reeleição

Merval Pereira: Um presidente disfuncional

O mais interessante, do ponto de vista político, é a frase de Bolsonaro ao final da declaração em que atestou que o país que governa “está quebrado”. Ele completou assim: “Vão ter que me engolir até o fim de 2022”. Isso mesmo, pelo menos por um ato falho, o presidente já está empenhado em defender seu primeiro mandato, sem falar em reeleição. 

Do ponto de vista econômico, é um desastre a fala de botequim do presidente, não apenas pela inadequação técnica, como vários economistas já demonstraram, como pela superficialidade vulgar com que aborda assunto tão delicado. Não, o país não está quebrado, está da mesma maneira de quando Bolsonaro se candidatou a governa-lo, com milhões de promessas não cumpridas no que importa, como privatizações, reformas estruturais. 

O que fez com que se elegesse, além do antipetismo, foi conseguir o apoio dos que nunca se aproximariam dele, acenando-lhes com um plano liberal comandado por Paulo Guedes. Se não fosse isso, ele poderia até ter muitos votos, mas os candidatos de centro-direita como Geraldo Alckmin, ou de centro-esquerda, como Ciro Gomes, estariam no páreo com o apoio do empresariado, dos investidores, das classes média e alta nas principais capitais do país. Bolsonaro disputaria o voto do eleitorado radicalizado com o Cabo Daciolo. 

Mas a mistura de antipetismo com liberalismo econômico acabou transformando-o em um candidato palatável para grande parte do eleitorado. Guedes, assim como Sergio Moro, achava que realmente teria carta branca para trabalhar. Continua no cargo porque, como ele mesmo diz, salva a República duas ou três vezes por semana. 

Promessas feitas em campanha, Bolsonaro só cumpriu as que são do seu interesse, a pauta ideológica e de valores. Liberou o uso e circulação de armas, reforçou os programas militares, combateu até onde pôde as instituições democráticas como o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), e agora ataca o Ministério Público, com insinuações que não pode provar de que filho de um procurador estaria envolvido em tráfico internacional de drogas. Também a política do Meio-Ambiente está sendo desmanchada premeditadamente, e a política internacional do país tornou-se uma piada, trabalhando ideologicamente, como o PT fazia quando estava no poder. 

Nenhuma medida de reforma da economia foi tomada, a não ser a reforma da Previdência, que já estava pronta desde o governo Temer. Não tem o menor sentido a declaração de Bolsonaro de que o país está quebrado porque a imprensa potencializou a COVID, e ele não pode fazer nada. Primeiro porque não há ciência no mundo que prove que a imprensa tem o poder de potencializar uma pandemia. 200 mil mortos são consequência clara da incúria do presidente pessoalmente, e de seu governo como um todo. 

Ele sabia, durante a campanha, que o Brasil estava mal das pernas e fez mil promessas que não pode cumprir, como a atualização do Imposto de Renda. Além do mais, o presidente está aí para enfrentar situações difíceis e dar conta delas. Por que, senão, por que estar lá e desistir quando se depara com uma crise como a pandemia da COVID-19?   

No mundo todo, existem líderes negacionistas como Bolsonaro, mas que aprenderam com a realidade. Donald Trump, que em boa hora está se despedindo da Casa Branca, ídolo do presidente do Brasil, se recusava a usar máscara, mas se rendeu e trabalhou para a vacina. Boris Johnson, no Reino Unido, também. Angela Merkel sempre entendeu a gravidade e está sendo recompensada pelo apoio magnífico na Alemanha. Governadores e candidatos a prefeito que trabalharam contra a COVID-19, ao contrário de menosprezar seu perigo, se deram bem nas recentes eleições.

Bolsonaro é incompetente - na economia e nos demais setores do governo, o mais medíocre que já tivemos, talvez comparável ao de Dilma, e está sentado em uma cadeira maior que ele. Mesmo antes da pandemia, a economia brasileira estava num rumo descontrolado, sem projeto que fosse factível. Vamos sofrer as consequências dessa tragédia até 2022, ou antes, se os fatos provocarem um pedido de impeachment. Ele já foi além do que podia ir muitas vezes. Se a economia for no mesmo nível à do ano passado, perderá apoio político no Congresso e na população, e caminhamos para uma crise institucional muito grave. Bolsonaro talvez seja liberado de carregar esse fardo, para o bem do país.


Bernardo Mello Franco: O tombo de Davi Alcolumbre

Davi Alcolumbre planejou um dezembro glorioso. O presidente do Senado esperava garantir a permanência no cargo e emplacar o irmão como prefeito de Macapá. Em duas semanas, tudo foi por água abaixo.

No dia 6, o Supremo Tribunal Federal surpreendeu e vetou a reeleição dos chefes da Câmara e do Senado. A jogada estava ensaiada, mas a Corte voltou atrás e desistiu de atropelar a Constituição.

No dia 20, veio a segunda derrota: Josiel Alcolumbre perdeu a eleição na capital do Amapá. Ele liderava as pesquisas desde o início da campanha, mas foi ultrapassado na reta final pelo azarão Dr. Furlan.

O presidente do Senado se empenhou nas duas disputas. Para conquistar a simpatia do Supremo, engavetou pedidos de impeachment e barrou a chamada CPI da Lava-Toga. Para eleger o irmão, montou uma coligação de 12 partidos, apoiada pelas máquinas do estado e da prefeitura. A chapa parecia invencível até o apagão que atingiu o Amapá em novembro.

Numa entrevista desastrada, Davi disse que o maior prejudicado com a falta de luz foi Josiel, “que ia ganhar a eleição no primeiro turno”. A declaração revoltou amapaenses que passaram 22 dias às escuras.

Na véspera das urnas, Jair Bolsonaro ainda tentou retribuir a blindagem do senador ao primeiro-filho. Em vídeo, ele pediu votos para Josiel “do fundo do coração”. Tarde demais: a zebra já estava no pasto em Macapá.

Em dois anos na cadeira, o presidente do Senado nunca deixou de agir como um político do baixo clero. Sem luz própria, ele se equilibrou graças à distribuição de cargos e favores. Quando os bolsonaristas ameaçavam fechar o Congresso, fez cara de paisagem e aproveitou para arrancar mais verbas para aliados.

Após se recuperar do tombo, Davi poderá ser recompensado com uma vaga de ministro. Nesse caso, Josiel também ganhará um consolo: ele é o primeiro suplente do irmão no Senado.

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Depois de dois anos sem trabalhar, Bolsonaro saiu de férias. Deve ser isso o que chamam de meritocracia.


Almir Pazzianotto Pinto: O ministro, a economia e o desemprego

Sem reduzir a miséria e recuperar o mercado de trabalho Bolsonaro terá poucas chances em 2022

Dentro de alguns dias o governo Bolsonaro completará dois anos. Metade do mandato foi consumida com providências mal alinhavadas para a retomada do crescimento. Incorrigíveis otimistas falam em recuperação da economia, embora admitam que os resultados são inconvincentes. É o que mostram as estatísticas sobre desemprego.

Há contradição em termos quando se fala em crescimento do produto interno bruto (PIB) se índices oficiais revelam que o desemprego atingiu no último trimestre 14,6% e pode chegar a 17% em 2021. Afinal, ninguém ignora que o mercado de trabalho é o espelho da economia.

As maiores taxas de desocupação registram-se na Bahia, 20%, em Sergipe, 19,8%, Alagoas, 17,8%, Amazonas, 16,5%, e Rio de Janeiro, 16,4%. São Paulo, o Estado mais populoso e desenvolvido, segundo o IBGE tem 13,6% de desempregados. Os menores índices pertencem a Santa Catarina, 6,9%, Paraná, 9,6%, e Rio Grande do Sul, 9,4%. Segundo as mesmas pesquisas temos 5,9 milhões de desalentados, que abandonaram a ideia de recolocação.

A responsabilidade pela crise não pode ser atribuída apenas ao presidente Jair Bolsonaro. É indesmentível, porém, que se aprofundou, turbinada pelo ambiente político e pela pandemia de covid-19, cujas extensão e gravidade não consegue entender. Em 1.º/1/2019, quando tomou posse, o Brasil já se achava em situação pré-falimentar. A presidente Dilma Rousseff foi deposta pelo descalabro da economia, com inevitáveis repercussões nas contas públicas e privadas. Não o foi pelas pedaladas. Incapacidade administrativa, embora em elevado grau, não bastaria para despojá-la de mandato obtido nas urnas em eleições democráticas. O País, todavia, já não se conformava com a inépcia governamental. Embora incompetência não seja crime, o despreparo de Dilma, motivo geral de chacotas, combinada com forte dose de arrogância, colaborou de forma decisiva para enquadrá-la no artigo 85, V, da Constituição.

Jair Bolsonaro, capitão de Artilharia e deputado federal com vários mandatos, passou a ser olhado como tábua de salvação. Para a vitória sobre Fernando Haddad contribuíram o temor ao Partido dos Trabalhadores, a inconsistência dos adversários e a punhalada em Juiz de Fora, impedindo o debate revelador do viés autoritário e a demonstração de precária base política e intelectual.

Dentro da situação caótica em que se encontrava o País, o presidente Bolsonaro buscou economista de renome para responder pelo Ministério da Economia, ao qual incorporou o arruinado Ministério do Trabalho. Após alguns meses de prestígio, o ministro Paulo Guedes se enfraqueceu por se revelar incapaz de revigorar a economia e de enfrentar as questões sociais. Permanece empenhado em conseguir o equilíbrio das contas públicas, meta inalcançável em período de pandemia. O primeiro parágrafo de editorial do Estado é certeiro e definitivo: “O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem uma vaga ideia de onde está, ignora para onde vai e desconhece, portanto, como chegar lá” (25/11, A3).

Afinal, dirá alguém, o que tem que ver o ministro Paulo Guedes com o mercado de trabalho? Tudo. Geração de empregos é problema econômico que não se resolve ao sabor do acaso. Depende de pesados investimentos públicos e privados, internos e vindos do exterior. Exige meticuloso planejamento em médio e longo prazos, ainda que ao preço de alterações nas legislações trabalhista e tributária e da Constituição federal. O Ministério da Economia é fundamental para a geração de desenvolvimento e emprego. Mal conduzido leva o País à ruína, como mais de uma vez aconteceu.

É impossível a rápida abertura de vagas para 15 milhões de desesperados e 6 milhões de desalentados, que desistiram de gastar dinheiro à procura de serviço. Se conseguirmos superávit anual de 2 milhões, meta difícil de ser atingida em clima de pandemia, levaríamos uma década para reduzir o desemprego a índices civilizados.

O que nos aguarda em 2021? Se houver vacina eficaz no volume necessário e o presidente abandonar a postura negacionista, menos mal. Até lá, porém, medidas obrigatórias de isolamento social retardarão a retomada das atividades econômicas e manterão o desemprego em níveis elevados.

O período natalino está às portas. Como celebrarão as festas de Natal e de ano-novo os desempregados, os desalentados, os empresários quebrados e a classe média empobrecida? O comércio aguarda avidamente consumidores com o dinheiro do 13.º salário para gastar. Encerradas as compras de final de ano, não se sabe como reagirá a economia no primeiro trimestre de 2021, com o andamento dos meses de recesso.

Sem reduzir a miséria e recuperar o mercado de trabalho o presidente Jair Bolsonaro terá poucas chances de se reeleger. Às oposições compete valer-se das experiências deixadas pela fragmentação partidária. Se desejarem vencer em 2022, devem construir frente única em torno de candidato honesto, experiente, viável e com perfil popular, capaz de derrotar o sectarismo bolsonarista e a máquina governamental.

*Advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho


Celso Rocha de Barros: Apoio da esquerda ao grupo de Maia foi uma decisão acertada

Aliança multipartidária é reação correta à escalada autoritária bolsonarista

Os partidos de esquerda estão de parabéns por terem decidido apoiar o grupo de Rodrigo Maia na eleição para presidente da Câmara dos Deputados. A aliança recebeu o nome de União da Democracia e da Liberdade.

A esquerda brasileira tem diferenças legítimas com o centro e a direita. Os últimos cinco anos, em especial, causaram feridas profundas, que vão exigir tempo e diálogo para cicatrizar.

Mas a esquerda não é mais o PT dos anos 1980, uma voz de protesto sem acesso ao poder. Depois de 13 anos na Presidência, a esquerda é um dos pilares da democracia brasileira, uma das forças responsáveis por sua preservação.

Tem grandes partidos, grandes lideranças, um legado —do SUS ao Bolsa Família, passando pelos direitos LGBT e pelas cotas para negros e negras nas universidades, da preservação da Amazônia aos sucessos educacionais de Ceará e Pernambuco.

A esquerda é grande o suficiente para fazer diferença na hora de recolocar a democracia de pé. É do interesse dos trabalhadores que ela seja recolocada de pé.

E o outro cara é o Jair.

O Jair é o Brasil sem vacina, com 180 mil famílias brasileiras de luto. É o risco permanente de golpe, é a guerra contra a liberdade, é o ódio às mulheres, aos negros e aos LGBT, é o elogio a Ustra no dia do impeachment, é o palhaço da Fundação Palmares ofendendo Zumbi, Marina e Benedita, é o cara que demitiu dois ministros da Saúde durante a pandemia, que desmoralizou os militares, que fez do Brasil um pária entre as nações.

As diferenças programáticas entre os membros da aliança continuam existindo, mas atenção: deixar Bolsonaro vencer no Congresso não trancará as pautas econômicas liberais, mas destrancará as autoritárias.

A aliança é a reação correta à escalada autoritária bolsonarista, ao contrário da manobra desastrada para permitir a reeleição de Maia e Alcolumbre, felizmente derrotada.

Nos dois casos, a preocupação era a mesma: a certeza generalizada de que Jair é golpista. A turma pode fingir que não, mas todo mundo viu Bolsonaro tentando o autogolpe em 2020. Mesmo assim, driblar a Constituição teria sido fazer o jogo de Bolsonaro.

Reunir os democratas, por outro lado, é injetar na democracia brasileira a marra de que ela anda precisando.

Resta saber o que os bolsonaristas vão fazer diante da nova frente. A única certeza é que, seja o que for que fizerem, vai ser sujo. Nos próximos meses, o Orçamento público será para o centrão como água benta da porta da igreja: quem for chegando, vai passando a mão.

Bolsonaro também deve ressuscitar a retórica do “eu contra o sistema” para reagir à união dos democratas. Era mais fácil quando não era “eu e o centrão contra o sistema”, mas talvez alguém acredite.

Também deve atacar a turma do Maia por se aliar à esquerda, deve chamar todos os homens de pedófilos, todas as mulheres de putas, aquele stand up que bolsonarista faz em vez de comprar vacina.

A aliança formada para a eleição da Câmara será permanente? Não. Tem chances de se converter em aliança eleitoral em primeiro turno em 2022? Não. Isso importa? Não. A luta programática continuará daí em diante, cada um do seu lado, democraticamente.

Por outro lado, a aliança aumenta a probabilidade de Bolsonaro perder a eleição no segundo turno em 2022? Sim. Repita esse “sim” em voz alta para você ver que beleza, que coisa linda.

*Celso Rocha de Barros, servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).


O Estado de S. Paulo: Alcolumbre sofre resistência para emplacar sucessor no Senado

Apoiado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco não encontra respaldo nas maiores bancadas; MDB vai lançar candidato único

Daniel Weterman e Anne Warth, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - O presidente do SenadoDavi Alcolumbre (DEM-AP), enfrenta resistências internas para emplacar seu sucessor no comando do Legislativo. O parlamentar tenta atrair apoio para a candidatura do líder do DEM, Rodrigo Pacheco (MG), mas o nome é questionado dentro das maiores bancadas. A disputa está marcada para fevereiro. O projeto original de Alcolumbre era ser candidato à reeleição, possibilidade barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Em um movimento para fazer frente ao candidato de Alcolumbre, o MDB, maior bancada do Senado, decidiu lançar um candidato único à sucessão. Dentro do partido, os senadores Eduardo Braga (AM), Eduardo Gomes (TO), Fernando Bezerra Coelho (PE) e Simone Tebet (MS) estão no páreo. Com quatro pré-candidatos, a legenda divulgou uma nota após reunião em Brasília afirmando que caminhará em “unidade” para voltar ao comando do Senado em 2021. O MDB tem 13 integrantes e buscará aliança com outros partidos. Um dos focos é o Podemos, que tem 10 senadores e faz oposição interna ao atual ocupante da cadeira.

Aos 44 anos, formado em Direito, Rodrigo Pacheco está na primeira legislatura no Senado – antes, foi deputado federal. Para alguns senadores, Pacheco é considerado imaturo para o cargo e há desconfiança de que ele usaria o posto para se alçar à disputa pelo governo de Minas Gerais em 2022. Por outro lado, aliados o apontam como alguém que consegue manter a ponte construída por Alcolumbre com o Palácio do Planalto e facilitar a demanda de colegas com o governo.

Senadores mais antigos na Casa querem o resgate de algumas tradições – entre elas a proporcionalidade na distribuição das comissões e da Mesa Diretora do Senado. Por essa regra, que vigorou por anos, os partidos com bancadas maiores têm direito a mais cargos. Alcolumbre, por sua vez, tem oferecido cargos em troca de apoio a Pacheco, sem observar essa prática.

A insatisfação foi expressa em nota divulgada pelo MDB após a reunião da bancada. “O momento exige bom senso e maturidade política. O respeito ao diálogo e à dimensão das bancadas é particularmente importante para garantir condução equilibrada de uma pauta de reconstrução do País, após esse período tão difícil que o Brasil enfrenta”, diz o texto.

Na semana passada, Alcolumbre esteve com o presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto e sinalizou que caminharia para definir um candidato fora do MDB. O parlamentar conseguiu aceno de Bolsonaro para apoiar o “ungido” e fazer seu próprio sucessor. A escolha alinhada com o governo antes de consultar líderes partidários causou incômodo. Para alguns senadores, Alcolumbre praticamente tirou Pacheco do “bolso” após ser impedido de tentar a reeleição. “O Senado não pode ser um apêndice do Executivo. Não ter proporcionalidade significa transformar o Senado em um balcão de negócios”, afirmou Simone Tebet (MDB-MS), que disputa a indicação do MDB à sucessão.

Nos últimos dias, Alcolumbre buscou apoio do PP e do PSD, partidos com senadores mais próximos a ele. As legendas, porém, evitaram declarar voto em Rodrigo Pacheco neste momento. Com as alianças indefinidas, o presidente do Senado vem buscando apoios individuais para a candidatura de Pacheco. Nas sessões do Senado durante esta semana, conforme o Estadão/Broadcast apurou, o parlamentar pediu votos para o candidato do DEM a colegas em meio à reunião de votações.

PSD

A bancada do PSD, com 12 senadores, se reuniu na segunda-feira para discutir a sucessão. Vice-presidente do Senado e aliado de Alcolumbre, Antonio Anastasia (PSD-MG) afirmou na conversa que não é candidato. Colegas do partido, porém, defendem que ele se lance na disputa. Além de Anastasia, Otto Alencar (BA) e Nelsinho Trad (MS) são citados como possíveis concorrentes. A legenda voltará a se reunir na próxima semana para decidir que rumo tomará na eleição. Um consenso entre os integrantes é tomar uma decisão única em comum acordo. Líderes do Senado apontam que duas forças despontam com maior influência para vencer a eleição: Alcolumbre e o MDB.


Rosângela Bittar: Depois da meia-noite

Rumo à reeleição, afloram os piores instintos políticos. A busca por adesões excita os currais

Para quem não está entendendo o sucesso da plataforma eleitoral antipovo do candidato Arthur Lira à presidência da Câmara, inclusive com o embarque da esquerda na caravana bolsonarista, aqui vai uma explicação. O deputado alagoano e suas costas quentes exploram muito bem, pois a conhecem profundamente, a oportunidade que o calendário oferece.

O tempo do Congresso se divide em dois. No primeiro, os dois anos iniciais do mandato, procuram-se realizar os avanços e as reformas. No segundo biênio, o bom senso dá lugar ao vale-tudo da renovação dos mandatos. Quando coincide com a campanha da reeleição também do presidente da República, a confluência de interesses chega ao paroxismo. É o que está se vendo neste momento.

Deputados e senadores só pensam em poder, emendas e cargos que os ajudem eleitoralmente. No Senado, os prazos são outros, pois o mandato é de oito anos, mas a essência é a mesma.

O ex-deputado e ex-ministro Roberto Brant, com sabedoria mineira, costumava comparar o que ali se passava com as diferentes etapas de uma festa: até a metade, os convidados mantêm a compostura e a elegância, conservam o glamour das novas ideias que trouxeram de casa. Mas, ao bater a meia-noite, tendem ao desespero. Jogam para o ar o que tinham de melhor e partem para o uso e o abuso.

Rumo à reeleição, afloram os piores instintos políticos. A busca por adesões excita os currais. Principalmente se quem vai exercer o poder o faz em nome do presidente da República.

Avanços políticos, alguns verdadeiramente civilizatórios, como foi a extinção do imposto sindical, voltam à mesa de negociação com cínica naturalidade. Celebrado no passado como novo sindicalismo, tal como Jair Bolsonaro foi celebrado como nova política, o malfadado imposto foi reprovado com amplo apoio popular. Para os que dele viviam, os chamados pelegos, a extinção teria sido a razão do enfraquecimento dos sindicatos. Raciocínio que é uma impostura. Sem ele, os sindicatos ganharam autenticidade. Ao associar-se ao projeto, a esquerda atinge o trabalhador em uma de suas mais difíceis conquistas.

Na cabala de votos, sobretudo do PT, o candidato bolsonarista se solidariza também com o período do uso da Petrobrás na montagem de um extenso esquema de corrupção. Acena com a facilitação da volta da candidatura Lula por intermédio da desmoralização da Operação Lava Jato, já abalada por certos equívocos dos principais condutores das investigações. Momento em que os extremos se encontram. Todos deliram na mesma farra eleitoral embora saibam que, Lula, candidato, nunca mais.

Incluiu-se na barganha temática um tranco na Lei da Ficha Limpa, outro avanço com apoio popular prestes a ser perdido. O candidato bolsonarista promete atenuar a lei, quem sabe, abrindo uma janela de fuga. As lacunas são conhecidas, entre elas uma das piores é o poder de juízes locais de fustigar os inimigos políticos com um peteleco jurídico, mas não é nesta circunstância que a discussão será justa e eficiente.

De posse da chave do cofre do governo nesta campanha, o candidato bolsonarista à presidência da Câmara promete reabastecê-lo de recursos, com a aprovação da também defenestrada CPMF. Uma regressão em proporções nunca vistas, camuflada pela infamante versão de que o único obstáculo ao absurdo imposto sobre transações era um capricho do atual presidente da Câmara. O fantasma da meia-noite da virada do mandato vestiu, com isso, sua máscara. A Câmara inteira era aliada da sociedade, contra o imposto. Não se sabe como será agora.

Se ficar a serviço deste projeto de poder, o Congresso deixa de ser proteção para ser ameaça. Pode-se prever o quadro de desequilíbrio que vem por aí. A economia, mal; a recuperação, incerta; o desemprego, subindo; o isolamento internacional, absoluto; o Congresso, servil. Para a sociedade, perplexa, nega-se até a vacina contra a morte.


Fernando Exman: Ano se arrasta e já avança sobre 2021

Bolsonaro simplesmente não fará campanha em 2020 onde sua palavra não virar lei

Dois mil e vinte, o ano que insiste em não acabar, é perseverante e espaçoso. Já avança sobre o calendário de 2021, sem cerimônia. O Ano Novo começará com jeito de velho, com pouco dinheiro nos bolsos, sem saúde para dar e muito menos vender. Bastante do que poderia ter sido feito há meses ficou para a última hora, uma tradição da política nacional que poderia ter sido deixada de lado desta vez por causa da pandemia.

Bastaria bom senso da maioria das autoridades dos diversos Poderes. No entanto, em Brasília ainda se discute se a maior emergência sanitária dos últimos tempos é ou não uma justificativa plausível para a prorrogação dos trabalhos durante o recesso. Sem uma convocação, diversas tarefas urgentes serão redistribuídas entre as folhinhas de fevereiro, março e até abril. Pouco tempo depois, só se falará nas próximas eleições gerais.

Neste melancólico fim de ano legislativo, tudo indica que a disputa política e a desorganização do governo devem seguir travando a agenda de 2021. Está difícil de se prever, infelizmente, um grande esforço nacional voltado à construção de um plano de saída da crise.

O Orçamento, por exemplo, ganha forma num ritmo muito lento. Se no Brasil a peça orçamentária já era considerada uma obra de ficção, desprovida de previsibilidade a respeito de suas premissas e execução, o Orçamento de 2021 ainda não passa de um esboço de roteiro. Dificilmente será reestruturado antes das eleições para as presidências das mesas diretoras do Congresso, até porque o comando da Comissão Mista de Orçamento, objeto de disputa feroz entre os grupos que brigam pelo controle da Câmara, está em negociação. Diversos partidos querem ter o poder de conduzir o colegiado onde se debaterá o Orçamento do período pré-eleitoral.

Esperada para esta semana, a votação do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias também depende de um melhor ambiente político. Isso porque a LDO é vista como um instrumento fundamental por quem deseja o mínimo de segurança jurídica para ordenar despesas e investimentos nos primeiros meses do próximo ano. Sua possível não aprovação, por outro lado, já começa a ser considerada no Legislativo como a oportunidade que a ala desenvolvimentista do Executivo tanto esperava para conseguir gastar mais. Mesmo que isso represente um risco ao governo e precise ser discutido depois, para evitar punições ou problemas com os órgãos de controle.

No Congresso, cresce a preocupação de que a inexistência da LDO, ou seja, a ausência de diretrizes e regras mínimas para o Orçamento de 2021, poderia até artificialmente criar uma brecha para a prorrogação do auxílio emergencial a partir de janeiro, quando está previsto o fim da ajuda do governo federal à parcela mais pobre da população.

É indiscutível o papel desempenhado pelo auxílio emergencial na manutenção da popularidade do presidente Jair Bolsonaro durante a pandemia. Parece ter colado o seu discurso de que o governo federal não pode ser responsabilizado pelo número de vítimas, que, inclusive, não para de crescer.

No fim de ano sempre há espaço para arrependimentos. Entre parlamentares independentes e da oposição, o incômodo se dá com a sensação de que o Legislativo poderia ter adotado ações mais objetivas para tentar responsabilizar o presidente, a despeito da falta de um clamor pela abertura de um processo de impeachment.

Bolsonaro continua relativamente popular e tem chances de ampliar esses níveis de aprovação, dependendo do desempenho da economia, o que lhe garantiria um lugar privilegiado na campanha à reeleição.

Dados coletados pelo governo sobre as insatisfações da população durante a pandemia também não geram preocupação entre auxiliares de Bolsonaro. Segundo um desses levantamentos, por exemplo, existe um número considerável de reclamações e denúncias relativas à concessão do auxílio emergencial, além de queixas sobre a adoção da medida que permitiu a redução de jornadas e salários no setor privado e acerca do tratamento dos passageiros das companhias aéreas.

Chegam à Controladoria-Geral da União (CGU) reclamações da atuação do Estado como um todo e em relação à suspensão das aulas presenciais. O governo recebe críticas sobre a demora na vacinação e o desrespeito às recomendações de distanciamento social, mas são poucas as denúncias de supostos desvios ou corrupção. Além disso, estas englobam os diversos entes da federação. O fato é que, até agora, a administração federal tem conseguido preservar sua imagem, enquanto a cada semana uma nova operação policial envolvendo a aplicação dos recursos para combater a covid-19 é realizada nos Estados.

Isso impõe à oposição e a parlamentares independentes uma estratégia que mescla uma postura defensiva com alternativas de ataque.

Na parte defensiva, a ideia é impedir que medidas heterodoxas prorroguem algum tipo de ajuda emergencial à margem das normas fiscais. Já o ataque se daria com a possível instalação, no ano que vem, de pelo menos uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apontar responsabilidades no atraso na implementação do programa nacional de imunização, por exemplo. A ideia seria pelo menos desgastar o presidente.

A iniciativa ainda não tem muito apoio entre os governadores. Eles preferem que se gaste tempo e energia na discussão de propostas que busquem aumentar a capacidade de investimento, a oferta de crédito e impulsionem parcerias público-privadas (PPPs). Eles reclamam que falta diálogo com o Ministério da Economia e querem retomar o mais rápido possível as reuniões convocadas para tratar de temas positivos. Preferem que o Congresso não crie obstáculos para a reorganização da economia. Isso depende também, claro, do governo e de sua base. Caso contrário, 2021 ficará com a cara de 2020 durante muitos meses.


Carlos Pereira: Bolsonaro se curvou e a democracia não quebrou

O engajamento do governo na eleição dos presidentes da Câmara e do Senado é sinal de aprendizado

Jair Bolsonaro, eleito presidente com uma plataforma antipolítica e antiestablishment, resolveu se engajar diretamente no processo político de escolha dos novos presidentes da Câmara e do Senado. O que explica essa mudança aparentemente contraditória no comportamento do presidente? 

Muito está em jogo com a eleição dos novos presidentes das duas Casas Legislativas. Tanto o presidente da Câmara dos Deputados como o do Senado são verdadeiros gatekeepers. Ou seja, têm o poder de vetar ex ante iniciativas que julguem indesejáveis ou de promover ações estratégicas que mudem o status quo de acordo com seus interesses. 

Esses poderes procedimentais e de agenda não são triviais. As regras internas da Câmara garantem a seu presidente um papel central na condução do processo legislativo e na definição e funcionamento do sistema de comissões permanentes e especiais. Em legislativos muito centralizados e fortemente hierarquizados, como o brasileiro, o papel do gatekeeper se torna ainda mais relevante, pois pode, inclusive, decidir unilateralmente a sorte do próprio governo de plantão ao, por exemplo, dar prosseguimento a pedidos de impeachment de presidentes. 

O desenho institucional hierarquizado do Congresso brasileiro se parece muito com o do Congresso americano do início do século 20. O speaker, equivalente ao presidente da Câmara, costumava ser tão poderoso que muitos o chamavam de “Czar”, pois não hesitava em usar seus poderes para nomear membros e presidentes de comissões e remover aqueles que não seguiam a sua liderança. Em 1910, um grupo dissidente de republicanos progressistas decidiu se aliar aos deputados de oposição do Partido Democrata em uma revolta contra os superpoderes do presidente da House of Representatives, Joseph Cannon. A revolta resultou na aprovação de uma resolução que diminuiu drasticamente os poderes do speaker. Essa reforma abriu caminho para um processo vigoroso de descentralização e profissionalização do Congresso americano.

Embora a concentração de poderes na mão do speaker não fosse tão decisiva para o funcionamento do sistema político dos Estados Unidos, caracterizado pelo bipartidarismo majoritário, ela gera ganhos de coordenação necessários ao presidencialismo multipartidário adotado no Brasil. 

Presidentes que conseguem ter aliados políticos como chefes das Casas Legislativas definitivamente dormem mais tranquilos. Conseguem ter mais sucesso na arena congressual aprovando mais reformas e enfrentam menores custos de governabilidade. Além do mais, quando existe alinhamento entre os chefes do Executivo e do Legislativo, é esperada a criação de um menor número de Comissões Parlamentares de Inquérito investigando as ações do Executivo. 

Existe, entretanto, um risco de o engajamento excessivo do governo criar animosidades com o Legislativo se seu candidato não for o vencedor, colocando-o em uma situação pior do que a que estaria se continuasse a se negar a fazer política com o Parlamento. 

Nos dois processos de impeachment bem-sucedidos no Brasil, o presidente da República não tinha como aliados os presidentes da Câmara dos Deputados. Fernando Collor (PRN) não se engajou na escolha de Ibsen Pinheiro (PMDB) e Dilma Rousseff apoiou explicitamente Arlindo Chinaglia (PT), derrotado por Eduardo Cunha (PMDB). 

Demorou quase dois anos de seu mandato para que Bolsonaro percebesse que uma atitude de negação da política gera custos proibitivos de governabilidade. Parece que finalmente o presidente acordou e percebeu que é muito mais difícil governar sem aliados em postos-chave no Congresso. Se houve aprendizado, este se deu a partir de perdas sucessivas impostas pelas instituições políticas. Quanto mais Bolsonaro se verga e joga o jogo institucional do presidencialismo multipartidário, mais a democracia brasileira mostra a sua força. 

*CIENTISTA POLÍTICO E PROFESSOR TITULAR DA ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS DA FGV


Vera Magalhães: Se dividir, Bolsonaro leva

É vital união entre forças divergentes e entre Câmara e Senado

Se o jogo da disputa pelas presidências da Câmara e Senado continuar a ser jogado de maneira desarticulada, e na base do cada um por si entre os partidos ditos opositores ao bolsonarismo, Jair Bolsonaro tem boas chances de emplacar aliados seus nas duas Casas do Congresso e com eles tocar seus dois últimos anos de mandato. E, bem no fundo, pode ser justamente isso que muitos dos atores do momento político querem. Vamos analisar um pouco a forma como cada um deles age.

Comecemos por Davi Alcolumbre. O presidente do Senado risca os dias na folhinha em pânico desde que o Supremo Tribunal Federal acabou com sua tentativa de dar um chega pra lá na Constituição e disputar novo mandato. Morto de medo de voltar ao baixo clero, tenta uma costura dissociada do correligionário Rodrigo Maia para eleger alguém sob sua influência para sua cadeira.

Para isso, vale até uma aliança com o presidente. Mais ainda se no pacote vier, quem sabe, um ministério para evitar que ele desça de volta à planície sem escala.

Se Alcolumbre fosse fechado com o DEM, seu partido, e se estivesse disposto a ajudar numa articulação para colocar alguém de fato independente em seu lugar, o jogo teria de ser casado com a Câmara, de forma a que o MDB fizesse o candidato lá, e o DEM ou algum partido sob a influência de Alcolumbre, o postulante à presidência do Senado.

E teria de ser uma “chapa” com o discurso da independência, para atrair ou pelo menos tentar arrancar um compromisso público de todos os partidos que entendem que dar o comando do Congresso a Bolsonaro agora significa autorizar que ele “passe a boiada” com sua pauta retrógrada em campos vitais da vida brasileira e tenha uma vantagem imensurável para fechar uma aliança e se posicionar para 2022.

Além disso, é ilusório achar que Arthur Lira (PP-AL), o candidato do bolsonarismo na Câmara, tenha qualquer compromisso com a responsabilidade fiscal. Só o pacote de promessas que ele fez para se eleger no périplo que vem cumprindo por lideranças partidárias já é suficiente para estourar o Orçamento e arrombar o teto de gastos. Se somar as emendas que o próprio Bolsonaro vem autorizando que sejam negociadas, a conta dobra.

Isso num ano em que a pandemia ainda está longe de acabar, como de novo de forma irresponsável mentiu o presidente, e está mais próximo o número de Paulo Guedes de voltarmos ao sinistro patamar de mais de mil mortes diárias por covid-19.

Já escrevi que não é o STF que deve ser responsabilizado pela vantagem com que Bolsonaro conta hoje, mas os próprios Maia e Alcolumbre, que se deixaram empanturrar pela fome de poder e agora correm o risco de ficar de mãos abanando, por não terem organizado a sucessão a tempo, quando ainda detinham o poder da caneta e uma coalizão forte em torno de ambos.

É por isso que cabe aos dois, e ao partido do qual fazem parte, bem como ao autoproclamado centro democrático e à esquerda que se diz antibolsonarista se unirem para evitar um desastre político com risco de se alastrar para a saúde, os costumes, o meio ambiente, a segurança pública, a educação e todas as outras áreas em que o toque de Midas reverso de Bolsonaro, que transforma tudo em morte e devastação, puder tocar.

Que o PT negocie com Lira em troca da revisão da Lei da Ficha Limpa e de outros marcos civilizatórios que são conquistas da sociedade brasileira diz muito sobre o estágio de putrefação avançada do partido, do qual ele teima em não sair.

Na ausência de democratas de verdade, cabe ao capitão autoritário, que antes se recusava a fazer política, ditar as regras e distribuir as cartas. O que mostra que quem foi derrotado em 2018 não aprendeu nada, nem diante dos descalabros de 2020.


Ascânio Seleme: Os candidatos

Decisão do STF de barrar por serem inconstitucionais as reeleições de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre inaugurou o lançamento de candidaturas nas duas casas

Congresso Nacional começa a viver os momentos de turbulência que antecedem a sucessão das mesas da Câmara e do Senado. A decisão do Supremo Tribunal Federal de barrar por serem inconstitucionais as reeleições de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre inaugurou o lançamento de candidaturas nas duas casas. Esta coluna não quer fazer juízo de valor, mas vai nomear cada um dos já lançados e acrescentar pequenas bios das suas trajetórias nas tramas da justiça. A elas.

CÂMARA

Arthur Lira (PP-AL), candidato do presidente Bolsonaro. Réu por desvio de dinheiro do erário e por enriquecimento ilícito; denunciado na Lava-Jato por lavagem de dinheiro; acusado pelo Ministério Público de Alagoas por desviar R$ 1 milhão através de rachadinhas durante mandato de deputado estadual; denunciado no STF por agressão à sua ex-mulher, que o acusou de participar de um esquema de corrupção em seu estado.

Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), foi ministro de Dilma e depois votou contra ela no processo de impeachment. Acusado pelo doleiro Alberto Youssef de receber mesada do PT para votar a favor das pautas do partido; citado na delação da Odebrecht por receber propina; denunciado pelo ex-procurador Rodrigo Janot por fazer parte da organização criminosa que assaltou a Petrobras.

Luciano Bivar (PSL-PE), presidente do partido que abriu as portas para Bolsonaro ser candidato em 2018. Em 2013, admitiu ter pago propina para a CBF para que o técnico da seleção Emerson Leão convocasse o jogador Leomar, que à época pertencia ao Sport, clube que Bivar dirigia; indiciado pela PF no esquema de laranjas do PSL nas eleições de 2018.

Marcos Pereira (Republicanos-SP), bispo licenciado da Igreja Universal, foi ministro do governo Temer. Ficou quase dois anos no cargo, mas se viu obrigado a renunciar ao posto quando seu nome apareceu na lista da Odebrecht como um dos beneficiários das propinas da empresa.

Elmar Nascimento (DEM-BA), deputado de segundo mandato. Acusado de ser um dos 81 parlamentares beneficiários do esquema da Odebrecht de distribuição de dinheiro para campanhas em caixa dois através da cervejaria Itaipava.

Baleia Rossi (MDB-SP), presidente nacional da sigla desde o fim da era de Romero Jucá. Foi acusado em 2016 pelo lobista Marcel Júlio como participante de um esquema de extorsão de fornecedores de merenda para escolas públicas de São Paulo. Mais tarde, o Coaf apresentou uma lista de envolvidos sem o seu nome.

Tereza Cristina (DEM-MS), ministra da Agricultura de Bolsonaro e deputada licenciada. Acusada de dar calote em cinco empréstimos que tomou de bancos e fundos de investimentos agropecuários, entre eles, um da JBS, para projetos rurais particulares.

SENADO

Fernando Bezerra (MDB-PE), ex-ministro do governo Dilma. Acusado de lavagem de dinheiro na Operação Turbulência para reeleição de Eduardo Campos em Pernambuco (parte do dinheiro teria sido usado na compra do avião que caiu em 2018 matando Campos); denunciado por receber propina da Camargo Corrêa nas obras da refinaria Abreu Lima; denunciado na Lava-Jato por receber R$ 20 milhões em propina.

Eduardo Braga (MDB-AM), ex-prefeito de Manaus, ex-governador do Amazonas, ex-ministro de Dilma. Suspeito na Lava-Jato por receber R$ 1 milhão em propina; acusado de ser dono oculto de um jato Citation de US$ 9 milhões (R$ 46,5 milhões), cujo prefixo é o sugestivo PP-MDB; denunciado pelo MP do estado por comprar terreno público por R$ 400 mil e vendê-lo três meses depois por R$ 13,1 milhões; conhecido nas planilhas da Odebrecht pelo apelido “Glutão”.

Nelsinho Trad (PSD-MS), ex-prefeito de Campo Grande. Teve R$ 101 milhões bloqueados em suas contas por envolvimento no maior escândalo do Mato Grosso do Sul, de desvios milionários da empresa de limpeza urbana da capital do estado, a Solurb; denunciado pelo MP estadual por fazer autopromoção com dinheiro público quando era prefeito.

Eduardo Gomes (MDB-TO), senador de primeiro mandato. Denunciado na Operação Sanguessuga por desvio de dinheiro do Ministério da Saúde destinado a compra de ambulâncias; acusado de fraudar licitações quando presidia a Câmara Municipal de Palmas; usou verbas indenizatórias do Senado para comprar “notícias” favoráveis a ele em jornais de Tocantins.

Antonio Anastasia (PSD-MG), ex-governador de Minas Gerais, ex-vice de Aécio Neves, a quem sucedeu. Citado na Lava-Jato como receptor de propinas. O ex-policial Jayme Oliveira Filho disse ter entregado dinheiro em BH a uma pessoa muito parecida com Anastasia. Alberto Youssef, de quem o policial era operador, negou que o dinheiro fosse para Anastasia. O processo acabou arquivado.

Simone Tebet (MDB-MS), senadora de primeiro mandato. Investigada por crime de responsabilidade em dois inquéritos que apuram fraude durante sua gestão na prefeitura de Três Lagoas (MS). Um deles foi arquivado por prescrição.

Rodrigo Pacheco (DEM-MG), senador de primeiro mandato. Defensor dos denunciados no mensalão, detrator da Lava-Jato e crítico do Ministério Público.

ATÉ HONDURAS

Com todo o respeito que aquele país da América Central merece, mas é bom notar que até mesmo a pequena Honduras (9,5 milhões de habitantes, PIB de US$ 49 bilhões e renda per capita de US$ 5,8 mil) vai começar a vacinação da sua população ainda este ano. Na capital, Tegucigalpa, as doses da vacina russa Sputnik começam a ser inoculadas na semana que vem. Alguém pode até dizer que a Sputnik não é segura, mas toda a família real de Dubai foi imunizada com ela.

O OSCAR BRASILEIRO

Daniel Day-Lewis leu cem livros sobre Lincoln para interpretar seu personagem no cinema. Assim que se trabalha. Quantos livros Bolsonaro e Pazuello leram sobre o coronavírus? O ator ganhou um Oscar por aquela interpretação. Que prêmio você daria ao presidente e ao seu ministro?

SAÚDE MENTAL

O governo resolveu revogar portarias que dão estrutura e recursos às políticas de saúde mental no Brasil. Parece que alguém mais, além do general Eduardo Paradão Pazuello, perdeu o juízo no Ministério da Saúde. Ou será que foi mais do mesmo?

HOTEL MUSEU

Nada contra um hotel no Jardim Botânico. Parques têm que ser usados e visitados pelas pessoas. São educativos e dão prazer e relaxamento aos visitantes. O maior parque do mundo, o Yellowstone, que se estende por três estados americanos em 8,9 mil quilômetros quadrados muito bem preservados, tem dez hotéis no seu interior. Todos geram renda e empregos e não atentam contra o meio ambiente. Agora, por que fazer logo no lugar do Museu do Meio Ambiente? Para reduzir o debate sobre a questão e suspender a movimentação de ideias e ideais preservacionistas. E para quê mais hotel no já abarrotado Rio de Janeiro? Aliás, Salles ajudaria muito se mandasse demolir o esqueleto do Gávea Tourist Hotel no Parque da Tijuca. Ou será que Eduardo Paes poderia se ocupar disso?

CANCÚN, NÃO

Por falar em hotel, é bom não se esquecer que ainda está muito bem viva a ideia maluca de Bolsonaro de querer transformar a baía de Angra dos Reis em uma “Cancún brasileira”. O que se quer fazer ali é uma agressão hedionda a um dos lugares mais preservados do planeta. A proposta é acabar com a estação ecológica e a APA de Tamoios e chamar investidores para erguer hotéis e resorts na área. Uma bobagem que não pode prosperar. E não vai, por que você acha que ainda tenha gente que acredite neste governo e invista numa furada dessas?

AINDA RODRIGO

O deputado Rodrigo Maia chegou a se coçar quando emissários de Bolsonaro o avisaram, há dois meses, que sua excelência pensava em lhe entregar um ministério. Poderia ser uma forma de agradecer ao presidente da Câmara por fazer nada com os mais de 30 pedidos de impeachment que recebeu. Mas, como revelou ontem o jornalista Fernando Rodrigues, do Poder 360, Paulo Guedes vetou Rodrigo num hipotético Ministério do Planejamento recriado. Pois é.

OS MITOS

Os políticos acreditam que o brasileiro gosta mesmo de líderes fortes e, melhor ainda, carismáticos. Muito provavelmente inspirados em outros modelos latinos, como o argentino, que até hoje vive sob a sombra de Juan Domingos Perón. Talvez seja por isso que políticos de direita (não falo do centrão das boquinhas, que não tem ideologia e está em qualquer governo) ainda acreditem em Bolsonaro, o mito de 2018. E esta também deve ser a razão para muitos bons quadros da esquerda continuarem teimando com Lula, o mito de duas décadas atrás.

NEGÓCIO NOVO

O mercado do direito autoral só se surpreendeu com o montante, não com a venda dos direitos autorais das músicas de Bob Dylan por US$ 300 milhões. No Brasil, investimentos no setor podem render até 13% ao ano, como mostrou em setembro a repórter Júlia Lewgoy, do Valor Investe. Significa quase cinco vezes mais do que paga a poupança. Mas é preciso saber como funcionam os direitos autorais de músicas para poder se movimentar por ali. Para isso é que estão sendo criados fundos específicos por bancos e fintechs. Trata-se de um novo negócio na praça.

AUDIÊNCIAS

A audiência da Fox News no verão americano foi a maior da história, superando todas as demais no cabo e ganhando até mesmo das emissoras de sinal aberto. Já por aqui, a Fox brasileira perdeu feio para a GloboNews.

IMPOSTOS E ARMAS

Bolsonaro vai zerar impostos para importação de armas a partir de 1º de janeiro. Neste caso, o presidente não surpreende mesmo. Agora, por que não zera também as alíquotas para seringas, já que os produtores locais dizem que não conseguem entregar o que o país precisa para a vacinação contra a Covid? Com a redução do imposto as indústrias poderiam contratar funcionários e produzir mais. Aliás, o que a Taurus, uma das maiores financiadoras da campanha de Bolsonaro em 2018, tem a dizer sobre a medida?

ULTRAJE

Não há outro nome para aquela ridícula exposição dos vestuários de Bolsonaro e Michelle no dia da posse.


Bruno Boghossian: Ministro só foi demitido por não se encaixar nos planos de Bolsonaro para 2022

Saída se explica pelas duas maiores preocupações do presidente: o controle do Congresso e a reeleição

Ameaçado no cargo, o ministro do Turismo comprou briga com um colega na terça (8). Num grupo de mensagens, Marcelo Álvaro Antônio destacou suas credenciais como apoiador precoce de Jair Bolsonaro em 2018, atacou o articulador político do Planalto e disse que o governo paga “um altíssimo preço” para aprovar projetos no Congresso. No dia seguinte, foi demitido.

Antes disso, Bolsonaro teve outras oportunidades para se livrar de Álvaro Antônio, mas preferiu manter o aliado no governo. Quando ele foi denunciado pelo Ministério Público no ano passado, sob acusação de desviar dinheiro no esquema de candidaturas laranjas do PSL, o presidente disse que não havia elementos para mandá-lo embora.

Um bate-boca no WhatsApp pode parecer um motivo menor, mas foi pretexto suficiente. A decisão instantânea de Bolsonaro se explica pelas duas maiores preocupações do governo na agenda política: o controle do Congresso e a eleição de 2022.

O presidente não teve dificuldade para demitir um aliado que fazia propaganda de sua dedicação ao chefe. Álvaro Antônio apostou cedo no deputado do baixo clero e foi muito bem recompensado com um ministério no governo. Ele só não percebeu que aquela lealdade envelheceu e que Bolsonaro pensa exclusivamente na próxima eleição.

O cargo do ministro se tornou uma peça na engrenagem que o presidente tenta recauchutar para fortalecer o governo no Congresso e pavimentar o caminho para sua candidatura à reeleição. O estopim da fúria de Álvaro Antônio foi justamente o empenho de Luiz Eduardo Ramos, chefe da Secretaria de Governo, na entrega desse posto para o centrão.

Para completar, Bolsonaro ainda puniu com uma demissão sumária o subordinado que apontou o dedo para o abraço entre o governo e os partidos tradicionais do Congresso. No fim das contas, a cadeira aberta na Esplanada dos Ministérios deve engordar as negociatas para eleger um presidente da Câmara afinado com o Palácio do Planalto.

*Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).


Ascânio Seleme: E agora, Rodrigo?

O deputado salvou o presidente. O presidente degolou o deputado

Não se pode negar que o deputado Rodrigo Maia teve momentos importantes e positivos no exercício da presidência da Câmara. Foi mérito quase exclusivo seu a reforma da Previdência, no segundo semestre do ano passado, quando chamou para si, tocou e fez aprovar o projeto, enquanto o governo fazia corpo mole. É verdade também que, durante todo o mandato, trabalhou incansavelmente pela sua reeleição. Fez os entendimentos possíveis e engoliu todos os sapos para ficar sempre pronto para ser reconduzido ao cargo, embora soubesse ser inconstitucional. O mais grave foi ter se sentado em cima de pelo menos 30 pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro.

O deputado sabe, como você e eu, que Bolsonaro cometeu uns dez crimes de responsabilidade nestes primeiros dois anos de mandato. Um deles poderia ser catalogado como hediondo, por atuar de maneira temerária em relação ao coronavírus. Crime em que agora está reincidindo com o retardamento do início da vacinação contra a Covid-19 por imprudência, inação e birra política. Também atentou contra a democracia ao dar apoio a manifestações públicas que pediam o fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional, inclusive em frente ao principal quartel do Exército. Numa delas, havia cartazes pedindo a prisão de Rodrigo Maia. E o que fez Rodrigo Maia? Nada.

Cabe exclusivamente ao presidente da Câmara dar início a um processo de impeachment. Embora ninguém pudesse exigir que desse andamento ao pedido de afastamento do presidente, o deputado ignorou sua atribuição constitucional. De maneira informal, repetiu a quem quisesse ouvir que não encaminharia o processo porque não daria em nada, já que não seriam alcançados os votos necessários para afastar Bolsonaro. Ora, deputado, convenhamos. Então, dane-se a Constituição? O presidente comete inúmeros crimes, e não se abre um processo porque faltam votos para ao final puni-lo?

Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Estados Unidos, abriu um processo de impeachment contra Donald Trump, mesmo tendo absoluta certeza de que ele não seria aprovado no Senado americano, que tinha maioria republicana. Corajosa, resoluta e politicamente responsável, cumpriu seu dever constitucional dando encaminhamento ao impeachment, que de fato acabou sendo barrado. Rodrigo Maia, não. Tratou de se preservar, talvez imaginando que, ao poupar Bolsonaro, não teria sua oposição quando chegasse a hora da eleição da Mesa da Câmara. Nancy Pelosi não perdeu um grama sequer de seu prestígio. Rodrigo Maia perdeu. Muito.

O deputado passou dois anos tratando de ficar bem com todos, inclusive com o Planalto. Embora vez por outra demonstrasse irritação com os arroubos do presidente e dos seus três zeros, jamais se distanciou de Bolsonaro. Só percebeu que estava tratando com um inimigo perigoso agora, quando o PTB bolsonarista arguiu a constitucionalidade da sua reeleição. Rodrigo ainda acreditou que o tribunal haveria de ver nele uma barreira contra a escalada autoritária de Bolsonaro, autorizando sua recondução. Não viu. E por que veria, se ele nada fez quando efetivamente pôde impedir o presidente?

Bolsonaro livrou-se de Rodrigo Maia. Descartou-o como se descarta uma garrafa vazia. O presidente queria e precisava livrar-se dele porque também só pensa na sua própria reeleição. O deputado seria uma sombra incômoda. Melhor ter um aliado incondicional no cargo, mesmo que seja um corrupto notório. Bolsonaro, que trabalha a favor de um segundo mandato desde que assumiu o governo, poderia ter sido afastado do primeiro, não fosse a inércia de Rodrigo Maia. O deputado salvou o presidente. O presidente degolou o deputado.

Rodrigo agora desce para a planície, volta ao chão do plenário que não pisa há cinco anos. Será, mesmo assim, um deputado influente, líder de um partido que se reinventou e que fez uma boa eleição municipal. Mas, no futuro, ainda terá de lidar com uma tarefa complicada, de explicar para a história por que não cumpriu a missão que a ele estava reservada.