhor à pandemia? Guiados por esta pergunta, um grupo de 67 pesquisadores, coordenados por Scott Greer e Elizabeth King (Universidade de Michigan), Elize Massard da Fonseca (FGV-SP) e André Peralta-Santos (Escola Nacional de Saúde Pública de Lisboa), acaba de lançar um compêndio de 663 páginas “Coronavirus politics”, (“A política do coronavírus”, ainda sem edição em português mas com livre acesso em www.fulcrum.org/concern/monographs/jq085n03q).

Os pesquisadores, que começaram a trabalhar junto com o vírus, em março de 2020, cobriram a primeira fase da pandemia, até setembro de 2020, quando as políticas públicas se resumiam a intervenções não farmacêuticas (campanhas de higiene, equipamentos de proteção individual, respiradores, isolamento social, testes, rastreamento e auxílios monetários). Ao contrário do atual momento, de segunda onda em alguns países e terceira em outros, quando a busca pela vacina é decorrente de um esforço majoritariamente dos governos centrais, a primeira etapa da doença foi marcada, fortemente, por embates entre instâncias locais e nacionais.

Um dos achados mais importantes do livro é o de que os governos locais, historicamente achatados pelas políticas de contenção fiscal no mundo inteiro, atuaram como contraponto ou, como prefere nominar Luísa Arantes, uma das autoras do capítulo sobre o Brasil, como um “back-up” a governos centrais inoperantes. É bem verdade que não de maneira uniforme. Nem no Brasil nem nos Estados Unidos.

Num extremo esteve o Maranhão, estrito em suas políticas de isolamento e ativo na compra de equipamentos de proteção e de respiradores, e no outro, Santa Catarina, que, ao abandonar precocemente o isolamento social, viu o número de casos mais do que duplicar em menos de uma semana. O federalismo se mostrou vivo com ou sem viés partidário. Se o Maranhão do governador Flávio Dino (PCdoB) deu uma das piores votações ao presidente da República, Santa Catarina sufragou, junto com o governador Carlos Moisés (PSL), um dos melhores desempenhos de Jair Bolsonaro. Dino, porém, esteve do mesmo lado, no cabo de guerra da pandemia, de governadores aliados de Bolsonaro, como o de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM).

Nos Estados Unidos, se a governadora do Michigan, Gretchen Whitmer, enfrentou a Casa Branca com sua política estrita de isolamento, a governadora de Dakota do Sul, Kristi Noem, nada fez para impedir que cerca de meio milhão de motociclistas se reunisse em uma festa no condado de Sturgis, em agosto de 2020, numa das maiores aglomerações mundiais da primeira fase da pandemia. Mais do que o viés democrata de Whitmer ou republicano de Noem, foi decisiva a determinação em atender a população, como foi o caso do governador republicano Mike DeWine, de Ohio, que fechou escolas por três semanas e proibiu aglomerações.

Os governos locais também ganharam fôlego com a pressão crescente por uma descentralização da gestão da saúde. Na Itália, país que alarmou o mundo para a devastação da pandemia, 100 mil médicos promoveram um abaixo-assinado por uma descentralização territorial da prestação de serviços públicos de saúde. Em Milão, os profissionais promoveram um protesto contra a deterioração de suas condições de trabalho dirigido a um governo local que, inicialmente, resistiu ao isolamento social.

Os governantes locais que ganharam condições de se contrapor às instâncias nacionais de poder na adoção de medidas de isolamento o fizeram porque, em grande parte, dispuseram de políticas de complementação de renda, regionais e nacionais, além de repasses federais que lhes permitiram restringir atividades econômicas que geram receita para a manutenção dos serviços públicos.

Estados Unidos, Índia e Brasil, diz Elize Massard, são exemplos claros de que subvenção social só funciona se houver uma política de saúde e esta vai muito além de uma infraestrutura hospitalar. Estados Unidos e o Brasil tinham, respectivamente, de acordo com o índice de segurança global de saúde (GHSI), da Universidade Johns Hopkins, o mais bem preparado sistema de saúde do mundo e da América Latina para responder a pandemias. E ambos fracassaram porque tiveram, no comando político nacional, presidentes negacionistas. Os Estados Unidos somavam 23% dos mortos em todo o mundo em agosto de 2020, apesar de ter apenas 4% da população mundial. O Brasil, apesar de abrigar 2,7% dos habitantes do planeta, tinha 33% das vítimas da covid-19 em março de 2021.

Apesar de subfinanciado, o NHS, sistema público de saúde britânico inspirador do SUS brasileiro, fez com que o Reino Unido pontuasse em segundo lugar mundial na gestão de sistemas de saúde responsivos a pandemias, segundo o GHSI. Isso até o coronavírus, quando o Reino Unido teve uma das piores taxas de mortalidade, depois da Espanha. Só foi salvo pela vacina. Nem os testes massificados, que só perderam para a China, foram capazes de neutralizar o atraso das medidas de isolamento social que marcaram a primeira fase do combate à pandemia no governo Boris Johnson. As mortes poderiam ter sido reduzidas pela metade se o lockdown de março de 2020 tivesse acontecido uma semana antes.

As falhas também atravessaram o Canal da Mancha. A França cometeu dois erros capitais no início da pandemia. O de apostar na cloroquina, durante dois meses, até maio de 2020, e de ter demorado na aquisição de equipamentos de proteção individual. O cochilo se deveu à decisão tomada durante a epidemia de H1N1, em 2009, quando o governo, alarmado, comprou € 1 bilhão em EPIs para enfrentar uma doença que “só” matou 342 pessoas no país.

Superados esses erros, o governo centralizou a resposta à pandemia e contou com um sistema de saúde que passou por duas décadas de reforma. Ainda assim, só deu conta porque gastou muito para manter o isolamento social, levando a população de rua para residências temporárias e abrindo os hospitais públicos para imigrantes ilegais. Calcula-se que a França tenha destinado 31% do seu Produto Interno Bruto em medidas de compensação social e econômica e gastos na saúde. Os EUA, cujo primeiro pacote aprovado pelo Congresso foi o maior da história, gastaram 18% do PIB.

O fôlego fiscal em todo o continente só foi possível porque a União Europeia ativou a cláusula geral de escape, em abril de 2020, para não cumprir a meta de déficit fiscal. Reproduziu o que os autores chamam de “momento hamiltoniano”, quando o governo americano, por inspiração do então secretário do Tesouro, Alexander Hamilton, assumiu as dívidas de guerra dos Estados depois da guerra da independência. A desigualdade na resposta à pandemia no continente foi decorrente das gestões locais. Portugal, a exemplo da França, saiu-se melhor que a Espanha e a Itália porque centralizou a reação. Já Áustria e Suíça coordenaram melhor seus Estados federados do que a Alemanha, cuja governança federativa foi conturbada pela disputa interna em torno da sucessão de Angela Merkel.

Se na Europa a negligência com migrantes foi relativizada em função da segurança sanitária, o mesmo não aconteceu na China. Neste país, as políticas compensatórias não os englobaram. Estima-se que na China haja 290 milhões de migrantes que não usufruem do sistema previdenciário estatal porque trabalham fora de seus locais de registro. Houve uma política deliberada de manter os migrantes ilegais longe dos centros urbanos.

Nas semanas que antecedem a virada do ano lunar, que em 2020 caiu no dia 25 de janeiro, os chineses deixam suas casas e visitam seus familiares. Mesmo já alertadas de que o vírus estava disseminado na província de Hubei, as autoridades permitiram que as pessoas viajassem a partir do dia 7 de janeiro. No dia 23 foi decretada uma quarentena draconiana. Ao impedir que os chineses voltassem para suas casas nos grandes centros urbanos, tentou-se evitar que as estruturas hospitalares ficassem sobrecarregadas. Isso não impediu que hospitais de Hubei rejeitassem pacientes. A província tem 4% da população do país e 1% dos leitos.

O pouco que se sabe do combate inicial à covid-19 na China se deve à diplomacia da Organização Mundial de Saúde, que, sob o preço da acusação de sinofilia, manteve canal aberto com autoridades chinesas. Foi isso que permitiu à OMS monitorar minimamente o desenvolvimento inicial da doença na China.

O comportamento das autoridades chinesas não foi uma regra na Ásia. No Vietnã, por exemplo, o país pobre e populoso de melhor resposta contra o vírus, a transparência era uma das únicas armas possíveis. O Vietnã busca pontuação em rankings mundiais de governança para colher benefícios diplomáticos e atrair investimentos estrangeiros. As outras armas, num país sem um sistema de saúde robusto, foi o fechamento de fronteira, quarentena para visitantes em instalações militares, multa para quem a desrespeita e rastreamento. O país deixou de ter transmissão comunitária em julho de 2020.

Se até aqui o estudo das instituições foi marcado por seus reflexos na estabilidade democrática e econômica, a pandemia indica uma inflexão em busca de desenhos institucionais que demonstrem eficiência na reação a emergências sanitárias. O desempenho do Brasil e dos Estados Unidos na primeira fase da pandemia demonstra que muitas dessas instituições são vulneráveis ao poder de maus líderes. A próxima parada do grupo de pesquisadores é a resposta global à vacina, quando o desempenho desses dois países se bifurca e isola o Brasil.

Fonte:

Valor Econômico

https://valor.globo.com/eu-e/coluna/maria-cristina-fernandes-pesquisa-desmonta-tese-de-que-governos-autoritarios-responderam-melhor-a-pandemia.ghtml


DW Brasil: Esquerda e independentes dominam Constituinte do Chile

Direita, que governa o país e concorreu com chapa única, sai como a grande perdedora da eleição para representantes que redigirão a nova Constituição e deve ter pouca influência no processo

 

A esquerda e chapas independentes, formadas por cidadãos que não são ligados a partidos políticos, devem garantir a maioria dos 155 assentos na Assembleia Constituinte, que irá redigir uma nova Carta Magna para substituir a atual, em vigor desde a ditadura de Augusto Pinochet.

Com mais de 96,2% dos votos apurados até a madrugada desta segunda-feira (17/05), os atuais resultados mostram que as duas listas que aglutinam os candidatos da esquerda devem ficar com 52 assentos, seguida pelos candidatos independentes, que alcançaram, juntos, 48 cadeiras. Já a lista unificada da direita obteve 38. Há ainda 17 assentos reservados a representantes de povos indígenas.

Analistas disseram que os partidos políticos tradicionais foram os grandes derrotados da eleição. Ao contrário do que as pesquisas previam e com um sistema de contagem proporcional que privilegia as grandes siglas políticas, os independentes alcançaram um resultado inédito.

Os independentes são sobretudo pessoas ligadas a diversas áreas sociais, como educação, justiça social, meio ambiente e feminismo. São figuras de fora da política que buscam canalizar as exigências dos cidadãos na crise social de 2019, e seu surgimento é visto por muitos especialistas como o início de um novo modelo de política cidadã e a certidão de óbito dos desacreditados partidos tradicionais. Muitos deles deverão se unir à esquerda para aprovar as leis da nova Constituição.

Essa foi a primeira vez que candidatos independentes puderam concorrer em eleições no Chile ao lado de partidos tradicionais. A votação da Constituinte também foi alvo inédito no país: em 200 anos de independência, o Chile teve três Cartas Magnas (1833, 1925 e 1980), mas nenhuma foi redigida por uma convenção de pessoas eleitas pelo voto popular.

“O desempenho das chapas independentes em termos de votos e cadeiras é uma grande surpresa, embora a maior surpresa seja o colapso absoluto da direita que, apesar de passar por uma chapa única, não chegaria nem a um terço das cadeiras”, disse à agência de notícias Efe Julieta Suárez-Cao, cientista política da Pontifícia Universidade Católica do Chile.

Derrota da direita

A direita, que se apresentava na chapa única “Chile Vamos” formada pelos partidos governistas, foi a grande perdedora nesta eleição ao conquistar menos de um terço das cadeiras, percentual necessário para influenciar o conteúdo da nova Carta Magna e vetar artigos.

“Nestas eleições, os cidadãos enviaram uma mensagem clara e forte ao governo e também a todas as forças políticas tradicionais: não estamos sintonizados adequadamente com as demandas e desejos dos cidadãos e estamos sendo desafiados por novas expressões e lideranças”, afirmou o presidente do Chile, Sebastián Piñera, na reta final da contagem dos votos.

Apesar de possivelmente ditarem o tom da nova Carta Magna, os independentes precisarão fazer acordos para passar suas propostas, que necessitam de dois terços dos votos para serem aprovadas. Como a maioria delas está alinhada a posições progressistas, especialistas acreditam que haverá uma união entre o bloco e a esquerda, o que poderá promover mudanças profundas no país.

A assembleia constituinte será ainda composta por igual número de homens e mulheres. Isso é algo inédito no mundo e, em poucos meses, fará do Chile o primeiro país a ter um texto fundamental escrito com paridade de gênero.

A participação eleitoral no pleito que decidiu a composição da constituinte, no entanto, ficou bem abaixo dos quase 80% alcançados no plesbicito em outubro de 2020, que decidiu a substituição da atual Constituição. Apenas cerca de 37% dos 14,9 milhões de eleitores chilenos foram às urnas no final de semana.

A nova Constituição

A constituinte foi convocada pelo Congresso chileno para esfriar os protestos que tomaram as ruas do Chile por quase um ano no final de 2019.

A assembleia constituinte, a primeira paritária do mundo e composta exclusivamente por membros eleitos, terá nove meses para redigir a nova Carta Magna, a primeira a nascer de um processo plenamente democrático e participativo em toda a história do país.

O prazo para a conclusão da nova Constituição é prorrogável apenas uma vez por mais três meses, e em 2022 deve ser aprovada ou rejeitada em referendo com voto obrigatório.

A Constituinte será o processo político mais importante em 31 anos da democracia chilena e abre um novo capítulo na história do país, que terá a oportunidade de estabelecer também as bases de um novo modelo socioeconômico.

O processo de elaboração da nova Constituição será concluído com um plebiscito para aprovar o texto que substituirá a atual Constituição, herdada do regime Pinochet (1973-1990) e criticada por parte da sociedade chilena por sua origem ditatorial e por privatizar alguns serviços básicos como água e aposentadorias.

Fonte:

DW Brasil

https://www.dw.com/pt-br/esquerda-e-independentes-dominam-constituinte-do-chile/a-57553680


Cristovam Buarque: A perplexidade do óbvio

Lula x Bolsonaro na próxima eleição

As chamadas forças contrárias ao Bolsonaro e também ao PT estão perplexas diante da resiliência do primeiro, apesar de seu governo desastroso e indecente, e diante do crescimento do apoio ao Lula, apesar de todas notícias do ocorrido em estatais durante seu governo. É uma perplexidade diante do óbvio: o país e seu eleitorado estão divididos de maneira polarizada, o que facilita bases sectárias para os dois lados terem provavelmente lugar no segundo turno. Além disto, cada um destes lados tem se mobilizado no sentido de ampliar sua base de apoio, não só para fortalecer-se no primeiro turno, mas também para ganhar no segundo.

Apesar de todo mal que faz, da incompetência reconhecida de seu governo, de indicadores claros de corrupção na família e na relação com o Congresso, apesar de quase 450.000 mortos pelo covid por relaxamento e negacionismo, apesar de tudo isto, Bolsonaro amplia sua base junto ao Centrão e outros grupos políticos, sem perder sua base central. Sobretudo, devido ao medo da volta do PT ao poder. Por sua vez, o Lula circula desembaraçado, com a auréola de vítima de perseguições jurídicas, fazendo aliança nos estados com partidos do centro e conseguindo apoio em meios conservadores, políticos e empresariais, que nada perderam e até ganharam durante os governos petistas.

Enquanto isto acontece no lado do Lula e do Bolsonaro, o chamado bloco democrático e seus candidatos, Ciro, Huck, Dória, Tasso, Leite, Mandetta, parecem perplexos diante do óbvio. A sensação é de que estes candidatos se concentram tanto em suas respectivas candidaturas, que caem na perplexidade ao óbvio: em tempo de extremos, os partidos mais radicais têm facilidade para chegar ao segundo turno, se os outros não se unificam desde o primeiro turno.

Prova desta perplexidade é uma mensagem colocada pelo PSDB em suas redes com a capa de um livro hipotético, tendo a foto de Bolsonaro e o título “Como trazer o PT de volta ao poder”. Uma mensagem que passa perplexidade e derrotismo.

No lugar de uma estratégia para ocupar ganhar os votos dos muitos que não desejam um ou outro dos extremos, o chamado polo democrático se divide para saber quem será o candidato. Ficam à espera de previas dentro do PSDB entre e da vontade de outros postulantes dos demais partidos.Todos batendo cabeça e perplexos quando percebem que os outros dois estão conseguindo apoio.

Está na hora de os que não estão com Lula ou Bolsonaro darem um prazo aos que se propõem a ser alternativa, para encontrarem um nome que os unifique, com uma proposta que seduza, passando confiança aos eleitores. Talvez ainda seja tempo de saírem da perplexidade do óbvio. Se não saírem e se unirem, não vai demorar que seus apoiadores migrarão para um dos outros dois lados.

*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador

Fonte:

Blog do Noblat/Metrópoles

https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/artigos/a-perplexidade-do-obvio-por-cristovam-buarque


Felipe Salto: Um Brasil lascado

O bordão do economista Gilberto Nogueira, do BBB21, caiu na boca do povo: “O Brasil tá lascado”. É a síntese deste tempo. Como ter esperança diante do caos econômico e social? O Orçamento de 2021 não reflete a dura realidade da crise e a necessidade de forjar a reconstrução da economia. Pior, um novo mecanismo parece ter tornado viável espécie de barganha assimétrica entre Executivo e Legislativo. Tudo passando ao largo do fundamental: preservar vidas e desenhar um novo futuro.

A gestão mal-ajambrada da crise da covid-19, a demora em tomar decisões essenciais e a ausência de planejamento ajudam a explicar esse quadro. O governo não está conseguindo vacinar a população no ritmo necessário e guarnecer as famílias mais pobres. Falta tudo.

Os que podem trabalhar de casa estão em situação melhor. Mas os mais pobres seguem desempregados ou na luta diária arriscando-se no transporte público. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram que a morte atingiu em cheio os trabalhadores diretamente expostos ao vírus. No topo dessa lista macabra (de abril de 2020 a março de 2021), motoristas de ônibus, cobradores, vigias, porteiros e zeladores. É cruel.

Vai ser difícil reconstruir o País depois do desmonte. O capítulo mais recente foi revelado pelo repórter do Estado Breno Pires (9 de maio): R$ 3 bilhões do Orçamento da União de 2021 teriam sido utilizados pelo governo como moeda de barganha junto ao Congresso. O processo orçamentário já estava maculado pelo risco de paralisação da máquina pública. Agora, desvendam-se novos contornos.

As chamadas emendas de relator-geral (classificadas como “RP 9” no Orçamento) foram ampliadas a partir de cortes nas previsões de despesas da Previdência, do abono salarial e do seguro-desemprego. A especificação do direcionamento desses recursos – uma atribuição do Executivo –, no entanto, teria sido parcialmente transferida para parlamentares, sem previsão expressa na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Como revelou o Estado, parte dos recursos se destinaria à compra de tratores a preços acima dos do mercado. Invertem-se prioridades, métodos e processos, para dizer o mínimo.

Ao contrário das emendas tradicionais – impositivas e divididas igualmente entre os parlamentares –, esse “novo jeito” de alocar recursos públicos revela que o Executivo teria escolhido quem atender e quem ignorar. Peça de ficção é pouco para classificar o episódio.

O pano de fundo é a economia estagnada e sem perspectiva de melhora efetiva. O crescimento esperado para 2021 deve-se majoritariamente ao carregamento estatístico, isto é, à base deprimida de 2020, ano de recessão. De 1930 a 1980, o produto interno bruto (PIB) per capita brasileiro crescia a 3,8% ao ano acima da inflação; de 1981 a 2020, apenas 0,6%; e de 2011 a 2020, queda anual de 0,6%. Perdeu-se o bônus demográfico, quando a população em idade de trabalhar aumentava mais, o que facilitava a tarefa de crescer.

A produtividade da economia não reagirá na ausência de melhores investimentos e de um ambiente de negócios favorável à atividade econômica. O relatório Doing Business, do Banco Mundial, mostra que o Brasil ocupa a 184.ª posição (de 190 países) no quesito pagamento de impostos. As empresas brasileiras gastam, em média, 1.500 horas ao ano para atender ao fisco.

Nas políticas sociais, Bráulio Borges mostrou que o chamado índice de Gini – indicador da desigualdade de renda – melhora muito pouco quando se computam as transferências, os incentivos e benefícios fiscais de toda sorte.

As renúncias tributárias, por exemplo, correspondem a cerca de 4% do PIB e, em geral, não beneficiam os mais pobres. É claro que não se deve jogar o bebê junto com a água suja do banho. Isto é, as políticas de incentivo e de subsídio podem ser feitas de outra forma: na base da transparência e da avaliação. Sem isso, é jogar dinheiro pela janela.

Na infraestrutura, Igor Rocha reuniu dados impressionantes: o investimento brasileiro nessa área passou de 5,4% do PIB nos anos 1970 para 1,7% do PIB em 2016. O Chile e a Colômbia investem três vezes esse montante, a Índia gasta mais de duas vezes e a China, mais de seis vezes. O economista estima que em 2020 o investimento em infraestrutura no Brasil deve ter ficado em R$ 123 bilhões, o mesmo patamar de 2016 em porcentual do PIB.

Não há saudosismo em relação às décadas de 1930 a 1970. Nesse período a desigualdade aumentou, apesar do crescimento. Também a hiperinflação foi sendo gestada até atingir o ápice no período pré-Plano Real. A verdade é que, depois da conquista da estabilização da moeda com aquele plano, remanesce o objetivo de crescer sem inflação e reduzindo a pobreza extrema e a desigualdade de renda e riqueza.

O Brasil está mesmo lascado, Gil. Cabe à nossa geração o desafio de pensar e agir “com vigor”. É difícil ter esperança em meio a tanta tristeza. Mas é necessário, apesar do pessimismo no diagnóstico, ter otimismo na ação!

*Diretor Executivo da IFI.

Fonte:

O Estado de S. Paulo

https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,um-brasil-lascado,70003710529


Paulo Fábio Dantas Neto: A política entre universos paralelos

Esta coluna é dedicada aos brasileiros assassinados na favela do Jacarezinho, Rio de Janeiro, na última quinta-feira, dia 6. Seus CPFs, ou suas “folhas corridas”, não são condições prévias para que se defenda seu direito à vida. No Brasil, nem a Justiça pode decretar pena de morte. Menos ainda uma operação policial, embora essa prática nefasta seja banal no mundo que existe fora da lei. Mundos paralelos, os dos justiceiros e o da lei, não se pode ignorar nem um nem outro, o primeiro, porque precisa ser identificado, para que possa virar passado, o segundo, porque precisa ser valorizado, como a única possibilidade de um futuro mais civilizado para o nosso país.

Voltando a Jacarezinho, se parte, ou mesmo a maioria das vítimas, cometera algum crime antes, essa mesma palavra é que exprime o que a polícia civil do Rio cometeu. Execução e massacre são crimes, em qualquer hipótese. E o são mais ainda no contexto de uma operação subversiva, como foi aquela, feita em flagrante desobediência a uma proibição do STF. O tom desafiador da operação, salientado por uma entrevista coletiva insolente de um delegado, é fato singular. Como tal precisa ser encarado, não como se fosse apenas “mais do mesmo”, parte da violência corriqueira de prepostos do Estado que, em nome do combate a criminosos, promovem terror contra cidadãos indefesos. Não é corriqueiro um funcionário público policial usar posição de comando numa operação letal para desafiar dessa forma um poder da República. Muito grave, tanto o que ele disse, como a situação que permitiu que dissesse.

É inaceitável, do ponto de vista social, que quem, diariamente, em ônibus ou em trens de metrôs, se expõe à pandemia para ganhar a vida corra o risco de perdê-la por comportamento miliciano de uma corporação de Estado que tem como missão garantir o oposto. E inaceitável, também, do ponto de vista institucional, que o desafio verbalizado por esse delegado passe batido. Se instâncias administrativas da cúpula da segurança o acobertam, cabe ao ministério público e à sociedade civil provocar instâncias judiciárias e, a essas, agir com presteza, de modo especial o STF que, a rigor, tendo sido flagrantemente desafiado, nem precisa ser mais provocado.  Precisa ser apoiado, sem ressalvas, no seu esperado agir.

Inaceitável, por fim, do ponto de vista político, que autoridades eleitas não tomem providências que enquadrem as cúpulas policiais na linha da segurança pública, para que a população não se veja abandonada. E que, ao contrário, o governador do estado onde ocorreu o massacre adote, como adotou, o discurso policial, sendo nisso abertamente avalizado pelo vice-presidente da República. Aliás, o abandono, pelo General Mourão, ao falar dessa ação policial, da pele de cordeiro e das meias palavras que costuma usar sobre todos os demais assuntos, é politicamente pedagógico. Mostra o quão ilusório é o impeachment como solução estabilizadora, nas circunstâncias dramáticas do Brasil atual.

Fecho parênteses para retomar o fio do argumento sobre o modo com que a política lidou, até aqui, com esse fato indicador – ao modesto ver deste colunista – de uma escalada subversiva gradual e não de um mero episódio isolado, muito menos de um “equívoco” da inteligência policial. Além da omissão, ou responsabilidade ativa, do governador, na operação policial subversiva, registra-se também posições pusilânimes, como a do prefeito da capital do Rio, tentando se colocar num ponto equidistante entre a ação de supostos “malucos” e um também suposto (pelo delegado insolente) “liberou geral” do STF. Preocupa também o silêncio ruidoso de importantes políticos fluminenses a ponto de o deputado Marcelo Freixo despontar, mais uma vez, para quem não usa lupa minuciosa, como honrosa exceção.

Universos paralelos: uma leitura política de Jacarezinho, para além do Rio

Todos os aspectos que abordei até aqui contribuem para qualificar como política a violência inaudita da operação policial que banhou Jacarezinho de sangue. Mais relevante que todos eles, é, no entanto, aquele fator que leva o fio do argumento a transcender a dramática situação do Rio de Janeiro e se concentrar num perigoso paralelismo que ameaça acometer a política brasileira. A coalizão de forças reacionárias que chegou ao governo com Bolsonaro perde amplitude e força na política institucional enquanto o presidente se ampara nas suas facções mais extremadas para deslocar às ruas o confronto que provocou (e perde) no âmbito do sistema político e no seu relacionamento com o Judiciário. Fracasso cumulativo, que não cessa de provocar fissuras no arranjo político-miliciano, bem como em suas conexões com o mundo da economia e com interesses de grupos sociais abençoadores da coalizão. É dos efeitos desse evidente fracasso que ele tenta, obstinadamente, blindar – até aqui com sucesso – a sua popularidade. Para segurar esses dedos, abandona, um a um, os anéis do governo e aposta no quanto pior, melhor. Incapaz de vencer na política, quer vencer a política insuflando o povo contra ela. Dispensa mediações, cria uma arena paralela e direta de operação política e a elege como seu universo.

É a partir desse universo que Bolsonaro tenta desviar a pauta nacional ou, não podendo fazer isso, deslegitimar, perante o eleitorado, as instituições políticas e judiciais (no limite as próprias eleições), os partidos e a sociedade civil que, gradativamente, se articulam para lhe impor uma pauta indigesta, qual seja a da responsabilização de seu não-governo pela crise e a de governar o país para tirá-lo dela. A crise que, há um ano, era adivinhada por ele como temida adversária, a ponto de lhe incutir paranoia, hoje é realidade que precisa se converter em caos para que o presidente sobreviva politicamente.

São dois universos paralelos. Num, a política democrática avança, escancara a natureza do retrocesso político, administrativo, cultural e moral em que o país mergulhou. Exorciza perigos, isola o extremismo, produz alguma política pública para situações emergenciais, busca saídas e fabrica alternativas, inclusive eleitorais, colocando obstáculos a que a aventura bolsonarista se renove pelas urnas. Noutro universo, a estratégia desestabilizadora do presidente volta a se radicalizar, em comícios e em suas lives. Repõe ameaças ao STF, aos governadores, às eleições; menciona, possessivamente, as três armas como cúmplices de suas ambições autocráticas e faz novas sabotagens à vacinação. A sensação de perigo retorna porque a desenvoltura do ator sugere que as amarras institucionais que aqui e ali bloqueiam seu ímpeto destrutivo estão mais frouxas do que há semanas atrás.

Tanto quanto os da polícia legal e da polícia fora da lei, esses dois universos políticos são reais. A crise sanitária, social e econômica é o pano de fundo que sustenta esse paralelismo. Nenhuma avaliação ponderada considerará inexorável o derretimento político do presidente hostil, nem superestimará sua capacidade de revogar aquele universo político que visivelmente acumula forças para derrotá-lo. Da mesma forma que não se pode – confiando no que vem ocorrendo no universo da política sistêmica – considerar seu universo paralelo como delírio e deixá-lo solto como se fosse cachorro quase morto que sangrará até a eleição, pelas garras duvidosas da CPI, também não se pode ir atrás do canto de sereia de sua estratégia, cedendo ao combate aberto nas ruas, como opção ao institucional, no qual ele patina.

Sinalizações subversivas do universo bolsonarista

De fato, não é puro delírio, nem se explica como desespero, o que Bolsonaro tem dito nas lives e em palanques armados país afora. Em primeiro lugar, o discurso não apenas tem repetido os mantras de sempre, mas os tem requalificado também, com boas doses de racionalidade. O discurso do comício de Rondônia, especialmente, mostra uma inflexão importante. Ali não estava mais o autocrata vítima de uma conspiração do sistema e limitado, por uma Constituição hostil à sua vontade, no cumprimento de promessas que fez ao seu povo. Agora ele não se limita a reclamar e a ameaçar reagir contra o Judiciário que estaria lhe empurrando a Carta pela goela. Declara-se agora dono efetivo da prerrogativa – que, no universo republicano, é conferida ao STF – de defensor e intérprete positivo da Carta, plenipotenciário senhor do destino do isolamento social, das prerrogativas de cada instituição e do próprio processo eleitoral, aí querendo ocupar também o lugar do TSE. Em segundo lugar, tem dado passos concretos para obter, dos indivíduos despoticamente livres do “seu povo”, o “eu autorizo” para implementar sua pauta. Não é sensato ignorar que levou muita gente à rua no domingo passado, além de estar armando milícias. Quem deu atenção ao clima do discurso da deputada Carla Zambelli, naquele insólito primeiro de maio, não viu desespero, mas celebração confiante de uma aparente decisão bolsonarista de avançar e tomar posse da Constituição como se fosse coisa sua. Como no dizer do professor Miguel Pereira, “não se trata mais de destruí-la, mas sim de preenchê-la com novo conteúdo, mantendo a forma”.

É na moldura desse universo político paralelo, que busca antagonizar o das instituições do Estado e movimentos da sociedade civil, que Jacarezinho adquire conteúdo político e dimensão nacional. A provocação policial ao STF, presente na acintosa coletiva após a chacina, consiste em insinuar que todos os gênios sairão das garrafas, inclusive algum que possa dirigir ao seu alvo o jipe do zero três.  Assinalando essa relação, não me vem à mente a ideia de que corramos, nessa conjuntura complicada, risco de golpe, ditadura ou algo assim.  Vontade não falta ao presidente paralelo, o que lhe falta é como fazer da bravata realidade. Mas sua aposta perene em que anomia fabrique caos social não pode sair do radar democrático.  A expansão da energia destrutiva pode abrir caminho a um imponderável e não são poucas as analogias que se lê com o que se tornaram Colômbia e México a partir de conjunturas críticas. E uma vez admitida a possibilidade de incremento da violência política, daqui a 2022, é forçoso não afastar, no rastro da fala de Mourão, uma “solução” que iniba e mutile a democracia de modo mais sério.

O universo paralelo que Bolsonaro agita contra o “sistema” assusta, impacienta e/ou planta ceticismo em muitas consciências “centristas”, ou de centro-esquerda, que não se identificam com o PT. Exigir uma Justiça ainda mais ativa, ao mesmo tempo contra Bolsonaro e contra as “incoerências” e o “toma lá, dá cá” dos políticos é aí uma pregação frequente que, por vezes, adquire um tom apostolar e desatento à imprescindibilidade democrática do mundo real da política. Por outro lado, a mesma agitação bolsonarista apressa certo pensamento assumidamente voluntarista, situado “à esquerda” da oposição de esquerda, a deduzir daí a ineficácia da Justiça e a complacência do sistema político, denunciando a inadequação de nossas instituições republicanas e liberal-democráticas para a necessária defesa contra o perigo. Enfrentar o fascismo com “luta popular” nas ruas e superar os “limites” do universalismo da democracia representativa são duas diferentes facetas de uma mesma ideia iliberal de fundação de uma república para os “de baixo”, através de uma democracia com maior “intensidade”.

Duas conclusões fatalistas resultam dessas variadas percepções que tendem a construir seus próprios universos paralelos. Elas não são eleitoralmente significativas, mas têm influência cultural e intelectual inibidora de convergências democráticas na política institucional. As de “centro radicalizado” percebem a polarização entre Bolsonaro e Lula como inevitável, tendendo a antecipar um alinhamento por gravidade, para evitar o pior. As da “esquerda crítica” são céticas, quase distópicas, face a qualquer política de frente. Apelam a um discurso de oposição com teor antissistêmico simetricamente oposto ao do bolsonarismo, no qual eleição é instrumento de arregimentação ideológica e não de solução política.

Sinalizações democráticas do universo da política e da sociedade civil

O argumento final aqui – reiterando um ponto que marca esta coluna desde a sua inauguração – vai na direção oposta, de salientar a realidade e vitalidade simultâneas do universo da “política dos políticos” e da rede de movimentos e outras organizações da sociedade civil. Quando nesse universo predominam consensos amplos ou conflitos civilizados, a qualidade da democracia e das relações sociais tende a melhorar, dando-se o oposto quando esse universo trava por polarizações extremas e, por isso, estéreis. A observação continuada do processo político no interior desse universo revela um processo lento, marcado por avanços e recuos, mas ainda assim contínuo, na direção da passagem de uma situação de polarização disfuncional (entre 2013 e 2018) para uma de agregações parciais, transição benigna ligada à  experiência traumática de defrontamento comum com o pathos destrutivo do bolsonarismo, variável em grau de intensidade, mas compartilhada com todas as instituições e todos os atores (mesmo aqueles que a ele se aliaram), desse universo sistêmico animado pela representação política.

No interior desse universo duas agregações estão em marcha, conforme comentei, nesta mesma coluna, três sábados atrás (“Pautas das oposições”, em 17.04.21). Uma delas em torno do nome do ex-presidente Lula, outra, ainda sem nome, por tentativas de aproximação de partidos e personalidades que, no ponto de partida, situam-se entre os campos de atração de Lula e de Bolsonaro. Coloco aqui uma objeção a análises que se suponham cientes, ou videntes, quanto aos respectivos pontos de chegada desses dois subcampos. São ainda ignorados, tanto os limites de agregação de cada um, quanto as entonações políticas que assumirão, por conta dessas mesmas agregações e de tendências que serão, a seu tempo, detectáveis no eleitorado (e que reverberam também a partir do que se dê no universo paralelo, assim como podem afetá-lo). As projeções possíveis de cenários precisam ser recebidas com a imprescindível cautela de quem está ciente do material perecível de que se compõem. Isso inclui as que farei, no próximo sábado, sobre o campo de agregação alternativo ao de Lula, já que a esse último dediquei outra recente coluna (“Lula não é para amadores”, em 24.04.21). Antecipo que, na mão oposta à de previsões fatalistas, vejo se dar, no universo da política sistêmica, uma aceleração de movimentos de convergência para oferecer, às forças que se despregam, ou podem se despregar, do combo bolsonarista, uma alternativa eleitoral que não as afaste do eleitorado afim ao seu posicionamento político, o qual, na falta de termo mais preciso, chamarei, por ora, de liberal, ou de centro-direita.

A possibilidade dessa lógica de agregação do campo democrático afetar e desconstruir o universo paralelo que Bolsonaro construiu para movimentar suas hostes não depende de uma convocação afoita de uma militância oposta para guerrear com ele e suas falanges nas ruas infestadas de coronavírus. Dependem mais da capacidade e do compromisso da política das instituições e partidos, em especial de governadores e prefeitos, tomar a si a responsabilidade por milhares de jacarezinhos que têm seus gritos abafados pelo terror das milícias do Rio e de suas congêneres espalhadas pelo Brasil. Essa empreitada não terá nada de passeio. Embora não se saiba ao certo (ao menos em público) até que ponto essa reprodução de células malignas já avançou sobre a área de segurança pública da União e dos Estados, é certo que não se pode mais adiar um freio de arrumação “nisso aí”, seguido de um programa de reconstrução institucional e de regeneração moral que sinalize aos cidadãos que eles não estão sós.

O desafio de fazer isso contando com o boicote e a sabotagem do governo federal e com a violência retaliativa que emergirá dos porões com a complacência, estímulo e apoio de representantes organizados em bancada no interior das instituições legislativas propicia compreensíveis raciocínios céticos. Mas não há outra atitude a cobrar da representação política, ainda que ao custo de conflitos que compliquem os movimentos de agregação acima mencionados. Além de cerrar fileiras em apoio ao STF, ela precisa assumir, como sua missão, fazer da sorte dos jacarezinhos uma causa nacional. Assim como os poderes da República buscam, com a luta pela vacina, fazer, apesar do presidente, os brasileiros todos virarem jacarés, é preciso buscar que os jacarés defendam os direitos violados dos jacarezinhos. Essa é uma construção cultural inadiável e de importância política decisiva, a ser feita no campo específico do Estado e no campo aberto da sociedade civil. Sem querer calar céticos e ouvindo as notícias verazes que trarão, dirijo-lhes o argumento final. Além desse dever de dirigentes do Estado não ser um passeio, ele nada terá de altruísmo. Deter a escalada de terror miliciano é condição para haver, em 2022, eleições capazes de lhes conferir mandatos. Nessa medida é um desafio que fala também ao seu interesse vital.

*Cientista político e professor da UFBa.

Fonte:

Democracia Política e novo Reformismo

https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/05/paulo-fabio-dantas-neto-politica-entre.html


Aluysio Abreu Barbosa: Com críticas ao PT, criador do Bolsa Família prega união contra Bolsonaro

Engenheiro, economista, primeiro reitor da Universidade de Brasília (UNB) eleito após a nossa última ditadura militar (1964/1985), ex-governador do Distrito Federal pelo PT, no qual implantou o Bolsa Escola em 1995, depois adotado no governo federal Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e ampliado como Bolsa Família no carro chefe dos 13 anos petistas no comando do país, Cristovam Buarque foi também ministro da Educação de Lula. E senador duas vezes: uma pelo PT e reeleito pelo PDT, pelo qual disputou a presidência da República em 2006. Como educador e político, é um currículo nacional de destaque. Que se aproxima de Campos nesta sexta (14), no debate virtual “A política econômica do desenvolvimento: de Vargas aos nossos dias”, entre 16h e 19h, promovido pela Fundação Astrojildo Pereira e com transmissão ao vivo pela Folha FM 98,3 e Plena TV. Nesta entrevista, Cristovam falou do seu rompimento com o PT, que o levou a votar como senador pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. De quem reafirma a prática de crime de responsabilidade, contrária à narrativa de “golpe”. Progressista, criticou uma “esquerda brasileira (que) nunca lutou pelo fim das mordomias, privilégios, desperdícios”. A classificou de “exquerda” e acusou de “negacionista” no “vício de considerar o Tesouro como ilimitado”. Ainda assim, prega a aliança entre as forças de oposição contra o que considera o objetivo principal em 2022: “vencer Bolsonaro”.

Folha da Manhã – Governador de Brasília, quando ainda estava no PT, o senhor implantou o Bolsa Escola em 1995, que seria adotado em 2001 pelo governo federal Fernando Henrique Cardoso. Em 2003, no governo Lula, o programa foi incorporado a outros no Bolsa Família, carro-chefe dos 13 anos do PT no poder. Que saldo faz do programa?

Cristovam Buarque – O Lula não acreditava no Bolsa Escola, tanto que não aceitou colocá-lo como proposta no documento “Educação Já”, publicado em nome dele e meu, em 1990, como produto do governo paralelo (ao do presidente Fernando Collor de Mello, eleito em 1989, batendo Lula no segundo turno). Quando assumiu o governo (federal, em 2003), eu disse (a Lula) que o Fome Zero não era necessário. Bastava espalhar e ampliar o valor do Bolsa Escola Federal que o FHC tinha criado, cinco anos depois de Brasília e por muita insistência minha. Quando percebeu a importância da ideia, por influência do Duda Mendonça (publicitário que criou o “Lulinha Paz e Amor” vencedor da eleição de 2002), Lula agarrou-a como seu grande programa, coisa que FHC nunca fez, como se sentisse vergonha diante do mundo de que o Brasil precisasse pagar para as crianças estudarem. Apesar disto, em sua autobiografia (“Minha Vida”, lançado em 2004), Bill Clinton (ex-presidente dos EUA) fez elogios, mantendo o nome Bolsa Escola em português. Mas ao adotar o programa, Lula provocou três deformações que levaram um programa educacional a ficar assistencial. Trocou o nome, o que faz com que uma mãe receba o dinheiro pensando que é porque sua família é pobre, antes era porque seus filhos iam à escola. Tirou do MEC e colocou no ministério da Assistência Social, que se chamava Desenvolvimento Social. E misturou beneficiários de filhos na escola com todos que precisavam de ajuda. Melhorou a gestão e elevou de 4 para 12 milhões de beneficiários. Tirou o Brasil do mapa da fome, mas não fez a mudança estrutural que, graças à Bolsa Escola, a educação teria feito.

Folha – Primeiro ministro da Educação de Lula, o senhor foi demitido por ele por telefone em janeiro de 2004. Mas só saiu do PT em 2005, com críticas ao “desprezo” do partido pela educação. Que foi a bandeira da sua candidatura a presidente pelo PDT em 2006, ficando em 4º lugar. De lá para cá, qual o lugar da educação na agenda de desenvolvimento do país?

Cristovam – Continua menosprezada. Quando me demitiu, Lula disse que queria um ministro dedicado a aumentar o número de alunos na universidade. De fato, minha preocupação maior era com a erradicação do analfabetismo e iniciar um processo de maior cuidado federal com a educação de base. Até hoje deixamos a educação de base para os pobres entregue às prefeituras pobres e desiguais. E financiamos a universidade com dinheiro federal. Há 50 anos melhoramos a passo de tartaruga, mas ampliando três brechas: entre pobres e ricos, entre o Brasil e o resto do mundo, e entre o que ensinamos e o que é preciso ensinar. Melhoramos ficando para trás e por conta disto estamos nos tornando um país de quarta classe. Já fomos emergentes, estamos caminhando para submergentes. São muitas razões, mas o atraso e a desigualdade educacional são as principais. Pior que não podemos colocar a culpa nos portugueses ou nos escravocratas ou nos latifundiários ou na ditadura militar. Nós, democratas progressistas, ficamos 26 anos no poder, 13 deles com o PT, e não fizemos o que sempre prometemos. Deixamos o país com 35 milhões sem água, 100 milhões sem esgoto, 12 milhões de analfabetos, recessão, desemprego, recessão e corrupção.

Folha – Em 2010, ainda no PDT, seu partido apoiou Dilma Rousseff (PT) a presidente. Em 2014 seu apoio foi para Eduardo Campos (PSB) e, após a morte dele, para Marina Silva. Ela foi a chance eleitoralmente mais viável para um progressista romper com a polarização entre PSBD e PT?

Cristovam — Além da origem e biografia, que o Lula também tem, Marina trazia os dois compromissos centrais para o futuro: educação e meio ambiente, com responsabilidade fiscal. E era uma posição de avanço nas propostas e comportamentos dos governos do PT, sem o aparelhamento da máquina do Estado e submissão ao corporativismo de trabalhadores e de empresários.

Folha – Em 2014, a disputa presidencial ferveu. Dilma se disse disposta a “fazer o diabo” para se reeleger, Lula chamou Aécio e o PSDB de “nazistas”, e a campanha do PT contra a ex-petista Marina seria classificada de fake news, termo criado em 2016, pelo presidente do TSE, ministro Luiz Fux. Se não era novidade, o “nós contra eles” radicalizou demais a partir dali?

Cristovam – A esquerda tem tendência a esta divisão com respeito à democracia, Bolsonaro radicaliza nesta posição, sem respeito à democracia. Mas a esquerda tende a se sentir dona da verdade e única defensora dos interesses populares, não aceita facilmente a alternância no poder. A derrota eleitoral é vista como derrota histórica. Por isto os partidos comunistas se perpetuam. Evo Morales tentou quatro mandatos sucessivos e tentaria o quinto, Chávez e Maduro nem sabemos quantos. Verdade que vencendo eleições, mas, como disse a Dilma, fazendo o diabo, porque a derrota do partido é vista como escravidão para o povo e derrocada do país. Some-se a isto o gosto de muitos pelo poder e pela fortuna.

Folha – O senhor é até hoje criticado pelos ex-companheiros petistas por ter votado, após trocar o PDT pelo PPS (atual Cidadania), pelo impeachment de Dilma no Senado. Assim como a favor da PEC do Teto dos Gastos Públicos e da proposta de reforma trabalhista do governo Michel Temer (MDB). Se pudesse voltar atrás, mudaria algo? Por quê?

Cristovam – Quanto à PEC do Teto e reforma trabalhista, não tenho a menor dúvida que eram necessidades. Não sou negacionista e acredito que 2 mais 2 é igual a 4 também nas finanças. Vejo que a inflação sempre empobrece ainda mais os pobres. E que o vício brasileiro de considerar o Tesouro como ilimitado, da mesma maneira que as florestas, tem servido para esmorecer as forças progressistas que reivindicam novos direitos sem cortar velhos privilégios. A esquerda brasileira nunca lutou pelo fim das mordomias, privilégios, desperdícios, subsídios. Prefere reivindicar a lutar, aumentando os déficits públicos, comemorando vitórias e deixando o povo pagar a conta com inflação e juros altos. Também não sou negacionista na realidade dos avanços técnicos e suas consequências nas relações entre capital e trabalho nos tempos atuais, comparados com o tempo da CLT. Naquele tempo não havia nem elevador sem ascensorista, hoje tem avião sem piloto. Não votei a lei da reforma previdenciária porque estava fora do Senado, mas afirmo que nisto também não sou negacionista: nascem menos crianças, os velhos vivem mais e o Estado se esgotou. Teria votado a favor. Quanto ao impeachment, a resposta é mais complicada. Foi um erro lógico diante do que perdi e sofri. Até netas minhas de menos de 10 anos foram atacadas por cartazes em Brasília. Não foi um voto inteligente e lamento ter sido obrigado a votar para manter minha coerência. Foi um voto decidido por razões morais. Passei dois anos alertando a presidente Dilma do crime de responsabilidade que ela cometia e das trágicas consequências de recessão e desemprego e inflação. Votar contra seria inteligente, mas não seria coerente. Fui prisioneiro de minha biografia moral, que arranhou bastante minha biografia política, porque meus eleitores, leitores e amigos se afastaram. Fiquei só com minha consciência e a sensação de ter sido corajoso e coerente. Eu continuei de esquerda, mas para ser de esquerda você não pode ser negacionista, nem covarde e tem que ser contemporâneo da contemporaneidade. Nossa esquerda ficou saudosista e não vê a história passar. Por isto chamo de “exquerda”.

Folha – Apontado em 2018 como alternativa progressista ao PT e à extrema-direita de Jair Bolsonaro (então, PSL), Ciro Gomes também sofreu críticas suas. Em 2015, quando se disse “rifado” do PDT, o senhor falou do cearense: “Não é um quadro que me entusiasme. O PDT está tão ruim, que nem a entrada do Ciro consegue piorar”. Qual era a opção em 2018?

Cristovam – Eu pensei ser o candidato à presidência pelo PPS, repetir a candidatura de 2006 pelo PDT. Mas Roberto Freire (presidente do PPS, hoje Cidadania) não quis e eu, recém ingressado no partido, abri mão em uma reunião do diretório. Ele queria apoiar (Geraldo) Alckmin (PSDB). Os deputados (Arnaldo) Jordy e Rubens Bueno até hoje reclamam dessa minha posição. O PPS apoiou Alckmin que nem ao menos apoiou minha candidatura ao Senado no DF (na qual ficou em terceiro lugar e não se reelegeu ao terceiro mandato). Eu explicitei que meu apoio era outra vez a Marina Silva, como tinha sido em 2014, depois da morte de Eduardo Campos.

Folha – Após o plenário do STF anular as condenações de Lula na Lava Jato de Curitiba, ele voltou com força ao tabuleiro eleitoral de 2022, no qual vem liderando todas as pesquisas ao primeiro turno e batendo Bolsonaro nas projeções do segundo. Como os 30% de intenções de voto de ambos podem ser alcançados por uma terceira via, a menos de 17 meses da urna?

Cristovam – Nossa tragédia é que acho difícil qualquer um chegar ao segundo turno sem apoio do PT e Lula, mas o PT poderá ter dificuldade no segundo turno para vencer Bolsonaro na disputa para ver quem tem menos rejeição. Além disto, a disputa no primeiro turno gera muito antagonismo, que é levado ao segundo. Temo que a luta entre os antibolsonaristas no primeiro turno leve muitos democratas a anularem o voto, viajarem, votarem em branco e o Bolsonaro vença da mesma forma que venceu ao Haddad, um candidato muito melhor e mais qualificado, técnica e moralmente. Tenho defendido que os candidatos atuais se unam logo no primeiro turno, e o eleito se comprometa a ficar um único mandato. Os outros candidatos de hoje adiariam a disputa para 2026. O ideal seria que o PT ajudasse a escolher um candidato sem rejeição. Mas se o PT não perceber que o momento deve colocar o Brasil e a democracia na frente, se não encontrarmos um candidato que unifique, melhor ir com o PT do que o suicídio nacional com um Bolsonaro reeleito, formando o “seu” exército oficial ou não oficial das milícias. Nem Lula, nem Ciro, nem (Luciano) Huck (sem partido), nem (João) Doria (PSDB), nem Tasso (Jereissati, PSDB) tem o direito de abrir caminho para este suicídio. Melhor que abram mão de suas candidaturas e escolham um deles em um esforço para vencer Bolsonaro. Mas parece que cada um está colocando mais a chance de ser presidente e de beneficiar seus partidos com o Fundo Partidário do que salvar o país. Uma das provas de que nossa geração não está à altura do momento é termos feito em nome de fortalecer a democracia um fundo partidário que ameaça afundar o país.

Folha – Os petistas têm encarado o reinício dos processos de Lula como sua inocência. Em seu livro “Por que falhamos — O Brasil de 1992 a 2019”, o senhor lista os erros da esquerda que levaram a Bolsonaro. E diz: “Nossos intelectuais toleraram de maneira subserviente a corrupção explícita”. Se essa leniência voltar ao poder, onde o Brasil pode parar?

Cristovam – Não será um bom destino, mas melhor do que Bolsonaro. Além disto, o PT e Lula devem ter aprendido com os erros. Apesar de que nunca reconhecem isto publicamente.

Folha – Refém do Centrão no Congresso, com mais de 100 pedidos de impeachment na Câmara, CPI da Covid no Senado, 420 mil brasileiros mortos pela pandemia, volta da inflação, desemprego e dólar em alta, e sem nenhum apoio internacional desde a derrota de Donald Trump nos EUA, Bolsonaro ainda mantém cerca de 30% de apoio popular. Collor e Dilma só caíram quando tinham 1/3 disso. O que projetar?

Cristovam – Projeto que Bolsonaro manterá seu núcleo fanatizado e os outros divididos ajudarão para que ele chegue ao segundo turno. A ideia de dois turnos é formidável: no primeiro, o eleitor escolhe o candidato mais próximo, no segundo, o menos distante. Mas em tempo de radicalismo, o primeiro turno elege os extremos que mantêm seus núcleos aguerridos. E, no segundo turno, os não extremos elegem um dos extremos com menor rejeição.

Folha – Quais são suas expectativas para o debate virtual “A política econômica do desenvolvimento: de Vargas aos nossos dias”, junto ao também professor e economista Bresser Pereira, que será promovido pela Fundação Astrojildo Pereira, das 16h às 19h da próxima sexta (14), com transmissão ao vivo pela Folha FM 98,3 e a Plena TV?

Cristovam – Vou me concentrar menos no que os economistas erraram e mais no que eles esqueceram: os limites ecológicos que desde os anos 60/70 já se percebiam; vetor educacional que outros países já percebiam nos anos 60/70, como mais do que um direito de cada pessoa, a alavanca do progresso econômico e da justiça social; a pobreza como um entrave ao crescimento; a perspectiva histórica que cobra a conta da modernidade apressada; e o esgotamento do Estado, fiscal, gerencial e moralmente. Qualquer que fosse o partido no poder nos últimos quase 100 anos, seus economistas não perceberam essas lacunas no pensamento econômico. Concentraram-se em caminhar rápido, sem perceber que estavam em um rumo errado.

Página 2 da edição de hoje (08) da Folha da Manhã

Fonte:

Blog Opiniões

https://opinioes.folha1.com.br/2021/05/08/com-criticas-ao-pt-criador-do-bolsa-familia-prega-uniao-contra-bolsonaro/


José Luis Oreiro: Minhas propostas para reconstruir o Brasil e retomar o desenvolvimento econômico

O resultado das eleições de 2018, com a eleição de uma pessoa que, por melhor que se possa falar dela, é o pior presidente da história do Brasil desde o tempo de Dona Maria I, a louca, Rainha de Portugal, quando nosso país ainda era colônia; mostra claramente que a sociedade brasileira está passando por uma enfermidade mental grave, que a impede de discutir com clareza e profundidade os problemas que mantem a economia Brasileira estagnada a 10 anos e com um crescimento medíocre da renda per-capita desde o início da década de 1980. Conforme a figura abaixo mostra claramente, desde 1980 a renda per-capita brasileira medida em US$ constantes vem se reduzindo com respeito a dos Estados Unidos, o que significa que a sociedade brasileira está se tornando cada vez mais pobre em termos relativos a mais de 40 anos; em em termos absolutos nos últimos 5 anos.

Desde o impeachment da Presidente Dilma Rouseff o mercado financeiro e os economistas liberais assumiram o controle da política econômica no Brasil, apresentando um programa de reformas estruturais (teto de gastos, reforma trabalhista, reforma da previdência, etc) que, em tese, deveriam acelerar o crescimento da economia Brasileira após a grande recessão da economia Brasileira (2014-2016), cuja responsabilidade eles atribuem a (sic) irresponsabilidade fiscal dos governos do PT. Essa agenda teve por base o documento “Ponte para o Futuro”, elaborado por Marcos Lisboa, José Márcio Camargo, entre outros e apresentado ao Presidente Michel Temer como base da política econômica a ser adotada no seu governo. Conforme argumentei em artigo publicado em 2017 na Revista Estudos Avançados da USP (A grande recessão brasileira: diagnóstico e uma agenda de política econômica (scielo.br))a grande recessão foi causada pela queda acentuada dos gastos de investimento ao longo do ano 2014, cuja origem se encontra na redução das margens de lucro das empresas não financeiras decorrente da elevação do custo unitário do trabalho e da sobrevalorização da taxa de câmbio. Os efeitos recessivos do colapso do investimento foram amplificados pelo realinhamento brusco dos preços relativos ocorrido no primeiro semestre de 2015, e pela contração fiscal executada pelo Ministério da Fazenda no primeiro ano do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Terminada a crise no quarto trimestre de 2016, a economia brasileira passa a apresentar um crescimento pífio, mostrando o fracasso inequívoco da agenda liberal, mesmo antes da eclosão da pandemia do covid-19, conforme argumentei em artigo publicado em meu blog em fevereiro de 2020 (Não, a economia brasileira não se recuperou da crise de 2014-2016; e talvez nunca se recupere … | José Luis Oreiro (wordpress.com)) .

Nas eleições de 2018 a agenda econômica não foi a peça central da corrida presidencial. O candidato vencedor não apresentou nenhuma proposta, limitando-se a dizer que a economia brasileira seria gerida por um super-ministro da economia, o liberal Paulo Guedes, que aspirava ao cargo de ministro da economia desde a época do Plano Real e chegou a assessorar o candidato do PPS, Ciro Gomes, nas eleições de 1998, quando Fernando Henrique Cardoso foi reeleito no primeiro turno. A atuação de Paulo Guedes a frente do Ministério da Economia acabou revelando sua enorme incompetência, conforme analisei numa live realizada em 2020 para o Portal Disparada ((1914) José Oreiro analisa Paulo Guedes – YouTube). Nas eleições de 2018 a tática adotada por Bolsonaro foi utilizar aquilo que o Professor Paul Krugman certa vez denominou de “armas de distração de massa”, ou seja, “iscas retóricas” para desviar o foco do debate público da economia para assuntos folclóricos como “kit gay”, “comunismo”, “ameaça de Venezualização do Brasil” e etc. Dessa forma, os interesses das classes dominantes, notadamente do sistema financeiro, podem passar despercebidos, enquanto a “grande massa” fica entretida com a “demonização” da esquerda e dos partidos de esquerda, os quais, apesar de suas falhas, historicamente representam os interesses dos trabalhadores e das classes menos favorecidas no Brasil, tal como em outras partes do mundo. Diga-se de passagem, como mostra Paul Preston na sua obra “El Holocausto Español: odio y exterminio en la Guerra Civil y después” (2013), a mesma tática foi adotada pela direita espanhola nos anos anteriores a guerra civil com o objetivo de transformar a toda e qualquer pessoa que defendesse as melhorias nas condições de vida das classes trabalhadoras numa inimiga da “civilização cristã ocidental” e, portanto, passível de ser eliminada do mundo dos vivos (ok, os anarquistas tornaram o trabalho da direita espanhola mais fácil com sua obseção para queimar igrejas e conventos e profanar lugares sagrados).

Isso posto, estou convencido que o Brasil só irá se livrar do pesadelo em que se encontra se as eleições presidenciais de 2022 forem pautadas pelo debate de ideias e propostas, não pelo debate em torno de pessoas. Tendo isso em mente na sequência irei apresentar uma série inicial de propostas de política econômica para reconstruir a economia brasileira e retomar o desenvolvimento econômico. Neste momento me coloco portanto como pré-candidato a Presidência da República, não por achar que tenha condições objetivas de ganhar as eleições (embora no Brasil nada seja impossível), mas como um pontapé inicial para que seja possível discutir de forma clara e profunda as medidas necessárias para colocar o Brasil de volta nos trilhos do desenvolvimento econômico.

Importante esclarecer que, neste momento, não estou filiado a nenhum partido político. Eu represento a mim mesmo e minhas ideias. Também esclareço que estou aberto a críticas e sugestões a respeito das propostas que apresentarei na sequência.

As propostas apresentadas a seguir exigem a formação de uma grande coalizão política em torno das mesmas. Por isso, o debate sério, sem ódios, é absolutamente necessário para a sua implementação. Estou dispostos a conversar com pessoas de todos os espectros políticos; menos, é claro, com Bolsonaristas. Esses serão julgados, com a Graça de Deus, nos tribunais Brasileiros e Internacionais pelo genocídio que está sendo praticado neste país, cujas provas são abundantes e contundentes.

1) Acabar com o teto de gastos e substituí-lo por uma meta de resultado primário estrutural suficientemente grande para reduzir a divida publica liquida como proporção do PIB para menos de 50% em 10 anos, sem prejudicar a retomada do crescimento econômico no curto e médio prazo que exige aumento imediato do investimento publico em infraestrutura, com foco em mobilidade urbana e descarbonização da economia. O cálculo do resultado primário estrutural requerido será feito, de forma independente, pela Instituição Fiscal Independente, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e a Secretária de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Será utilizada a média dessas três estimativas como meta de resultado primário estrutural.

2) Reforma tributaria unindo a PEC 45 de autoria do deputado Baleia Rossi com as propostas dos partidos de esquerda de reforma do IRPF, do IRPJ e dos impostos sobre propriedade (IPTU, ITR, IPVA) para aumentar a progressividade da carga tributaria e aumentar a arrecadação de impostos.

3) Restabelecimento do papel dos bancos públicos, notadamente do BNDES, no financiamento do investimento na modernização do parque industrial brasileiro, com metas de exportação de manufaturados e conquista de market share. A TLP será substituída pela TJLP, cujo valor será fixado pelo Conselho Monetário Nacional

4) Introdução de um efetivo regime de mandato duplo para o Banco Central do Brasil, com metas para inflação e crescimento da economia. As metas de inflação serão baseadas no core inflation e o prazo de convergência para a meta de inflação será estendido para 24 meses.

5) Introdução de controles de entrada e saída de capitais externos para reduzir a volatilidade da taxa de cambio e mantê-la num patamar competitivo no médio e longo prazo, os quais serão de competência exclusiva do Conselho Monetário Nacional, o qual deverá definir uma meta de médio e longo-prazo para a taxa real de câmbio, utilizando os controles de capitais e todos os instrumentos regulatórios que julgar necessários para a obtenção da referida meta.

6) Introdução de um imposto de exportação de commodities, com alíquota variável a depender dos preços internacionais das mesmas, como argumentei em artigo publicado no Jornal do Brasil em maio de 2018 (Como Administrar o Câmbio? (Jornal do Brasil, 06 de maio de 2018) | José Luis Oreiro (wordpress.com) A receita deverá ser usada para reconstituir o Fundo Soberano Brasileiro, a ser usado para financiar a descarbonização completa da economia brasileira ate 2050.

7) Introdução de um programa de renda mínima não-universal, em substituição ao Bolsa Família no valor de R$ 300,00 por mês, para famílias cuja renda mensal per capita seja inferior a R$ 250,00. O programa será de caráter permanente, garantido por Emenda Constitucional. O valor do benefício será reajustado anualmente com base na meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional.

8) Nova regra de reajuste do salario mínimo com base na meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional acrescentada da media móvel de 5 anos da taxa de crescimento do PIB per capita, calculada com os dados disponíveis no momento do reajuste salarial.

9) Reforma das FFAA brasileiras com substituição do recrutamento obrigatório por recrutamento voluntario, e redução dos efetivos em 30%. A medida tem por objetivo garantir a profissionalização das FFAA brasileiras, ao mesmo tempo que permite um aumento do gasto com o reaparelhamento do equipamento militar, financiando os mesmos com a redução dos gastos com salários e pensões dos membros das forças armadas. As pensões para filhas de militares deverão ficar restritas a mulheres com até 21 anos, independente de seu estado civil.

10) Fim do contingenciamento de gastos. A LOA devera definir uma banda de valores para as projeções de crescimento do PIB, inflação e taxa de juros de maneira a se obter um resultado primário anual dentro de uma banda. A meta de resultado primário nominal da LOA deverá ser compatível com a meta de resultado primário estrutural. A LOA deverá ser elaborada de forma a garantir um piso para o investimento em Ciência e Tecnologia de 1% do PIB por parte do governo federal. Esse valor será repassado para a FINEP, CNPq e IFES. Caso a meta de resultado primário definida na LOA não seja cumprida, os Ministros da Fazenda e do Planejamento deverão encaminhar ao Senado Federal, num prazo de até 90 dias após o início do ano calendário, uma carta explicando as razões do descumprimento e as medidas que serão adotadas para o cumprimento da mesma em exercícios posteriores. Caso o Senado Federal não aprove a explicação e /ou o plano de ajuste, então os ministros serão automaticamente demitidos dos seus cargos a bem do serviço público.

Fonte:

José Luís Oreiro

https://jlcoreiro.wordpress.com/2021/05/09/minhas-propostas-para-reconstruir-o-brasil-e-retomar-o-desenvolvimento-economico/