comunicação
Estados Unidos: o excesso de poder da minoria que ameaça a democracia
Gianfranco Pasquino*, Esquerda Democrática
Pensava que fosse, sobretudo, expressão de provincianismo mesclada com ostentação de excepcionalismo (positivo) a enxurrada de artigos e livros sobre Trump publicados pelos estudiosos norte-americanos. Que sua preocupação fosse temporária, agitada deliberadamente para poder afirmar com grande fanfarra: “A democracia da maior potência que o mundo jamais conheceu superou também o desafio do trumpismo”. Algumas outras democracias dobram-se sobre si mesmas, declinam, morrem. A democracia americana reage e se renova. Ainda que homem branco e ancião, o presidente Biden abrirá uma nova fase.
E, no entanto, não. A cultura do cancelamento mostrou todos os seus limites de cultura e de falta de elaboração, o trumpismo deixou um legado pesadíssimo, mas, sobretudo, está demonstrando representar algo muito profundo na sociedade americana. E as instituições trincam.
Sem nunca terem sido uma democracia majoritária plena, que Madison não quis, os Estados Unidos tornaram-se uma democracia minoritária. Graças a alguns mecanismos, a começar do colégio eleitoral para a eleição do presidente, os republicanos, faz tempo partido de minoria entre os eleitores, controlam, inclusive por meio de montanhas de dinheiro dos seus apoiadores, uma enorme quantidade de poder político.
Por um conjunto fortuito de circunstâncias e pela inescrupulosa coesão dos senadores republicanos, o presidente Trump mudou por pelo menos uma geração, mais de trinta anos, a composição da Suprema Corte, tornando-a não só a mais conservadora desde sempre, mas também patentemente reacionária, vale dizer, disposta a fazer recuar a sociedade e a cultura por, no mínimo, cinquenta anos.
Nos estados que controlam, graças inclusive ao apoio de evangélicos e lobbies poderosíssimos, os republicanos estão agredindo o direito básico e fundamental de uma democracia: o voto. Tornar muito mais difícil, às vezes quase impossível, sua expressão: menos cadeiras, horários reduzidos, menos inscritos nas listas, e colocar sempre em discussão, até previamente, seu resultado. Não poucos estados dos Estados Unidos não satisfariam os requisitos básicos de adesão à União Europeia, e não só porque neles se pratica a pena de morte, mas por carência de democracia eleitoral e, às vezes, excesso de corrupção política.
A abolição da possibilidade juridicamente reconhecida, garantida e tutelada, de recorrer à interrupção da gravidez, não menos grave porque antecipada por indiscrições, é o auge do ataque aos setores sociais mais frágeis, as mulheres das classes populares, as latinas, as mulheres negras, às quais faltarão redes de apoio e recursos e às quais, em boa medida, nega-se também o direito ao voto.
A lendária cidade que brilha na colina está perdendo a capacidade de iluminar e atrair aqueles que no mundo amam a liberdade.
Por que tanto Biles?
Tibério Canuto*, Esquerda Democrática
Artigo de Marco Aurélio Nogueira publicado no Estadão de sábado [ver abaixo "Uma oportunidade a mais"] provocou ira nas brigadas lularianas que poluem as redes sociais. Tudo porque Marco, um cientista político de primeira linha, formado politicamente na boa e velha escola do Partidão, afirmou que Simone poderia qualificar a disputa presidencial, assim como Ciro Gomes. Entendia que essas duas candidaturas poderiam tirar os dois presidenciáveis que lideram as intenções de voto da zona de conforto. Não no sentido de subtrair-lhes o favoritismo para ir ao segundo turno. Mas de levá-los a explicitar seus programas, para além de platitudes, como no meu governo eu fiz isso, fiz aquilo. Não há como negar, há um pacto não escrito e implícito entre os dois para congelar a disputa eleitoral no oceano de obviedades.
Sobraram cobranças para Simone e sobretudo xingatórios e mentiras. Foi acusada de defensora do extermínio do meio ambiente, de índios e de golpista, como se o palanque que Lula está montando só tivesse puros e bons. E ninguém que tivesse apoiado o impeachment de Dilma. Aí vale a lógica, quem hoje está do meu lado, não importa o seu passado. É só elogio. E quem não está do meu lado, eu desconstruo, o transformo em um cão chupando manga.
Nessa visão distorcida que divide a política entre anjos e demônios sobrou até para Milton Lahuerta, outro intelectual respeitado. O conheço desde os tempos da militância no Partidão. Milton não é eleitor de Simone, longe disso. Mas não faz política à base de Fla-Flu e elogiou o artigo de Marco, reproduzindo-o em seu Face. Imediatamente surgiram cobranças a Simone e a ele. A ponto de Milton ter postado em comentário a famosa frase de Ulysses: “política cisca-se para dentro, quem cisca para fora é galinha”. E tem razão. Recomenda-se aos simpatizantes da candidatura Lula pensar no momento seguinte, na hipótese de um segundo turno, onde, por óbvio precisará do apoio de quem ficou de fora. Estigmatizar Simone ou Ciro é ciscar para fora, é inviabilizar possíveis pontes que se farão necessárias.
Já tinha notado a onda “Simonofóbica” desde quando publiquei um post dizendo que fiquei impressionado com seu desempenho na entrevista a Renata Lo Prete. Tanto na minha página como nas redes sociais lularianas choveram impropérios contra a candidata. Não discutiram as ideias programáticas que Simone defendeu na entrevista. Uma velha amiga dos tempos do Partidão, hoje convertida ao credo petista, disse desconfiar da candidata porque desconfia de quem fala manso, insinuando que isso era a prova dos nove de que Simone é falsa.
Uma outra, que conheci nas manifestações do impichi de Dilma. Vestida de amarelo e não dando um pio contra o grito dos manifestantes de “minha bandeira jamais será vermelha”, virou anti-Simone histérica. Esse é o problema de cristão novo. Para purgar seus pecados, renega tudo que fez e vira mais cristão do que Jesus Cristo. Não vou estigmatizá-la por ter mudado a cor de sua camisa. Eu mesmo já mudei de opinião várias vezes na minha vida. Já fui um “revolucionário bravo”, hoje sou um reformista flor de laranjeira. Ela tem o direito de mudar, assim como Geraldo Alckmin tem o de estar no mesmo palanque de Lula, apesar de no passado recente ter afirmado que Lula queria voltar ao lugar do crime, além de ter sido árduo defensor do impichi de Dilma. Ele e um monte de gente que hoje está no palanque de Lula. Mas vão ser renegados por causa disso? Seria uma estupidez.
Política se faz olhando para a frente, pois quem vive de passado é museu. Nada a obstar quanto ao arco que Lula está construindo. Posso achar que ele é insuficiente, ainda é marcadamente uma frente de esquerda, mas não faço a crítica religiosa de que ele se juntou aos “impuros”.
Confesso não entender por que tanto fel contra Simone. Não é pelo fato de ela ter vínculos com o agronegócio. Até porque dos governos petistas participaram Roberto Rodrigues e o então maior produtor de soja do mundo, Blairo Maggi. E o que dizer de Kátia Abreu, que virou amiga de Dilma quando foi ministra da Agricultura? Olha que há pouco tempo Katia ganhou o troféu “motosserra do ano”.
Vamos deixar de cretinice. O agronegócio é positivo para o País, os grãos são os principais produtos da nossa pauta de exportação, geram empregos e impostos. Ele não pode ser tratado como inimigo e nem Lula cometerá tamanho desatino. Agora o que não pode é adotar a hipocrisia de muitos petistas. Xingam o agronegócio no palanque eleitoral, mas buscam seu apoio no escurinho do cinema. Ou Lula não despachou emissários para conversar com eles?
Há agronegócio destruidor do meio ambiente? Há. Mas não é a maioria. Seu polo dinâmico já percebeu que o meio ambiente é um ativo e que a exportação de seus produtos pode ficar comprometida. O capitalismo, meus caros, guia-se pela lógica implacável do lucro, já dizia aquele velho barbudo nascido na Alemanha. Ora, na medida em que a destruição do meio ambiente e o extermínio passam a comprometer seus negócios, eles deixam para trás sua prática predatória. É o que vem acontecendo com a agricultura de fronteiras plenamente estabelecidas, como o centro-oeste. Na entrevista a Renata Lo Prete expressou muito o pensamento desse polo mais avançado. Quem dera se a maioria do agronegócio deixasse de apoiar Bolsonaro e passasse a apoiar a presidenciável do MDB. Isso seria um avanço!
Como candidato nenhum imagina governar de costas para o agronegócio, não é por causa disso que Simone Tebet vem sendo demonizada pelas hostes lularianas. Ninguém chuta cachorro morto, diz o velho e sábio ditado. Ora, se Simone tem apenas 1% nas intenções de voto no Datafolha ou no máximo 3%, segundo o Ideia Data, por que escorre tanto fel pelo canto da boca das brigadas virtuais da candidatura Lula?
Cenário eleitoral e guerras de narrativas
Simone Tebet: “Fantasma da fome volta a nos atormentar”
Incentivo à leitura: FAP doa 4,2 mil livros à população durante feira em Brasília
Não é por geração espontânea. Trata-se de uma ação articulada e vejo duas hipóteses não excludentes e complementares como explicação. A primeira é que nos cálculos petistas a candidatura Simone provoca temores no arraial petista. Não no sentido de alterar radicalmente o quadro, mas de ter um potencial de crescimento e de puxar o PT para uma disputa num terreno para o qual o PT não se preparou: o da disputa das ideias. Em sendo assim, é melhor matar essa ameaça logo no matadouro, daí a metralhadora giratória gastar pólvora, chumbo e bala em uma candidatura com apenas 1% das intenções de voto.
A segunda hipótese é o velho cacoete autoritário de querer instituir o pensamento único. No mundo binário, que vem desde o “nós contra eles” pregado por Lula lá em 2006, só existe o bem e o mal, o preto e o vermelho. E não há na política colorações multifacetadas. Eles são a encarnação do bem e quem não adere a eles é a própria encarnação do mal.
Voltando ao artigo de Marco Aurélio. Ele prova que ainda tem intelectuais inteligentes neste País. Parece redundância, mas não é. Num País onde uma Márcia Tiburi diz que quem não votar em Lula no primeiro turno é fascista e a plateia petista ainda aplaude e pede bis, faz bem à nossa alma ter um intelectual de cabeça altiva como Marco. Ele nos inspira a não nos deixarmos intimidar pelas patrulhas ideológicas – de direita ou de esquerda.
*Jornalista
Incentivo à leitura: FAP doa 4,2 mil livros à população durante feira em Brasília
Luciara Ferreira e João Vítor*, com edição do coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
Autoridades políticas destacaram as ações de incentivo à leitura e valorização da cultura desenvolvidas pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), que doou 4.232 livros à população, durante os 10 dias da 36ª Feira do Livro de Brasília (Felib), realizada no Complexo Cultural da República. A pré-candidata a presidente Simone Tebet (MDB); o presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire; e a deputada federal Paula Belmonte (Cidadania-DF) passaram pelo estande da entidade e ressaltaram a relevância do conhecimento.
Freire defendeu a valorização dos livros e a educação cultural, realizada por meio de publicações da FAP. “Firma a identidade da nação amarela. Não podíamos passar aqui sem ver a fundação, que tem um trabalho exatamente nessa direção aqui em Brasília”, disse o presidente do partido.
A seguir, veja galeria de fotos do estande da FAP:












































"Livro salva das fake news"
Simone Tebet, que é apoiada pelo Cidadania e PSDB, disse que o livro é um ferramenta de propagação da verdade e beneficia a sociedade. “O livro salva [a população] dessas fake news, salva do radicalismo, salva dos extremismos. Quem tem cultura, quem tem a oportunidade de, através do livro, conhecer a verdade, é capaz não só de transformar, mas de transformar o país”.
“Dá para acreditar, dá para fazer um Brasil diferente. É preciso reconstruir [o país] em outras bases do fortalecimento das instituições democráticas, mas com base na verdade e igualdade para todos. E há só um caminho, o caminho da educação. Esse é o nosso compromisso principal como professora, política e brasileira”, disse a pré-candidata a presidente.
A presidenciável foi a primeira mulher a disputar o comando do Senado, em 2021. Também foi a primeira parlamentar mulher a comandar a disputada Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a primeira vice-governadora de Mato Grosso do Sul e primeira prefeita de Três Lagoas (MS).
FAP doa quase 700 obras no 1º fim de semana da Feira do Livro de Brasília
População receberá obras doadas pela FAP na 36ª Feira do Livro de Brasília
Na ocasião, Tebet recebeu, autografada, a obra Política em Movimento: Roberto Freire na imprensa, de autoria do presidente nacional do Cidadania, e disse que leria a “bonita” história de vida dele. O livro era um dos que estavam disponíveis para doação no Estande Ipê Amarelo (número 21), organizado pela Biblioteca Salomão Malina, mantida pela FAP.
"Conhecimento"
Paula Belmonte afirmou que "o livro é uma arma, da sociedade, do conhecimento". Ela elogiou a iniciativa da Fundação Astrojildo Pereira de incentivo à leitura e disse ter honra de participar tanto do partido quanto da entidade.
“A democracia só vai, realmente, se tornar uma realidade para todos nós quando as pessoas começarem a ter mais conhecimento. E a fundação vem fazendo isso. Trazendo bons temas para uma discussão da sociedade e, mais ainda, oferecendo isso gratuitamente para as pessoas”, disse a deputada federal.
A Feira do Livro de Brasília foi realizada no Complexo Cultural da República, pela Câmara do Livro do Distrito Federal (CLDF) e pelo Instituto de Produção Socioeducativo e Cultural Brasileiro (IPCB), com apoio da Câmara Brasileira do Livro (CBL) e do Sindicato dos Escritores do Distrito Federal.
*Integrantes do programa de estágio da FAP, sob supervisão do jornalista, editor de conteúdo e coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
Revista online | Top Gun: Maverick – um voo de nostalgia
Lilia Lustosa*, especial para a revista Política Democrática online (44ª edição: junho/2022)
Recentemente, uma sequela (sequel, em inglês) vem arrasando quarteirões e dando o que falar justamente por despertar na plateia aquela sensação gostosa de reviver o passado, de voltar no tempo, de reencontrar ídolos ou crushes da juventude. Top Gun: Maverick é uma explosão de nostalgia, com direito a Tom Cruise, Val Kilmer, Danger Zone (música de Kenny Loggins) e aquele sentimento de anos 1980 que invade por completo tela e mente.
Trinta e seis anos depois do sucesso de Top Gun: Asas Indomáveis (1986), longa-metragem que lançou Tom Cruise ao estrelato e garantiu seu lugar na cultura pop mundial, o novo Top Gun veio ainda melhor, mostrando que o tempo, às vezes, pode aprimorar uma obra, assim como faz com bons vinhos.
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Para dirigir essa sequela de peso, Joseph Kosinski foi o escolhido. Conhecido por sua aptidão no uso da computação gráfica – Tron: O Legado (2010) e Oblivion (2013) –, desta feita, o diretor americano optou por manter a estética e o estilo de seu predecessor, Tony Scott, filmando in loco, sem fundo verde. As cenas de abertura são exatamente como as do primeiro filme, incluindo a fonte utilizada para apresentar os créditos. Kosinski parece não ter querido deixar dúvidas sobre a filiação de seu Top Gun, prestando, ao mesmo tempo, bela homenagem ao diretor britânico que tirou sua própria vida em 2012. Kosinski agrega, porém, verniz de modernidade ao filme, aliando o que há de melhor na tecnologia atual ao realismo do cinema daqueles tempos. Em Top Gun: Maverick, os atores voam mesmo! Não é CGI. E mais, eles filmam também, já que nem diretor nem cinegrafista podiam acompanhá-los nos voos.
















Para que os atores pudessem enfrentar tantos desafios, o próprio Maverick – ops! Tom Cruise – preparou um boot camp de três meses para deixar todos no ponto para subir nos aviões. Kosinski, por sua vez, instalou quatro câmeras dentro de cada jato, duas viradas para os atores e duas para fora, e ainda lançou mão de drones e aviões com a equipe de filmagem voando ao lado dos protagonistas. Uma proeza de realização e, sobretudo, de montagem, ponto alto do filme. As sequências de voos são de tirar o fôlego. Super-realistas e editadas à perfeição para fazer os espectadores voarem junto naqueles caças supersônicos.
O roteiro, talvez, seja o ponto mais fraco do longa. Mas isso já era no original. Afinal, a trama de Top Gun 1 é bem simples: piloto rebelde, com muito talento, mas que não gosta de obedecer às ordens. Entra para a equipe de elite da Marinha americana, a Top Gun. Por seu temperamento, vai acumulando inimigos e perdendo oportunidades na carreira. Para piorar a situação, em um momento de rebeldia aérea, acaba perdendo seu melhor amigo e parceiro de voo, Nick “Goose” Bradshaw (Anthony Edwards). Uma ferida difícil de cicatrizar e que vai apagar um pouco a chama de rebeldia de Pete “Maverick” Mitchell.
No filme atual, o capitão Maverick é um piloto de testes, estagnado na carreira e na vida. Ele é chamado para treinar a equipe escolhida para uma missão quase impossível. Os seis pilotos selecionados da Top Gun terão que eliminar um inimigo que não tem cara (russos, chineses?). Entre eles está Bradley “Rooster” Bradshaw (Miles Teller), filho de seu amigo Goose. Maverick vai viver um dilema: treinar o rapaz para que ele participe dessa missão suicida ou eliminá-lo do grupo, protegendo sua vida, mas impedindo-o, com isso, de alcançar seus sonhos?
Top Gun 2 traz à tona velhos sentimentos, fantasmas e medos, além de propor uma reflexão sobre a maturidade e a passagem do tempo. Não que Maverick tenha perdido a rebeldia, mas agora ela é mais pensada, contida, controlada. As transformações físicas também têm destaque. Nesse quesito, um momento especial é a aparição de Tom “Iceman” Kasansky (Val Kilmer), antigo inimigo de Maverick, que, por seu talento e conformação às regras, chega à diretoria da Top Gun. Na vida real, sabe-se que Val Kilmer passa por um momento difícil, tendo perdido a voz depois de um câncer de garganta. Mas a tecnologia do século 21 torna sua participação possível e emocionante.
Quem ficou de fora mesmo foi a música-tema do primeiro Top Gun, Take My Breath Away, interpretada pela banda Berlin. Para seu lugar, Hold My Hand foi especialmente composta, interpretada por ninguém mais, ninguém menos que Lady Gaga. Será que ela também leva o Oscar, como fez sua predecessora?
Mas o melhor de Top Gun: Maverick é que ele prescinde de conhecimento prévio do filme de 1986, sendo assim um excelente entretenimento também para os jovens de hoje. As explicações necessárias estão todas ali, permitindo que todos desfrutem dessa aventura banhada de sol oitentiano. Mas, se der, vale assistir ao primeiro Top Gun e, também, ao documentário Val (2021), dirigido por Ting Poo e Leo Scott. Eles podem acrescentar um tom de sépia às emoções do presente, fazendo tudo ganhar mais alma e sentido.
Sobre a autora

*Lilia Lustosa é crítica de cinema e doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL), Suíça.
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de março de 2022 (44ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.
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Revista online | "Bolsonaro é um bom exemplo de degradação", diz Carlos Melo
Equipe da Revista e, como convidado especial, Luiz Sergio Henriques | (44ª edição junho/2022)
O cientista político, mestre e doutor pela Pontifícia Unidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Carlo Melo disse que “as lideranças em vários partidos estão calcificadas”. “A crise de liderança política afeta a todos”, afirmou. Ele, que é professor de Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), é o entrevistado especial desta 44ª edição da revista Política Democrática online deste mês (junho de 2022).
Na avaliação de Melo, o cenário eleitoral deste ano reflete o problema apontado por ele. “O fato de a gente chegar a esta altura da disputa eleitoral diante do dilema Lula ou Bolsonaro é revelador da crise de liderança política por que estamos passando”, destacou ele, que diz ter buscado contribuir com o debate político, econômico e social do Brasil, por meio de uma análise conjuntural isenta e reflexão desapaixonada.
Analista político, com participação ativa em vários veículos de comunicação, palestrante e consultor de empresas nacionais e estrangeiras, Melo também faz um alerta ao centro, que, segundo ele, “não se dispõe a assumir claramente um projeto, uma visão de mundo”.
Na entrevista, Melo também defende “ajuste fiscal”. “Isso é importante, fundamental, embora ainda não suficiente”. Além disso, segundo ele, “independentemente do resultado da eleição a crise haverá de continuar a partir de janeiro de 2023”. A seguir, leia os principais trechos da entrevista.
Revista Política Democrática Online (RPD): Há quase três anos, tivemos uma bela conversa em que você explorou com o brilho habitual a conjuntura política nacional. Hoje, talvez conviesse centrar-nos na grande crise institucional brasileira, que é antes de mais nada uma crise de representatividade dos partidos. Um estranhamento radical entre representantes e representados. Você concorda?
Carlos Melo (CM): Acho ótimo evitar falar de conjuntura. Nosso problema não é exatamente a conjuntura, nossos problemas são estruturais. Diria mais, nossos problemas são estruturais e não são só no Brasil. O mundo todo está passando por um momento complicadíssimo. Outro dia, participei de um evento com a grata presença do embaixador Rubens Ricupero, que disse: “O mundo me preocupa mais que o Brasil, e não é que o Brasil me preocupe pouco”.
A verdade é que estamos vivendo uma revolução, cujo início vem lá dos anos Reagan e Thatcher, quando o mundo virou de cabeça para baixo, ao perder algumas referências do pós-guerra. O Estado de bem-estar social, por exemplo. Aquela política tributária que tirava dinheiro dos ricos para distribuir para a sociedade e fazer o bem-estar morreu e começa a concentrar nos ricos. De fato, os ricos investem, geram um baita processo tecnológico. Os Estados também investem pesadamente nisso. Aos poucos, a gente vai mudando completamente. Costumo brincar com meus alunos e dizer que troquei canal de televisão no seletor. Todos nós trocamos assim os canais de televisão. E não foi de um século para o outro, parece ter sido para outro milênio, considerando o longo tempo que faz. No mundo de hoje, a reza diária, a Bíblia que uma pessoa lê, o primeiro que se pega é, de fato, o celular, onde se concentram as notícias.
Devo registrar que troquei o canal de televisão no seletor, usei máquina de escrever, usei máquina de tirar fotografia, vi telex e, depois, muito mais à frente, vi o fax. Hoje, tudo isso está no celular. Essas mudanças afetaram terrivelmente a sociedade, em particular o mundo do trabalho, ao deslocar milhões, bilhões até de pessoas para uma situação de abandono, afetando a política.


























A política e o Estado não reagiram a esse fenômeno. Sejamos justos, porém: não seria muito fácil. Tínhamos de compreender esses processos a quente, o que me faz lembrar de anedota atribuída a um político chinês, que, perguntado sobre a Revolução Industrial, disse: “Bom, só se passaram três, quatro séculos. É, portanto, muito cedo para avaliar”.
Eu diria que as mudanças que estamos enfrentando ainda não nos deram tempo, nem distância, para serem avaliadas. Daí talvez porque a política não tenha podido oferecer respostas, dando origem ao sentimento de desamparo de muita gente em nossos dias. O que se vocaliza é a demagogia. Não vou dizer que seja o populismo, porque o populismo, com todos os seus defeitos, tem uma qualidade superior a essa demagogia em voga na fala das lideranças políticas que conhecemos. Não surpreende, assim, que, diante dessa confluência de fatores e da multiplicidade de demagogos, o sistema político esteja absolutamente perdido, sem capacidade de resposta.
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Os partidos, não só do Brasil, mas da maioria dos países democráticos, padecem desse mal. O grande historiador Tony Judt antecipou em um livrinho, cujo título O mal ronda a Terra já tudo revelava, um processo da década final do século passado, invadindo o atual, de mal-estar que já adoecia o sistema político. Ele defendia a volta de uma visão capaz de reunir as pessoas que, como ele, estivessem tão absolutamente desoladas. A morte precoce privou-o de aprofundar seu pensamento e de contribuir para, quem sabe, influir nos partidos, nos intelectuais, e dar as respostas reclamadas por esse processo extraordinário de transformação.
Há pouco tempo, um ano antes da pandemia, fui convidado a falar sobre a política brasileira. Contrapropus falar não do Brasil, mas do mundo. É o cenário por onde se aceleram esses processos tecnológicos que causam mal-estar. Foi quando um senhor da plateia me interpelou: “Mas o que tem de errado em adotar avanços tecnológicos para reduzir custos de produção?”. Respondi: “Não sei se é certo, ou se é bom, saberemos dentro de um século, mas, agora, vivemos uma transição, que é custosa”. Sérgio Abranches amplia essa discussão com particular brilho, em seu belo livro A era do imprevisto.
Essa discussão não é nova, mas segue importante. Zygmund Bauman, por exemplo, recupera o sentido do conceito de transição desenvolvido por Antonio Gramsci, chamando de “interregno” este processo. Antonio Scurati, de sua parte, escreveu M, o filho do século, sobre Mussolini e o mundo do primeiro pós-guerra, um período claramente de transição, de interregno, parecido com o mundo pós-Guerra Fria, com todo este sentido de transição. Os partidos têm perdido essa perspectiva do processo histórico. Há partidos sérios e há partidos picaretas, que não se atualizam, seguem na mesma toada, como parasitas do sistema político.
Senti necessidade de explorar essas digressões para melhor situar o debate sobre o papel dos agentes políticos na tarefa de compreender o mundo em transformação e, ao mesmo tempo, traduzi-lo no conteúdo das metas prioritárias das ações dos governos. De novo, reconheço que se trata de um desafio tão difícil transpor como fundamental enfrentar.
RPD: No rastro de decisões que o Congresso vem tomando com insistência, não se enxerga com clareza o interesse nacional; antes, interesses patrimonialistas. Limito-me a mencionar que agora se cogita de um projeto declarar estado de calamidade pública nacional, que, entre outros efeitos, liberaria o governo para fazer o que lhe aprouvesse, incluindo um estado de emergência, vale dizer um golpe de estado, sob pretexto de fazer frente à calamidade pública de turno. Isso remete ao paradoxo imaginado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, de que partidos fracos favoreceriam um Congresso forte. O que pensa a esse respeito?
CM: Essa tentativa de decretar uma calamidade pública justamente para tirar proveito da ocasião de fato, passa por um problema sério. Algo precisa ser feito. Levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV) por esses dias revela que ultrapassamos a média mundial em relação à fome, a partir de uma pergunta simples: “Nos últimos 12 meses, você passou algum dia com fome, sem poder comer?”. As respostas afirmativas superaram 36%, acima da média mundial (35%), dado inédito na História do Brasil.
Posso estar enganado em algumas cifras, mas não muito. Na última pesquisa realizada, 31% das mulheres, hoje são 47%, responderam que sim, ao passo que os homens variaram um pouco menos: eram 27% dos homens, hoje são 26%. Essa calamidade está pesando muito mais sobre as mulheres. Renato Meireles, do Instituto Locomotiva, mostrou-me recentemente dados impressionantes. Hoje, temos 14,6 milhões de mães solo, o que significa famílias desestruturadas, mulheres tocando sozinhas a vida de seus filhos, suas próprias vidas, não raro carregando toda uma família, mãe, pai...
É uma situação calamitosa, e algo precisa ser feito. Só que não pode ser feito dentro de um espírito oportunista. Aliás, não poderíamos ter chegado a esse ponto. Alguns colegas dizem, tentando mascarar ou simplesmente evitar o debate, ou por mera insensibilidade, que a situação está, de fato, ruim, mas as instituições estão funcionando. As instituições estão funcionando porcaria nenhuma, algumas estão resistindo. Se elas estivessem realmente funcionando, não estaríamos onde estamos. Se as instituições estivessem funcionando, não teríamos o Bolsonaro. Simples assim. Existe, sim, oportunismo no sistema político brasileiro.
Além de todos os problemas comentados, não vamos esquecer de acrescentar problemas estruturais de âmbito mundial, bem conhecidos desde sempre. Tomemos como exemplo o próprio patrimonialismo. Uma coisa é passar por uma crise estrutural de mudança de paradigma num país democrático; outra bem diferente é passar pela mesma crise em um país com pouca tradição democrática e extremamente patrimonialista. Os sanguessugas, aqueles parasitas que matam o hospedeiro, correm para se aproveitar disso.
Sem dúvida, há motivos, sim, para ações emergenciais. Vários setores da sociedade, como o mercado financeiro, precisam saber que a pauta mudou. Nada pode ser feito se não tiver ajuste fiscal, se não tiver equilíbrio fiscal. Isso é importante, fundamental, embora ainda não suficiente. O equilíbrio fiscal demanda políticas públicas eficazes para resolver esse problema emergencial, mas não só se limitando a garantir que os compromissos assumidos e os contratos celebrados devam ser honrados. Não é esse o ponto. Impõe-se, na emergência, adotar políticas públicas eficazes, bem concebidas, que não desperdicem recursos públicos e se destinem a resolver, ou pelo menos mitigar, as questões estruturais, elidindo o patrimonialismo, o oportunismo e a picaretagem que há décadas assolam a trajetória das políticas públicas no Brasil. A sociedade tem de ter consciência do que está acontecendo no país e dar um basta nisso. Esse é o grande problema.
RPD: Com relação às eleições que se aproximam, temos, de um lado, um candidato buscando a reeleição, apoiado em uma corrente de opinião radical, extensa, ampla, embora minoritária, e que prescinde de siglas partidárias. De outro, como o nome mais bem posicionado nas pesquisas até este momento, um candidato ancorado em um partido estruturado, sólido, também dependente da vocalização de um único líder. Está claro que a democracia necessita mais do que isso. O que nos falta?
CM: O fato de a gente chegar a esta altura da disputa eleitoral diante do dilema Lula ou Bolsonaro é revelador da crise de liderança política por que estamos passando. Essa crise, aliás, não atinge só o Brasil. Se compararmos a liderança política do mundo nos anos 1980, época da queda do muro de Berlim e, depois, da unificação da Europa, com a liderança que temos hoje, é desolador. É verdade que algo tem também a ver com o processo de transformação da era Reagan/Thatcher. Lembremos que Thatcher declarou que esse negócio de sociedade não existe, o que existe são os indivíduos e suas famílias. Outro dia, comentei essa opinião com o ministro Delfim Neto, que se limitou a dizer: “Foi um equívoco”. Equívoco ou não, a sociedade acreditou que ela não existia e voltou-se para um individualismo hedonista, consumista.
O enfraquecimento da liderança tornou-se evidente. Sentimos falta de um Adenauer, de um Kohl, de uma Angela Merkel, reduzidos como estamos a um Putin, figura terrível, deletéria. No Brasil, no lugar de um doutor Ulysses ou de um Nelson Jobim, gente do que se poderia chamar alto clero, ou José Genoíno, Gastone Righi e José Lourenço, temos agora gente de todos os matizes, conformando um baixíssimo clero que se tornou hegemônico. Dos remanescentes daquela época – o período da redemocratização – sobraram-nos Fernando Henrique com 93 anos de idade e Lula, com 76 anos.
Voltando ao processo como um todo, um homem não substitui um partido. Tenho dito há mais de um ano, quando me perguntam da possibilidade da candidatura do Lula, que, apesar de todos os problemas com a justiça, ele estava cercado por um estado-maior de altíssima qualidade. Pode-se gostar ou não, mas, olhando para o passado, ele podia contar com José Dirceu, Luiz Gushiken, uma pessoa extraordinária, responsável pela indicação do Palocci, Márcio Thomaz Bastos, Duda Mendonça, um staff capaz de livrá-lo de um monte de frias. Hoje isso não acontece. Enquanto conversamos, Lula terá voltado a errar em algo. Ficou, às vezes, quase irreconhecível, na comparação com aquele homem que dava regularmente provas de sapiência, de sagacidade política. Era bem aconselhado, muito bem assessorado. Diante do vazio dos partidos – PT, incluído –, as lideranças políticas decaíram em qualidade de forma estrondosa. Restou o Lula. Então, tudo bem, é com esse que a gente vai. Tem méritos? Tem méritos, mas está longe de ser aquele quadro de 2002, quando tinha um grupo.
































A crise de liderança política afeta a todos. Olhemos para a direita, temos em Bolsonaro um bom exemplo de degradação. Lembremos que a direita radical teve figuras pelo menos mais bem formadas. Do Plínio Salgado ao Carlos Lacerda, ao próprio Paulo Maluf, com todos os seus problemas, eram políticos mais bem equipados do ponto de vista intelectual, inclusive. Com o ocaso do malufismo no começo dos anos 2000, a direita debilitou-se, caiu no vazio terrível. O PSDB tentou abraçá-la, mas não conseguiu. Faltava-lhe um ingrediente, um princípio ativo ao Serra e ao Alckmin. Esse princípio ativo apareceu nesse genérico Jair Bolsonaro, que também é uma degradação no sentido da liderança mesmo de uma direita radical, extremista.
Parodiando a música do Pedro Caetano, é com esse que eu vou. É isso que a gente tem. Infelizmente é isso, com todo o respeito ao Lula, porque não cabe compará-lo a Bolsonaro. Essa é a verdade. Mas mesmo o Lula é um homem de ontem, não é um homem de amanhã. É um homem de ontem. Só que a gente está em uma situação tão complicada que talvez seja necessário recuperar o ontem para colocar os pés no presente de novo e, quem sabe, daqui a quatro anos, poder olhar para o futuro.
RPD: A gente está lidando entre o estrutural e o conjuntural, no mundo e no Brasil. Passamos aí pela extrema truculência da direita atual e, também, pela velhice do padre eterno da esquerda. Os sintomas de envelhecimento do Lula se mostram até no vestuário. Não sei se vocês têm reparado que ele se apresenta ainda hoje, depois de 20 anos, com o mesmo terninho bolivariano nas apresentações públicas, para um público sempre exaltado. São sinais do passado, signos melancólicos. Mas talvez convenha passar a conversa para a questão central, a de examinar a série de partidos, desde a União Brasil, pela centro-direita, até o Cidadania, pela centro-esquerda, passando pelo PSD, do Kassab, PSBD, MDB, frações de um centro democrático que há décadas – não é um fenômeno recente – não consegue se articular, se coordenar, minimamente. Por que a prevalência dessas forças centrífugas no território do centro? Isso tem conserto?
CM: Gostei muito da imagem do “terninho bolivariano”. Percebi isso semanas atrás em um evento na PUC, São Paulo, mas não tinha elaborado dessa forma brilhante. É perfeito.
Quanto à questão do centro, existe uma série de questões de conceituação. Primeiro, falar de centro no Brasil é falar de muita coisa. Fala-se de um centro fisiológico ou de um centro democrático? Geraldo Alckmin, em 2018, foi vítima da crítica ao centro fisiológico. Seu maior erro foi deixar-se abraçar pelo Centrão. Aliás, o governo do Temer foi um governo de centro, o Temer sendo um primus inter pares. Durante algum tempo, não se usava o termo centrão, era “peemedebização”, referindo-se à lógica peemedebista de abandonar candidaturas majoritárias, para aderir a quem se estimava fosse ganhar a eleição e engordar suas bancadas, para beneficiar-se, assim, de um butim maior da máquina pública.
Segundo, tem também um centro democrático, que, sendo justo, inclui parcelas do MDB, de fato preocupadas com a democracia. O problema é que ambos os tipos de centro se confundem. Veja, por exemplo, o caso do PSDB. Depois de tantas idas e vindas, depois de perder sua principal característica fundadora – a ideia da social-democracia, de ser um partido de centro-esquerda –, pouco a pouco, perdeu a identidade de centro-esquerda, para se tornar um partido de centro por excelência. Ele tem setores que são centro democrático e setores que são centro fisiológico. A luta do PSDB, hoje, é para não ter um candidato à presidência da República, para ficar liberado à adesão fisiológica nos estados, à lógica do partido estadual, à lógica da federação de partidos estaduais em um só partido.
Urge separar o joio do trigo, o que é centro democrático e o que é centro fisiológico, fenômeno que contagia todos os partidos chamados de centro. Veja o União Brasil: a candidatura do Bivar é uma caricatura desse processo. O Bivar, presidente do PSL, há quatro anos deu guarida a Jair Bolsonaro. O PSL foi o partido do Bolsonaro por um bom tempo e agora se apresenta como partido de centro democrático. O primeiro problema é separar o joio do trigo e não jogar o trigo fora. É isso.
Falemos do centro democrático. Carece, também, de renovação de lideranças. É impressionante verificar como as lideranças em vários partidos estão calcificadas. São lideranças de ontem, algumas até com mérito, é verdade, mas também é verdade que de ontem, com imensa dificuldade de olhar para o futuro. E, assim, retoma-se o problema mais conjuntural: como definir esse centro. Para além de ser centro democrático, como se define? Nem Lula nem Bolsonaro? O que qualifica o centro é estar equidistante de dois polos? Isso lá é forma de definir algo?
Isso é pouco. É o que venho defendendo, sem êxito, há algum tempo. O centro não se dispõe a assumir claramente um projeto, uma visão de mundo. Talvez um certo oportunismo: surrupiar forças da direita e da esquerda, para engordar, mas sem engrossar nem fortalecer a musculatura. Atua num espaço do nem-nem. Não conseguiu se qualificar a ponto de, aí sim, surgir como uma força de centro capaz de aglutinar os outros. Os candidatos de centro que apareceram eram todos candidatos com esse perfil indefinido. Basta a proposta do nem Lula nem Bolsonaro. Qual projeto de futuro, qual crítica ao patrimonialismo, onde está uma verdadeira visão moderna de mundo? Surgiu alguém com capacidade política, intelectual, moral, para efetivamente conduzir esse projeto?
O que aconteceu com o centro pode ser uma reedição extemporânea do jogo “resta-um”. De início, eram 11 jogadores, passou-se para 10, depois nove e, assim, sucessivamente, até chegar a dois, Ciro e Simone Tebet. E ainda pode se reduzir a um ou uma. Pena que não se enxergue que não existe mais esse negócio de nem-nem, encoberto por uma cortina de fumaça que ofusca uma aposta cega na ambiguidade de perfis, de identidade política. A expectativa – equivocada – é a de que cerca de 25% do eleitorado, que não pretendem votar nem no Lula nem no Bolsonaro, terminarão migrando, por gravidade, para o centro. Quem acredita nisso é melhor voltar para a casa.
Ou, ainda, será possível que Eduardo Leite volte a encarnar o sonho peessedebista de concorrer à eleição para presidente? Tudo no Brasil é possível, pois, como ensinava Ulysses Guimarães, a política brasileira é sempre movida por “sua excelência, o fato novo”. Por isso, ainda há tempo. Mas por que não se construiu uma identidade? Será ele, finalmente, candidato à governança do Rio Grande do Sul, depois de ter rejeitado a proposta de Kassab para concorrer nacionalmente pelo PSD, ter sido deslocado da disputa presidencial pela vitória de Doria, na prévia do PSDB, e, em seguida, pela perda de espaço junto ao MDB, de Simone Tebet? Sem esquecer que este partido está fraturado, se equilibrando entre apoiadores de Lula ou de Bolsonaro. Esse é apenas um reflexo sobre a estratégia na campanha eleitoral da ausência de projeto de governo dos candidatos alternativos. Seguimos atraídos por nomes, não por programas, menos ainda por lideranças.
A falta de definição de segmentos do eleitorado revela a grande crise de liderança. Quando falo de liderança, não estou falando de uma liderança unipessoal. Estou falando de um grupo capaz de conduzir processos, preocupantemente ausente no universo político-partidário do país, que reúne homens de ontem que não sabem separar o joio do trigo e um centro que mescla centro democrático e centro fisiológico.
O exemplo mais eloquente disso é o PSDB. Três ou quatro facções brigam entre si, mas todas se indignaram com a declaração de Lula de que o PSDB morreu. Embora politicamente infeliz, a assertiva sobrevive a uma análise objetiva no sentido de que o partido, se não morreu, está na UTI, e precisa de alguma forma ser resgatado. Foi um partido importantíssimo. Basta lembrar o legado dos governos Fernando Henrique, que tiveram entre tantas outras realizações o Plano Real. Mas, já em 2002, na primeira campanha sem FHC, José Serra saiu-se com essa: “Continuidade sem continuísmo”. Em 2006, Geraldo Alckmin, sendo criticado pela esquerda por conta das privatizações, tirou aquela foto ridícula com um bonezinho do Banco do Brasil e a blusa da Caixa Econômica, exibindo seu afastamento do projeto do Fernando Henrique. Não vejo ninguém, hoje, do PSDB discutindo o problema da gasolina, dos combustíveis, etc. Bolsonaro cometeu essa patacoada de querer privatizar a Petrobras, e ninguém do PSDB resgatou a ideia das agências de regulação, da importância da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), da importância de todas essas agências, projetos vencedores do governo Fernando Henrique. Ninguém resgata isso. Quem se der ao trabalho de ler meus artigos nesses dois últimos anos verá que defendi a ideia de que o centro democrático deveria tentar a formação de uma frente ampla até mesmo com o PT de Lula. Mas isso não ocorreu, e temo dizer que, independentemente do resultado da eleição – e sabe-se lá que resultado teremos e com quais consequências –, a crise haverá de continuar a partir de janeiro de 2023.
Sobre o entrevistado

*Carlos Melo é cientista político e professor senior fellow do Insper.
** O artigo foi produzido para publicação na revista Política Democrática online de maio de 2022 (43ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não reflete, necessariamente, as opiniões da publicação.
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Putin reescreve a história. Apontamentos de São Petersburgo
Nicolò Sorio, Formiche*
A expectativa era alta, alimentada também pelo porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, que apresentara o discurso do presidente russo como “extremamente importante”. Apesar do atraso de cerca de uma hora, devido a um ataque hacker, Vladimir Putin não traiu as expectativas: “A época do mundo unipolar terminou, isto é iniludível, apesar das tentativas de conservá-la. Trata-se de uma mudança natural da História que irá de encontro aos estereótipos impostos por um só centro decisório, com uma só potência que controla os Estados a ela vizinhos e faz tudo no seu interesse exclusivo. Depois de vencer a Guerra Fria, os Estados Unidos sentem-se os mensageiros de Deus. Seus governantes são pessoas que não têm nenhuma responsabilidade, mas só cultivam os próprios interesses, criando uma rota que torna o mundo instável”.
O discurso, e em particular este trecho, sufraga o que foi a mudança de percurso operada pela Federação Russa no último decênio e permite fazer uma reflexão de mais amplo fôlego sobre a posição de Moscou em relação ao ambiente internacional. Os últimos anos podem ser lidos através da passagem fundamental da Federação Russa de potência insatisfeita a potência revisionista. Todas as matrizes de insatisfação que a Rússia amadurecera no pós-Guerra Fria (e não só) são postas a serviço de um projeto explicitamente voltado para subverter a ordem internacional liberal, a ordem internacional sob a direção estadunidense (ou pelo menos para orientá-la no sentido de uma estrutura mais compatível com os interesses e as expectativas da Rússia).
O conflito ucraniano enquadra-se perfeitamente neste sentido e pode ser lido, através da lente interpretativa de Moscou, como possível solução para os dois problemas/objetivos fundamentais do revisionismo russo. O primeiro é um objetivo distributivo: a Rússia reivindica uma zona, o espaço pós-soviético, de influência privilegiada, quando não exclusiva, considerada tradicionalmente em termos de “civilização”. O segundo é um problema reputacional: o reconhecimento do status de grande potência. A Rússia, neste sentido, ambiciona voltar ao centro do sistema de segurança europeu, e não só.
Durante seu discurso, Putin se disse pronto para enfrentar qualquer desafio: “Somos pessoas fortes e podemos enfrentar qualquer desafio. Como nossos antepassados, resolveremos qualquer problema, é o que fala toda a história milenar do nosso País”, reconectando-se a outra diretriz fundamental que constitui a política exterior russa: a autopercepção russa. O último decênio foi caracterizado pela construção de uma precisa narrativa inerente à civilização russa ("rossiiskaya"), uma concepção paraétnica da comunidade russa e russófona, baseada nas suas especificidades e no seu papel na era internacional. Os elementos-chave desta narrativa dizem respeito à convicção de que a Rússia desfruta de um direito natural, corroborado pela própria geografia, à imposição das regras do jogo político internacional e à formação de um patriotismo organicista, antitético àquele etnicista de molde ocidental.
O Fórum de São Petersburgo é, antes de tudo, um fórum econômico, e amplo espaço no discurso de sexta-feira foi dedicado ao tema das sanções ocidentais. Sobre este tema Putin reiterou a inutilidade do mecanismo europeu de sanções e o inevitável efeito bumerangue que terá sobre a economia ocidental: “Queriam quebrar nossas cadeias produtivas. Não conseguiram. Tudo o que se diz sobre o estado da nossa economia é só propaganda. Eles estão se autopunindo, porque sua crise econômica, que certamente não foi causada pela nossa Operação Militar Especial, fará nascer dentro dos seus países elementos radicais e de degradação que, em futuro próximo, levarão a uma substituição de elites. A União Europeia está arruinando sua própria população, ignorando os próprios interesses. Nossas ações no Donbass nada têm a ver com isso, a inflação e a escassez de matérias-primas são o resultado dos seus erros de sistema. Mas eles usam o Donbass como uma desculpa que lhes permite atribuir a nós todos os erros feitos nestes anos”.
No curso da intervenção relevantes foram as considerações sobre as relações entre Moscou e a Europa: “A União Europeia perdeu completamente sua soberania política”. A acusação é a de ter-se prostrado sob a égide estadunidense, negligenciando os próprios interesses nacionais. Este trecho deve ser interpretado levando em consideração a particular percepção que a Federação Russa tem do Velho Continente. A representação coletiva russa da Europa é bifronte. Por uma parte, é percebida como um modelo a ser observado em termos de progresso: à Europa se reconhece um papel histórico na construção da identidade russa (Moscou como terceira Roma) e no desenvolvimento econômico industrial. Por outra, é vista como um covil de vícios, emblema da decadência ocidental, à qual se deve necessariamente contrapor a ortodoxia russa.
Ao fim desta intervenção, que durou cerca de uma hora, foi reservado um espaço para algumas perguntas da plateia. Em particular, surpreende a pergunta relativa ao suposto estado de saúde do presidente da Federação Russa, à qual o próprio Putin responde, parafraseando a conhecida frase de Mark Twain: “Os boatos sobre minha morte são muito exagerados”.
* Analista geopolítico, em Geopolítica.info. Texto originalmente em Formiche
Eleições 2022: pré-candidatos a presidente e seus obstáculos
Nathalia Passarinho, BBC News Brasil*
A eleição presidencial de 2022 tende a gerar grande polarização, com Jair Bolsonaro (PL) disputando a reeleição e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tentando retornar à Presidência da República para um terceiro mandato.
Mas pré-candidatos de esquerda, centro e direita tentam se viabilizar como "terceira via", entre eles Ciro Gomes (PDT) e a senadora Simone Tebet (MDB). O ex-juiz Sergio Moro havia sido anunciado como pré-candidato pelo Podemos em novembro passado, mas em março abriu mão da corrida após se filiar ao União Brasil.
Já o PSDB havia escolhido em suas prévias o governador de São Paulo, João Doria, como pré-candidato do partido à eleição. Em 23 de maio, contudo, Doria anunciou sua desistência da disputa presidencial. A sigla sinalizou que deve se unir ao MDB e ao Cidadania em torno de uma candidatura única - no caso, a de Tebet.
Cabo Daciolo (PMB), por sua vez, anunciou em meados de março ter desistido de se candidatar novamente à Presidência e declarou voto em Ciro. Em 2018, Daciolo ficou em 6º lugar com 1,3 milhão de votos — 1,26% do total.
Até agora, existem três mulheres entre pré-candidatos à Presidência da República: Simone Tebet (MDB), Vera Lúcia (PSTU) e Sofia Manzano (PCB). A lista definitiva de candidatos só vai ser definida nas convenções partidárias que vão ocorrer entre 20 de julho e 5 de agosto de 2022.
A BBC News Brasil lista aqui as pessoas que, pouco menos de um ano antes da eleição, já foram lançadas como pré-candidatas — e os desafios que cada uma tem a enfrentar.
Jair Bolsonaro, pelo PL

O presidente Jair Bolsonaro vai disputar a reeleição pelo Partido Liberal, legenda de Valdemar Costa Neto, um dos condenados no escândalo do mensalão. Atualmente, um dos principais desafios de Bolsonaro é a baixa popularidade. baixa. em baixa. Segundo pesquisa divulgada em março pelo Datafolha, 46% dos brasileiros avaliam seu governo como ruim ou péssimo. Seu governo é aprovado por apenas 25% dos entrevistados.
Alguns elementos contribuíram para essa queda: a reação do governo à pandemia do coronavírus; os escândalos envolvendo filhos do presidente, especialmente o chamado caso das "rachadinhas"; e as acusações relacionadas à compra de vacinas contra a covid. Mais recentemente, seu governo foi atingido por suspeitas de irregularidades praticadas no Ministério da Educação. As suspeitas são de que pastores evangélicos estariam cobrando propina de prefeitos em troca da liberação de verbas do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (FNDE). O governo alega que determinou que o caso fosse investigado, mas o caso já levou à queda do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro.
A crise econômica, com alta contínua da inflação, e o aumento da pobreza também podem significar desafios para a reeleição de Bolsonaro. Por outro lado, o aumento do valor do Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família) pode ajudar a recuperar parte dos votos. Bolsonaro deu novo nome ao Bolsa Família, numa tentativa de imprimir marca própria na assistência social. O presidente também conta com uma base de eleitores fiéis dispostos a ir às ruas para defender suas posições, como ocorreu nos protestos de 7 de setembro.
"O principal desafio de Bolsonaro é a avaliação ruim do seu governo, conforme mostram pesquisas de opinião", disse à BBC News Brasil o cientista político Claudio Couto, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Para Couto, outro desafio será sustentar o discurso de combate à corrupção, especialmente após as denúncias de corrupção na compra de vacinas contra a covid e as acusações de que tentou interferir em investigações da Polícia Federal.
Se antes de se eleger presidente Bolsonaro era um dos principais defensores da Lava Jato, foi durante seu governo que a força tarefa foi desmantelada e o ritmo das investigações se reduziu consideravelmente.
"Para Bolsonaro o discurso anticorrupção foi perdido e foi perdido por conta dos problemas na família, o envolvimento em compra de vacina, e o favorecimento de seus aliados do Centrão. Esse discurso, a não ser para quem acredita que o PT detém o monopólio da corrupção, não vai colar como em 2018", diz Couto.
Bolsonaro está, atualmente, em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás apenas de Luiz Inácio Lula da Silva. Num eventual segundo turno com Lula, ele poderá voltar a personificar o antipetismo que o ajudou a se eleger em 2018.
Luiz Inácio Lula da Silva, pelo PT

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silvia aparece em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto para presidente da República, seguido por Bolsonaro. Desde que teve sua condenação por corrupção anulada pelo Supremo Tribunal Federal, sua candidatura pelo PT à Presidência é tida como certa por políticos do partido.
Embora, não tenha confirmado que irá concorrer, o ex-presidente tem participado de eventos para discutir propostas para o Brasil, vem se reunindo com setores da sociedade, como lideranças evangélicas, e até rodou a Europa para dialogar com chefes de Estado e de governo.
O principal obstáculo do ex-presidente é o antipetismo, que ainda deve ter peso na próxima disputa presidencial, com eleitores buscando alternativas numa terceira via ou recorrendo a Bolsonaro para evitar um retorno de Lula. Apesar disso, as últimas pesquisas de opinião mostram que a rejeição do ex-presidente é menor que a dos outros quatro candidatos mais competitivos na disputa. Uma das estratégias do PT para diminuir a resistência ao nome de Lula foi o anúncio de que o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSB) será o seu candidato a vice, caso a candidatura seja confirmada.
Lula aparece com 43% de rejeição na pesquisa de intenção de voto da Quaest/Genial, divulgada no dia 8 de dezembro, enquanto 64% dizem que não votariam em Jair Bolsonaro (PL). Já Ciro Gomes (PDT) tem 55% de rejeição e João Doria (PSDB), 59%.
"O Lula tem a dificuldade de vencer o antipetismo. Mas isso está mais fraco do que foi anteriormente. Uma parte dos problemas que originou o antipetismo, que é o escândalo de corrupção, se dissolveu pelo tempo que passou, são escândalos já precificados", avalia Claudio Couto, da FGV..
Lula tem a vantagem de, ao menos por enquanto, só ter Ciro Gomes (PDT) como adversário de esquerda na disputa. Todos os demais pré-candidatos são associados à centro-direita ou direita. Isso garante a ele maior facilidade para chegar ao segundo turno.
"Lula, de todos os candidatos, é o que pode estar na posição mais confortável. Ele tem na esquerda um apoio consolidado. Ciro Gomes, ao bater forte em Lula e Dilma, como tem efeito, abdicou de parte do eleitorado da esquerda", diz Couto.
Ciro Gomes, pelo PDT

O PDT lançou a candidatura de Ciro Gomes à Presidência no dia 21 de janeiro, em ato na sede do partido em Brasília. Esta será a quarta vez que Ciro Gomes concorre ao cargo. Em 2018, ficou em terceiro lugar no primeiro turno, com 12,5% dos votos.
Ele também concorreu à Presidência em 2002 e 1998. Candidato associado à esquerda ou centro-esquerda, Ciro Gomes tenta novamente despontar como terceira via, ou seja, alternativa a Lula e Bolsonaro.
A seu favor, ele conta experiência política, numa eleição que não dará o mesmo peso a "outsiders" ou figuras antipolíticas como a de 2018. Ciro foi prefeito de Fortaleza, deputado estadual, deputado federal, governador do Ceará e ministro dos governos Itamar Franco e Lula.
Ele passou por sete partidos e deve concorrer à eleição de 2022 pelo PDT. Para fazer frente à candidatura de Lula, Ciro tem adotado uma estratégia de ataque, criticando fortemente o ex-presidente petista.
"Lembre que o Brasil mudou muito e Lula não renovou as ideias. Será que ele se corrigiu e não vai repetir aqueles erros terríveis que você só descobriu depois? O pior é que você nunca viu ele pedir perdão pelos erros e está vendo ele se juntar de novo às mesmas pessoas", escreveu Ciro nas redes sociais.
O ex-governador do Ceará também chegou a acusar Lula de conspirar para o impeachment de Dilma e, quando a petista saiu em defesa do padrinho político, Ciro reagiu dizendo que a ex-presidente foi uma das pessoas "mais inapetentes, incompetentes e presunçosas" a presidir o Brasil.
Se por um lado essa estratégia visa firmar Ciro Gomes como alternativa a Lula, por outro, pode eventualmente afastar eleitores que nutrem alguma simpatia pelo PT ou que defendem uma ampla aliança anti-Bolsonaro.
"Ao mesmo tempo em que essa estratégia pode custar votos de eleitores da esquerda, Ciro tem dificuldade em conquistar, de fato, eleitores da direita. Ele ainda é visto como alguém, no mínimo, de centro-esquerda", diz o cientista político Claudio Couto.
Simone Tebet, pelo MDB

A pré-candidatura de Simone Tebet foi lançada em dezembro de 2021 pela direção nacional do MDB.
Ela foi a primeira mulher a disputar o comando do Senado, em 2021. Também foi a primeira parlamentar mulher a comandar a disputada Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a primeira vice-governadora de Mato Grosso do Sul e primeira prefeita de Três Lagoas (MS).
A possibilidade de candidatura à Presidência surgiu do destaque que Tebet teve na CPI da covid no Senado. Embora não fosse integrante fixa da comissão, ela participou dos principais depoimentos da CPI com uma postura contundente e crítica à gestão do governo Bolsonaro na pandemia.
O principal obstáculo que a senadora deverá enfrentar é se tornar nacionalmente conhecida. "Ela é desconhecida fora de seu estado, o Mato Grosso do Sul. A CPI fez com que ela se tornasse conhecida por uma parcela pequena dos eleitores, aqueles que leem jornal, mas isso não é ainda suficiente", avalia Couto.
Tebet chegou a enfrentar resistência interna dentro do próprio MDB. Líderes do partido reuniram-se com o ex-presidente Lula e indicaram que poderiam apoiá-lo no primeiro ou no segundo turno. Em meados de maio, contudo, a sigla sinalizou que poderia unir forças com PSDB e Cidadania em torno da candidatura da senadora - possibilidade que ganhou força com a desistência de João Doria, pré-candidato tucano até dia 23 de maio.
Luciano Bivar, pelo União Brasil

O deputado federal e presidente nacional do União Brasil, Luciano Bivar (PE) teve seu nome escolhido pela bancada do partido na Câmara dos Deputados como o pré-candidato da legenda à Presidência da República. A decisão ainda precisará ser referendada pelas convenções partidárias, que deverão acontecer nos próximos meses. Ele tem 77 anos de idade.
Bivar é empresário e já foi dirigente do Sport Clube Recife, um dos mais tradicionais de Pernambuco. Ele foi um dos fundadores do PSL, partido pelo qual o presidente Jair Bolsonaro se elegeu em 2018.
Após desentendimentos entre Bolsonaro e o comando da sigla, o presidente deixou o partido. Em fevereiro deste ano, o PSL se fundiu ao Democratas para criar o União Brasil.
Em seus discursos, Bivar defende o liberalismo econômico. Em 2006, ele chegou a disputar a Presidência da República, mas ficou em penúltimo lugar entre todos os candidatos, com apenas 0,1% dos votos válidos.
Apesar de estar em um partido grande e que deverá ter acesso a R$ 770 milhões do fundo eleitoral, para se consolidar como candidato, Bivar deverá ampliar a faixa do eleitorado que o conhece. Além disso, ainda não está inteiramente claro se a pré-candidatura de Bivar à Presidência é uma posição firme do partido ou se ela irá mudar ao longo dos próximos meses.
Vera Lúcia, pelo PSTU

O Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) lançou a candidatura de Vera Lúcia na sexta-feira (19/03). Esta será a segunda vez que ela disputa a presidência pela sigla. A primeira foi em 2018, quando obteve 55,7 mil votos, o equivalente a 0,05% dos votos válidos.
O PSTU foi fundado no início dos anos 1990 a partir de dissidências de outros partidos como o PT, partido ao qual Vera Lúcia chegou a ser filiada até 1992. O partido se auto-define como "socialista e revolucionário".
Antes de ingressar na carreira política, Vera Lúcia foi faxineira e costureira em Sergipe, estado onde iniciou sua militância. Ela participou da fundação do sindicato dos profissionais de costura da indústria calçadista do estado.
Durante os governos petistas, o PSTU se colocou como oposição, fazendo críticas tanto às gestões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto de Dilma Rousseff.
Na avaliação da cientista política Carolina Botelho, o Laboratório de Estudos Eleitorais, de Comunicação Política e de Opinião Pública da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), o principal obstáculo a ser enfrentado por ela e por outros candidatos pouco conhecidos é, justamente, a a alta taxa do eleitorado que afirma não saber quem eles são.
"Em geral, a principal barreira é o desconhecimento. Para fazer dessa candidatura algo nacional, é muito difícil nesse contexto", afirma Botelho.
Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha divulgada na quinta-feira (24/03) mostra que 69% dos eleitores entrevistados afirmam não conhecerem Vera Lúcia.
Sofia Manzano, pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Em fevereiro, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) lançou a pré-candidatura da professora universitária Sofia Manzano. Ela tem 50 anos de idade começo sua militância política aos 18, em 1989.
Manzano é economista formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), mestra em desenvolvimento econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e doutora em História pela Universidade de São Paulo (USP).
Desde 2013, ela vive em Vitória da Conquista, onde dá aulas na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). O foco das suas pesquisas são as relações de trabalho e a desigualdade social.
Em entrevista concedida no dia 6 de abril para o site Brasil de Fato RS, Manzano defendeu propostas como intensificar pesquisas universitárias para o setor agrícola para que elas tenham como foco a agricultura familiar e as pequenas propriedades e não o chamado agronegócio. Ela também fez uma defesa do comunismo.
"Porque o comunismo é a proposta mais generosa que a humanidade já produziu para ela própria. Mas como o comunismo sempre é o responsável pelo enfrentamento do que há de mais terrível no capitalismo, é muito demonizado", disse Sofia.
Luiz Felipe D'Ávila, pelo Partido Novo

O cientista político Luiz Felipe D'Ávila foi anunciado no dia 3 de novembro como pré-candidato do Partido Novo à Presidência da República. Em 2018, o partido surpreendeu em desempenho quando seu então candidato à presidente, João Amoêdo, terminou o primeiro turno em quinto lugar, com 2,5% dos votos, à frente de candidatos como Henrique Meirelles e Marina Silva.
Amoêdo, que chegou a anunciar voto em Bolsonaro no segundo turno, passou a defender o impeachment do presidente durante a pandemia. Ele chegou a ser lançado novamente como pré-candidato pelo Novo no início do ano, mas sua candidatura sofreu oposição de parcela dos integrantes do partido, sobretudo entre os que apoiam Bolsonaro. O partido, então, decidiu lançar Luiz Felipe D'Ávila.
Ex-PSDB, D'Ávila coordenou o programa de governo do candidato tucano à Presidência Geraldo Alckmin em 2018, mas depois deixou o partido e recentemente se filiou ao Novo. Ele é crítico de Bolsonaro e Lula, e diz que os dois formaram governos "populistas de direita e esquerda". Ao ser lançado pré-candidato pelo Novo em cerimônia no dia 3 de novembro, ele defendeu privatizações e outras reformas para reduzir o papel do Estado na economia.
"O populismo apenas perpetua a miséria, a pobreza, a corrupção e o mau funcionamento das instituições democráticas", disse.
A dificuldade do partido Novo será tornar D'Ávila conhecido nacionalmente. Além disso, enquanto em 2018 o partido se beneficiou de um forte movimento de rejeição da política e de busca por quadros novos, a eleição de 2022 tende a ser menos focada na busca pelos chamados "outsiders".
Na avaliação de Carolina Botelho, um dos principais obstáculos a serem enfrentados por D'Ávila é o desgaste do Partido Novo decorrente da aproximação da legenda com posições bolsonaristas.
"Acho que o principal problema a ser enfrentado é a rejeição que o Novo ganhou nos últimos anos. Eles foram responsáveis pelo ingresso do ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles na vida pública e estão com uma imagem muito associada ao bolsonarismo", afirmou.
Leonardo Péricles, pela Unidade Popular pelo Socialismo (UP)

Leonardo Péricles é técnico em eletrônica e presidente nacional do Unidade Popular pelo Socialismo (UP), um partido de esquerda fundado em 2019. Ele mora em uma ocupação em Belo Horizonte e sua pré-candidatura foi anunciada em novembro de 2021.
O pré-candidato defende pautas como a realização de uma nova assembleia constituinte e um plebiscito para consultar a população sobre refinanciamento da dívida pública do país e a reforma urbana por meio da destinação de imóveis ociosos para moradia popular.
Assim como Vera Lúcia, Leonardo também enfrenta uma alta taxa de desconhecimento por parte do eleitorado.
Segundo o Datafolha, 80% dos eleitores entrevistados em março afirmaram não conhecerem o pré-candidato.
"Acho que essa barreira (baixa taxa de reconhecimento) é muito grande. Até por isso, não acredito que algumas dessas candidaturas tenham, de fato, o objetivo de chegar à presidência. É comum que alguns usem esse momento para levantar suas bandeiras e fazerem seus partidos ficarem mais conhecidos", afirma Carolina Botelho.
André Janones, pelo Avante

O partido Avante oficializou a candidatura do deputado federal André Janones (MG) no dia 29 de janeiro. Em discurso, ele defendeu a criação de um programa de renda mínima para pessoas na faixa da pobreza no Brasil.
"Vamos encampar essa campanha de um programa de renda mínima para aqueles que mais precisam. E quando eu falo sobre isso, a primeira coisa que sempre me perguntam em qualquer entrevista ou debate é 'vai tirar dinheiro de onde?'. Ninguém nunca perguntou de onde vai tirar dinheiro para pagar o juro a banqueiro, para pagar amortização de dívida, para pagar privilégio de político", disse.
Janones também tenta se consolidar como a "verdadeira" opção da "terceira via". No lançamento de sua candidatura, ele chamou Ciro Gomes (PDT) e Sergio Moro (Podemos) de "puxadinhos" de Lula e Bolsonaro, respectivamente.
"As pessoas não migraram para a terceira via porque perceberam que era mais do mesmo. O eleitor que vota em Bolsonaro não vê muita diferença se for para Moro e os eleitores de Lula não veem muita diferença em mudar para Ciro. É trocar seis por meia dúzia", declarou.
André Janones tem 37 anos, nasceu em Ituiutaba, no triângulo mineiro, é advogado e exerce seu primeiro mandato como deputado federal.
Em 2016, ele se candidatou à prefeitura da cidade em que nasceu, mas foi derrotado. Dois anos depois, foi um dos principais apoiadores da greve dos caminhoneiros em MG, o que fez bombar a sua popularidade das redes sociais.
Em 2018, foi o terceiro deputado federal mais votado de Minas Gerais, com 178.660 votos. Assim como os demais pré-candidatos à presidência que são parlamentares, Janones terá a dificuldade de se tornar realmente conhecido em âmbito nacional.
José Maria Eymael, pelo Democracia Cristã

O fundador e atual presidente do Democracia Cristã, é apresentado como pré-candidato pelo partido desde 2020, mas a informação foi formalizada na quarta-feira (30/03).
Empresário e advogado, com especialização em Direito Tributário, Eymael já disputou a Presidência outras cinco vezes no passado. Foi deputado federal constituinte em 1988 e ficou conhecido pelo jingle "Ey, Ey, Eymael, um democrata cristão", lançado em 1985, quando se candidatou a prefeito de São Paulo pela primeira vez.
No discurso em que formalizou sua participação na corrida de 2022, o candidato disse que é a favor de "valores da família" e que defende a adoção de programas de emprego e moradia para o país.
"Nossos valores são os valores da família, as necessidades da família. E na campanha para a Presidência da República vamos defender alguns princípios. Um deles é o emprego. E, para ter emprego, precisamos ter desenvolvimento no país", declarou.
O convite para o evento do Democracia Cristã em Brasília na quarta o apresentou como pré-candidato e informou que o ato foi destinado a filiações à legenda.
Eymael, de 82 anos, concorreu à Presidência nas eleições de 1998, 2006, 2010, 2014 e 2018. Nunca foi para o segundo turno e, nas últimas eleições, recebeu 41,7 mil votos (0,04%).
Pablo Marçal, pelo PROS

Em maio, o Partido Republicano da Ordem Social (PROS) anunciou que estava lançando a primeira candidatura para presidência do Brasil de sua história: a do empresário Pablo Marçal, que se define em seu site como "cristão, filantropo, empreendedor imobiliário e digital, mentor, estrategista de negócios e especialista em branding".
Marçal se coloca como distante da divisão entre esquerda e direita e exalta sua presença nas redes sociais.
Mas seu nome apareceu no noticiário no início de janeiro não por suas pretensões políticas, e sim por ter liderado uma expedição ao Pico dos Marins, no Estado de São Paulo, que acabou exigindo resgate pelo Corpo de Bombeiros.
O pré-candidato ainda não apresentou formalmente suas propostas, mas já anunciou seu objetivo de estimular o empreendedorismo nacional, com a criação de 4 milhões de empresas e 20 milhões de empregos. Ele também defende a aproximação entre educação e digitalização, por exemplo com a implantação de universidades públicas digitais.
Além da inexperiência dele na política, e a de seu partido na corrida presidencial, ambos terão que lidar com um orçamento do fundo eleitoral bem abaixo das siglas com cifras mais avantajadas — segundo estimativa da Associação Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep) feita a pedido do portal UOL, o PROS deverá receber algo em torno de R$ 89 milhões do fundo.
*Texto publicado originalmente no BCC News Brasil. Título editado.
"A vida seria muito difícil sem música", diz curador de concertos da FAP
João Vítor e Luciara Ferreira*, com edição do coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
Além de ser o ganha-pão do violoncelista Augusto Guerra Vicente, de 50 anos, a música mostra, para ele, o lado bom da vida, entretém e o ajuda a confortar as pessoas. “É uma forma de arte muito sublime e necessária. A vida seria muito difícil sem ela. As pessoas estão sempre escutando música”, afirma.
Mestre em música Brasileira pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), Vicente participa de vários grupos musicais e integra a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional. Ele diz que lhe faltam palavras para definir o que é música. Isto porque ele ressalta que a arte tem vários sentidos. “Tudo que tenho, devo à música", agradece.
A melodia corre nas veias. De avô para pai, de pai para filho, Vicente é o terceiro violoncelista de uma família que espalha musicalidade por onde vai. Antônio Guerra Vicente, pai de Augusto, por exemplo, saiu do Rio de Janeiro, em 1972, e foi para Brasília ajudar a criar o curso de violoncelo da Universidade de Brasília (UnB).
Série de concertos
Entre os grupos que Vicente compõe, está o Quarteto Capital, que se apresentará no Espaço Arildo Dória, dentro da Biblioteca Salomão Malina, mantida pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília. O evento será no dia 30 de julho, a partir das 16 horas, para todo o público. A entrada é gratuita.
O evento é organizado pelo próprio violoncelista. O projeto Em Torno de 22: Cem Anos de Modernismo na Música Brasileira é parte das comemorações pelo Centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, que marca um divisor de águas na história da arte no Brasil e na área de música, em particular.
Com início marcado para o dia 25 de junho, a série de cinco concertos terá sua primeira apresentação com o pianista Fernando Calixto, de 37, interpretando as obras do carioca Heitor Villa-Lôbos e Debussy.
Veja, abaixo, vídeo de Fernando Calixto:
A Semana de Arte Moderna teve como compositor “oficial” Villa-Lôbos, responsável maior pela introdução do modernismo e do nacionalismo na música brasileira. Embora não tenha sido o único precursor, o carioca mostrou-se como o maior divulgador das novas técnicas musicais chamadas modernas e teve, no palco do Teatro Municipal de São Paulo, um privilegiado cenário para seus objetivos.




















"A música me escolheu"
Nascido em Uberaba (MG), o pianista Calixto diz que a música o escolheu e não ele a escolheu. “Desde de que eu ganhei um tecladinho de brinquedo quando eu tinha apenas 13 anos, eu sabia que seria músico”, afirma.
Ele diz não ver a menor possibilidade de viver sem a música. "É algo essencial quase como ar", ressalta.
O pianista tem um instituto que leva seu nome. Mais do que ensinar música, segundo ele, o Instituto Fernando Calixto busca transformar vidas por meio da arte, da percepção do mundo sonoro e da individualidade de cada um.
O projeto mostra Villa-Lobos como o principal artista representado, de modo que se fará notar tanto por meio de suas próprias obras quanto pelas de compositores que o influenciaram ou que por ele foram influenciados.
De acordo com Vicente, pode-se dizer que Villa-Lobos é o primeiro compositor preocupado em dar à música brasileira uma cara própria. “Muito influenciado pelas ideias de Mário de Andrade”, analisa.
O curador do evento ressalta a participação de Fernando Calixto, que também tocará algumas das peças executadas pelo pianista Guiomar Novais na Semana de Arte Moderna de 1922. “Serão peças de Villa-Lobos e do compositor francês Claude Debussy, que foi a grande influência que Villa-Lobos recebeu no que diz respeito à técnica composicional”, afirma.
Organizado em cinco programas, a série de concertos sobre a origem do modernismo do Brasil será tratada, na primeira apresentação, com algumas das obras apresentadas pela pianista Guiomar Novaes na Semana de 22, em um recital de piano solo. A seguir, em um recital de violão solo, será tratada a escolha deste instrumento como representante da nacionalidade, por meio de peças de compositores do século XX, alguns deles oriundos da música popular urbana.
No terceiro recital, será abordado um dos desdobramentos do modernismo na música brasileira, que foi o nacionalismo, por meio de um recital do Quarteto Capital. Em seguida, a quarta apresentação vai mostrar uma miscelânea de obras de música de câmera de Heitor Villa-Lobos, trazendo o instrumento favorito do compositor, o violoncelo, como fio condutor. Por fim, o compositor Cláudio Santoro, considerado o principal de Brasília, fechará a série em Brasília, que, por si só, é um dos principais marcos do modernismo no mundo.
Programação
Veja, abaixo, detalhes da série de concertos Em torno de 22: Cem Anos de Modernismo na Música Brasileira, com a curadoria de Augusto Guerra Vicente, no Espaço Arildo Dória, dentro da Biblioteca Salomão Malina, no Conic, região central de Brasília (DF).
25/06, às 16h
Concerto 1: As Origens
Piano Solo: Fernando Calixto – Obras de Villa-Lobos e Debussy
09/07, 16h
Concerto 2: O violão como instrumento nacional
Violão Solo: Álvaro Henrique – Obras de Villa-Lobos, Guerra-Peixe, Dilermando Reis e Baden-Powell
30/07, 16h
Concerto 3: Desdobramentos do modernismo: o nacionalismo brasileiro
Quarteto Capital - Obras de Villa-Lobos, Osvaldo Lacerda, Glauco Velásquez, Ernst Mahle, Aurélio Melo e Vicente da Fonseca
Violino I: Daniel Cunha
Violino II: Igor Macarini
Viola: Daniel Marques
Violoncelo: Augusto Guerra Vicente
13/08, 16h
Concerto 4: Obras de música de Câmara de Villa-Lobos para violoncelo
Obras de Heitor Villa-Lobos com:
Violoncelo: Norma Parrot
Violino: Daniel Cunha
Flauta: Thales Silva
Piano: Larissa Paggioli
27/08, 16hEm torno de 22: Cem Anos de Modernismo na Música Brasileira
Concerto 5: Desdobramentos do modernismo: Cláudio Santoro em Brasília
Obras de Cláudio Santoro com:
Viola: Mariana Costa Gomes
*Integrantes do programa de estágio da FAP, sob supervisão do jornalista, editor de conteúdo e coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
Martin Cezar Feijó faz sessão de autógrafos no 7º Salão do Livro Político
João Vítor*, com edição do coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
A biografia de Astrojildo Pereira, um dos fundadores do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e que morreu aos 75 anos no Rio de Janeiro, é registrada na nova edição do livro O revolucionário cordial, escrito pelo historiador Martin Cezar Feijó. Ele realizará sessão de autógrafos, nesta quarta feira (22/6), a partir das 18 horas, durante o 7º Salão do Livro Político, no teatro Tucarena da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). A obra completa o conjunto de seis títulos recém lançados na coleção que leva o nome do intelectual.
Coleção Astrojildo Pereira é lançada com nova edição de seis obras
O Salão do Livro Político voltou ao formato presencial neste ano. O evento, que começou na segunda-feira (20/6), seguirá presencialmente até quinta-feira (23/6), com debates e feira de livros no teatro. Na sexta (24/6) e no sábado (25/6), haverá atividades online. A programação conta com um curso e mais de quinze mesas de debates sobre democracia na América Latina, literatura e gênero, ecologia e questões raciais, dentre outros temas.
As palestras serão transmitidas ao vivo pelos canais de YouTube do Salão do Livro Político, da PUC-SP, da Boitempo, da Autonomia Literária e de entidades apoiadoras.
Confira debate sobre Astrojildo Pereira no 7º Salão do Livro Político
Veja vídeo de lançamento da Coleção Astrojildo Pereira, em Brasília
Entre os convidados, os destaques são a ex-presidenta Dilma Rousseff, Glenn Greenwald, Manuela D’Ávila, Don L, Guilherme Boulos, Sonia Guajajara, Ricardo Antunes, Preta Ferreira, Fernando Morais, Elias Jabbour, Ladislau Dowbor, Valério Arcary, Juliane Furno, Luiz Bernardo Pericás, Josélia Aguiar, Jones Manoel, Sérgio Amadeu e Álvaro García Linera, vice-presidente da Bolívia entre 2006 e 2019, que participará da mesa de abertura “Resgatando a democracia na América Latina”, a ser realizada no Tuca.
O evento contará com lançamentos exclusivos, sessões de autógrafos após cada mesa com os participantes e alguns convidados – como Renato Janine Ribeiro (dia 23, 18h), Martin Cezar Feijó (dia 22, 18h), entre outros – e uma feira de livros com mais de 70 editoras independentes.
Programação
Segunda (20/06)
11h-12h30
Debate online – Livros sob ataque: como e por que defender o mercado editorial
Marisa Midori, Cecilia Arbolave, mediação de Maria Carolina Borin
14h-16h
Curso Outro Mundo é Possível – Revolução africana
Jones Manoel
16h30-18h
Literatura, rap e política: o microfone como arma
Don L, Preta Ferreira e Mariana Felix, mediação Emerson Alcalde
18h-19h
Sessão de autógrafos
Álvaro García Linera, Guilherme Boulos, Manuela D’Ávila, Preta Ferreira, Emerson Alcalde, Mariana Felix
19h-21h
Abertura oficial: Resgatando a democracia na América Latina, no TUCA
Dilma Rousseff, Álvaro García Linera, Guilherme Boulos e Manuela D’Ávila, mediação de Ivana Jinkings
Terça (21/06)
11h-12h30
Raça, classe e gênero: o front antifascista
Tamires Sampaio, Carlos Montaño e Leticia Parks, mediação de Edson França
14h-16h
Curso Outro Mundo é Possível – América Latina revolucionária
Osvaldo Coggiola
16h30-18h
A república dos militares: como acabar com o partido fardado
Piero Leirner, Jan Rocha e Rodrigo Lentz, mediação de Bia Abramo
18h-19h
Sessão de autógrafos
Glenn Greenwald, Sérgio Amadeu, Jan Rocha, Piero Leirner, Renata Mielli, Rodrigo Lentz, Marcos Sayid Tenório
19h-21h
Hackeando o neofascismo para salvar a democracia
Pedro Serrano, Glenn Greenwald, Sergio Amadeu e Renata Mielli, mediação de Ana Mielke
Quarta (22/06)
1h-12h30
Biografias: vidas que mudaram o Brasil
Fernando Morais, Camilo Vanucchi, Joselia Aguiar e Luiz Bernardo Pericás, mediação de Osvaldo Bertolino
14h-16h
Curso Outro Mundo é Possível – Revolução Russa
Marly Vianna
16h30-18h
Ecologia sem luta de classes é jardinagem
Victor Marques, Murillo Van Der Laan e Sonia Guajajara
18h-19h
Sessão de autógrafos
Juliano Medeiros, Victor Marques, Valério Acary, Luiz Bernardo Pericás, Ana Prestes, Marly Vianna, Josélia Aguiar, Murilo Van Der Laan
19h-21h
O retorno da onda rosa na América Latina?
Diana Assunção, Ana Prestes, Juliano Medeiros e Valério Arcary, mediação de Debora Baldin
Quinta (23/06)
11h – 12h30
Como combater a inflação e o desemprego
Ana Paula Salviatti, Ladislau Dowbor e Pedro Rossi, mediação de Rosa Marques
14h-16h
Curso Outro Mundo é Possível – Revolução Asiática
Elias Jabbour
16h30-18h
Como o imperialismo e a cruzada anticomunista moldaram nosso mundo
José Reinaldo Carvalho, Vincent Bevins e Juliane Furno
18h-19h
Sessão de autógrafos
Elias Jabbour, Vincent Bevins, Juliane Furno, Gabriel Tupinamba, José Reinaldo Carvalho
19h-21h
Capitalismo de crise e crise das esquerdas
Ricardo Antunes, Ludmila Abílio e Gabriel Tupinambá
Sexta (24/06)
11h-12h30
Debate online – Golpe de Estado e neofascismo no séc. XXI
Iuri Tonelo e Milton Bignotto
14h30-16h
Debate online – Astrojildo Pereira, o comunista que beijou a mão de Machado de Assis
Dainis Karepovs, José Antonio Segatto e José Luiz Del Roio, mediação de Renata Cotrim
16h30 – 18h
Debate online – Sexualidade e revolução
Marilia Moschkovich, Maíra Marcondes Moreira e Coletivo LGBT Comunista, mediação de Kaic Ribeiro
Serviço
VII Salão do Livro Político
Endereço: Tucarena (PUC-SP) – R. Monte Alegre, 1024 – Perdizes, São Paulo – SP, 05014-001
Data: 20 a 26 junho
Feira do livro presencial: 20 a 23 de junho
Feira do livro online: 20 a 26 de junho
Site: https://salaodolivropolitico.com.br
YouTube: Salão do Livro Político
Instagram: @salaodolivropolitico
Facebook: @salaodolivropolitico
Realização: Autonomia Literária, Alameda, Anita Garibaldi, Boitempo e PUC-SP
*Integrante do programa de estágio da FAP, sob supervisão do jornalista, editor de conteúdo e coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
Gilberto Maringoni: entre a análise e a militância
Gilberto Maringoni, Carta Capital*
Os cem anos de fundação do Partido Comunista Brasileiro (PCB) mereceram comemorações públicas abaixo de sua importância histórica. No mundo editorial há, no entanto, uma celebração maiúscula: a reedição das obras completas de Astrojildo Pereira (1890-1965), um dos fundadores e um dos primeiros teóricos da agremiação.
Lançados esparsamente entre 1935 e 1963 por pequenas e heroicas editoras, os cinco volumes vêm agora numa caixa, acrescidos de um sexto. Trata-se de O revolucionário cordial, perfil político de autoria de Martin Cezar Feijó. Estamos diante de um de nossos raros intelectuais orgânicos a serviço de uma causa transformadora, para usar a definição de Gramsci.
Coleção Astrojildo Pereira é lançada com nova edição de seis obras
Em Astrojildo, biografia e bibliografia são inseparáveis. Da obra, pode-se dizer que “é como Portugal e os jumentos: é pequena, mas tem uma história grande”. A definição bem-humorada é dele mesmo, ao classificar seu primeiro livro URSS, Itália e Brasil, lançado numa magérrima tiragem de 180 exemplares, em 1935.
A vida política do personagem, ao contrário, foi longa e rocambolesca. Como líder anarquista na juventude, percebeu as limitações de uma ação pública sem organicidade definida e teoricamente frágil. Influenciado pelos ventos da Revolução Russa, logo transitou para o marxismo e o comunismo.
Esse carioca de Rio Bonito foi o único brasileiro a presenciar os funerais de Lenin, em 1924, “sob um frio de 30 graus abaixo de zero”, em Moscou. Em sua folha corrida consta o feito de levar os primeiros livros marxistas ao capitão do Exército que liderara uma marcha pelo interior do Brasil entre 1925 e 1927. Por suas mãos, Luís Carlos Prestes começou a trajetória de dirigente comunista, num encontro na Bolívia, em 1929.
Em reviravolta marcada por acusações de desvios pequeno-burgueses e sectarismos variados, foi expulso, no ano seguinte, do Partido, ao qual voltaria apenas em 1945. Seguiu a partir daí trajetória inusitada, de vendedor de frutas a refinado crítico literário.




















Os primórdios do comunismo no Brasil geraram dois intelectuais que viviam às turras entre si, Astrojildo Pereira e Octávio Brandão, autor de Agrarismo e industrialismo (1927), tentativa de se fazer um levantamento da economia brasileira sob a ótica socialista. Lido hoje, o livro mostra-se primário e maniqueísta, mas foi uma ousadia em tempos de escassez de dados oficiais e reduzido acesso à literatura marxista. O que Brandão exibia de dogmatismo, Astrojildo escancarava em criatividade e aplicação flexível do materialismo dialético.
Seu segundo livro, Interpretações (1944), é uma espécie de portfólio pessoal. Nos anos finais do Estado Novo, o autor revela maturidade intelectual em análises literárias e históricas, em pelo menos dois ensaios longos e inovadores. O primeiro é “Machado de Assis, romancista do segundo Reinado”, no qual aponta “uma consonância íntima e profunda entre o labor literário (…) e o sentido da evolução política e social do Brasil”, com destaque para a escravidão. O segundo é “Confissões de Lima Barreto”, sobre o autor que pertencia “à categoria dos romancistas que (…) menos se escondem e se dissimulam” em suas obras.
É pouco provável que Astrojildo tivesse contato com as formulações pioneiras do marxismo no terreno da estética, em especial as de György Lukács, lançadas no Brasil no início do século XXI. A esse respeito, José Paulo Netto assinala, no prefácio de Machado de Assis (1959), terceiro volume da coleção, que seu “quadro teórico (…) era pobre” no âmbito da crítica literária. É, porém, inegável que o fundador do PCB incide com competência nas relações entre literatura e ideologia.
Nessa obra, ele dá seguimento ao caminho aberto por José Veríssimo, em História da literatura brasileira (1912), que arrisca estabelecer correspondências entre a literatura e a ideia de nação. A partir de uma crônica de 1873, Astrojildo especifica: “O problema da literatura como representação e interpretação da nacionalidade foi, com efeito, uma constante inalterável em toda a obra de Machado de Assis”. O conceito de nação, um dos mais controversos nas Ciências Sociais, é enfrentado sem escorregões pelo autor.
Astrojildo jamais colocou suas memórias no papel. Apenas um fragmento foi produzido, com Formação do PCB (1962), lançado para as comemorações dos 40 anos do Partido. Uma observação feita no prefácio dá a noção do país em que o ativista se formou: “Não nos esqueçamos que o PCB, em 40 anos de vida, passou ao menos 35 na ilegalidade”. Se estendermos a observação para os dias atuais, podemos dizer que a agremiação enfrentou seis décadas e meia de proscrição institucional.
Há, no livro, uma permanente tensão entre o analista e o militante, o que o leva a delimitar seu período de análise do Partido entre 1922 e 1929, ou seja entre os antecedentes da fundação da legenda e a data de seu III Congresso. Nada há sobre o abalo político representado por sua expulsão.
Crítica impura (1963) é seu último e mais alentado trabalho, e único publicado por uma grande editora, a Civilização Brasileira. Nele, Astrojildo alarga seu radar reflexivo para autores como Eça de Queiroz, José Lins do Rego, Monteiro Lobato, Aníbal Machado, José Veríssimo e Howard Fast, e faz ensaios sobre Cuba, China, sindicalismo, escravidão etc.
Preso aos 74 anos, após o golpe, Astrojildo Pereira morreria em 1965, de ataque cardíaco. A reedição de seus textos deve ser saudada em tempos nos quais o país se debate entre um obscurantismo tacanho e a possibilidade da retomada de tradições democráticas e libertárias no terreno cultural.
*Texto publicado originalmente no Carta Capital
FAP doa quase 700 obras no 1º fim de semana da Feira do Livro de Brasília
Luciara Ferreira e João Vítor*, com edição do coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
A Fundação Astrojildo Pereira (FAP) doou 668 livros no primeiro fim de semana da 36ª Feira do Livro de Brasília (Felib), que vai seguir até o próximo domingo (26/6). O evento é realizado no Complexo Cultural da República, ao lado da Biblioteca Nacional de Brasília. A entrada é gratuita.
População receberá obras doadas pela FAP na 36ª Feira do Livro de Brasília
Os livros são doados no Estande Ipê Amarelo (número 21) pelas equipes da FAP e da Biblioteca Salomão Malina, mantida pela fundação. Durante a semana, a Felib, que começou na sexta-feira (17/6), é aberta ao público das 9h às 22h. Aos sábados e domingos, das 10h às 22h.
Veja, abaixo, galeria de fotos:












































Uma das pessoas que já receberam doação de livros da FAP é o auxiliar administrativo Bruno Charles, de 36 anos. Ele ganhou o livro História como presente e disse ter visto na obra a chance de aprender mais sobre o país neste ano de eleição. “Para votarmos melhor e ver se o Brasil muda”, diz.
O professor Rodrigo Salvador também diz que a participação da FAP na feira teve importância destacada pela questão política, social e histórica da esquerda brasileira.
Com o livro Na trincheira da verdade na mão, a comerciante Tânia Lima, de 61 anos, diz que é por meio da leitura se argumenta e debate melhor. “Consequentemente você pode sobressair em todos os sentidos. Até na sua vida amorosa. Se você não for capaz de argumentar a vida vai sempre te atropelar. O livro te permite vencer os debates”, afirma.
A importância da leitura é lembrada pela professora Aline Pinheiro, de 40 anos, uma das participantes da Felib. “Sempre tento influenciar meus filhos a gostar de ler”, diz ela, para acrescentar que nunca deixa de ir à feira. “Hoje, minha filha insistiu para vir no primeiro dia, já estava ansiosa”, afirma.
Entre as obras da FAP à disposição do público, estão livros de poesia, sustentabilidade, política e ciências sociais. Além disso, durante todo o evento, estará disponível para a venda, via QR code, a Coleção Astrojildo Pereira, recém lançada pela fundação e editora Boitempo.
Lista de livros
A seguir, veja relação de obras da FAP disponíveis para doação:
- A arquitetura fractal de Antonio Gramsci
- Gramsci no seu tempo (2ª edição)
- A história como presente
- Almeida: um combatente da democracia (2ª edição)
- Encontro de sonhos, história do PCB ao PPS no Amazonas
- Modernidades alternativas do século XX
- Na trincheira da verdade
- Política em movimento: Roberto Freire na imprensa
- Revista Política Democrática
- Slam-Déf: Palavra em liberdade
- Jalapão ontem e hoje
- Um mundo de riscos e desafios
A feira tem reunido público diversificado, com a presença de professores, jovens e crianças na companhia de seus responsáveis. A mobilização cultural visa incentivar a leitura, destacando a sua importância por meio da diversidade de títulos à disposição das pessoas interessadas.
Com o objetivo de celebrar os seus 40 anos de criação, a feira incentiva e valoriza a leitura. O evento também oferece ao público atividades lúdicas, com a proposta de criar um ambiente familiar e acolhedor. A programação é que acontece piqueniques aos domingos, com a participação de grupos brincantes, contação de histórias e oficinas de leitura para bebês.
Vídeo
Abaixo, veja vídeo de lançamento da 36ª Felib:
Serviço
36ª Feira do Livro de Brasília
Dias: 17 a 26 de junho
Horário: de segunda à sexta-feira, das 09h às 22h e, aos sábados e domingos, das 10h até as 22h
Onde: Complexo Cultural da República, ao lado da Biblioteca Nacional de Brasília.
Realização: Câmara do Livro do Distrito Federal (CLDF) e do Instituto de Produção Socioeducativo e Cultural Brasileiro (IPCB), com apoio da Câmara Brasileira do Livro (CBL) e do Sindicato dos Escritores do Distrito Federal.
*Integrantes do programa de estágio da FAP, sob supervisão do jornalista, editor de conteúdo e coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida
Revista online | A reinvenção da democracia brasileira e as eleições de 2022
Marcus Pestana*, especial para a revista Política Democrática online (44ª edição: junho/2022)
Poucos meses nos separam daquela que talvez seja a eleição mais tensa, decisiva e importante das últimas décadas. O horizonte que se abre é carregado de dúvidas. A democracia brasileira será testada no limite. As escolhas que serão feitas poderão impactar não apenas nos próximos quatros anos, mas em uma geração inteira.
É preciso reconhecer que há uma obra incompleta a ser concluída. Todos nós, que participamos intensamente das lutas que levaram à redemocratização, tínhamos a expectativa de que a conquista da anistia, das eleições diretas para presidência da República e do novo marco constitucional consolidado em 1988 resultariam, com o passar dos anos, na solução dos mais graves problemas que afetavam a população e o país. Passados 34 anos da conclusão do processo de redemocratização, é inevitável admitir que hoje, ao olharmos o Brasil, fica a sensação de um copo meio cheio, meio vazio.
Veja os todos os artigos desta edição da revista Política Democrática online
Os resultados são contraditórios. Por um lado, construímos o mais longo período democrático de nossa história, derrotamos a inflação, construímos o SUS, lançamos as bases de uma sólida rede de proteção social, universalizamos o ensino fundamental. Mas não podemos festejar os resultados da Nova República tendo metade da população sem coleta de esgoto, 33 milhões de brasileiros vítimas da fome, 23 milhões deles abaixo da linha da pobreza vivendo com 7 reais por dia, desempenho sofrível nas avaliações da qualidade do aprendizado de nossas crianças e nossos jovens, comunidades inteiras sequestradas pelo tráfico e pelas milícias, ameaças permanentes ao nosso patrimônio ambiental e um crescimento econômico pífio ao longo de décadas.
A eleição presidencial de 2022 pode ser um precioso momento catalisador das discussões sobre a agenda nacional de desenvolvimento, identificando desafios e gargalos e apontando soluções. Pode efetivamente se tornar uma oportunidade de reinventarmos a democracia brasileira, relançando, sob novas bases, nosso pacto político e social. Isso se não nos perdemos em uma polarização estéril, verdadeiro simulacro de embate ideológico, onde a eficácia das urnas eletrônicas, a tornozeleira do irrelevante deputado, a manipulação da discussão sobre valores morais ou questionamentos às posturas de ministros do STF roubem a cena e eclipsem a discussão dos mais profundos problemas estruturais do país.
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Nossa história política é povoada de traços populistas, caudilhescos, autoritários e paternalistas. O Estado sempre esteve no centro de gravidade da vida nacional e à população foi negado o exercício pleno de uma cidadania ativa e madura. Os personagens e líderes se sobrepõem às ideias. Primeiro, discute-se nomes, personalidades, predicados e defeitos pessoais, apoios e rejeições individuais. Depois, de forma tardia e improvisada, procura-se rechear as candidaturas com algum conteúdo programático. Pelas informações disponíveis até agora, é impossível identificar, a poucas semanas da eleição, qual é o programa econômico ou as linhas estratégicas das principais políticas públicas dos dois candidatos que lideram as pesquisas. Nada além de platitudes, obviedades e retórica vazia.
As forças democráticas precisam virar esse jogo e impor uma discussão profunda no seio da sociedade sobre o futuro que esperamos construir nesse imenso Brasil. Creio que cinco eixos estratégicos orientadores devem presidir o debate:
- Defesa e fortalecimento da democracia: para além da resistência a qualquer tentativa de rompimento da ordem constitucional e de retrocesso político, precisamos avançar na superação das inconsistências e fragilidades de nossos sistemas de governo, partidário e eleitoral. Isto implica em promover profunda reforma política visando remodelar a convivência entre os três poderes republicanos; colocar na mesa a discussão do parlamentarismo e do semipresidencialismo; repensar o sistema eleitoral, apontando para algum nível de regionalização do voto com a superação do fosso existente entre representantes e representados; racionalização do quadro partidário em busca de partidos mais orgânicos, democráticos e com maior densidade programática; e, aprimorar o regramento dos mecanismos de financiamento das atividades partidárias e eleitorais.
- Construção de um novo modelo de crescimento econômico: após ter sido, de 1932 a 1980, o país com a maior taxa média de crescimento em todo o mundo, assistimos nas últimas quatro décadas a uma trajetória semelhante a um voo de galinha. Espasmos de crescimento acelerado alternados com recessões profundas, desenhando uma trajetória que nos torna prisioneiros da armadilha da renda média. No mesmo período, alguns países, como Coréia do Sul, Portugal, Espanha, Israel, Austrália e Singapura, atravessaram a fronteira que os separava do mundo desenvolvido. A receita é conhecida. A questão é de liderança política e formação de maioria parlamentar em torno da agenda de reformas. Conquistar a complexa e imprescindível reforma tributária que simplifique e torne mais justo e eficiente nosso sistema. Revisitar a questão previdenciária, ainda longe de superar suas iniquidades e responder às mudanças demográficas. Gerar expectativas positivas oferecendo um rumo claro, estabilidade política, legal, regulatória, e segurança jurídica. Dar uma equação definitiva ao dilema fiscal. Enfrentar com coragem e competência o desafio da abertura externa. Incrementar radicalmente a capacidade de inovação da economia e o aumento de sua produtividade. Avançar na qualificação do ensino fundamental, médio e profissionalizante como alavanca do crescimento. Privatizar, com modelos transparentes e corretos, estatais que ganharão eficiência e gerarão efeitos positivos para a sociedade e a economia, como foram os casos da siderurgia, da mineração, das telecomunicações e da indústria aeronáutica. Agressiva política de parceria com o setor privado para a superação dos gargalos de infraestrutura que abalam a competitividade da economia brasileira.
- Ataque frontal às desigualdades, à pobreza e à miséria: a principal tarefa do futuro governo será colocar sobre trilhos sólidos e consistentes à política social combinando os programas de transferência de renda, geração de emprego e renda e políticas públicas eficientes de educação, saúde, combate às desigualdades regionais e qualificação profissional. O maior “Calcanhar de Aquiles” da democracia brasileira é a abissal distância a separar famílias e regiões através de uma das piores distribuições de renda de todo o mundo. A mudança no modelo de crescimento econômico deve ter como objetivo central gerar inclusão e justiça social.
- Recuperar o protagonismo na busca do desenvolvimento sustentável: a sustentabilidade ambiental é hoje um imperativo global no século 21. As mudanças climáticas são uma realidade viva e inequívoca. O Brasil, desde a Cúpula Rio-92, assumiu uma posição de vanguarda e protagonismo e construiu um dos marcos legais mais sofisticados e profundos para a área ambiental entre todos os países. Infelizmente, houve retrocessos visíveis no atual governo. Recuperar, dentro de uma perspectiva de integração governamental horizontal, o compromisso com o desenvolvimento sustentável é tarefa imprescindível que caberá ao próximo presidente da República.
- Aprofundar a reforma do Estado: é fundamental recuperar a credibilidade da ação de Estado junto à sociedade. Gastar menos com a máquina estatal e mais com os cidadãos. Devolver serviços públicos de melhor qualidade. Apostar radicalmente nas tecnologias da informação como ferramentas de oferta ágil e desburocratizada de serviços e potencializar o seu uso na teleducação, telessaúde e na segurança pública. Consolidar o papel das Forças Armadas e das polícias estaduais como instrumentos institucionais e órgãos de Estado e não de governo a serviço do poder civil. Organizar a estrutura do governo à luz das demandas da sociedade e não da lógica da inércia histórica e da visão dos interesses corporativos.
A atual polarização não favorece a discussão profunda desta agenda. As candidaturas Bolsonaro e Lula não são portadoras de uma visão de futuro promissora. Independente dos números das pesquisas de opinião, o polo democrático, que congrega setores que vão do social-liberalismo à esquerda democrática, passando pela socialdemocracia, mais do que o direito, tem o dever de apresentar uma alternativa moderna e progressista ao confronto entre um presente que não nos orgulha e um passado que não abre os horizontes necessários de um novo Brasil.
Sobre o autor

*Marcus Pestana foi deputado federal (2011-2018) e secretário estadual de planejamento (1995-1998) e saúde (2003-2010) de Minas Gerais.
** O artigo foi produzido para publicação na revista Política Democrática online de junho de 2022 (44ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.
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