Presidência

Correio Braziliense: Candidato da oposição na Câmara, Rossi foi mais fiel ao governo que Lira

Na disputa pela Presidência da Câmara, Baleia Rossi conta com o apoio da oposição, e Arthur Lira, do Planalto. Porém, ambos têm posturas similares e Rossi chegou a ser mais fiel ao Executivo e votações que seu adversário

Wesley Oliveira, Correio Braziliense

Mesmo em lados opostos na disputa pela Presidência da Câmara, os deputados Arthur Lira (PP-AL) e Baleia Rossi (MDB-SP) sempre tiveram perfis parecidos e, até certo ponto, andaram alinhados em seus posicionamentos dentro do Congresso. Apesar do discurso distinto nas campanhas — o político alagoano é apontado como candidato do governo, e o paulistano, da oposição —, ambos deverão manter o modelo de condução dos trabalhos, seja qual for o vitorioso. O pleito na Casa está marcado para 1º de fevereiro.

Nos bastidores, Lira e Rossi são conhecidos como conciliadores em momentos de crise, portanto, atuam como negociadores nas pautas em consenso. Além disso, os dois deputados são lembrados pelos demais colegas por cumprirem os acordos firmados entre os líderes da Casa. Ou seja, nesse sentido, só deverão andar pautas que tiverem anuência da maioria.

Apesar do apoio do Palácio do Planalto, Lira tem se comprometido com seus pares a manter a postura independente da Casa em relação ao Executivo. Entre as promessas do líder do Centrão estão a distribuição de relatorias dos projetos e presidências dos colegiados de acordo com o tamanho das bancadas. Isso favorece tanto o PT (52 deputados), da esquerda, quanto o PSL (50), da direita.

Já Baleia Rossi foi o escolhido pelo atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), como seu candidato, no intuito de não favorecer o Planalto nas chamadas pautas de costume. “Minha preferência é por um nome que consiga manter de pé um projeto para derrotar essa pressão, essa pata do governo dentro da Câmara dos Deputados, que vai ser muito ruim”, disse Maia, enquanto buscava um nome para a sucessão dele.

Mesmo assim, o MDB, partido que Baleia preside, conta com parlamentares simpáticos ao governo de Jair Bolsonaro. Portanto, pedidos de impeachment contra o chefe do Executivo não deverão ser aceitos por nenhum dos dois candidatos, por exemplo.

Recentemente, Lira aproveitou uma entrevista à Rádio CBN para apontar que seu adversário não era “totalmente” independente do governo. “Continuo a dizer que, até que o MDB entregue as lideranças do governo no Senado e no Congresso, até que os seus deputados entreguem todos os cargos que têm na administração pública nos estados e no governo federal, que o líder Baleia entregue a Secretaria Nacional de Habitação, eles são tão governo quanto qualquer partido de centro. Todos são da base”, enfatizou.
Logo após receber o apoio oficial do PT, na segunda-feira, Rossi afirmou que seu bloco é composto por partidos compromissados com a democracia. “Tem esquerda, centro, direita. Diferentes que se juntam num objetivo comum: manter a Câmara livre e a democracia viva”, escreveu o emedebista, em uma rede social.

Um levantamento da consultoria de análise política Arko Advice mostra que tanto Lira quanto Rossi mantiveram posicionamentos parecidos em votações de interesse do Executivo nos últimos dois anos. O emedebista teve um índice de apoio de 90,24% ao governo, em 2019; e Lira, de 86,29%. Em 2020, os percentuais foram de 77,82% e 70,59%, respectivamente.

Gráficos mostram como votaram os dois candidatos à Presidência da Câmara
Gráficos mostram como votaram os dois candidatos à Presidência da Câmara(foto: Editoria de Arte/CB)

Diálogo

Na avaliação de Breno Montezano, consultor e analista político pela Fundação Getulio Vargas (FGV), os dois postulantes à Presidência da Câmara são do Centrão, portanto, atuam da mesma forma. “Eles podem adotar discursos diferentes agora, mas, pela quantidade de partidos dentro da Câmara, todo candidato sempre tem o mesmo perfil. É preciso conversar e dialogar com os vários pares para que haja avanço nos projetos”, explica.

Apesar da expectativa de que Lira dê prioridade às pautas governistas, o analista destaca que não haverá clima para grandes mudanças. No mesmo sentido, ele frisa que Rossi não fará muitas concessões para a esquerda. “Por se tratarem dos dois últimos anos de mandato, o próximo presidente da Casa não terá tempo para fazer mudanças bruscas dentro do Parlamento. As reformas de interesse do governo vão andar de acordo com a vontade e a pressão do mercado e se houver consenso sobre a matéria”, ressalta. “Já pautas conservadoras ou progressistas ficarão esquecidas, pois ambos estarão de olho no eleitor de 2022.”

No entendimento do economista Paulo Jorge Gomes, as propostas de menor envergadura e com mais consenso vão continuar passando no Congresso, como os marcos regulatórios — entre os quais, a lei do gás e o projeto de ferrovias. Além disso, a proposta de emenda à Constituição (PEC) Emergencial, de corte de gastos públicos, deve ser aprovada, mas com tamanho muito menor do que era previsto.

“A pulverização dentro do Congresso não favorece grandes mudanças. Além disso, a pandemia mudou o foco do parlamento, que prometia ser reformista. Os próximos dois anos serão para planejar as eleições. Então, qualquer que seja o novo presidente da Câmara, o trabalho será de continuidade do que já temos até agora”, avalia.


O Estado de S. Paulo: Mesa Diretora estuda fazer eleição virtual para sucessão de Maia

Embora não haja decisão sobre o assunto, deputado Arthur Lira já se articula para barrar eventual mudança no sistema de votação

Rafael Moraes Moura e Camila Turtelli, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A cúpula da Câmara dos Deputados avalia a possibilidade de promover votação virtual na eleição que vai escolher o sucessor do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em 1° de fevereiro. Embora ainda não haja decisão sobre o assunto, o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, já se articula para barrar eventual mudança no sistema de votação e seus aliados falam até em risco de ataques hackers.

A mobilização de 513 deputados para eleger quem comandará a Câmara no biênio 2021-2022 impõe um desafio logístico ao Legislativo por causa da pandemia do novo coronavírus. O candidato de Maia é o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), que será lançado oficialmente nesta quarta-feira, 6, em ato na Câmara. Após atrair o apoio do PT e de outros partidos de oposição, Baleia formou um bloco com maior número de deputados do que o de Lira, líder do Centrão.

Nos bastidores, adeptos da campanha de Lira dizem agora que ele tem mais chances de vencer a disputa se a eleição for presencial, porque pode virar votos no corpo a corpo, e há até mesmo quem aponte o receio de fraude durante a votação. Em documento enviado a Maia no dia 22 de dezembro, o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do Progressistas, observou que o regimento da Câmara dos Deputados prevê apenas votações presenciais.

“Como garantir que o processo de escolha daquele que ocupará a 3ª posição constitucional na linha sucessória da Presidência da República não seja contaminado por ataques de hackers, que têm quebrado sistemas de segurança de órgãos, entidades e empresas mundiais?”, perguntou Ciro a Maia. “Qual a garantia de que o sigilo do voto de cada parlamentar será preservado, bem assim a integridade de sua escolha, já que o processo de votação será realizado pela ‘internet’, abrindo-se a possibilidade de ataques e manipulações externas?”

Após a reportagem ser publicada nesta quarta-feira, 6, o próprio Lira foi ao Twitter criticar a possibilidade de eleição virtual. "Nas eleições,148 milhões de eleitores tiveram a obrigação de ir às urnas e votar em plena pandemia. Agora,o presidente da Câmara @rodrigomaia e seu candidato @baleiarossi  querem votar remotamente na eleição p/ presidência da Câmara. Qual a verdadeira intenção por trás disso?", questionou.

Diante da polêmica, a Mesa Diretora da Câmara também estuda um modelo misto, no qual apenas os idosos, grupo de risco para o novo coronavírus, votariam de forma remota.

Definição

Oficialmente, a Câmara informa que “ainda não há uma definição sobre a forma como ocorrerá a sessão de votação para escolha da nova Mesa Diretora”. No mês passado, Maia cogitou a possibilidade de ampliar o espaço físico da votação e espalhar urnas pelo Congresso, para além do plenário, como no Salão Verde da Casa, o que poderia evitar aglomerações.

“Estou pensando em fazer presencial e ampliar o espaço do plenário, talvez fechando o Salão Verde. É uma ideia inicial”, afirmou o presidente da Casa no dia 16 de dezembro.

A possibilidade de se convocar os 513 deputados para irem a Brasília, no entanto, é criticada até mesmo entre aliados de Maia. Para o líder do PSB, Alessandro Molon (RJ), seria uma "irresponsabilidade". “Considerando as circunstâncias em que País se encontra em função da pandemia, seria uma irresponsabilidade obrigar todos os parlamentares, muitos dos quais de grupos de risco, irem a Brasília para votar. É fundamental garantir a possibilidade de se votar remotamente”, afirma Molon, que apoia Baleia. 

Se a Câmara optar pelo formato remoto, esta não seria a primeira vez que os parlamentares escolheriam a distância nomes da Mesa Diretora. Em julho do ano passado, a Câmara elegeu os deputados Expedito Netto (PSD-RO) e Paulão (PT-AL) para os cargos, respectivamente, de 3.º secretário e 4.º suplente usando o sistema virtual. Eles substituíram Fábio Faria (PSD-RN), que assumiu o Ministério das Comunicações, e Assis Carvalho (PT-PI), que morreu após sofrer um infarto. O Sistema de Deliberação Remota (SDR) foi adaptado para assegurar o cumprimento do regimento interno, que exige o voto secreto.

Entre os que são contra a eleição remota está o candidato à primeira vice-presidência na chapa de Lira, o deputado Marcelo Ramos (PL-AM). “A eleição deve ser presencial. Formalmente a eleição para a Câmara só tem um dia de campanha para apresentação de chapa e contato com os eleitores. Devemos aumentar muito o número de locais de votação, usando as salas das comissões e controlando o acesso, mas a votação tem que ser presencial”, disse. 

Há ainda os que defendam o formato misto, como é o caso da deputada Joice Hasselmann (PSL-SP). “Dá pra fazer das duas formas. Na minha opinião o melhor modelo seria o misto. Se for apenas presencial será uma eleição que pode demorar o dia todo porque são 513 votos e não pode aglomerar. Mas a coisa está caminhando para o presencial. Mas tenho receio de muitas faltas, em especial dos mais idosos”, afirmou.

No Senado, ainda não foi escolhido o modelo, mas a tendência é adotar o mesmo utilizado para a votação de autoridades -- indicações para agências, embaixadores e outros órgãos. Neste formato, equipamentos são colocados na garagem do Congresso e senadores podem votar sem sair dos próprios carros, numa espécie de “drive thru”.  / COLABOROU DANIEL WETERMAN


Ricardo Noblat: Ano que vem tem eleição para presidente do Brasil

Ano que vem tem eleição para presidente do Brasil

Será pedir demais que elegemos um presidente da República no ano que vem de fato comprometido com a preservação da vida? Porque se vidas pouco importam, nada mais importa.

Vida de todas as espécies, o que passa pelo respeito incondicional ao equilíbrio do meio ambiente.  Vida no seu sentido mais amplo, o que implica na construção de um país mais justo.

Não pode ser justo um país onde a concentração de renda seja absurda, o racismo flagele a maior parte de sua população, a homofobia seja tolerada e o feminicídio faça tantas vítimas.

Justo não é um país que facilita o acesso a armas porque o Estado se revela incompetente para garantir a vida dos seus cidadãos, ou porque seu mandatário é sócio eventual de criminosos.

Onde haverá vida que valha a pena ser vivida quando se nega a Ciência, desmoralizam-se as verdades e falseia-se o verdadeiro significado do que seja liberdade de expressão?

Por democracia entende-se o regime onde as leis prevalecem, onde os poderes são independentes e a vontade popular se expressa periodicamente por meio do voto.

Nele, portanto, não há espaço, ou não deveria haver, para governantes autoritários que conspiram impunemente para afrouxar suas regras e, no limite, revogá-las.

Para os que acreditam em Deus, todos somos filhos dele e, igualmente, devemos ser tratados. Isso independe de religião ou mesmo à falta de uma. Mas o Estado é laico.

Não pode impor uma religião nem proibir que se professe qualquer uma.  Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos.

Como tal, a mulher deve ser livre para conceber ou não, ou para interromper uma gravidez indesejada. Ela é dona do seu próprio corpo. Quanto a isso, soberana para agir como quiser.

Com base em tais princípios e em outros que guardem afinidade, o ano há pouco anunciado deflagra o processo da busca de nomes que possam repor o país na direção de um destino melhor.

Feliz e produtivo 2021 para todos.


Raphael Di Cunto: Os riscos da aposta de Bolsonaro na Câmara

Independentes” serão decisivos para votações pós-eleição

O presidente Jair Bolsonaro tem apostado alto ao mobilizar o governo para eleger o líder do PP, Arthur Lira (AL), presidente da Câmara. Há promessa - e entrega- de verbas orçamentárias, cargos e até ministérios para quem apoiar seu candidato. Não são poucos os aliados dele que alertam que tal aposta pode dificultar a governabilidade nos dois anos finais de seu mandato e esgarçar a relação com os deputados.

Como toda aposta de risco, o retorno, é claro, pode ser muito grande. Um aliado no comando da Câmara fará andar a agenda conservadora de costumes que o elegeu e com a qual ele pretende sustentar sua reeleição. Ao presidente interessa que o debate tome conta da sociedade, colocando em segundo plano a pandemia, a morte de milhares de pessoas e a economia capenga.

O atual presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ), barrou parte dessas propostas, mas menos do que seu contundente discurso para agradar os partidos de esquerda faz parecer. É verdade que ele segurou a reação à flexibilização do aborto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), impediu o debate sobre o Escola Sem Partido e o ensino doméstico, defendeu a ciência e a vacina e segurou parte da agenda armamentista, mas, quando estava em busca de aproximação com Bolsonaro, Maia levou direto ao plenário o projeto que flexibiliza a lei de trânsito e o porte de arma na propriedade rural.

O acordo de Lira com Bolsonaro, segundo parlamentares ouviram do próprio presidente, é colocar para debate todos os projetos do governo e não deixar as medidas provisórias (MP) perderem a validade por falta de votação. Não significa necessariamente aprová-los, mas instalar as comissões especiais necessárias para que a discussão ocorra na Casa. Ao bolsonarismo, interessa mais o bate-boca na sociedade do que a aprovação de algumas pautas.

A proposta de emenda constitucional (PEC) do “voto impresso”, por exemplo, é uma dessas em que o debate renderá mais frutos ao presidente do que a implantação, já que a checagem comprovaria que, de fato, não existe a tão alardeada fraude no sistema de votação. O discurso bolsonarista em 2022 terá mais apelo se a PEC fracassar, com os partidos de oposição votando contra. Caberá a Lira dar vazão a esse e a outros debates, ao instalar as comissões especiais e pautar as propostas no plenário.

Essa é a visão otimista para os bolsonaristas, que viram na aliança de Maia com a esquerda a deixa que permitiu que perdessem a vergonha de assumir o voto em Lira, até então um dos mais claros representantes da “velha política” que Bolsonaro dizia combater. Mas, como toda aposta, há um risco embutido, e que nesse caso não é pequeno.

Primeiro, é óbvio, o presidente nacional do MDB, Baleia Rossi (SP), pode vencer. Ele está à frente de um dos partidos mais governistas da Câmara, seus correligionários acumulam cargos no governo e seu perfil não é, até hoje, o de partir para o embate. Mas Baleia faz um discurso externo de independência, com o objetivo de reposicionar o MDB, e deverá sua vitória muito aos partidos de oposição, que terão voz ativa nas decisões.

O outro risco é que MDB, DEM, PSDB, PSL, PV e Cidadania votam a favor dos projetos do governo relacionados à economia e estão se sentindo desprestigiados na distribuição de cargos e verbas. São cerca de 130 deputados (já descontando os “bolsonaristas raiz” do PSL) sem os quais será impossível aprovar PECs como as reformas administrativa e tributária e a PEC Emergencial.

Será difícil que esses partidos consigam se posicionar contra projetos que já defendiam antes da eleição, mas há temas muito polêmicos dentro dessas propostas com os quais eles ainda não se comprometeram (como o fim da estabilidade no serviço público) e não se trata de derrotar a agenda toda, mas se unir à oposição em pontos fundamentais para imprimir derrotas a Bolsonaro.

Foi o que ocorreu com a exclusão das escolas filantrópicas da distribuição de verbas do Fundeb e na proibição de que o governo possa exigir um termo de consentimento para quem tomar a vacina contra a covid-19, para dar dois exemplos da última semana de votações da Câmara. A própria ampliação do Fundeb, em agosto, ainda bem longe da eleição no Congresso, já foi um indicativo de como essa aliança funcionará. Podem também oferecer as 40 assinaturas que faltam à oposição para comissões parlamentares de inquérito (CPI), por exemplo.

A estratégia de condicionar cargos no governo e a liberação de verbas em troca do apoio a Lira tem resistências entre parte dos aliados do presidente e é vista com muitas ressalvas por articuladores políticos mais experientes. A fatura não acabará na eleição da Câmara e será preciso negociar nos projetos mais importantes.

Não vai dar para desprezar os que ficaram ao lado de Baleia e é fácil imaginar a reação dos “aliados de primeira hora” se o governo atender só os preteridos agora com novas verbas ou cargos quando for preciso votar projetos mais importantes. Um aliado do presidente também destaca que faz pouco sentido oferecer dinheiro numa eleição que é secreta. Pode-se até desconfiar da traição, mas quem pula a cerca não sai por aí anunciando.

Lira é um político experiente. Em dez anos na Câmara, liderou seu partido em seis e presidiu as duas comissões mais importantes, a de Constituição e Justiça (CCJ) e a de Orçamento (CMO). Tem uma grande capacidade de articulação política e poderá driblar essas resistências para construir maiorias a favor do governo e dos projetos que achar relevantes. Mas não é o que ele tem prometido em público, ao refutar o papel de líder do governo, e, mesmo assim, não será algo fácil.

Rodrigo Maia venceu o “Centrão” liderado por Eduardo Cunha (MDB-RJ) na disputa da presidência da Câmara em 2016 e reaglutinou o grupo em torno do si meses depois para viabilizar sua reeleição, mas demorou para quebrar resistências. A eleição de 2022 batendo as portas e afetando fortemente a agenda da Câmara e do governo no segundo semestre dificultará mais esse realinhamento.


Bruno Boghossian: Bolsonaro emporcalha a Presidência até durante as férias

Provocações hediondas e exaltação da tortura são incompatíveis com o exercício da política

Jair Bolsonaro já era um político indigno do cargo que ocupava em 1999, quando dava entrevistas para defender atrocidades como assassinatos políticos e agressões a prisioneiros. "Eu sou favorável à tortura, tu sabe disso", declarou o então deputado ao programa Câmera Aberta, da TV Bandeirantes.

A propaganda continuou nas duas décadas seguintes. O parlamentar ganhava projeção ao glorificar o regime militar e recomendar a execução de rivais. "O erro da ditadura foi torturar e não matar", repetiu, dois anos antes de ser eleito presidente.

O país escolheu um apologista da tortura para comandar o Palácio do Planalto. Depois de fazer fama com aquelas declarações, ele passou a emporcalhar a Presidência da República com um repertório atualizado de barbaridades –até durante as férias.

Antes de embarcar para o Guarujá (SP), na segunda (28), Bolsonaro lançou dúvidas sobre a tortura que a ex-presidente Dilma Rousseff sofreu na ditadura. "Dizem que a Dilma foi torturada e fraturaram a mandíbula dela", disse. "Não sou médico, mas até hoje estou aguardando o raio-X."

Além de repugnante, a ofensa é covarde e desprovida de lógica. Bolsonaro costuma tratar torturadores como exemplos de heroísmo e explora a selvageria praticada nos porões como arma política. Em 2016, ele mesmo citou o chefe do DOI-Codi como "o pavor de Dilma Rousseff"; agora, debocha dos atos que exaltou.

Não é preciso dizer que o presidente tem o direito de discordar de seus opositores em quase tudo. As provocações hediondas que ele escolhe fazer para alimentar esses confrontos, no entanto, só reforçam que seu comportamento é incompatível com o exercício da política.

Essa é a essência de Bolsonaro. No início de maio, enquanto trabalhava em período integral para atrapalhar os esforços de contenção da pandemia do coronavírus, o presidente ainda abriu um espaço na agenda para receber o Major Curió, símbolo da repressão da ditadura. O Planalto divulgou o encontro e chamou o militar reformado de herói.


Míriam Leitão: Uma disputa nada trivial no Congresso

Há muito mais em jogo na disputa do comando das duas casas do Congresso do que parece. As diferenças ideológicas entre partidos de centro, ou entre pessoas de um mesmo partido, podem parecer imperceptíveis. Mas, dependendo da escolha feita pelos parlamentares, o país elevará os riscos institucionais que correm na atual administração, ou terá a chance de reduzi-los.

A autonomia do Legislativo é parte fundamental da barreira contra as tendências autoritárias do presidente e de luta contra a sua agenda retrógrada. Não se espera um Congresso que faça oposição ao presidente, mas que ponha limites ao Executivo dentro do necessário e saudável processo de freios e contrapesos.

Bolsonaro, em 2020, no início da pandemia, participou de manifestações que pediam o fechamento do Congresso. Isso deveria ser o suficiente para convencer os partidos de oposição, ou os parlamentares que têm apreço pela democracia, de qualquer partido ou tendência, a ficarem longe de um deputado ou senador que tenha a marca de candidato desse presidente.

Não foi exagero, portanto, que a frente articulada pelo deputado Rodrigo Maia em torno do deputado Baleia Rossi tenha se apresentado com a bandeira da democracia. É disso que se trata. E quem deixou isso claro foi o próprio presidente, com a sua reiterada apologia da ditadura militar que vitimou o Brasil por duas décadas. Hoje o governismo representa também apoio às medidas de desmonte do aparato de proteção institucional das comunidades indígenas, do meio ambiente, da educação e da saúde.

A agenda do presidente Bolsonaro é estranha às necessidades urgentes do país. O Brasil precisa neste momento fortalecer Saúde, Educação e proteção ambiental. O presidente quer excludente de ilicitude para os policiais, a chamada escola sem partido, mineração em terra indígena e armamentismo. Nada mais estrangeiro às necessidades do país. A educação se transformou em uma tarefa mais urgente com a pandemia. A Câmara teve que lutar inúmeras vezes para derrotar as tentativas de tirar dinheiro do Fundeb. Ora eram ideias ruins do Ministério da Economia, ora eram truques do governo para levar dinheiro para instituições privadas.

Alguém pode considerar que, na economia, o candidato do governo teria mais aderência à agenda de reformas. Pode ser o oposto. A reforma econômica mais importante no Congresso é a tributária, e quem levou o projeto que tramitou na Câmara, mesmo diante de todo o desinteresse do governo, foi o deputado Baleia Rossi. Também no projeto econômico o candidato da frente não governista pode ser mais interessante. Diante da queda da sua aprovação, o presidente-candidato pode reagir com o ideário no qual ele acredita: o populismo fiscal.

O argumento do deputado Arthur Lira de que sua eleição daria ao governo um aliado para enfrentar a crise só ficaria de pé se o governo tivesse enfrentado a crise. Ele a agravou quando criou conflitos federativos, fez campanha eleitoral antecipada, provocou aglomerações, submeteu o Ministério da Saúde ao seu obscurantismo e mandonismo, sabotou medidas sanitárias de proteção, espalhou dúvidas sobre a vacina. Bolsonaro demonstrou durante toda a crise de 2020 que ele é impermeável ao conhecimento. Simplesmente não entendeu a natureza da crise, nem quis entender. Sua ação foi deletéria. Dar mais poder a este governo eleva exponencialmente o risco que o país corre em todas as áreas.

No Senado, abre-se uma possibilidade com a candidatura da senadora Simone Tebet. Ela é mulher num país de poder excessivamente masculino. É qualificada. A candidatura dela representaria sem dúvida um avanço, porque a senadora é também uma profunda conhecedora da Constituição, que tem sido tão afrontada nos últimos anos. Entre ela e os senadores homens pré-candidatos, dois deles líderes do governo no Congresso e no Senado, há uma enorme diferença.

Nas duas Casas agora se negocia. É natural que os cargos das mesas e das comissões estejam em disputa, porque isso dará à minoria maior ou menor possibilidade de atuação. O grande cenário, contudo, mostra que há algo muito mais valioso em jogo do que os cargos que o governo tem oferecido em troca de apoio aos candidatos dóceis ao Executivo.


Ricardo Noblat: Tenebrosas transações pavimentam a eleição na Câmara

A Nova Política a pleno vapor

Quem diria que no governo do ex-capitão Jair Bolsonaro a Operação Lava Jato seria largada ao Deus dará, ao sol e à chuva para se desidratar. Largada, não: a palavra certa é esvaziada, nos seus estertores, a um passo de sucumbir.

Afinal, Bolsonaro pegou carona nos feitos da Lava Jato para se eleger presidente da República. Prometeu mundos e fundos para atrair a companhia do ex-juiz Sérgio Moro. E bradou que com ele no poder, o combate à corrupção jamais teria fim.

Há muitas formas de corromper, e nem todas tipificam crimes previstos no Código Penal Brasileiro. Exemplo? O loteamento de cargos no governo em troca de aprovação de matérias do seu interesse no Congresso. O é dando que se recebe.

É natural que partidos identificados com as ideias do governo dele possam participar. Presidente algum governa sozinho. Até ditadores precisam de ajuda para governar. Outra coisa é distribuir cargos no varejo para alcançar determinados fins.

No momento, é o que ocorre com a disputa pela presidência da Câmara dos Deputados. Bolsonaro carece ali de votos para eleger Arthur Lyra (PP-AL), seu candidato à sucessão de Rodrigo Maia (DEM-RJ). Fazer então o quê? Acenar com cargos.

Não está em discussão à vista de todos medidas para atenuar os mais graves problemas do país. Esperar que se discutisse algo ambicioso, um projeto de país pós-pandemia – por que não? -, seria exigir demais dos medíocres personagens em cena.

Tudo se resume a: o presidente da Câmara é quem manda na pauta. É ele quem define o que será votado, como e quando. Pode ser pressionado a pôr em votação o que não quer, mas tem meios e modos para tentar impor sua vontade.

É um cargo-chave para quem governa. Daí porque os presidentes da República procuram manter uma relação amistosa com quem preside a Câmara. Se for um aliado, tanto melhor. Bolsonaro quer um presidente da Câmara servil.

E para isso está disposto a pagar qualquer preço. Liberar o pagamento de emendas parlamentares ao Orçamento da União? Moleza. De resto, é obrigatório. Só que a liberação sairá mais rápida se o autor ou autores da emenda votarem em Lira.

Dir-se-á que os presidentes que antecederam Bolsonaro agiram assim. Mas nenhum deles submeteu-se ao voto popular garantindo que faria o contrário – Bolsonaro submeteu-se. A Velha Política daria vez à Nova, não lembra? Já esqueceu?

É conveniente esquecer como Bolsonaro o fez, como fizeram os generais que o cercam e que sempre mantiveram distância das figurinhas do Congresso encrencadas com a Justiça, mas dispostas a se encrencarem mais se o prêmio compensar.

Há um lote de centenas de cargos a serem repartidos com quem se disponha a apoiar Lira, por sinal um político que responde a processos, assim como boa parte dos seus pares. Cargos para chamar de seus e para facilitar futuras negociatas.

Outra vez, ao povo cabe assistir, bestificado, tenebrosas transações.


Correio Braziliense: Eleição na Câmara vai ditar o rumo de projetos no Congresso

Disputa entre Baleia Rossi e Arthur Lira para a Presidência da Casa Legislativa definirá se o parlamento continuará com o esforço reformista, que marcou a gestão de Rodrigo Maia, ou abrirá espaço para a pauta de costumes, valorizada pelo Planalto

Sarah Teófilo e Renato Souza, Correio Braziliense

A depender de quem ocupar as cadeiras de presidente na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, uma mudança de rumos poderá ser vista no Congresso a partir de fevereiro de 2021. Depois de um 2020 trágico, o Legislativo decidirá quem comandará as Casas pelos próximos dois anos, em meio a um cenário delicado nos âmbitos sanitário, econômico, político e social.

Dois caminhos mostram-se traçados, em especial na Câmara: de um lado, a manutenção de uma pauta reformista e liberal, e do outro, o surgimento, com mais força, de matérias da chamada “pauta de costume”, até o momento contida, muitas vezes, pelo atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que é quem pauta as matérias para análise. Depois de ter sido impossibilitado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de concorrer à reeleição, assim como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), as movimentações têm sido intensas para viabilizar uma sucessão.

Na quarta-feira, Maia e 11 partidos definiram o deputado Baleia Rossi (MDB-SP) como o candidato que representará o grupo que pretende ser independente do governo e vai rivalizar com Arthur Lira (PP-AL), líder do Centrão e preferido do Planalto para comandar a Casa Legislativa em 2021. A aliança em torno de Baleia Rossi tem respaldo até de partidos de esquerda, como o PCdoB e PT, e do PSL. Essa duas últimas legendas compõem as maiores bancadas da Casa.

Arthur Lira também busca viabilizar uma vitória. Apesar do esforço de mostrar que não levará adiante as pautas de costume, um aceno importante de Bolsonaro ao seu eleitorado, Lira deve ceder para agradar o Palácio do Planalto se for o próximo presidente da Câmara. No âmbito econômico, analistas afirmam que Lira não tem o mesmo perfil reformista e liberal de Rodrigo Maia, embora valorize as pautas ligadas a esses temas.

Em relação às pautas de interesse do Planalto, Rossi e Lira sinalizam para caminhos opostos. Em caso de uma vitória do emedebista, a tendência seria manter uma agenda reformista e independente do governo. Se a Presidência estiver nas mãos do pepista, o alinhamento será grande com o Planalto, que terá maior facilidade de emplacar matérias de interesse, em especial temas controversos da “pauta de costumes”. Em qualquer cenário, vale frisar, os analistas acreditam que as pautas relativas à pandemia terão prioridade.

Sócio da Hold Assessoria Legislativa, o cientista político André César afirma que se o bloco alinhado com o atual presidente da Câmara vencer, deve-se esperar uma continuidade no esforço de aprovar reformas estruturantes. “A tributária pode ter chance; a administrativa, também. Tem, ainda, a PEC emergencial e outras matérias, como a de autonomia do Banco Central, e a Lei do Gás”, pontua. Segundo o analista, as pautas reformistas continuarão sendo debatidas com o roteiro já traçado.

No caso de vitória de Lira, César acredita que também haverá o discurso de reformas, mas essa iniciativa chegará atrasada, pois o roteiro já foi traçado. É possível que Lira queira reorganizar a ordem de prioridades estabelecida ao longo de 2020. A expectativa maior será em relação à “pauta de costumes”, componente ao qual o Planalto tem muito apreço. Nos últimos dias, o presidente Jair Bolsonaro sinalizou seus interesses no Congresso, ao dizer que uma possível mudança na Casa Legislativa, alinhada com o governo, permitiria aprovar o excludente de ilicitude, espécie de salvo conduto para policiais militares que matarem durante operações de segurança. “(Com a vitória de Lira), haverá reforço nesta agenda que o Maia, de certa forma, conseguiu segurar”, diz André César.

Pandemia
Ainda que haja diferenças importantes entre Rossi e Lira na Presidência da Câmara, em qualquer cenário, a pauta relativa à pandemia deve receber prioridade. É como avaliam André César e a professora de ciência política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mayra Goulart. Ela frisa, também, que o governo federal, em termos de agenda econômica e políticas públicas, tende a querer gastar pouco, ao mesmo tempo em que pretende mobilizar a pauta de costumes. Segundo ela, o debate moral segue uma estratégia política. “Porque gasta pouco, entrega pouco e não tensiona com o mercado”, explica.

De acordo Mayra Goulart, falta interesse ao governo tensionar por qualquer agenda — seja econômica, seja de costumes. Na avaliação da professora, quando o presidente fala, por exemplo, de excludente de ilicitude, trata-se de uma “bravata”. “É o tipo de coisa que já foi apresentada antes, e caiu sem muita briga por parte do governo. É mais bravata, é fácil de falar. Você agrada as suas bases conservadores, mas, ao final, não aprova nada, não acontece nada”, afirma.

O analista político do portal Inteligência Política Melillo Dinis acredita, por sua vez, que a pauta econômica será prioridade, independentemente da vitória de Rossi ou Lira. “Maior do que a vontade de cada grupo, todos nós estaremos submetidos a uma grande pressão — a pandemia. Por mais que ele (Bolsonaro) seja separado da realidade, a realidade vai bater à porta”, argumenta. No caso de vitória do bloco de Maia, Dinis acredita que o processo de contenção do governo federal continuará. Já em caso de vitória de Lira, a quem ele chama de “gestor de conveniências”, haverá sinal verde para movimentar a pauta de costumes.

Professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), Paulo Calmon ressalta por que essas eleições do Congresso são fundamentais para o Planalto. De acordo com ele, Bolsonaro enviou diversas propostas ao Congresso que foram ignoradas. “Com a eleição de um aliado na Presidência da Câmara, essas propostas poderiam ganhar novo fôlego, assim como outras que estão praticamente prontas, mas, ainda, não foram encaminhadas pelo Palácio do Planalto porque se julgava que teriam pouca chance de aprovação em uma Câmara sob a liderança de Rodrigo Maia”, pontua.

O cientista político reitera que, com Lira, o governo deve enviar propostas que integram a “pauta de costumes”, assim como reformas do sistema político/eleitoral e do sistema penal/judiciário. Calmon acredita que o Planalto também deve aproveitar para enviar reformas nas relações federativas, “alterando o atual equilíbrio e restringindo a autonomia dos estados e municípios”. “E reformas econômicas, especialmente aquelas voltadas para redução do tamanho do Estado e imposição de austeridade fiscal”, diz.

No caso de uma vitória da aliança constituída por Maia, Calmon aposta no avanço das reformas econômicas, principalmente a tributária. “Por outro lado, (Maia) questionaria as pautas mais conservadoras, obstacularizando o avanço da agenda de reformas propostas pelo presidente”, avalia.

Senado discreto
No Senado, a disputa talvez fique centralizada entre Davi Alcolumbre e o MDB, que tem alguns nomes no páreo e é favorito na disputa. Os líderes do governo no Senado, Fernando Bezerra (PE), e no Congresso, Eduardo Gomes (TO), que integram o partido, são possíveis candidatos. O líder da bancada do partido, Eduardo Braga (AM), também tem o nome lembrado, e a senadora Simone Tebet (MS), que se colocou à disposição e diz que o MDB não será oposição ao governo.

Paralelamente aos movimentos do MDB, Alcolumbre tenta viabilizar Rodrigo Pacheco (DEM-MG). O nome de Antonio Anastasia (PSD-MG), vice-presidente da Casa, também foi citado. Entra na disputa o Muda Senado, grupo composto por 18 senadores de diferentes partidos que, se não lançar candidatura própria, deve apoiar um nome para tirar Alcolumbre de campo.

Para o cientista político André César, o Senado vive uma realidade distinta da Câmara. Não há uma dicotomia clara na disputa entre um nome alinhado ao governo e outro mais independente. Além disso, a tendência é de que se busque um nome mais consensual. Para ele, o grupo Muda Senado deve fazer barulho, mas sem peso, enquanto o governo busca viabilizar uma sequência à gestão Alcolumbre.

“Alcolumbre foi um líder que ajudou na agenda governista, contribuiu para minimizar ruídos, por exemplo o caso do Flávio (Bolsonaro), com as rachadinhas e tudo mais. O que o governo teme é que entre alguém do MDB menos alinhado, como o Eduardo Braga”, afirma. Ainda assim, segundo César, pensando em Braga e Simone Tebet, por exemplo, o cenário ao Planalto é mais propício com Braga que, para o analista, tem um perfil que possibilita uma negociação com o Planalto melhor do que seria no caso da senadora.

O cientista político Melillo Dinis afirma não enxergar mudança substancial no cenário, independentemente do nome que chegará à mesa do Senado. “O Senado não terá protagonismo algum; ficará na esteira do que a Câmara impuser ou do que o Planalto provocar. O Senado gostou desse ‘local’ de reivindicação de governadores. Virou uma Casa de repercussão. Alcolumbre e parte do Senado estavam atrás de construir temas locais, virou um clube de vereadores”, afirma.

O professor Paulo Calmon, da UnB, avalia que o Senado continuará muito influenciado pela sua atuação como Casa revisora. “Ou seja, revendo e corrigindo eventuais excessos ou equívocos ocorridos nas decisões da Câmara e do Palácio do Planalto”, afirma. De acordo com o professor, o Senado “continuará sendo avesso às propostas que geram efeitos importantes no equilíbrio federativo”.

Para ele, o Senado tem um equilíbrio de forças diferente daquele que prevalece na Câmara, e a ascensão de Alcolumbre “decorreu de um movimento de renovação, impulsionado pelo clima da eleição presidencial, e de enfrentamento de um grupo mais experiente de senadores que vinha liderando o Senado ao longo de muitos anos”.

“O momento, agora, é outro e muitos senadores simpáticos a essa ampla renovação mudaram de opinião. Ainda não está claro qual será o desfecho desse novo processo de realinhamento”, opina.

De olho em 2022
O mandato nas presidências do Senado e da Câmara é de dois anos — mais um motivo pelo qual a disputa é tão importante ao presidente Jair Bolsonaro. Os próximos chefes do Parlamento estarão nos cargos nas eleições de 2022, quando Bolsonaro deve disputar a reeleição.

Para o analista político Melillo Dinis, a vitória de Arthur Lira significaria um “salto” mais liso e agradável ao presidente. Ao mesmo tempo, o chefe do Executivo terá que trabalhar, porque não poderá culpar a Câmara por eventuais problemas ou falta de avanço na pauta do Planalto. Já a vitória do outro bloco significa mais dificuldade a Bolsonaro, mas ele continuará culpando a Casa. “O que é uma prática que ele faz com muita qualidade. O presidente é campeão em culpar os outros por seus atos”, afirma.

A professora da UFRJ Mayra Goulart afirma que uma vitória de Lira certamente deve ajudar Bolsonaro, no sentido de evitar o tensionamento e a manter as pautas de costume, que são promessas de campanha do presidente que ele ainda não conseguiu cumprir.


O Estado de S. Paulo: Baleia Rossi estreou na política aos 20 anos, seguindo passos do pai

Filho do ex-deputado Wagner Rossi, parlamentar vai disputar a presidência da Câmara com Arthur Lira

Jussara Soares, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Escolhido pelo grupo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ)para disputar o comando da Casa, o deputado Baleia Rossi, eleito presidente do MDB no ano passado, estreou na política aos 20 anos ao se eleger vereador de Ribeirão Preto (SP), em 1992. Na campanha para o Legislativo municipal, o jovem teve o apoio do então deputado Ulysses Guimarães, símbolo do MDB que presidiu da Assembleia Constituinte.

O registro do encontro, que ocorreu meses antes de Ulysses morrer em uma queda de helicóptero em outubro daquele ano, em Angra dos Reis, é a foto de perfil do WhatsApp de Baleia, que foi apontado como o nome mais viável para o confronto com o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), candidato do presidente Jair Bolsonaro.

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Na semana passada, antes da definição do nome de Baleia, Maia, ao lançar o bloco de 11 partidos em uma ofensiva contra o Palácio do Planalto, também recorreu ao símbolo do MBD para respaldar o grupo. “Certamente, Ulysses Guimarães estaria deste lado aqui e talvez repetiria em alto e bom som: eu tenho ódio e nojo das ditaduras”, disse o presidente da Câmara.

O apoio de Ulysses no início da vida política do candidato à sucessão de Maia se deu graças ao pai, o ex-deputado Wagner Rossi, filiado ao MBD desde 1981. Anos depois, Rossi se tornaria ministro da Agricultura dos governos Lula e Dilma Rousseff (PT), entre 2010 e 2011. Pressionado, não durou muito: pediu demissão diante de denúncias de irregularidades na pasta.

Batizado Luís Felipe Tenuto Rossi, Baleia recorreu ao apelido dado pelos irmãos para concorrer à vaga de vereador, em uma ironia por ele ser, à época, muito magro. Em princípio, não gostava, mas foi convencido pelo avô a adotar a alcunha. Assim nasceu Baleia Rossi, eleito outras duas vezes vereador em Ribeirão Preto.

Em 1995, ele lançou o “Programa do Baleia”, transmitido por emissoras locais para todas as cidades do interior de São Paulo. Na televisão, Baleia apresentava quadros como o que proporcionava uma transformação visual e outro em que levava flores e lia cartas enviadas pelo público a outra pessoa. O programa durou até 2006.

A popularidade na TV o ajudou a ser conhecido em boa parte do Estado e a aumentar a projeção política. Em 2002, ele se elegeu pela primeira vez deputado estadual. Em 2014, se tornou deputado federal. Em 2015, votou a favor do impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Esse fato e a proximidade com o ex-presidente Michel Temer - muito amigo de seu pai - foram apontados como motivo para a resistência da oposição a seu nome.

Em maio de 2016, o deputado virou líder do MDB na Câmara e se aproximou de Rodrigo Maia (DEM-RJ), que se elegeu pela primeira vez presidente da Casa dois meses depois, em julho. No mesmo ano, foi apontado como recebedor de propinas em um esquema de fraudes em merenda em Campinas e em Ribeirão Preto. Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF), atendendo um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), arquivou o caso por falta de provas.

Baleia ganhou mais destaque ao apresentar, a pedido de Maia, o projeto da reforma tributária (PEC 45). O relator do texto é o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que até a reta final disputou com ele a indicação de Maia.

Interlocutores de Baleia atribuem sua escolha a um jogo de paciência no qual ele articulou boa parte do tempo parado ou sem grandes movimentos. Aos 48 anos e muito discreto com a vida pessoal, o deputado é apontado por integrantes do MDB como um político sensato e focado em seus objetivos.

Embora inicialmente com melhor aceitação por partidos da oposição, Aguinaldo é do mesmo partido de Arthur Lira e, portanto, não tem a legenda na mão. Enquanto Maia tentava encontrar um nome de consenso contra o candidato do Planalto, Baleia passou a conversar, nos últimos dias, com nomes do PT para quebrar resistências. Nas conversas, sempre disse que, se eleito para o comando da Câmara, dará espaço e se manterá independente do Planalto.


Bruno Boghossian: Jogo bruto na eleição da Câmara aumenta riscos para Bolsonaro e oposição

A cada dia que passa, governistas e o grupo de Rodrigo Maia têm mais a ganhar ou perder na disputa

A disputa pelo comando da Câmara deve ficar um pouco mais bruta até a eleição de fevereiro. Lances feitos pelos principais jogadores nos últimos dias aumentaram o risco que a vitória e a derrota vão representar para cada um deles.

A exibição de poder feita por Rodrigo Maia (DEM) em seus momentos finais na cadeira deu uma pista sobre as ameaças que devem rondar o Palácio do Planalto caso seu grupo político continue na chefia da Casa a partir do ano que vem. O movimento sugere que a disputa já mudou a dinâmica de forças por ali e pode se aprofundar nas próximas semanas.

Na última sexta-feira (18), Maia incluiu na pauta uma votação que poderia tornar permanente o pagamento da 13ª parcela do Bolsa Família. A nova despesa não estava no radar da equipe econômica, mas o deputado usou a proposta numa reação a Jair Bolsonaro, que acusava a Câmara de segurar esse benefício.

Maia repetiu a dose nesta semana. Pautou um projeto de ajuda a municípios, com impacto de R$ 35 bilhões em dez anos, e tentou forçar o governo a mobilizar sua base aliada para tirar a proposta de votação. De uma só vez, ficaram expostos a falta de articulação política de Bolsonaro e os danos que o Planalto pode sofrer se perder a eleição.

Os recados dos últimos dias não significam necessariamente que o grupo de Maia vai bombardear o governo com projetos desse tipo caso ganhe a disputa, mas indicam que Bolsonaro pode ter mais dores de cabeça se perder a corrida para uma coalizão que tem partidos de esquerda em papel determinante.

Por uma questão de sobrevivência política, o presidente já estava empenhado em eleger um aliado para o comando da Casa. Agora, ele ganha novos incentivos para abrir ainda mais o governo para o centrão e desalojar a turma de Maia.

Se Arthur Lira (PP) vencer, há poucas dúvidas de que Bolsonaro se sentirá tentado a instigar seu candidato a retaliar os oposicionistas e o time perdedor. A cada dia, os dois lados têm mais a ganhar ou perder.


Rosângela Bittar: O futuro do atraso

A eleição dos presidentes da Câmara e do Senado não ficam definidas por antecipação, nunca. As negociações que levam a reviravoltas na boca da urna não permitem dizer que o favoritismo de hoje, do candidato governista Arthur Lira, permanecerá até 2 de fevereiro.

Dois exemplos da memória.

O mais recente: na primeira eleição de Rodrigo Maia, 2017, depois do mandato tampão após renúncia de Eduardo Cunha, o DEM só o apoiou na véspera, e o aliado principal, o PSDB, definiu-se na manhã da votação.

O mais perturbador: Apesar da proibição regimental, o PT se dividiu em 2005 e lançou dois candidatos. Um oficial, Luiz Eduardo Greenhalgh, outro avulso, Virgílio Guimarães. Venceu Severino Cavalcanti, que não estava na história. E saiu dela como uma anedota.

São fatos que reduzem a mera hipótese a apregoada certeza da vitória dos candidatos do presidente Jair Bolsonaro às presidências da Câmara e do Senado. No Senado ainda há três nomes disputando a unção presidencial mas, na Câmara, o candidato Arthur Lira já negocia abertamente em nome do presidente, há meses. 

Embora favorito, com uma campanha agressiva em concessões e troca de favores, Lira ainda não pode receber cumprimentos. Qualquer celebração antecipada é mera ironia.

Tudo pode acontecer nesses longos 40 dias que separam este Natal da inauguração do ano Legislativo, data da eleição das Mesas. Será um janeiro de frenesi político, longe de qualquer realidade dos brasileiros.

Única alternativa que resta ao governo para dar seriedade à sua empreitada é formular uma agenda que dê substância ao varejo das negociações. O Congresso não faz milagres, não tem planos de governo e precisa de uma proposta sobre a qual trabalhar e votar.

O que Bolsonaro já apresentou até agora é um rosário de demandas pessoais, familiares, corporativas e eleitorais. Algumas de exceção à lei. Barrar o impeachment, na Câmara, e salvar o enlameado filho Flávio Bolsonaro, no Senado, são metas explícitas.

O que inquieta nas manifestações recentes do presidente sobre o que quer para o ano que vem é a inexistência das áreas de emergência, começando pelo controle da pandemia.

Bolsonaro quer mandar na Câmara e no Senado para aprovar o excludente de ilicitude (licença para matar), a educação domiciliar, os benefícios para igrejas, o imposto sindical, a redução da Lei da Ficha Limpa e da Lava Jato. Sem esquecer o atraso dos atrasos: a volta do voto impresso.

Não contente em dedicar todo o seu mandato, exclusivamente, à campanha da reeleição, o presidente quer usar a Câmara para discutir o voto impresso e montar desde já o processo de acusação de fraude eleitoral, diante da possibilidade crescente da derrota em 2022.

Os sinais são preocupantes, o Brasil está sendo arrastado ao abismo social, econômico e político. Bolsonaro transforma suas convicções pessoais e retrógradas em políticas públicas.

Sindicato

A propósito das negociações para a volta do imposto sindical, João Carlos Gonçalves, Juruna, secretário-geral da Força Sindical, enviou-me um esclarecimento:

“Li seu artigo cujo título é Depois da meia-noite. Queria lhe informar que o movimento sindical não está pedindo a volta do imposto sindical, aquele que cada trabalhador pagava um dia de salário anual. Pagava porque o não associado também é beneficiado pelos acordos e convenções coletivas. O que o movimento sindical quer, e isso está parado na Câmara dos Deputados, é a regulamentação de legislação que deixe claro se o sindicato vai também trabalhar para não sócios sem receber nada. A cada convenção coletiva que o sindicato faz, precisa fazer um Termo de Ajuste de Conduta, com o Ministério Público do Trabalho, para poder cobrar de quem não é sócio, pelos benefícios das convenções coletivas estendidas a ele”.

*COLUNISTA DO ‘ESTADÃO’ E ANALISTA DE ASSUNTOS POLÍTICOS


O Estado de S. Paulo: Partidos de esquerda fecham apoio ao bloco de Maia

Siglas têm juntas 281 deputados; nome de candidato da frente ainda será decidido

Camila Turtelli, Anne Warth e Ricardo Galhardo, O Estado de S. Paulo

Numa ofensiva contra o Palácio do Planalto, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou nesta sexta-feira, 18,  a entrada de cinco partidos de esquerda no bloco que formou para a disputa do comando da Casa, marcada para 1.º de fevereiro. Agora, seu grupo conta com 11 legendas, que somam 281 deputados, mais do que os 257 necessários para um candidato se eleger. Não foi desta vez, porém, que Maia anunciou o nome do parlamentar que será o seu candidato.

A intenção de Maia é derrotar o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), líder do Centrão que conta com o apoio do governo de Jair Bolsonaro. Lira tem o apoio de dez partidos, que somam 203 parlamentares.

A adesão da esquerda ao bloco de Maia foi puxada pelo PT, maior bancada da Câmara, com 54 deputados, que decidiu na noite de anteontem apoiar um nome do grupo liderado pelo atual presidente da Casa. Em 2019, a sigla decidiu não apoiar o deputado do DEM na disputa, o que lhe custou cargos no comando do legislativo.

Além do PT, PSB, PDT, PCdoB e Rede entraram no bloco que já tinha DEM, PSL, MDB, PSDB, Cidadania e PV. Como o voto para a presidência da Câmara é secreto, o apoio do partido não significa necessariamente que todos os deputados da sigla vão votar no mesmo candidato. A “traição” neste tipo de disputa, por sinal, costuma ser comum.

Maia disse que a tendência é o grupo definir um nome de centro-direita como candidato, mas não descartou a possibilidade de que ele saia, inclusive, do campo da esquerda. Os preferidos do presidente da Câmara são Baleia Rossi (MDB-SP) e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). “Este grupo que hoje se apresenta tem muitas diferenças, sim. Porque, diferente daqueles que não suportam viver no marco das leis e das instituições e que não suportam o contraditório, nós nos fortalecemos nas divergências, no respeito, na civilidade e nas regras do jogo democrático”, disse.

Ao lado dos líderes dos 11 partidos do bloco, Maia leu uma carta em defesa da democracia. Segundo ele, a Câmara ganhou projeção nos últimos anos por ter se tornado a “fortaleza da democracia no Brasil, o território da liberdade, exemplo de respeito e empatia com milhões de cidadãos brasileiros”.

Sem citar Bolsonaro, o presidente da Câmara acusou o governo de autoritarismo e citou Ulysses Guimarães, que presidiu a Casa em duas ocasiões: antes da ditadura militar, entre 1956 e 1958, e na redemocratização, entre 1985 e 1989. “Enquanto alguns buscam corroer e lutam para fechar nossas instituições, nós aqui lutamos para valorizá-las. Enquanto uns cultivam o sonho torpe do autoritarismo, nós fazemos a vigília da liberdade. Enquanto uns se encontram nas trevas, nós celebramos a luz”, disse. “Certamente, Ulysses Guimarães estaria deste lado aqui e talvez repetiria em alto e bom som: Eu tenho ódio e nojo das ditaduras.”

A carta do bloco de Maia ressalta a diferença entre os partidos do grupo e sustenta que ele é mais forte em razão dessas divergências. “Esta não é uma eleição entre candidato A ou candidato B. Esta é a eleição entre ser livre ou subserviente, ser fiel à democracia ou ser capacho do autoritarismo, ser parceiro da ciência ou ser conivente com o negacionismo, ser fiel aos fatos ou ser devoto de fake news”, diz.

Lira reagiu com ironia ao anúncio do bloco por Maia. “Meu projeto é claro e está posto. Mas eu queria saber uma coisa: quem é o candidato do Rodrigo Maia?”, postou em uma rede social.

A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), disse que a adesão do partido ao bloco não significa apoio imediato às candidaturas preferidas por Maia. “Temos muito respeito pelos companheiros Aguinaldo e Baleia, mas a oposição construirá um nome para apresentar ao bloco também como alternativa”, disse.

Ela reconheceu que o bloco reúne partidos que divergem sobre várias pautas, sobretudo a agenda econômica. “Temos muitas diferenças e já travamos muitos embates nessa Casa, mas temos uma pauta que nos une, a defesa da democracia, das instituições e da liberdade dessa Casa”, acrescentou, ressaltando que o bloco espera ainda contar com o apoio do PSOL.

Até o início desta semana, um grupo de parlamentares, líderes sindicais e ex-dirigentes do PT defendiam apoio a Arthur Lira. O movimento foi barrado pela bancada na quinta-feira com a aprovação de uma resolução que proibia o apoio do partido a candidatos ligados a Bolsonaro. Depois da derrota, este grupo, junto com dissidentes do PSB, passou a defender o lançamento de uma candidatura própria, o que pulverizaria as candidaturas e beneficiaria Lira.

A agenda mínima proposta pela oposição tem como ponto fundamental o respeito ao critério da proporcionalidade das bancadas na escolha dos cargos na Mesa Diretora e comissões. Em 2019, o PT não apoiou Maia e mesmo tendo a maior bancada da Casa ficou sem nenhum cargo na mesa e sem a presidência de comissões.

A oposição avalia que Maia jogou errado, apostou que o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizaria sua reeleição, e enfrentou dificuldade para unificar seu bloco em torno de um nome. Por isso, o presidente da Câmara teria ficado dependente da oposição, que tem 133 parlamentares e pode ser a fiel da balança na disputa contra Lira.