Luiz Carlos Azedo: Temer livre; Moreira, também

“A libertação do ex-presidente e seu ex-ministro desanuvia as tensões com o MDB, mas vai acirrar os ânimos no Congresso em relação à CPI do Judiciário, batizada de Lava-Toga”

O desembargador do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) Antonio Ivan Athié revogou a prisão preventiva do ex-presidente Michel Temer (MDB), do ex-ministro Moreira Franco e dos outros seis investigados que estavam presos desde a quinta-feira (21) por decisão do juiz federal Marcelo Bretas, responsável pela Operação Lava-Jato no Rio de Janeiro. Com base em jurisprudencial dos tribunais superiores, alegou que houve violação de garantias constitucionais na decisão de primeira instância. O desembargador marcara para amanhã o julgamento dos pedidos de liberdade, mas antecipou sua decisão.

Athié é presidente da primeira turma especializada em direito penal, previdenciário e da propriedade industrial, à qual o Ministério Público deverá recorrer. A primeira turma é formada também pelos desembargadores federais Paulo Espírito Santo e Abel Gomes. O caso de Temer caiu nas mãos de um gato escaldado: Athié ficou afastado do cargo durante sete anos por ter sido alvo de uma ação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2004, sob acusação de estelionato e formação de quadrilha. O inquérito contra ele foi arquivado em 2008 pelo próprio STJ, a pedido do Ministério Público Federal, que alegou não ter encontrado provas de que Athié teria proferido sentenças em conluio com advogados.

Na sua decisão, Athié elogiou Bretas (“notável juiz, seguro, competente, corretíssimo”), mas discordou do juiz federal em relação aos argumentos utilizados para decretar a prisão preventiva de Temer e dos outros suspeitos, por considerar que não respeitaram o devido processo legal. Bretas recorreu à Convenção da ONU Contra a Corrupção para justificar as restrições de liberdade, o que não foi aceito por Athié: “Não se vá dizer que outro órgão, outra pessoa, ou quem quer que seja, afora o Judiciário em processo regular, possa validamente declarar alguém culpado de algum delito, para fins penais”.

Tensões
A libertação de Temer e Moreira Franco desanuvia as tensões com o MDB, mas vai acirrar os ânimos no Congresso em relação à CPI do Judiciário, batizada de Lava-Toga, que une setores de esquerda e a base mais radical do presidente Bolsonaro. Autor do requerimento, o senador Alessandro Vieira (PPS-SE) minimiza os riscos de uma crise institucional: “O Brasil não vai virar um caos e não vai parar com a Lava-Toga. O Brasil prendeu o presidente da República mais popular da história, denunciou duas vezes um presidente no exercício do mandato, colocou na cadeia ex-governadores, prefeitos, deputados, e não entrou em crise coisa alguma. A democracia brasileira está sólida o suficiente para passar por mais essa etapa”. A cúpula do Senado, porém, não concorda com isso: Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente da Casa, já disse que a CPI dificilmente será instalada, porque os principais partidos não apoiam.

Na Câmara, um grupo de parlamentares está em campanha aberta contra o Supremo Tribunal Federal (STF), por razões claramente ideológicas. Na semana passada, a deputada Bia Kicis (PSL-DF) protocolou um pedido de impeachment dos quatro ministros do STF que já votaram a favor da equiparação da homofobia ao racismo nas duas ações que discutem o tema no tribunal: Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Do grupo fazem parte, entre outros, Alexandre Frota (PSL), Kim Kataguiri (DEM) e Luiz Philippe Orleans e Bragança (PSL), descendente da família real brasileira.

É nesse ambiente que a turma do deixa disso tenta apagar o incêndio nas relações entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que andaram se estranhando no fim de semana. Ontem, Bolsonaro pediu aos ministros “foco na pacificação” e escalou o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para negociar a votação da reforma da Previdência com os líderes partidários. Em nenhum momento, porém, admitiu um encontro com Maia, para restabelecer o diálogo. No estado-maior de Bolsonaro, caiu a ficha de que a não aprovação da reforma da Previdência pode levar o governo ao fracasso econômico. Entretanto, a lógica do “meu pirão primeiro” ainda prevalece entre os generais do governo, que querem aprovar a reestruturação da carreira dos militares a qualquer preço, embaralhando as negociações sobre a reforma no Congresso.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-temer-livre-moreira-tambem/


Ricardo Noblat: Quanto pior, melhor para o capitão

Ameaça à democracia

Ao Congresso, uma vez que queira se comportar com responsabilidade, cabe pôr suas impressões digitais na reforma da Previdência e aprová-la em tempo razoável. Porque para o presidente Jair Bolsonaro, tanto faz como tanto fez.

Bolsonaro votou contra todas as propostas de reforma da Previdência nos seus sete mandatos de deputado. Para isso até alinhou-se com o PT. Terceirizou a área econômica de um eventual governo só para obter o apoio do mercado.

Uma vez que se elegeu, pouco se lhe dá se a reforma for aprovada ou não. Cumpriu o ritual de ir ao Congresso apresentá-la. Vez por outra repete que sem ela o país quebrará. Mas ao mesmo tempo a torpedeia sempre que pode.

Se ela passar, Bolsonaro dirá que se deveu ao seu empenho e ao do ministro Paulo Guedes. Do contrário, culpará o Congresso pelo que possa acontecer ao país mais tarde. Jamais confessará que aposta no pior. É nisso, de fato, no que aposta.

Os que analisam o governo Bolsonaro cedem à tentação de normalizá-lo, de o observarem como a maioria dos governos que o país já teve – particularidades à parte. Mas ele não é e não quer ser um governo como qualquer outro.

Embora tenha ficado quase 30 anos na Câmara, Bolsonaro nada aprendeu ali, nada quis aprender, e por isso jamais se destacou entre seus pares – salvo como um tosco parlamentar, estridente e monotemático, em defesa das piores causas.

Ele foi a primeira pessoa a surpreender-se com a descoberta de suas chances de se eleger presidente – a segunda foi sua mulher. Isso ocorreu depois da facada em Juiz de Fora. À falta de equipe e de um plano de voo, montou o pior governo das últimas décadas.

Sem compromisso com coisa alguma, apreciador de ralas e confusas ideias, todos os seus passos até aqui têm sido na direção do enfraquecimento da democracia. Direto ao ponto: Bolsonaro sonha com o estabelecimento de um regime autoritário sob seu comando.

Daí seu desprezo pelos partidos, seu pouco caso com a Justiça cada vez mais acossada por seus devotos nas redes sociais, e seu ódio à imprensa independente. Se não houver a ruptura institucional tão desejada por ele, seguirá em frente aos trancos e barrancos.

Se sua situação no cargo tornar-se insustentável, será capaz de jogar tudo para o alto e ir gozar a vida confortável de ex-presidente. Era seu plano original: ajudar os filhos a se reelegerem e desfrutar da companhia de dona Michele e da filha mais nova. Aí deu no que deu.

A resistência de Rodrigo Maia

Bolsonaro, o fabricante de crises

Desde o início da semana passada quando Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, tornou-se o alvo preferencial de Bolsonaro e dos seus acólitos, Maia e o ministro Paulo Guedes, da Economia, trocam mensagens diárias pelo WhatsApp.

Guedes está horrorizado com o cerco a Maia, mas sabe que tem pouco a fazer pela sorte dele. Bolsonaro não o escuta em matéria de articulação política. Também não dá muita bola para o que ouve do ministro Onyx Lorenzoni, da Casa Civil.

Não passa de lenda essa história de que a ala militar do governo controla Bolsonaro. Os generais o aconselham, bancam os moderados, mas Bolsonaro os contraria com frequência. O respeito à hierarquia os impede de ir além.

O sucesso da resistência de Maia aos acintes de Bolsonaro depende unicamente do apoio que obtiver dos líderes dos partidos na Câmara e fora dela.

ABIN de olho em políticos

No radar
A agência Brasileira de Inteligência (Abin) está atenta aos passos de cabeças coroadas do Congresso. Uma delas, por sinal, já foi avisada por um amigo e começou a tomar cuidado com o que fala e escreve.


Bolsonaro estimula celebração do golpe militar de 1964; generais pedem prudência

Presidente orienta Forças Armadas a comemorar aniversário do golpe militar de 31 de março

Tânia Monteiro, de O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro orientou os quartéis a comemorarem a “data histórica” do aniversário do dia 31 de março de 1964, quando um golpe militar derrubou o governo João Goulart e iniciou um regime ditatorial que durou 21 anos.

Generais da reserva que integram o primeiro escalão do Executivo, porém, pedem cautela no tom para evitar ruídos desnecessários diante do clima político acirrado e dos riscos de polêmicas em meio aos debates da reforma da Previdência.

Em um governo que reúne o maior número de militares na Esplanada dos Ministérios desde o período da ditadura (1964-1985) – o que já gerou insatisfação de parlamentares –, a comemoração da data deixou de ser uma agenda “proibida”. Ainda que sem um decreto ou portaria para formalizá-la, a efeméride volta ao calendário de comemorações das Forças Armadas após oito anos. Veja onde estão os oficiais das Forças Armadas no governo no "mapa dos militares".

Em 2011, a então presidente Dilma Rousseff, ex-militante torturada no regime ditatorial, orientou aos comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha a suspensão de qualquer atividade para lembrar a data nas unidades militares.

O Planalto pretende unificar as ordens do dia, textos preparados e lidos separadamente pelos comandantes militares. Pelos primeiros esboços que estão sendo feitos pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, o texto único ressaltará as “lições aprendidas” no período, mas sem qualquer autocrítica aos militares. O período ficou marcado pela morte e tortura de dezenas de militantes políticos que se opuseram ao regime.

O texto também deve destacar o papel das Forças Armadas no contexto atual. De volta ao protagonismo no País, militares são os principais pilares de sustentação do governo Bolsonaro. Por isso, generais da reserva disseram à reportagem que no entendimento da cúpula das Forças Armadas e do próprio presidente, a mensagem precisa ser “suave”. Eles afirmam que não querem nenhum gesto que gere tumulto porque não é hora de fazer alarde e/ou levantar a poeira. O momento, dizem, é de acalmar e focar em reverter os problemas econômicos, como reduzir o número de desempregados.

Investigações. A suspensão da festa em comemoração a 1964 por Dilma coincidiu com a criação da Comissão Nacional da Verdade. O grupo foi criado pela presidente em meio à pressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), que condenou o Estado brasileiro pelo desaparecimento de guerrilheiros na região do Araguaia, e da Justiça Federal, que cobrava a entrega de restos mortais a familiares de vítimas da ditadura.

Embora não tenha avançado nos esclarecimentos dos episódios mais emblemáticos do período, a comissão desagradou aos militares. Na época, segundo relato de oficiais, ficou estabelecido uma espécie de acordo informal com o Exército – comandado à época pelo general Enzo Peri – de que não haveria “perseguição”. Oficiais afirmam que Dilma, na ocasião, chegou a dizer: “Não farei perseguição, mas em compensação não quero exaltação”.

Do outro lado, integrantes da comissão chegaram a demonstrar desconforto com a postura do então ministro da Defesa, Celso Amorim, e dos comandantes das Forças Armadas de, segundo eles, não se esforçarem na busca de informações. O relatório final do grupo foi entregue em dezembro de 2014 e considerado um fiasco por pesquisadores e parentes de desaparecidos políticos.

A partir daí, as comemorações nas unidades militares minguaram. A lembrança da passagem do 31 de março ficou limitada às atividades do Clube Militar, com sede no Rio, formado por oficiais da reserva.

Em janeiro de 2016, o então chefe do Comando Militar do Sul, o atual vice-presidente Hamilton Mourão, deixou o posto com um discurso em que citava a derrubada de Goulart. Ele lembrou que assumiu o cargo em 31 de março de 2014. “31 de março, grande data”, disse. Ao lado dele estava o substituto, general Edson Pujol, hoje comandante do Exército.

Cabeceira. O próprio Bolsonaro já declarou ter como ídolo um dos símbolos do regime militar, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, morto em 2015. Ustra foi comandante do DOI-Codi do II Exército, em São Paulo, onde teriam morrido 45 prisioneiros.

Durante a campanha, o presidente disse que seu livro de cabeceira é A verdade sufocada, uma versão de Ustra para os assassinatos de opositores do regime. Na época da campanha eleitoral, generais chegaram a sugerir que Bolsonaro não repetisse a afirmação.

Ao votar pelo impeachment de Dilma, Bolsonaro citou Ustra no discurso, causando polêmica. “Perderam em 64, perderam agora em 2016. Pela família, pela inocência das crianças em sala de aula, que o PT nunca teve, contra o comunismo, pela nossa liberdade, contra o Foro de São Paulo, pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff, pelo Exército de Caxias, pelas Forças Armadas, pelo Brasil acima de tudo e por Deus acima de tudo, o meu voto é sim”, declarou na ocasião em plenário.


Fernando Gabeira: O momento da Lava-Jato

É possível que avance no governo a tese de que a operação reduz as chances de aprovação da reforma da Previdência

Aqui no alto da Serra de Ibitipoca, uma bela região de Minas, chove e faz frio. Na minha cabeça, tentava organizar um artigo sobre uma possível intervenção militar na Venezuela. Rememorava a Guerra do Iraque e os grandes debates da época. Achava uma visão idealista tentar impor, numa sociedade singular, a democracia liberal à ponta do fuzil.

Continuo achando. Lembro-me de que, num debate em Paraty, o escritor Christopher Hitchens ficou bravo com meus argumentos. Nada grave. Semanas depois, escreveu um artigo simpático sobre aquela noite. Hitchens, ao lado de outros intelectuais como Richard Dawkins, dedicava-se muito ao combate da religião. Mas não percebeu como suas ideias sobre a invasão do Iraque, como observou John Gray, tinham uma ponta de religiosidade.

Esse era meu plano. No alto do morro, o único lugar onde isso era possível, o telefone deu sinal da mensagem: Temer foi preso. Moreira Franco também. A possibilidade da prisão de Temer sempre esteve no ar. Na última entrevista, lembrei a ele que ia experimentar a vida na planície.

Aqui neste pedaço da Mata Atlântica, não é o melhor lugar para se informar em detalhes. No meio da semana, tinha escrito um artigo sobre a derrota da Lava-Jato no STF, que deslocou o caixa 2 e crimes conexos para a Justiça Eleitoral.

Lembrava que o grupo de ministros que se opõem à Lava-Jato aproveitou um momento de desequilíbrio. Foi o escorregão dos procuradores ao tentar destinar R$ 2,3 bilhões, oriundos do escândalo da Petrobras, para uma fundação. Eles recuaram para uma alternativa mais democrática, um uso do dinheiro através de avaliação mais ampla das necessidades do país.

Distante dos detalhes da prisão de Temer, tento analisar este novo momento da Lava-Jato. Até que ponto vai fortalecê-la ou ampliar o leque de forças que se opõem a ela, apesar de sua popularidade? Diante da prisão do ex-presidente, que é do MDB, certamente vai surgir uma tendência de opor as reformas econômicas à Lava-Jato.

É uma situação nova, que ainda tento avaliar. O ministro Sergio Moro tem um pacote de leis contra o crime que já está sendo colocado em segundo plano, em nome da reforma da Previdência. É possível que avance junto ao governo uma nova tese, a de que a Lava-Jato prejudica as reformas, reduzindo suas chances de aprovação. Além disso, há o mercado, sempre expressando seu nível de pessimismo.

As acusações contra Temer eram conhecidas. Como diz um analista estrangeiro, ele gastou grande parte da energia e do tempo de seu governo para tentar escapar delas. Por essas razões, será necessário deixar bem claras as razões que levaram Temer à cadeia. É apenas mais um ex-presidente; mas, no caso de Lula, só houve prisão depois de condenado em segunda instância. Essa diferença desloca o debate técnico para a causa da prisão. Daí a importância de bons argumentos.

A ideia geral é de que a Lava-Jato deve seguir seu curso independentemente de análises políticas. Mas ele depende do apoio da opinião pública. Qualquer momento de fragilidade é usado pelos lobos no Supremo que querem devorá-la.

Numa análise mais geral, as eleições fortaleceram a Lava-Jato. A própria ida de Moro para o governo era o sinal de que agora ela teria o Executivo como aliado. Mas as coisas não são simples assim. A escolha de Moro por Bolsonaro foi um gesto político.

A renovação no Parlamento pode ter ampliado o apoio à Lava-Jato. Mas ainda é bastante nebuloso prever que leis contra o crime, especialmente o do colarinho branco, tenham um trânsito fácil, maioria tranquila.

O governo perde prestígio, segundo as pesquisas. Está dependendo da reforma da Previdência. Pode haver uma convergência momentânea para empurrar com a barriga as leis contra a corrupção.

Houve maioria no Supremo para mandar processos para uma Justiça Eleitoral sem condições de investigá-los com rigor. A mesma maioria de um voto pode derrubar a prisão em segunda instância.

Nesse momento, não adiantará aquele velho argumento: perdemos uma batalha, mas venceremos no final. Uma sucessão de derrotas precisa acender o sinal de alarme. Somente uma interação entre a opinião pública e a parte do Congresso que entendeu a mensagem das urnas pode reverter essa tendência. Haverá força para isso?

Aqui no meio do mato, não me arrisco a concluir nada. Eleições não decidem tudo. Ainda mais uma falta de rumo dos vencedores, que chega a nos fazer temer que, na verdade, não tenham resolvido nada. Exceto mudar o rumo, da esquerda para a direita.


Demétrio Magnoli: A conspiração e a ultradireita do governo

A teoria conspiratória eleva qualquer um à condição de sábio

Diante de uma lápide, no antigo cemitério judeu de Praga, à sombra da noite, reúnem-se 12 rabinos, representantes das tribos de Israel. O mais venerável toma a palavra. No seu discurso, proclama que “18 séculos pertenceram a nossos inimigos”, mas “o século atual e os futuros pertencerão a nós”. Em seguida, explica que a luta pela hegemonia mundial se desenrolará nos planos político, econômico e religioso, por meio da tomada de controle das finanças, do poder de Estado, dos meios de comunicação e das instituições educacionais.

A estrutura narrativa da conspiração encontra seu paradigma no mito da conspiração judaica, que emerge em romances baratos, artigos fantasiosos de jornal e uma célebre falsificação da polícia czarista russa, na passagem do século 19 para o século 20. O historiador Raoul Girardet segue a trilha desses textos no ensaio “A conspiração”, que faz parte do livro “ Mitos e mitologias políticas ” , publicado em 1986. É um guia inesperado para compreender o que se passa, hoje, no governo Bolsonaro.

A facção ultradireitista do governo, formada por seguidores de Olavo de Carvalho, nutre-se da ideia da conspiração. No lugar dos judeus, o Bruxo da Virgínia coloca os “liberais globalistas” e os “comunistas”, ligados por um pacto de dominação global que almeja destruir as “nações de sangue”. Se a constrangedora visita presidencial aos EUA nos ensina algo, a lição é que a paranoia conspiratória sedimentou-se como convicção fundamental do próprio presidente.

O Bruxo da Virgínia não inventou a versão contemporânea da conspiração mundial. De fato, ele apenas reproduz a tábua da fé da alt-right, a direita nacionalista americana, que tenta organizar um movimento nacionalista internacional. A crença difunde-se entre os fiéis pelo labirinto das redes sociais, em fragmentos de informação descontextualizada, boatos ferozes e acalorados rumores. Uma concha protetora providenciada pela aversão à imprensa profissional isola a seita da torrente de notícias que descortinam a complexidade do mundo.

A conspiração seduz, hipnotiza, encanta os espíritos. Sua narrativa simples, similar às do conto de fadas e do folhetim, oferece explicações completas para fenômenos complexos. Sua força persuasiva floresce no solo da ignorância histórica e da preguiça intelectual. Não é preciso ler, estudar, investigar: a teoria conspiratória eleva qualquer um à condição de sábio. A conspiração é o travesseiro, o lençol e o cobertor dos incultos. O Bruxo da Virgínia, que sabe disso, fez dela o núcleo do seu modelo de negócios.

Depois que deita raízes, a teoria conspiratória é invulnerável à prova negativa — e, inclusive, alimenta-se dela. Postos diante de contestações lógicas ou factuais, os espíritos tomados por ela retrucam que o autor da refutação faz parte da própria conspiração. Experimente sugerir a um “aluno de Olavo” que o keynesianismo fechou caminhos às proposições socialistas. Ele responderá que o interlocutor é um arauto do keynesianismo — isto é, do “marxismo cultural” espraiado nas instituições, na mídia e nas universidades. Nas bolhas das redes sociais, a resposta patética passa como contrarrefutação indiscutível.

Figuras imersas no caldo de cultura da conspiração inclinam-se a fantasiar pequenos complôs cotidianos— e a reagir articulando, eles mesmos, complôs paroquiais. O MEC, comandado por um discípulo do Bruxo da Virgínia, é um microcosmo desse fenômeno. A crônica guerra civil que o paralisa, contrapondo fanáticos “olavetes” a assessores técnicos e militares, evidencia a inviabilidade de um governo submetido ao paradigma conspiratório. Governar exige um mínimo de respeito a regras de administração e alguma estabilidade política. Nada disso é compatível com as quimeras que movem a facção ideológica do bolsonarismo.

“Se continuar assim, mais seis meses e acabou”, pressagiou Olavo de Carvalho sobre o governo Bolsonaro, no jantar em Washington, pouco antes de tomar assento ao lado do presidente. O Bruxo da Virgínia tem os meios para demonstrar o acerto de sua profecia.


El País: “O problema da esquerda não é a pauta dita identitária, mas sim a lacração”, diz Tatiana Roque

Para filósofa e matemática, campo progressista deve se opor à reforma da Previdência de Bolsonaro apresentando seu próprio projeto. Defende que a renovação deve vir a partir dos municípios

Por Felipe Betim, do El País

No ano passado, a filósofa e matemática Tatiana Roque, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), decidiu se filiar ao Partido Socialismo Liberdade (PSOL) e se candidatar a deputada federal pelo Rio, conseguindo 15.789 votos. Não foi o suficiente para entrar na Câmara dos Deputados. De volta a vida acadêmica, Roque agora ajuda a articular um movimento transversal de pessoas independentes que não se encaixam ou não identificam com as correntes de partidos como o PT e o próprio PSOL, mas que querem fazer política e ter propostas progressistas concretas. "Muitos expressam vontade de fazer trabalho de base. A experiência do 'vira voto' [às vésperas da eleição de Jair Bolsonaro] foi muito marcante para todo mundo. Eram pessoas que estavam afastadas da política. E elas vão fazer política onde agora? Como?", explica Roque em entrevista ao EL PAÍS. O principal foco, acredita, é reconstruir a esquerda, derrotada nas últimas eleições pelo ultraconservador Bolsonaro, a partir das eleições municipais de 2020.

Pergunta. O que você destacaria de positivo e negativo na reforma da Previdência?
Resposta. Antes de fazer uma discussão técnica, há uma discussão política. Ela precisa ser pensada num contexto político muito especifico. Existe um campo liberal que realmente não está interessado em combater os privilégios, mas em diminuir os direitos. Fez uma aliança com o Governo Bolsonaro, o que há de mais retrógrado e antidemocrático, para empurrar essa reforma. Independentemente de pontos que sejam pertinentes, como a idade mínima, que diz respeito a uma mudança demográfica e que é consenso, tem esse problema político. A reforma é fruto de uma aliança entre uma força ultraliberal representada por Paulo Guedes, que quer fazer não só essa como várias reformas que vão no sentido de diminuir o estado de bem-estar social, e uma força ultraconservadora antidemocrática.

P. Em outra entrevista, no auge do Governo Temer, você afirmou que a esquerda deveria ter um projeto de reforma da Previdência, mas que aquele Governo era ilegítimo. Bolsonaro chegou pelas urnas. A esquerda deve se opor a uma reforma mais uma vez, ou negociar no Congresso?
R. Uma coisa não anula a outra. A esquerda deve ser uma oposição radical a um Governo radical. O que eu dizia e continuo dizendo é que a esquerda tem que fazer oposição a essas reformas ultraliberais tendo um outro projeto de reforma da Previdência. Isso foi inclusive apontado pelo Nelson Barbosa [ex-ministro da Fazenda do Governo Dilma Rousseff]. Agora, é claro que, na ação parlamentar, você deve tentar diminuir aqueles pontos mais prejudiciais para os mais pobres, como as mudanças no Benefício da Prestação Continuada (BPC), na aposentadoria rural... Existem mudanças claramente prejudiciais aos mais pobres e acho que existe uma aliança mais ampla contra esses pontos. E é claro que a esquerda deve se unir a esse bloco parlamentar e negociar junto. Mas, de um modo geral, como força de oposição, deve ser contra. Mas deve ter um projeto próprio.

P. Isso parece estar longe de acontecer...
R. Vai ter que caminhar junto com uma renovação da esquerda. Ela está numa fase de mutação, passando de uma fase de hegemonia do PT para uma fase em que varias forças estão disputando essa hegemonia. O PSOL está em boas condições de disputar essa hegemonia, mas esse projeto só vai ser possível assim que essa esquerda conseguir se renovar e renovar seu quadro institucional. É natural que, nesse processo, a ação seja mais de resistência. Precisamos passar urgentemente dessa fase, com projetos mais afirmativos. E não acho que serão, em um primeiro momento, projetos nacionais. A tendência, e foi assim na história do Brasil, é que a esquerda comece a firmar seus projetos mais positivos no âmbito local.

P. Isso tem a ver com o conceito de municipalismo que você vem trabalhando? O que significa?
R. Existe uma tendência internacional, em países como Espanha e Bolívia, em dar maior poder aos municípios, tanto do ponto de vista da gestão como da arrecadação e do desenvolvimento econômico. Mas, sobretudo, do ponto de vista do aprofundamento da democracia, no sentido de torná-la mais participativa e menos representativa. Trata-se de buscar os mecanismos que podem nos fazer sair dessa crise da democracia representativa. E podemos tanto utilizar experiências do passado como propor experiências novas. A instância que permite fazer isso é o município. É uma instância que favorece a participação, o controle social, a transparência e as políticas participativas. Focar nos municípios é o caminho mais efetivo para renovar a esquerda.

P. No Brasil isso passa por rever o pacto federativo?
R. Exatamente. O Brasil tem um problema: a Constituição de 88 teve um grande avanço ao dar mais autonomia aos Estados e municípios, mas isso não se traduziu em uma descentralização orçamentária que acompanhasse a execução das políticas. Muitas responsabilidades foram transferidas sem uma contrapartida orçamentaria, sendo que a capacidade de arrecadação própria é pequena. Isso gera aquelas missas de prefeitos e governadores indo pedir mais e mais para a União. Também acho que existe uma cultura em não se investir em desenvolvimento econômico local, a partir de suas vocações territoriais.

P. As eleições de 2020 são um ponto de partida?
R. Totalmente, acho que precisamos investir muito nisso, não só no PSOL. Esse tipo de construção na esquerda tem uma longa tradição na história do PT, que começou a ocupar governos locais e a se distinguir por um modo singular de governar, o modo petista de governar. A experiência do Orçamento participativo é tida como referência de aprofundamento da democracia e de experimentação de mecanismos participativo no mundo inteiro. Mas essas experiências tão inovadoras implementadas pelo PT foram deixadas de lado pelo próprio PT. Isso faz parte dessa mudança que o PT teve quando foi para o Governo Federal, em que as políticas locais se tornaram secundárias, fazendo com que o partido aderisse a práticas de governo viciadas e clientelistas que interromperam esse caminho de renovação. O grande dilema que temos é como renovar a esquerda a partir dessas práticas renovadoras sem cair nos vícios dos governos petistas.

P. O PT demorou 20 anos para chegar ao poder federal. A esquerda pode demorar tudo isso para voltar?
R. A reconstrução não vai ser rápida. Se nesse meio tempo vamos a um Governo Federal não dá para saber. A situação está muito aberta, muitos não esperavam a eleição de Bolsonaro. Seria bom que a esquerda estivesse preparada para voltar, mas isso depende de uma reorganização dessas forças muito mais difícil e imprevisível de se fazer. Devemos investir agora, principalmente no caso do PSOL, que está mais bem posicionado para isso, nessas experiências de governo locais. No Rio, talvez com Marcelo Freixo candidato, vamos fazer esse debate.

P. As chamadas questões identitárias parecem não ter apelo junto a setores populares. Como acha que a esquerda deve abordar essas pautas?
R. Não é que as ditas questões identitárias não tenham apelo popular. Acho que o modo como muitas vezes a luta é travada chega a população de um jeito distorcido. É menos a pauta dita identitária que o modo lacrativo de se fazer política. Essa cultura da lacração está atrapalhando não só as pautas identitárias, está atrapalhando geral. Se a gente tiver propostas concretas de políticas públicas voltadas para as mulheres, por exemplo, acho que teria receptividade na população mais pobre e na despolitizada. O problema é como abordar isso. Elas precisam ser abordadas dentro de um trabalho político mais amplo, que não seja só essa disputa de marcação de posição.

P. A esquerda perdeu conexão com a classe trabalhadora?
R. A esquerda tem a concepção de que o agente da transformação é baseado nessa ideia de trabalhador, que é uma ideia muito homogeneizante. Isso continua existindo, apesar de o trabalho ter mudado. Só que os grupos que se organizam para melhorar suas condições de vida não se organizam mais em função de categorias tão homogeneizantes. Os modos de vida, as experiências, as sensibilidades se tornaram muito mais importantes ao se inserir num coletivo. Não à toa vemos tantos coletivos feministas, negros, LGBTs, de legalização das drogas, de ambientalistas... Os coletivos se organizam mais em função daquilo que os afeta de modo singular. Muito mais do que uma categoria de trabalho. As pessoas são trabalhadoras de jeitos tão diferentes que não necessariamente vão se identificar pelo fato de serem trabalhadoras. O movimento dos Coletes Amarelos, na França, é um ótimo exemplo. Trouxe uma série de atores invisíveis. A esquerda tem que estar muito atenta porque esses atores estão demandando atenção. E a esquerda tem que se abrir para isso. A greve dos caminhoneiros foi isso. No Brasil temos uma enorme categoria de jovens nem nem, que nem estudam nem trabalham. Se a esquerda não fala com elas, algo está errado. Um projeto de Previdência tem que dar proteção para essas pessoas que têm trabalho informal, situação de vida instável, intermitente... E a proposta não pode ser pleno emprego, porque isso não é muito realista.

P. O que aprender com a nova esquerda norte-americana?
R. Precisamos de uma mudança econômica de fundo, e essa nova esquerda americana vem falando muito no Green New Deal. É algo fundamental, porque por trás de Trump está o negacionismo climático. Então a oposição a ele também deve focar nisso, tem que levar a sério o aquecimento global e as limitações ecológicas. As mudanças econômicas têm que ser pensadas a partir disso.

P. Como isso poderia ser aplicado no Brasil?
R. Existe uma esquerda brasileira com uma visão muito industrializante, que acha que a solução para o desenvolvimento econômico é industrializar, e a partir disso criar emprego e resolver as questões sociais a partir do emprego. Tudo bem, acho que um país como o Brasil, que tem pouca indústria, precisa fazer isso. Mas principalmente fazer isso com um modelo produtivo mais tecnológico, não uma industrialização atrasada —e não vai criar emprego suficiente pra resolver o problema social. Acredito cada vez mais que esse outro modelo tem que partir da limitação ecológica, encarando com seriedade o problema das mudanças climáticas. Não adianta um projeto econômico baseado em commodities e mineração que afete o meio ambiente e leve a um desastre como o de Brumadinho. Não dá mais. E isso tem a ver com o municipalismo, porque a partir das iniciativas de desenvolvimento econômico local, de economias territoriais, é mais possível desenvolver alternativas que em escala nacional. E aí tem duas vias fundamentais: uma é a questão dos cuidados, uma proposta de trabalho e proteção social baseado numa economia dos cuidados, que cuide desse problema e crie postos de trabalho voltados para isso, já que é uma tendência mundial; outra coisa é a questão dos bens comuns, como a água, a energia.... Essa gestão dos bens comuns com uma preocupação ecológica é uma outra tendência que a gente tem que incorporar nesse modelo municipalista. Tem a ver também com saneamento básico, que é um ponto terrível e que o Brasil não consegue fazer.

P. Vê riscos para a democracia?
R. Estamos vivendo uma fragilização em várias camadas. Do ponto de vista econômico, é um ataque ao estado de bem-estar social, que é o que temos de democracia mais efetiva no mundo. Acho que isso é o mais grave para a democracia. É uma tentativa de fazer com que áreas do bem-estar social passem a fazer parte de um campo de acumulação de capital. A questão da capitalização da Previdência é isso, a privatização da saúde e educação é isso. O SUS é referência mundial, a educação universal pública precisa melhorar qualidade e a gestão, mas o modelo a gente conseguiu implementar. Não é andando pra trás que vamos resolver.

Também temos que estar atentos porque a democracia não se fragiliza com práticas ditatoriais, mas com mecanismos antidemocráticos sendo inseridos dentro das instituições democráticas e dentro das leis. Por isso, muitas vezes não reparamos como sendo antidemocráticos. É o que Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria, chama de "democracia iliberal". Trata-se de minar as instituições da democracia liberal por dentro.

P. Como responder a essas ameaças?
R. Existe uma demanda por mais participação, por um aprofundamento da democracia que foi deixada nas mãos das elites e econômicas, e as pessoas não se sentem participando após o momento do voto. Muitas decisões que afetam a população são tomadas por uma tecnocracia, uma elite de experts que não é eleita. Isso é algo aprofundado pelo neoliberalismo. Dá a sensação de que não importa em quem você vote, vão ser sempre essas pessoas que tomam decisões. O maior exemplo é a União Europeia. O ápice foi quando os gregos votaram 'não' no plebiscito sobre o ajuste, mas o Governo fez o contrário porque era uma determinação da troika [Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional]. No Brasil, muitos votaram em Bolsonaro por protesto, de saco cheio de tudo. Temos que ter uma resposta para isso.

P. Que tipo de resposta?
R. Não temos instituições de controle, de acompanhamento, de accountability, de transparência entre as ações de quem elegemos e a população. Votamos e depois acabou. A solução para isso não é um incentivo ao nacionalismo. Precisamos inventar novas instituições democráticas. Quando os livros que estão aí falam em "fim da democracia", acho que isso significa um esgotamento de uma forma de democracia que vivemos desde o fim de Segunda Guerra. Não é o fim, é a necessidade de pensar em inovações democráticas, mecanismos democráticos que respondam a esse anseio da população e que faça que tenha um engajamento com as decisões e políticas.

P. Durante a campanha o PSOL falou muito em realizar referendos. Acredita que a democracia direta é o caminho?
R. Existe uma idealização do uso do referendo como forma de aprofundamento da democracia. Não sei se é via referendo que vamos deixar mais direta a democracia. Acho que podemos pensar em novas instituições que vão além da temporalidade do voto, instituições que mantenham uma participação contínua. Por isso gosto das experiências participativas que se dão nas esferas locais, como foi o caso dos Orçamentos participativos no Brasil.


Vera Magalhães: Bolsonaro quer reforma?

Amadorismo na política e corporativismo militar são riscos à aprovação da proposta

Poucos presidentes na história recente do Brasil tiveram a oportunidade de, com uma única ação, definir o sucesso de seu governo e ter quatro anos de relativa tranquilidade econômica e política. Mas Jair Bolsonaro não enxerga a reforma da Previdência como prioridade. E aí reside um risco enorme não só à aprovação da medida, mas ao êxito de seu quadriênio presidencial.

Na transmissão ao vivo que fez do Chile na última quinta-feira, Bolsonaro explicitou exatamente o que pensa do assunto: por ele, não gostaria de fazer reforma nenhuma. Mais: o presidente da República voltou a agir como um sindicalista, se referindo aos militares como “nós” e defendendo a forma excepcionalíssima com que as Forças Armadas foram tratadas na discussão da reforma.

A má vontade com que encaminha o projeto se traduz no desastre da articulação política. Nem o PSL, a colcha de retalhos em forma de partido à qual hoje o presidente é filiado, tem manifestado apoio firme à reforma.

Insistindo no discurso vazio de que não cederá à velha política para negociar, Bolsonaro corre o risco de perder o principal interlocutor pró-reforma hoje, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ainda que tenha procurado reduzir o tom nas últimas entrevistas, o presidente da Câmara deixou claro o que pensa do governo: um deserto de ideias mais preocupado com o Twitter que em resolver os problemas do País, como desemprego e pobreza. E ele está correto no diagnóstico.

Isso fica evidente quando um dos assessores diretos do presidente, Filipe Martins, faz no mesmo Twitter uma série de posts com pretensão de alta filosofia política em que identifica uma suposta ala “anti-establishment” no governo, que seria a chave para, com base em mecanismos próprios de democracia direta, promover uma mobilização popular permanente via redes sociais capaz de pressionar o Congresso a aprovar as agendas do governo, entre elas a reforma.

Trata-se de um diagnóstico absolutamente descolado da realidade, típico de alguém que nunca acompanhou os meandros do Legislativo e ignora as diferentes realidades sociais de um país complexo como o Brasil, no qual a militância virtual é uma ínfima e irrelevante fração.

Mas Bolsonaro está preso a essa quimera. Três meses depois de empossado segue acreditando que o discurso ideológico de Foro de São Paulo para cá, ideologia de gênero para lá será capaz de lhe garantir governança. A ponto de chegar ao ridículo, sem ter ninguém que o alerte para tal, de repetir essas platitudes em plena Casa Branca. E desdenha dos índices que mostram rápido derretimento de sua popularidade no mundo real, aquele em que as pessoas precisam de emprego e a economia continua travada.

Além de viver a ilusão de que é possível governar a partir das redes sociais, o presidente dá corda ao corporativismo militar. Por mais que as Forças Armadas estejam com suas carreiras e seus soldos defasados, fazer essa reestruturação concomitantemente com a inclusão dos militares na reforma foi um tiro no pé.

Como defender um discurso de que a reforma foca em privilégios se o ganho com o aperto no Benefício de Prestação Continuada, que atinge os mais pobres, responderá por uma fatia bem maior do sacrifício que exigido dos poderosos militares? Não há como, e isso ficou patente no semblante derrotado dos outrora confiantes técnicos do Ministério da Economia, que viram o esforço de narrativa virtuosa da reforma ir por terra.

Com o amadorismo na política e o corporativismo renitente de Bolsonaro, a reforma corre risco. Mas não parece haver humildade nem sabedoria da cúpula do governo, com exceção da “ilha” Paulo Guedes, para mudar o rumo e salvar o único projeto capaz de definir o sucesso da administração.


Bruno Boghossian: Bolsonaro tenta abrir caminho na política a golpes de machado

Presidente anda para trás no trabalho de articulação e aprofunda isolamento

Jair Bolsonaro igualou uma façanha dos tempos modernos quando se elegeu sem fazer alianças com grandes partidos. Ao tomar posse, concretizou um lance audacioso ao montar um governo sem negociar ministérios em troca de apoio no Congresso. Desde então, o presidente passa os dias admirando os dois títulos pendurados na parede.

Bolsonaro chega à reta final do terceiro mês de mandato sem apresentar um diagrama do que será erguido no lugar das relações partidárias que ele prometeu derrubar. Na última semana, o governo obteve a proeza de aprofundar ainda mais seu isolamento político.

O PSL, partido do próprio presidente, deu sinais de esfarelamento. O líder da sigla na Câmara criticou a proposta do Planalto para reformar a aposentadoria dos militares e disse que a legenda não estava disposta a “descascar o abacaxi no dente”.

O desprezo do clã Bolsonaro pela tal velha política se traduziu em hostilidade. Conseguiu incomodar o DEM, o único partido que fazia esforços para dar sustentação ao governo, com o comando das duas casas do Congresso. O presidente andou para trás no trabalho de articulação.

Bolsonaro não precisa ceder ao “toma lá, dá cá” que marcou, por décadas, a relação entre Executivo e Legislativo, mas também não conseguiu mostrar como conquistar votos para aprovar os projetos de seu interesse. Sua única estratégia, até agora, foi tentar abrir caminho na política a golpes de machado.

O governo decidiu se mover de acordo com a algazarra de seus apoiadores fiéis e ignorar as vozes do Congresso —o que afasta Bolsonaro cada vez mais de pautas como a reforma da Previdência. Nenhum de seus eleitores mais aguerridos, afinal, votou nele pensando no ajuste do sistema de aposentadorias.

O presidente aposta numa filosofia da terra arrasada. No jantar que teve com Olavo de Carvalho, Bolsonaro disse que precisa “desconstruir muita coisa para depois começar a fazer”. Pelo visto, o dinheiro da obra pode acabar já na fase de demolição.


Eliane Cantanhêde: 'Não tem governo'

Rodrigo Maia: “É um governo vazio, sem ideia, sem proposta, sem articulação”

Mais uma semana infernal no Congresso, no Executivo, no Judiciário, no mercado e, muito especialmente, no twitter. Começou e terminou com o presidente Jair Bolsonaro ajustando as posições brasileiras às de Donald Trump, enquanto o Brasil pegava fogo. Mais um ex-presidente preso, o presidente da Câmara em pé de guerra e os filhos do presidente desgovernados nas redes sociais.

A maior vítima é a reforma da Previdência, que sofreu vários solavancos: críticas no Congresso à proposta dos militares, considerada mais branda do que para outras categorias; parlamentares do PSL comemorando a prisão de Michel Temer, maior nome do MDB; a queda de 15 pontos na popularidade de Bolsonaro no Ibope; a desarticulação do governo com sua base.

Nada, porém, foi tão nocivo às chances da reforma da Previdência quanto os ataques de bolsonaristas e até do governo ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que é, nada mais, nada menos, a peça principal para a aprovação da proposta no Congresso.

De pavio curto, como se sabe, Maia não gostou quando o ministro Sérgio Moro se reuniu com a “bancada da bala” e disse que iria insistir na tramitação do pacote anticrime o quanto antes. Maia, que tinha acertado com Bolsonaro dar prioridade à Previdência e deixar o pacote Moro para o segundo semestre, deu um pulo. E avisou que não falava com funcionários, só com o chefe. Ou seja, não falava com Moro, só com Bolsonaro.

O clima piorou quando Carlos Bolsonaro, o 02, usou a trincheira da internet para defender Moro e atacar o presidente da Câmara com insinuações. A coisa mudou de figura. E de patamar. Nesse meio tempo, Maia ameaçou não receber o projeto dos militares e abandonar a articulação da reforma, furioso com uns e outros. Inclusive os que usaram a prisão do padrasto da sua mulher, Moreira Franco, para atingi-lo.

Quando liguei para ele, Rodrigo Maia contra-atacou: “Não tem governo. É um governo vazio, que não tem ideia, proposta, articulação”. E continuou: “Para dissimular, criou esse confronto do bem contra o mal, do bonito contra o feio, do quente contra o frio. Eles são o bem, os bonitos, os quentes. E nós, os políticos, somos os maus, os feios. É só para manter a base ultraconservadora na internet”.

Bolsonaro sabe que a reforma da Previdência é questão de vida ou morte para o País e para o governo dele, mas finge que não queria, que não é com ele. “Ele tira o corpo fora e vende a imagem de que nós é que estamos obrigando o governo a fazer a reforma”, diz Maia.

Ainda na sexta-feira, o filho 01, senador Flávio Bolsonaro, tentou consertar o estrago (pelo twitter...) e elogiou o presidente da Câmara: “Assim como nós, ele está engajado em fazer o Brasil dar certo”. Maia devolveu o elogio, mas com ressalva: “O Flávio é bom, mas ele é do Parlamento, não do Executivo”.

É assim que o governo, em vez de aglutinar, vai dividindo, afastando, criando atritos, dificultando não só a reforma da Previdência como a sua própria vida. O 01 tem mais noção política e mais responsabilidade, mas o 02 e 0 03 precisam lembrar que Bolsonaro não governa para seus eleitores, muito menos para os eleitores genuínos (que votaram efetivamente nele, não contra o PT). Governa para todos.

O Planalto não pode correr o risco de perder o apoio de Maia, porque ele abriria uma longa fila de adversários, o DEM, o PSDB, o MDB, parte dos evangélicos do PRB e vai por aí afora. O que sobraria? O PSL, novo inexperiente e dividido?

O pior é que a culpa da guerra de guerrilhas na internet sempre cai sobre os filhos, mas Maia tem uma certeza: “É tudo patrocinado por ele”. Quem é ele? Jair Bolsonaro.


Sérgio Gonzaga de Oliveira: A retomada do Desenvolvimento Econômico (I)

Democracia não deve ser um regime político baseado em práticas puramente eleitorais, desvinculada das condições objetivas da sociedade. Na verdade, a democracia pressupõe a existência de determinados direitos e liberdades básicas para que possa ser exercida com integridade. Dentre esses, os direitos sociais são fundamentais. Salário digno, previdência social, saúde, educação, habitação e tantos outros não podem ser relegados a um segundo plano. É muito difícil o exercício da cidadania quando os indivíduos vivem no limite da sobrevivência. Embora o Bolsa Família seja um programa importante para retirar da miséria absoluta milhões de brasileiros não é possível imaginar que um valor básico de R$ 85,00 e máximo de R$ 195,00 por mês irá transformar essas pessoas em cidadãos perfeitamente integrados à democracia. E direitos sociais não surgem do nada. Pelo contrário, exigem que a economia tenha atingido um patamar mínimo de produção e distribuição de renda.

Adicionalmente, o conceito atual de desenvolvimento econômico inclui obrigatoriamente a preservação do meio ambiente. Devemos lembrar que o ambiente natural é a fonte onde os humanos vão buscar alimentos, matérias primas e energia que lhes são tão necessários. A destruição do meio ambiente atinge mortalmente a economia. Os exemplos são cada vez mais alarmantes.

Cansamos de ler e ouvir que o Brasil é um país “emergente” ou “em desenvolvimento”. Até o início dos anos 80 do século passado, pelo menos em termos de crescimento econômico, era verdade. Entretanto, a partir daí, até nossos dias, o cenário mudou muito e para pior. Registra o economista José Luis Oreiro, em artigo recente, que entre 1930 e 1980 crescemos em média 6,32%aa e entre 1981 e 2013, apenas 2,55%aa. Se computarmos os cinco últimos anos de crise e baixo crescimento, o número cai ainda mais. Considerando o aumento populacional no período, esse número é lamentável. Alguns surtos de crescimento foram observados nos anos 90 e na primeira década do novo século, mas não foram suficientes para alterar a média geral muito baixa. São praticamente quatro décadas perdidas. Enquanto ficamos patinando, países como a Coréia do Sul, China, Austrália, Nova Zelândia e vários outros cresceram muito e estão a caminho de se tornarem desenvolvidos.

A questão do desenvolvimento não é trivial. Deveria ser uma preocupação constante de todos aqueles que lutam contra a injustiça social. Na verdade os que mais sofrem com a falta de produção, emprego e renda são os 50% da população de renda mais baixa que vivem nas regiões mais pobres e nas periferias das grandes cidades. Para esses, falta tudo: salário, alimentação, vestuário, saneamento básico, saúde, habitação e muito mais. É uma vida miserável e sem perspectiva. Do ponto de vista da cidadania, essa situação é uma tragédia.

A experiência mostra que quando se pretende estabelecer um projeto de desenvolvimento, é relativamente fácil reunir meia dúzia de economistas, advogados, engenheiros, sociólogos e outros acadêmicos para listar as principais medidas a serem tomadas para levar o projeto adiante. Alias é o que têm feito os partidos políticos de quatro em quatro anos, sem grandes resultados. Essa prática burocrática e eleitoral é a principal razão pela qual os projetos de desenvolvimento nos últimos quarenta anos no Brasil não vão adiante. Um projeto de desenvolvimento, principalmente em um ambiente democrático, precisa, antes de tudo, ser um projeto político. Deve ser construído, item a item, simultaneamente à formação de uma frente política capaz de levá-lo adiante. Sem essa configuração, perde-se tempo.

Ao pretendermos que o desenvolvimento seja inclusivo, distribuindo renda e respeitando o meio ambiente, estamos definindo que essa frente política, além de democrática, deve ser progressista. Por outro lado, para que possa ser efetivado com sucesso, deve ser majoritária. Uma frente política majoritária, democrática e progressista, construída em torno de um projeto de desenvolvimento, deveria ser hoje uma aspiração de todos os brasileiros. Não se deve limitar a participação das forças políticas nesse projeto, indicando a priori quem pode ou não pode tomar parte. Certamente as forças mais retrógradas, internas ou externas, que apostam no atraso social, de onde tiram suas eventuais maiorias eleitorais ou vantagens econômicas, não sentarão a mesa para negociar. Ao contrário, farão uma forte oposição. E o acordo político passa por negociações às vezes muito duras e difíceis. Soluções burocráticas foram tentadas nas últimas décadas, como o Programa Avança Brasil, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e “Uma Ponte para o Futuro”. Os resultados, como eram de se esperar, têm sido irrelevantes.

A experiência internacional tem indicado que um acordo político dessa natureza resulta em um conjunto coerente de ações estratégicas, planejamento estatal e participação do capital privado. Os recursos financeiros necessários são extremamente elevados para que o desenvolvimento possa ser alcançado, em um prazo razoável, sem a participação do setor privado. Os escassos recursos do Estado devem ser reservados para as áreas onde a alternativa privada não é viável, para setores estratégicos ao próprio desenvolvimento e para a segurança nacional. Muitos dos investimentos necessários só podem ser efetivados pelo Estado, já que não têm retorno financeiro suficiente para atrair o capital privado. É o caso, por exemplo, da educação e saúde de populações de baixa renda ou investimentos em tecnologias básicas e adequadas aos recursos produtivos brasileiros. Talvez a maior contribuição do Estado ao desenvolvimento seja o planejamento e a coordenação dos planos e projetos estratégicos acordados.

No Brasil, a atual fragmentação das forças políticas e sociais e a falta de um projeto de desenvolvimento comum leva a uma virtual paralização do Estado. Pior do que isso, os grupos privados e corporativos mais organizados “canibalizam” a máquina estatal, destroem sua capacidade operacional e fragilizam as finanças públicas. A desorganização do Estado se reflete em toda a economia. Os consumidores se retraem e adiam as compras. Os fabricantes diminuem a produção. O setor privado reduz os investimentos em novas unidades produtivas ou aplica somente quando consegue taxas de lucro muito altas para compensar as incertezas. O desenvolvimento econômico cessa ou avança em ritmo muito lento, imobilizando o país. Estamos nessa situação há quase quatro décadas. É angustiante.

Em resumo, os problemas podem ser econômicos, mas a saída é necessariamente política. A solução para esse impasse é um movimento político que mude as expectativas negativas que os agentes econômicos e a população em geral têm em relação ao futuro do país. Sabemos que a construção desse projeto não é uma tarefa simples, mas certamente é necessária. Dificilmente uma força política sozinha, por mais bem intencionada que seja, conseguirá levá-lo adiante. De qualquer forma, a compreensão da importância e da natureza do problema é um primeiro passo para sua superação.

Para provocar o debate pretendo, num próximo artigo, tentar esboçar um diagnóstico da situação atual, tomando por referência as variáveis básicas dos modelos que buscam entender a dinâmica da economia capitalista no longo prazo.
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(*) Sérgio Gonzaga de Oliveira é engenheiro pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e economista pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL)


Marcus Pestana: Mitos e evidências sobre a reforma da previdência

Como prometido, retomo hoje a discussão sobre a reforma da previdência.

A previdência tem papel central no crescente endividamento do Brasil. Nossa dívida chega, segundo o FMI, a 87% do PIB, e o déficit nominal anual está em 9,3% do PIB. Isto é grave ou não? Gravíssimo. A dívida média dos países emergentes é de 49,9% e o déficit nominal médio é de 4,2%. A Previdência é o maior fator do desequilíbrio fiscal, o gasto total previdenciário consome 14% de toda a riqueza gerada pela sociedade, sendo o déficit total dos diversos regimes 335 bilhões de reais ou 5,1% do PIB. Diante disso alguém vai dizer que não há déficit e que a situação é sustentável? Pior é o agravamento do déficit previdenciário, mais 50 bilhões de reais por ano, ou seja, o valor da construção e equipamento de 400 novos bons hospitais, temos sete inconclusos em Minas.

No mundo inteiro, reformas da previdência se fazem necessárias. Por um simples motivo, as mudanças demográficas. Nascem cada vez menos bebês e, felizmente, estamos vivendo cada vez mais. Em 1980 tínhamos apenas 4,0% da população acima de 65 anos, em 2020 teremos 9,8% e em 2060 25,5%. Paralelamente, em 1980 tínhamos 38,2 de crianças e jovens abaixo dos 14 anos, em 2020 serão 20,9% e em 2060 teremos 14,7%. Menos gente contribuindo, mais gente usufruindo. Simples assim. Ou será que o IBGE está mentindo?

Apenas 12 países não têm, como o Brasil, idade mínima. No México, no Peru e no Japão é de 65 Anos. Na Argentina e no Chile, 65 para homens e 60 para mulheres. Nos EUA, 66. Será que Irã, Iraque, Nigéria e Brasil estão certos e o resto do mundo errado? E não há evidências demográficas para a diferenciação de idade entre homens e mulheres. As mulheres vivem muito mais. O argumento é o peso inegável da maternidade. Neste sentido, achei interessante a proposta de que a idade seja a mesmo, mas a mulher tenha um prêmio de um ano abatido da idade mínima por cada filho. Hoje 30% das mulheres não têm filhos.

Mas a questão central é combater os privilégios e a previdência como fator de concentração de renda. O servidor do Legislativo Federal tem um benefício médio 18,9 vezes maior que os 30 milhões de aposentados e pensionistas do INSS, o Judiciário 12,7 vezes, Ministério Público Federal 10,3 e o Executivo Federal, seis vezes. É justo isso? O déficit é financiado pelos impostos pagos pela população que poderiam ser usados para melhor a saúde e a educação de todos. Sabem qual é a renda transferida para o aposentado a cada ano para o financiamento do déficit? São 63 mil reais para os servidores civis da União, 43,5 mil reais para os aposentados dos Estados e apenas 4,6 mil reais para os do INSS. Será que os que dizem defender os pobres não enxergam isso?

Se não fizermos a reforma, em 2027 o sistema consumirá 82% dos recursos disponíveis. Sobrarão 18% para educação, saúde, segurança, meio ambiente, ciência e tecnologia, diplomacia, forças armadas. É isso que queremos? E não adianta falar que é só cobrar a dívida dos devedores do INSS, que equivale apenas ao déficit de um ano e é relativa na maioria das vezes a empresas falidas como a VASP e VARIG. Ou o mito que é só gastar menos com juros da dívida, o que é uma tolice econômica.

Precisamos de menos mitos e mais evidências na discussão. É o futuro do país e das novas gerações que estará em jogo!


Maurício Huertas: Um partido pra chamar de meu!

Antes de mais nada, frente à descrença generalizada na política, nas mãos desses políticos populistas, hipócritas, corruptos e fisiológicos envolvidos nos mais tenebrosos escândalos, dessa polarização burra e odiosa que divide o Brasil em bolhas ideologizadas e idiotizadas, a dúvida é: será que eu ainda preciso de um partido pra chamar de meu? A resposta, por mais incrível e antiquada que pareça, é SIM!

Se queremos um mundo melhor, mais justo e mais plural, sem preconceito e intolerância, menos desigual, violento e inseguro, com oportunidades para todos, temos que ocupar todos os espaços disponíveis e fazer valer a nossa voz. Ter a liberdade de sermos quem nós somos, o direito de expressar os nossos sentimentos, a garantia de correr atrás dos nossos sonhos e ideais.

A política não pode ser monopólio desses velhacos que manipulam os três poderes e lembram do povo só na hora de apertar botão em dia de eleição. A política tem que ser invadida, hackeada por gente jovem e bem intencionada, essa geração que já marca presença nas ruas e nas redes e que agora precisa arejar as instituições, redemocratizar a democracia, reinstalar o sistema ao disputar e ganhar cadeiras no parlamento e no executivo.

Cidadãos de bem, ativistas autorais que botem pressão diária nos políticos tradicionais, revolucionem os partidos e fiscalizem com isenção e autonomia o poder público. Que a periferia ganhe protagonismo. Que a borda invada o centro. Que as minorias tenham vez e exerçam a sua devida representação. Que a nossa opinião não seja ouvida apenas entre amigos, nos grupos de whatsapp ou nos stories do instagram.

Que a gente mostre a nossa cara na sociedade e exercite no dia-a-dia a nossa cidadania. Na mídia, na política, no mercado de trabalho, na porta de casa, na escola, na família, no lazer, na cultura, no parque, na praça, na ciclovia, no transporte público, na associação do bairro, na igreja, no movimento que pede mudança na política, na entidade de defesa dos animais.

Mas entre tantas siglas e bandeiras, trinta e tantos partidos oficializados no país, por que escolher esse tal de #Cidadania23? O que essa legenda que se diz nova, no meio de tantas outras que prometem a mesma coisa, tem de diferente das demais? Qual motivo ou argumento sensato te convenceria a ingressar, a votar ou até mesmo a ser você um dos seus candidatos? Ninguém aguenta mais tanto blablablá!

Ao conhecer a Carta de Princípios desse recém-nascido #Cidadania23, uma certeza você tem: vai ler uma proposta sincera, moderna, viável e diferenciada para responder grande parte das nossas angústias diante de uma realidade global que se torna, dia a dia, mais asfixiante e desesperadora.

Esse partido-movimento surge como uma chance de se concretizar de forma coerente os ideais democráticos, da cidadania plena, da sustentabilidade e da justiça social. É uma oportunidade de se falar de igual para igual com o político que tem mandato ou com o cidadão anônimo da base, que faz a política cotidiana na sua rua, na sua comunidade.

Se aprendemos por tentativa e erro, vale apostar no que propõe essa turma originada do antigo PPS com a soma de integrantes desses novos movimentos como Agora, Livres, Acredito, Renova, RAPS e outros. Muito além de uma nova sigla, eles (nós) pretendem(os) inaugurar uma forma diferente e inovadora de ver e de fazer a política, integrada aos novos tempos e inserida nessa revolução tecnológica que transforma continuamente a sociedade.

Em linhas gerais, essa nova formatação partidária se propõe a trilhar um caminho propositivo, reformador e equidistante da atual polarização entre a velha esquerda e essa "nova" direita - que de nova não tem absolutamente nada. Reafirma seus compromissos com a cidadania, a liberdade, o humanismo, a diversidade, o meio ambiente, o estado democrático de direito e os princípios republicanos.

Não parece pouca coisa, nem uma missão fácil. Precisamos arregaçar as mangas, pisar barro e vender o nosso peixe. Mas quem disse que temos medo de dificuldades ou de cara feia dos figurões da velha política? Então, vamos em frente, trilhar este novo caminho. Sejam bem vindos cidadãos, cidadãs, cidadanistas! Por um Brasil melhor, sempre!