PIB

Merval Pereira: Sem compostura (2*)

Brincar com crescimento pífio do PIB é brincar com desemprego, é menosprezar consequências no cotidiano do cidadão

Vivendo na bolha virtual das redes sociais, o presidente Bolsonaro espanta-se quando os jornais independentes estampam nas manchetes sua falta de compostura. Diz que jornalista é raça em extinção, mas se incomoda quando identificam nele a contrafação do palhaço contratado.

Numa metalinguagem involuntária, um palhaço orientava o outro sobre que perguntas fazer para os jornalistas, enquanto bananas eram distribuídas. O que em Chacrinha era pura arte brasileira, em Bolsonaro e Carioca é a explicitação de uma visão de mundo apequenada pela atuação permanente no lado escuro da sociedade.

Beppe Grillo, o cômico italiano, youtuber e blogueiro, que criou um partido político de extrema-direita com influência importante na política italiana, é o que há de mais próximo de Bolsonaro na política internacional. Não por ser de extrema-direita, mas por ser palhaço.

Apalhaçado também é Trump, assim como foram Hitler e Mussolini, em comum todos de extrema-direita chegados ao poder em momentos críticos da vida de seus países e do mundo.

Como não podia deixar de ser, Bolsonaro enfrentou reações negativas sobre sua postura em relação ao resultado do PIB. "PIB? O que é PIB? Pergunta para eles (jornalistas) o que é PIB", disse Bolsonaro ao humorista Márvio Lúcio, conhecido como Carioca, caracterizado como o presidente, que chegou ao Palácio da Alvorada num carro oficial da Presidência, ao lado do chefe da Secom, Fabio Wajngarten.

Brincar com o crescimento pífio do PIB brasileiro é brincar com a taxa de desemprego, é menosprezar as conseqüências no cotidiano do cidadão de baixa renda ou sem renda. Bolsonaro, de tão tosco, deixa pistas sobre suas impropriedades, e até mesmo suas ilegalidades, pelo caminho.

Ao levar a tiracolo um palhaço empregado da rede de televisão Record, depois de elogiar a chegada da franquia CNN Brasil, deixa claro o que considera imprensa que merece respeito. Millor Fernandes já dizia que jornalismo tem que ser de oposição, ou então é secos e molhados.

Pois humor a favor não é humor, é propaganda. Uma velha lição jornalística foi dada por William Randolph Hearst, magnata da imprensa inspirador do Cidadão Kane de Orson Welles: “Notícia é tudo aquilo que alguém não quer ver publicado. O resto é propaganda”.

Bolsonaro confirma candidamente que não gosta de críticas, repetindo um dos nossos ditadores militares, Costa e Silva, que retrucou a explicação de que as críticas jornalísticas eram “construtivas” também com sinceridade: “Prefiro elogios construtivos”.

O ex-presidente Lula também tinha dificuldade em separar o joio do trigo, e não gostava muito dessa definição de notícia. A ex-presidente Dilma também tinha sua contrafação, o comediante que fazia a Dilma Bolada e recebia, segundo diversas delações, pagamento mensal em “dinheiro não contabilizado” para tornar a presidente em figura simpática popularmente, missão de resto impossível.

Nunca houve, no entanto, presidente algum que tenha levado a cabo com tanto entusiasmo a degradação da função presidencial, querendo adaptar os usos e os costumes republicanos ao seu modo de vida à margem das instituições, utilizando-se delas para tentar destruí-las.

Mau soldado, segundo o ex-presidente Ernesto Geisel, foi acusado de planejar atos terroristas à guisa de reivindicação salarial nos quartéis. Mau político, anda às voltas com denúncias de divisões salariais ilegais em seus escritórios e no de seus filhos, a chamada “rachadinha”. Em 27 anos como deputado federal, só aprovou dois projetos na Câmara.

Presidente eleito por uma maioria de mais de 57 milhões de votos, hoje representa um núcleo extremista da sociedade que incentiva a ir às ruas contra as mesmas instituições que jurou proteger. Não tem noção do que seja decoro, na vida privada e na pública, nem respeita a “liturgia do cargo”.

*Em 21/12/2019 foi publicada uma coluna com o mesmo título


Eliane Cantanhêde: Que surpresa?

É normal crescer 1%? Não. Não é normal, mas não é surpresa e faz todo o sentido

O ministro Paulo Guedes manifestou “surpresa com a surpresa” diante do pibinho de 1,1% de 2019, que conseguiu a proeza de ser menor que o 1,3% de 2017 e 2018, apesar de pesos e condições políticas bem diferentes: o presidente Michel Temer assumiu após um impeachment, Jair Bolsonaro chegou com a força do voto.

Na verdade, porém, não houve “surpresa” com o pibinho, mas, sim, desânimo, decepção e preocupação com o futuro. Se no primeiro ano de um governo cheio de gás foi assim, como será o segundo? Em 2019, houve Brumadinho, os embates EUA-China, se quiserem dá para incluir a crise suína na China. Em 2020, há coronavírus, Bolsas derretendo, dólar disparando e previsão de desaquecimento global, que já antecedia tudo isso. E não é só. Há muito mais para atrapalhar.

Na barafunda, uma constatação incomoda: a agenda do governo parece ter se esgotado em 2019, com a reforma da Previdência e o programa de privatizações e concessões deixado praticamente de bandeja por Temer. Logo, não dá para pular de otimismo para este ano. Nem para os próximos.

Como o que está ruim sempre pode piorar, há um mesmo fator político em 2019 e 2020 segurando investimentos, confiança e a própria recuperação do Brasil: o presidente Jair Bolsonaro, que insiste em viver em guerra e ultrapassa limites mínimos de civilidade e de respeito ao cargo.

Como investir num país onde o presidente, para fugir de falar do PIB, traz em carro oficial um comediante para jogar bananas em repórteres? Eles estão ali para ouvi-lo (ao presidente, não ao comediante) e informar a população. E, não satisfeito com cenas grotescas, o presidente também age colocando em risco o aquecimento da economia, logo, a retomada dos tão desesperadamente necessários empregos.

Além da “surpresa com a surpresa”, Guedes declarou que a economia está “claramente acelerando” e acenou com crescimento de 2% neste ano... “se as reformas forem aprovadas”. É aí que mora o perigo, porque não adianta botar a culpa nos deputados e senadores, no coronavírus, em Marte ou na “herança maldita”, como fazia Lula em relação a Fernando Henrique. A responsabilidade maior pelas reformas é do Executivo e não dá para fugir disso. Ele tem de apresentar suas propostas e tem de negociá-las com o Congresso, como em toda democracia.

Há dois consensos, dentro e fora do governo. Um é que a reforma da Previdência foi um ótimo passo, mas só um primeiro passo. Outro é que o Congresso tem uma disposição muito positiva para aprovar as reformas seguintes, mas há uma questão de timing: o ano é eleitoral e, portanto, deputados e senadores têm interesses diretos nas campanhas, aliás, legitimamente.

Se Guedes condiciona crescimento a reformas e o Congresso está disposto a aprová-las, o que está atravancando o processo? A área econômica, o Planalto, ou o próprio presidente? A reforma tributária do governo, ninguém sabe, ninguém viu. A reforma administrativa foi fechada pela equipe de Guedes há meses e o Planalto diz que Bolsonaro já assinou, mas é um fantasma. Foi adiada uma, duas, três, sei lá quantas vezes, atravessou o carnaval, a Quarta-Feira de Cinzas, a semana seguinte e... ainda não se materializou!

Para piorar, as reformas só saem com acordo entre Executivo e Legislativo (ou “entendimento”, para não contrariar o presidente e os bolsonaristas), mas Bolsonaro, os filhos e seu entorno não param de atacar os “chantagistas” do Congresso e torcem pelos protestos que terão Rodrigo Maia na mira das pedradas.

Para o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, “não é normal um país como o Brasil crescer 1% ao ano”. De fato. Nada é surpresa, nada é normal, mas tudo faz sentido.


Coronavírus: Como epidemia pode afetar crescimento econômico da China e do Brasil?

Em artigo produzido para Política Democrática Online, economista José Luis Oreiro cita que economia do Brasil pode ter crescimento inferior a 1,5% em 2020

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

A epidemia do coronavírus pode contribuir na projeção da redução do crescimento da China para 4% em 2020 e queda de 33% no ritmo de crescimento na comparação com 2019, segundo analistas. A avaliação é reforçada pelo professor associado do Departamento de Economia da UnB (Universidade de Brasília) e doutor em economia José Luis Oreiro. Em artigo que produziu para a 16ª edição da revista Política Democrática Online, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), ele analisa como o aumento de casos de infecção pelo coronavírus também pode impactar, negativamente, a economia do Brasil. A íntegra do artigo e outros conteúdos podem ser acessados gratuitamente no site da entidade.

» Acesse aqui a 16ª edição da revista Política Democrática Online

“Nesse contexto, é possível que a economia brasileira apresente crescimento inferior a 1,5% em 2020, completando assim quatro anos de crescimento medíocre após o fim da grande recessão”, afirma o economista. A produção da indústria brasileira recuou 1,1% em 2019 na comparação com 2018, segundo informações divulgados no mês passado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Ele tem um site próprio e já publicou mais de 80 artigos em revistas científicas no Brasil e no exterior.

 De acordo com o economista, o recuo da produção industrial interrompe o movimento de tímida recuperação da produção industrial ocorrido em 2017 e 2018. “Os dados de recuo da produção industrial jogaram um balde de água fria nas expectativas de uma aceleração mais robusta do crescimento em 2020”, afirma Oreiro. Ele acrescenta que não há como escapar da conclusão de que a grande recessão de 2014 a 2016 produziu redução da tendência de crescimento da economia brasileira.

Dados divulgados pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), conforme ressalta o economista, mostram que a formação bruta de capital fixo recuou 2,7% no quarto trimestre, na comparação com o período imediatamente anterior. “Diante dos dados recentemente divulgados, os analistas do mercado financeiro já começaram a reduzir suas previsões de crescimento para 2020, as quais já se encontram bem abaixo de 2,5%, com algumas até mesmo abaixo de 2%”, afirma o professor da UnB.

A questão relevante, de acordo com o professor da UnB, é saber qual o motivo. “Na minha visão, a redução do potencial de crescimento de longo prazo é um fenômeno que vem ocorrendo desde meados da década passada, em função da desindustrialização crescente da economia brasileira; fenômeno esse que foi tardiamente percebido pelas administrações petistas e enfrentado de forma tíbia e inconsistente no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.

Oreiro foi professor do departamento de economia da Universidade Federal do Paraná de 2003 a 2008, onde exerceu o cargo de Diretor do Centro de Pesquisas Econômicas (CEPEC), de vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico (2004-2008) e de coordenador do Boletim Economia & Tecnologia (2005-2007), do qual foi o fundador.

Além de escrever para a revista Política Democrática Online, o economista já publicou artigos em outras veículos de grande relevância, como Journal of Post Keynesian Economics, Cambridge Journal of Economics, International Review of Applied Economics, Investigacion Economica, Revista de la Cepal, Economia (Anpec), Revista de Economia Política, Economia e Sociedade e Estudos Econômicos.

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Bernardo Mello Franco: Pouco pão e muito circo

Em dia de pibinho, Bolsonaro levou um comediante ao Alvorada. O truque já ficou manjado. Quando a notícia é ruim, o capitão apela ao bizarro para desviar a atenção

O truque já ficou manjado. Quando se vê diante de uma notícia ruim, Jair Bolsonaro apela à bizarrice para desviar a atenção. Ontem o presidente recrutou um humorista para substituí-lo no contato matinal com a imprensa. O objetivo era se esconder de perguntas sobre o pibinho do ano passado.

O dado mostrou que as promessas de recuperação econômica eram conversa fiada. No início de 2019, o Banco Central projetava um crescimento de 2,53%. O ministro Paulo Guedes arrochou salários e cortou aposentadorias, mas só conseguiu entregar 1,1%. Um desempenho pior que o do governo Michel Temer.

Para não comentar o resultado pífio, Bolsonaro cedeu o lugar a um comediante da TV Record. De terno escuro e faixa presidencial, o dublê tentou distribuir bananas e dar entrevista no lugar do presidente. Só arrancou risos dos puxa-sacos que amanhecem na porta do palácio para aplaudir o “Mito”.

A presepada consumiu tempo e estrutura do governo. O humorista desceu de um carro oficial com o secretário de Comunicação Social, o enrolado Fabio Wajngarten. Um ajudante de ordens filmou a cena para abastecer as redes sociais do chefe.

Bolsonaro ainda tentou participar do número. “PIB? O que é PIB? Pergunta para eles o que é PIB”, disse, apontando na direção dos repórteres. Ninguém achou graça, e ele foi embora sem dar explicações sobre o fiasco econômico.

O desrespeito tem sido rotina nas entrevistas no cercadinho do Alvorada. Em vez de prestar contas à sociedade, o presidente usa o espaço para fazer grosserias e insultar jornalistas. Os bolsonaristas pensam que os desaforos humilham a imprensa. Na verdade, eles só escancaram a falta de compostura do capitão.

Os romanos desenvolveram o método de governar com pão e circo. Distribuíam comida para evitar revoltas e promoviam espetáculos para distrair a plebe. Bolsonaro acha que é possível imitar a fórmula com pouco pão e muito circo. Se a economia continuar na lona, em algum tempo ele só conseguirá enrolar os seguidores mais fanáticos.


William Waack: Haja Confusão

O cenário político está embaralhado, mas o pequeno PIB de 2019 não confunde

É óbvio que um presidente contracenando com humoristas faz parte do arsenal de promoção de imagem “humana” ou “popular” em qualquer lugar – Barack “Late Night Show” Obama que o diga. Mas quando Jair Bolsonaro divide a cena com um humorista fantasiado de presidente do Brasil diante do Alvorada (um edifício oficial) – como ocorreu ontem –, a quem encarrega de responder a perguntas de repórteres, e depois o próprio presidente divulga o vídeo em redes sociais, sugere uma confusão: afinal, quem é o comediante?

Pode-se até acreditar que confusão seja uma arma conscientemente empregada por Bolsonaro para desequilibrar adversários, mas não se pode fugir à constatação de que virou uma de suas características permanentes. Para focar no que é mais recente, é confusa a pauta da manifestação que ele apoia (ou não?) para o dia 15, além da palavra de ordem mais abrangente de prestigiar o presidente.

Ficou confusa também a demanda, do ministro da Economia, Paulo Guedes, para que participantes do ato “defendam reformas”. No caso da tributária, qual a ser defendida? Existe uma do governo? Qual das várias que tramitam no Legislativo? Qual se deveria pedir em primeiro lugar? A PEC emergencial, talvez?

A favor de Bolsonaro deve-se assinalar que não é o único, de propósito ou não, a criar confusões. Na raiz da queda de braço entre Legislativo e Executivo para disputar migalhas do Orçamento (afinal, mais de 90% já estão comprometidos em despesas obrigatórias), está uma confusão política de autoria dos próprios parlamentares.

O fundo da questão não era o Orçamento impositivo, mas a esdrúxula criação do dispositivo que permitiria a um relator dispor de R$ 30 bilhões do Orçamento. Os parlamentares criaram uma perigosa confusão entre “legisladores” e “executores” do Orçamento. Que o governo, confuso, demorou para perceber.

Nos desdobramentos da original criou-se mais uma confusão espetacular. Os que apoiaram a manutenção de vetos presidenciais (que o Planalto havia negociado, depois repudiado, depois renegociado) à “emenda do relator” eram em boa parte senadores conhecidos pela oposição ao governo, mas cientes de uma confusão de interesses dentro do próprio Congresso. Querendo arranjar um jeito de continuar onde estão além do fim do ano, os dois presidentes das casas legislativas tinham topado uma manobra (a tal “emenda do relator”) de políticos aglomerados numa massa em geral amorfa (o tal “Centrão”), ao preço de deslegitimar a própria instituição.

Desembarcar de acordos “meia boca” discutidos em conversas de bastidores não ficou fácil pra ninguém dos dois lados da praça. Mesmo a projetada tramitação “normal” e seguindo ritos daquilo destinado a eliminar confusões – os projetos do governo regulamentando a execução de emendas, parte dos “acordos” – não diminuiu as ansiedades. Raposas felpudas no Congresso alertam para o fato de que na Comissão Mista Orçamentária, que vai examinar os tais projetos, jabuti sobe em árvore. Em outras palavras, não consideram letra morta a esdrúxula “emenda do relator”, pois é o “Centrão” seu motor e a grande força no Congresso.

De novo a favor de Bolsonaro deve-se reconhecer que ele tinha de proteger seu ministro da Economia ao retirar dele poderes para movimentar o Orçamento – que mais fazer, diante da confusão sobre aplicação e alcance do Orçamento impositivo? Note-se, porém, que, ao se evitar uma confusão dessas, torna-se ainda mais evidente uma outra de imensa abrangência na economia: a da insegurança jurídica. Fora a ironia do fato de Guedes ter ingressado no nutrido clube de gestores públicos que preferem nada decidir, pois temem ver seu CPF envolvido numa averiguação de órgãos de controle.

Nesse cenário, talvez só o PIB de 1,1% em 2019 não confunda. É muito pouco.


Bruno Boghossian: Com economia fraca, Bolsonaro inventa distração do circo sem pão

Ao se esconder atrás de imitador, presidente cria retrato vergonhoso de si mesmo

Era para ser uma sátira, mas foi uma representação fiel da realidade. No dia em que o país registrou um crescimento frustrante do PIB, Jair Bolsonaro apareceu ao lado de um humorista que encarnava um presidente que não dá a mínima para a economia e não sabe nem o significado daquelas três letras.

"PIB? O que que é PIB? Pergunta o que que é PIB", recomendou Bolsonaro ao piadista Márvio Lúcio, vestido com a faixa presidencial.

Quem esperava do verdadeiro governante um plano para o crescimento precisou se contentar com mais uma encenação indecente. Bolsonaro pôs um imitador diante das câmeras e o estimulou a se comportar como um pateta malcriado. Depois que o presidente se recusou a falar sobre os apertos da economia, o comediante atirou bananas aos jornalistas.

Além de levar a um novo patamar de insulto suas afrontas à imprensa, Bolsonaro criou um retrato vergonhoso de si mesmo e do governo. A cena revelou um presidente sem capacidade de liderança sobre um tema delicado, disposto a apelar para distrações cada vez mais infantis.

A caricatura tosca feita na porta do Palácio da Alvorada era tão verossímil que repetia o nome de Paulo Guedes para fugir de explicações sobre o crescimento. O ministro, no entanto, corre o risco de se tornar uma boia de salvação esvaziada, demonstrando a auxiliares desconforto com as dificuldades impostas pelo presidente à sua agenda de reformas.

Bolsonaro só quis falar dos números do PIB no fim do dia. Disse apenas que a recuperação estava em curso e que esperava um 2020 melhor.

Ao se recusar a prestar contas sobre assuntos difíceis, um governante também desrespeita aqueles que precisam de solução. A brincadeira de Bolsonaro pode ser encarada como um desrespeito às milhões de pessoas que procuram emprego ou veem suas rendas corroídas há anos.

O humor da população é especialmente sensível ao giro da economia. Sem sinal da prometida recuperação milagrosa, o presidente tenta oferecer um espetáculo de circo sem pão.


José Luis Oreiro: PIB de Bolsonaro é pior que o de Temer

O IBGE acaba de divulgar os dados de crescimento do PIB de 2019: a economia brasileira apresentou um crescimento de 1,1%, alcançando um patamar de R$ 7,3 bilhões de valor da produção de bens e serviços finais. Esse é valor inferior a média dos valores observados em 2017 e 2018, anos nos quais a economia brasileira cresceu a taxas de 1,32% e 1,31% respectivamente. Dessa forma o desempenho da economia brasileira no primeiro ano do mandato do Presidente Bolsonaro conseguiu a proeza de ser pior do que a observada durante os dois anos de mandato do Presidente Temer, a qual já foi bastante medíocre, ficando muito abaixo da média de 2,81% de crescimento do PIB no período 1980-2014.

Do lado da demanda, o crescimento do PIB foi puxado pelo crescimento do consumo das famílias que cresceu 1,8% ao longo do ano passado. Como o consumo das famílias cresceu num ritmo superior ao PIB, o resultado foi uma redução da (baixíssima) taxa de poupança da economia brasileira, a qual recuou de 12,4% do PIB em 2018 para 12,2% do PIB em 2019. A redução da poupança doméstica levou a um aumento da poupança externa (déficit em conta corrente do balanço de pagamentos), o qual passou de 2,8% do PIB em 2018 para 3,2% do PIB em 2019.

Do lado da oferta, o crescimento foi puxado pelo setor de serviços, o qual cresceu 1,3%, ao passo que a indústria de transformação permaneceu estagnada com um crescimento de apenas 0,1% ao longo do ano de 2019.

Em suma, a economia brasileira em 2019 desacelerou o seu ritmo de crescimento com respeito ao observado durante o governo Temer, amplificando o seu desequilíbrio externo e o peso do setor de serviços na economia, com reflexos negativos para as perspectivas de crescimento da produtividade do trabalho.

A evidência empírica está mostrando de forma bastante contundente de que a agenda de reformas iniciada com o governo de Michel Temer e aprofundada no governo de Bolsonaro simplesmente não está funcionando. Não adianta dizer que a economia ainda está sentindo os efeitos das administrações petistas. A crise de 2014-2016 foi muito profunda mas, ao contrário do que ocorreu em crises anteriores, a economia brasileira está apresentando um padrão de recuperação cíclica extremamente lento. Quantos resultados pífios de crescimento serão necessários até que a sociedade brasileira se convença que a agenda liberal de reformas simplesmente não funciona? Está claro que o Brasil precisa de várias reformas, mas ESSA agenda aplicada desde meados de 2016 (Teto de gastos, reforma trabalhista, reforma da previdência, etc) simplesmente não está funcionando. Chegou o momento da sociedade brasileira dizer NÃO ao programa liberal. Este país só terá um futuro quando discutir seriamente uma Agenda Nacional de Desenvolvimento.


Revista Política Democrática || Sérgio C. Buarque: Os sinais e as incertezas

Economia do país reage e apresenta sinais alentadores, com ambiente macroeconômico favorável, com inflação de 3,4% ao ano e a mais baixa taxa Selic da história recente do Brasil (5% ao ano, menos de 2% em termos reais). É só o presidente não atrapalhar e as tensões externas arrefecerem 

Os sinais da economia brasileira são alentadores. Apesar do tímido crescimento esperado para este ano e dos níveis alarmantes de desemprego, a combinação de inflação em patamares civilizados (3,4% ao ano) com a mais baixa taxa de juros de referência (Selic) da história recente do Brasil (5% ao ano, que representa menos de 2% em termos reais) cria ambiente macroeconômico muito favorável. Se o presidente da República não atrapalhar e as tensões comerciais externas arrefecerem, é provável que a economia brasileira retome ciclo de crescimento nos próximos anos. Nada espetacular e rápido, contudo, como seria desejável para a geração de renda e emprego e para ampliação da receita pública. Mesmo com a reforma da Previdência, a crise fiscal ainda vai se arrastar por alguns anos, as famílias e as empresas continuam endividadas e a economia internacional caminha a passos de tartaruga.

A queda da taxa de juros de referência deve gerar três efeitos positivos e complementares na economia. De imediato, reduz o custo da dívida pública, contendo a tendência de expansão do endividamento, que gera insegurança e instabilidade, e diminuindo o tamanho do superávit primário necessário para pagamento dos juros. Ao mesmo tempo, a redução da Selic já está empurrando para baixo os juros do crédito comercial, mesmo com a persistência de oligopólio bancário e da elevada inadimplência.

Além disso, a redução da Selic deve levar a uma redução da atratividade das aplicações financeiras em títulos da dívida pública, grande parte dos quais são remunerados pela taxa de referência. Como consequência, pode haver migração das aplicações da poupança nacional para produtos mais rentáveis, incluindo ações, e mesmo para o consumo ou o investimento. O desestimulo da “economia rentista” anima os empreendedores à procura de negócios com maior remuneração e risco mais elevado. Como a economia está operando com alto índice de ociosidade, a ampliação da utilização da capacidade instalada, acompanhada da contratação de mão de obra desocupada, complementa o ciclo virtuoso de recuperação do crescimento econômico.

Entretanto, esta conjuntura favorável convive com muitas incertezas, que assustam os agentes econômicos e podem comprometer o crescimento da economia. O primeiro fator de insegurança reside no próprio governo, na incompetência e no desequilíbrio emocional e ideológico do presidente da República, sua incontinência verbal alimentada pela paranoia reacionária, provocando quase cotidianamente o conflito e a instabilidade. A isto se agrega a recente libertação de Luís Inácio Lula da Silva com um discurso de radicalização política que deve acentuar a polarização entre lulistas e bolsonaristas, elevando a temperatura política, o que pode desfocar o debate das reformas estruturais.

É surpreendente, em todo caso, a consistência da política econômica de um governo completamente desorientado, parecendo indicar que o presidente delegou, efetivamente, ao ministro Paulo Guedes e a outros ministros da área econômica a condução das reformas que podem destravar a economia e estimular novos investimentos privados. Além das iniciativas para privatização de várias estatais e concessão de serviços públicos, o governo vem avançando em algumas reformas do Estado para flexibilizar, regular e reduzir as despesas públicas. O Ministério da Economia falha, lamentavelmente, quando se omite das negociações que levam à reforma tributária (com duas propostas tramitando no Congresso), fundamental para melhoria do ambiente de negócios, que estimula os investimentos.

Não bastassem as incertezas internas, a situação internacional emite ondas de instabilidade que podem atrapalhar muito o desempenho da economia brasileira. A disputa comercial dos Estados Unidos com a China, amenizada transitoriamente, pode gerar retração da economia global e, de imediato, atingir os dois maiores parceiros comerciais do Brasil. A União Europeia, às voltas com um nacionalismo retrógrado e com a confusão do Brexit, mostra sinais de estagnação econômica que contraem também o comércio internacional. Mais perto do Brasil, o renascimento do peronismo kirchnerista na Argentina, nosso terceiro parceiro comercial, ameaça a existência do Mercosul, base para negociação de acordos comerciais com grandes centros econômicos, especialmente o entendimento com a União Europeia, já muito abalado pelas barbaridades do presidente Jair Bolsonaro.

Mesmo com toda a reserva em relação a um presidente autoritário e reacionário em áreas importantes da vida brasileira, há motivos para otimismo quanto a uma possível retomada do crescimento da economia brasileira. Os sinais são positivos, embora as incertezas ainda sejam muito grandes.

 

 


Revista Política Democrática || Sérgio C. Buarque: Os sinais e as incertezas

Economia do país reage e apresenta sinais alentadores, com ambiente macroeconômico favorável, com inflação de 3,4% ao ano e a mais baixa taxa Selic da história recente do Brasil (5% ao ano, menos de 2% em termos reais). É só o presidente não atrapalhar e as tensões externas arrefecerem 

Os sinais da economia brasileira são alentadores. Apesar do tímido crescimento esperado para este ano e dos níveis alarmantes de desemprego, a combinação de inflação em patamares civilizados (3,4% ao ano) com a mais baixa taxa de juros de referência (Selic) da história recente do Brasil (5% ao ano, que representa menos de 2% em termos reais) cria ambiente macroeconômico muito favorável. Se o presidente da República não atrapalhar e as tensões comerciais externas arrefecerem, é provável que a economia brasileira retome ciclo de crescimento nos próximos anos. Nada espetacular e rápido, contudo, como seria desejável para a geração de renda e emprego e para ampliação da receita pública. Mesmo com a reforma da Previdência, a crise fiscal ainda vai se arrastar por alguns anos, as famílias e as empresas continuam endividadas e a economia internacional caminha a passos de tartaruga.

A queda da taxa de juros de referência deve gerar três efeitos positivos e complementares na economia. De imediato, reduz o custo da dívida pública, contendo a tendência de expansão do endividamento, que gera insegurança e instabilidade, e diminuindo o tamanho do superávit primário necessário para pagamento dos juros. Ao mesmo tempo, a redução da Selic já está empurrando para baixo os juros do crédito comercial, mesmo com a persistência de oligopólio bancário e da elevada inadimplência.

Além disso, a redução da Selic deve levar a uma redução da atratividade das aplicações financeiras em títulos da dívida pública, grande parte dos quais são remunerados pela taxa de referência. Como consequência, pode haver migração das aplicações da poupança nacional para produtos mais rentáveis, incluindo ações, e mesmo para o consumo ou o investimento. O desestimulo da “economia rentista” anima os empreendedores à procura de negócios com maior remuneração e risco mais elevado. Como a economia está operando com alto índice de ociosidade, a ampliação da utilização da capacidade instalada, acompanhada da contratação de mão de obra desocupada, complementa o ciclo virtuoso de recuperação do crescimento econômico.

Entretanto, esta conjuntura favorável convive com muitas incertezas, que assustam os agentes econômicos e podem comprometer o crescimento da economia. O primeiro fator de insegurança reside no próprio governo, na incompetência e no desequilíbrio emocional e ideológico do presidente da República, sua incontinência verbal alimentada pela paranoia reacionária, provocando quase cotidianamente o conflito e a instabilidade. A isto se agrega a recente libertação de Luís Inácio Lula da Silva com um discurso de radicalização política que deve acentuar a polarização entre lulistas e bolsonaristas, elevando a temperatura política, o que pode desfocar o debate das reformas estruturais.

É surpreendente, em todo caso, a consistência da política econômica de um governo completamente desorientado, parecendo indicar que o presidente delegou, efetivamente, ao ministro Paulo Guedes e a outros ministros da área econômica a condução das reformas que podem destravar a economia e estimular novos investimentos privados. Além das iniciativas para privatização de várias estatais e concessão de serviços públicos, o governo vem avançando em algumas reformas do Estado para flexibilizar, regular e reduzir as despesas públicas. O Ministério da Economia falha, lamentavelmente, quando se omite das negociações que levam à reforma tributária (com duas propostas tramitando no Congresso), fundamental para melhoria do ambiente de negócios, que estimula os investimentos.

Não bastassem as incertezas internas, a situação internacional emite ondas de instabilidade que podem atrapalhar muito o desempenho da economia brasileira. A disputa comercial dos Estados Unidos com a China, amenizada transitoriamente, pode gerar retração da economia global e, de imediato, atingir os dois maiores parceiros comerciais do Brasil. A União Europeia, às voltas com um nacionalismo retrógrado e com a confusão do Brexit, mostra sinais de estagnação econômica que contraem também o comércio internacional. Mais perto do Brasil, o renascimento do peronismo kirchnerista na Argentina, nosso terceiro parceiro comercial, ameaça a existência do Mercosul, base para negociação de acordos comerciais com grandes centros econômicos, especialmente o entendimento com a União Europeia, já muito abalado pelas barbaridades do presidente Jair Bolsonaro.

Mesmo com toda a reserva em relação a um presidente autoritário e reacionário em áreas importantes da vida brasileira, há motivos para otimismo quanto a uma possível retomada do crescimento da economia brasileira. Os sinais são positivos, embora as incertezas ainda sejam muito grandes.

 

 


O Globo: Por que o país não cresce? Entenda como a engrenagem do PIB parou  

Economia voltou a ficar no vermelho no 1º trimestre deste ano, com queda de 0,2%

Luciana Rodrigues, Daiane Costa e Gabriel Martins

RIO - Depois de dois anos seguidos em expansão, a economia brasileira voltou a ficar no terreno negativo no primeiro trimestre. O IBGEinformou nesta quinta-feira que oProduto Interno Bruto ( PIB , conjunto de bens e serviços produzidos no país) recuou 0,2% entre janeiro e março .

A queda do PIB, depois de um período de fraco crescimento — a economia cresceu só 1,1% em 2017 e repetiu essa baixa expansão em 2018 — já leva alguns economistas a avaliarem que o país vive um quadro contínuo de estagnação e outros a não descartarem sequer o risco de o Brasil cair numa depressão .

Indicador síntese da atividade econômica, o PIB reflete a falta de ânimo de consumidores e empresários e a crise fiscal do governo. Entenda, abaixo, como a engrenagem da economia brasileira parou.

CONSUMIDOR
Sérgia Monteiro, de 49 anos, perdeu o emprego como secretária em 2015 e desde então mantém a casa com o dinheiro das encomendas de doces que faz e o salário do filho mais velho, que trabalha com inspeção veicular.

Do ano passado para cá, porém, viu a clientela cair por conta da crise. E precisou cortar despesas e adaptar as compras de mercado para não fechar o mês no vermelho:

— Cheguei a pedir dinheiro emprestado para conseguir pagar as contas. Tive que cancelar o telefone residencial e mudar o pacote da TV a cabo para um mais básico. No mercado, só compro as marcas mais baratas ou que estão em promoção — explica a moradora de Bonsucesso, na Zona Norte do Rio.

No Brasil, a economia é muito dependente do consumo das famílias. Os gastos de 210 milhões brasileiros respondem por mais de dois terços do PIB, com um peso de 64% na geração de renda do país. Ou seja, quando as famílias têm que cortar suas despesas, é muito difícil o país crescer.

Com mais de 13 milhões de brasileiros desempregados e 62,3 milhões de consumidores com contas em atraso, as famílias estão sem fôlego para consumir. Mesmo quem está empregado e sem dívidas é afetado pelo clima econômico ruim e se mantém cauteloso nos gastos.

O índice de confiança dos consumidores brasileiros, que chegou a subir entre outubro de 2018, logo após as eleições, e janeiro deste ano, em meio a uma expectativa de melhora na economia, voltou a cair em fevereiro e há três meses está em queda.

COMÉRCIO
Com os consumidores apertando os cintos, as lojas vendem menos. O comércio viu suas vendas cresceram só 1,3% nos últimos 12 meses.

Na loja de bijuterias Biju Prime, no Centro do Rio, o movimento está bem fraco, segundo Claudio Vaz, gerente do local.

— Desde de 2016, é só ladeira a baixo. Todos os anos as despesas aumentam, por conta dos reajustes, mas as vendas caíram 50%.

Vaz conta que precisou demitir funcionários e tentar reduzir a conta de luz, economizando no ar-condicionado da loja, que fica no centro de comércio popular Saara.

— Não sei onde está o crescimento, até agora estou esperando a melhora no comércio — diz Vaz.

No ano passado, o varejo teve um alívio e chegou a abrir 11 mil lojas pelo país — número pequeno se comparado a um total de 220 mil pontos de venda fechados entre 2014 e 2017.

Mas, este ano, segundo levantamento da confederação do setor, os empresários do comércio voltaram a sofrer com a crise e, de janeiro a março, 39 lojas encerraram suas atividades.

O setor de serviços, que além do comércio engloba atividades como educação, saúde e transportes, tem peso de 73% no PIB e só consegue crescer quando aumenta o consumo dos brasileiros.

INDÚSTRIA
Se o consumidor não gasta e o comércio não vende, a indústria não produz. O setor industrial foi o mais afetado pela crise e cresceu só 0,6% no ano passado.

À frente da fábrica Plastlab, que construiu há 28 anos em Madureira, na Zona Norte do Rio, o empresário Marcelo Oazen já chegou a fabricar 130 toneladas por mês de  plásticos variados. Hoje, sua produção é de 40 toneladas mensais. Os plásticos e derivados são vendidos para hospitais, companhias aéreas e comércio em geral.

No auge, ele chegou a empregar 82 trabalhadores, mas demitiu 22 funcionários.

— Há oito anos, no pico de produção, produzíamos muito para multinacionais que acabaram saindo do país.

A indústria muitas vezes avança puxada pelas exportações, porque não depende só da demanda dos brasileiros para produzir mais. Porém, com a crise na Argentina (principal mercado para as exportações industriais do Brasil) e a guerra comercial, o cenário externo também não está favorável.

A Plastlab, de Madureira, fornecia para multinacionais instaladas no Brasil e que deixaram o país na crise. Este ano, o empresário Marcelo Oazen acredita em alguma recuperação do setor, porque conseguiu novos clientes e, por isso, contratou dois funcionários.

Marcelo Oazen, dono da fábrica de plásticos Plastlab, no Rio, mostra um de seus produtos: empresa teve de cortar funcionários Foto: Marcos Ramos / Agência O GloboMarcelo Oazen, dono da fábrica de plásticos Plastlab, no Rio, mostra um de seus produtos: empresa teve de cortar funcionários Foto: Marcos Ramos / Agência O Globo

Além da indústria de transformação, tem grande peso no Brasil o setor extrativo, principalmente petróleo e minério de ferro.

Mas a produção de petróleo tem crescido a passos lentos. E a extração de minério de ferro deve ser menor do que o previsto este ano com a suspensão das atividades em várias minas da Vale, após a tragédia de Brumadinho.

Com peso cada vez menor no PIB brasileiro, a indústria hoje responde por 21% da geração de riquezas no país, mas é considerada uma atividade chave para a geração de empregos de melhor qualidade e para impulsionar outras atividades, como os serviços.

A falta de perspectiva de que a economia vá reagir impede que os empresários elevem sua produção ou façam novos investimentos para ampliar sua capacidade produtiva. Depois de atingir 99 pontos em fevereiro, a confiança da indústria voltou a cair em maio para o patamar de 97 pontos. Índices abaixo de 100 são considerados pessimismo.

Muitos executivos afirmam que apenas após a aprovação de uma agenda de reformas, como a da Previdência e tributária, a confiança da indústria será restaurada.

GOVERNO
Com os brasileiros gastando menos, o comércio reduzindo as vendas e a indústria pisando no freio, a arrecadação de impostos pelo governo não avança. Em abril, descontando os royalties de petróleo, a arrecadação de tributos federais recuou 0,34%.

E este é apenas um dos problemas fiscais do país, que deve caminhar para ter o sexto déficit consecutivo nas contas públicas este ano.

A previsão é que o rombo em 2019 fique em R$ 132 bilhões e o resultado permaneça no vermelho pelo menos até 2022. Especialistas afirmam que, sem a reforma da Previdência, o quadro levará a um colapso da máquina pública, com o governo ficando sem dinheiro para as despesas mais básicas.

O governo já reduziu drasticamente os investimentos públicos nos últimos anos. Em 2018, foram investidos apenas R$ 27,88 bilhões, ou 0,4% do PIB, o menor patamar em dez anos.

CONSTRUÇÃO CIVIL
O corte nos gastos do governo e a redução nas despesas das famílias afetam em cheio a construção civil. O setor, importante empregador de mão de obra, é um termômetro importante dos investimentos do PIB.

A construção civil reflete tanto os investimentos do governo em obras públicas, como os feitos por indústrias na instalação de novas fábricas ou ampliação de unidades existentes. E também o que é gasto pelas famílias na compra de novas moradias, cifra que é considerada investimento, e não consumo, nas estatísticas do PIB.

Para contornar a crise no setor, a construtora paulistana de alto padrão Vitacon precisou requalificar seus empreendimentos para evitar ter que adiar obras ou cancelar projetos.

— Optamos por produtos com valores unitários mais baratos. Para isso, investimos em metragens menores ou em metros quadrados mais em conta, para atrair o maior número possível de pessoas — explica o CEO da companhia, Alexandre Lafer Frankel.

Em 2018, o setor de construção teve o pior desempenho do PIB, com queda de 2,5%. A taxa de investimento do Brasil está em 15,8%, perto de suas mínimas históricas.

AGROPECUÁRIA
Setor que vem mantendo um bom desempenho, a agropecuária reage muito mais a fatores externos, como maior demanda de alimentos da China, e a condições naturais, como a competitividade elevada do Brasil no segmento e o clima particularmente favorável em alguns dos últimos anos.

Em 2019, a agropecuária tende a apresentar bons resultados novamente. Segundo a mais recente previsão de safra agrícola do IBGE, o Brasil deve produzir 230 milhões de toneladas de grãos este ano, o segundo melhor resultado da série histórica.

Com peso muito pequeno no PIB, de apenas 5%, a agropecuária, quando vai bem não consegue puxar outros setores da economia.  (Colaboraram: Bárbara Nóbrega e David Barbosa, estagiário, sob supervisão de Luciana Rodrigues)

Fonte: IBGE, SPC/CNDL, FGV, CNC


Cida Damasco: Esperança é 2020

PIB de 2019 empaca com demanda sem tração e cenário político nebuloso

Pelo visto, mesmo quem considerava a recuperação da economia uma questão de torcer a favor ou contra o governo Bolsonaro, começa a jogar a toalha. Os indicadores do trimestre ainda não estão consolidados, mas os sinais são de que o PIB do período pode fechar com “crescimento zero” ou até “crescimento negativo”. Aqueles eufemismos aos quais os técnicos gostam de recorrer para amaciar a dura realidade da estagnação ou da recessão. Pior, a essas alturas já se acredita que o ano está perdido.

A esperança, nesse caso, foi protelada para 2020. Exagero? Há quem diga que sim, considerando-se que o governo, sensível a essa situação e a seus desdobramentos políticos, ainda poderia adotar pauta específica para injetar algum ânimo à economia. Essa aparente precipitação, porém, parece ligada a uma preocupação em não repetir o que aconteceu no ano passado – quando os primeiros meses foram de puro entusiasmo com a expectativa de um crescimento nas vizinhanças de 3% e os últimos meses de pura decepção, com a confirmação de que o resultado final do ano ficaria a um terço dessa marca. Por esse raciocínio, é melhor se preparar desde já, para a aterrissagem ser mais suave.

Dois importantes indicadores agregados do comportamento da atividade econômica comprovam que, para dizer o mínimo, a situação está desconfortável. Diagnóstico reforçado pelas filas quilométricas de trabalhadores à procura de um emprego e pela quantidade de lojas fechadas nas ruas e nos shoppings das grandes cidades. Depois de uma alta de 0,3% em janeiro, o Monitor do PIB da Fundação Getulio Vargas (FGV) apontou uma queda de 0,4% em fevereiro, que bateu na agropecuária, na indústria e no setor de serviços. Desempenho definido pela FGV como “modo de espera”.

O mesmo movimento foi detectado pelo Índice de Atividade Econômica do Banco Central, o IBC-Br. Fevereiro mostrou uma queda de 0,73%, a maior em nove meses, desde a parada dos caminhoneiros, em seguida a uma redução de 0,3% em janeiro. Na esteira desses resultados, ganha velocidade a descida das projeções para o fechamento do ano. Embora a Pesquisa Focus, do BC, ainda aponte um aumento de 1,95%, vários analistas já põem suas estimativas mais para perto de 1%. E, se essas apostas mais conservadoras emplacarem, 2019 será o terceiro ano consecutivo praticamente com o mesmo resultado medíocre – foi 1,1% tanto em 2017 como em 2018 –, depois da longa recessão que engoliu 8% do PIB.

Se há quase um consenso de que a economia brasileira não tem força suficiente para acelerar o crescimento neste ano, as recomendações para mudar esse quadro têm divergências. Os devotos do liberalismo radical acreditam que o crescimento só virá mais à frente, como consequência direta das reformas, especialmente a da Previdência, e o “natural” restabelecimento da confiança dos investidores. Na outra ponta estão os adeptos da tese de que será preciso acionar imediatamente instrumentos afiados de incentivo à demanda, mesmo levando-se em conta que alguns artificialismos, nessa direção, já tiveram sua eficiência testada e reprovada em outros governos. Sem isso, não haverá disposição de investimento, ainda que as reformas consigam vencer as resistências do Congresso e sejam aprovadas em tempo razoável.

Cada vez mais, contudo, ouvem-se vozes em defesa da combinação de duas coisas. Cuidar das chamadas mudanças estruturantes, mas também vitaminar alguns setores, como o da construção civil e obras públicas, para que eles garantam algum fôlego à atividade econômica, num prazo mais curto. Aqui é o caso de perguntar: cadê o programa de reativação de obras paradas, tão falado durante a campanha eleitoral?

Como se não bastassem as enormes dificuldades para se identificar e aplicar as terapias indicadas para reabilitar a economia, há ainda essa barafunda na política. Os três Poderes não se entendem e esticam a corda da normalidade democrática. Em pouco mais de uma semana, o presidente desautorizou, numa só penada, o superministro da Economia e a cúpula da principal empresa do País, o Supremo ressuscitou a censura à imprensa e desencadeou uma caça aos críticos nas redes sociais. E o Congresso se aproveita da confusão, dita a pauta conforme seus interesses, expondo a extrema fragilidade da articulação política do governo. Nesse cenário, quem se arrisca a pôr dinheiro para valer – e para ficar – na economia brasileira? Um ano perdido, “apenas”, talvez até seja lucro.


Míriam Leitão: Futuro do PIB

Dentro de um ano, o país estará diante de um número melhor do que o 1% que colheu esta semana. O PIB de 2018 deve ficar, segundo as previsões dos economistas, em torno de 3%. Mesmo com o extremo nevoeiro do cenário político, o país deve dar mais alguns passos na recuperação do produto perdido. O consumo vai subir e até o investimento será positivo.

O crescimento de 2017 foi baixo e concentrado na agricultura, e o único fato a comemorar foi o fim da recessão de 2014-2016. Os indicadores foram positivos, mas magros, e não se sentiu a mesma temperatura em toda a economia. Em 2018, o PIB deve ser mais forte e espalhado pelos demais setores. A agricultura, por ter crescido muito no ano passado e batido recorde de produção, deve encolher 3%. Porém, as projeções estão ficando melhores do que as iniciais. Mesmo sendo menor do que a do ano passado, a colheita de grãos deve ter o segundo maior nível da história: 226 milhões de toneladas. Isso terá outros efeitos benéficos na economia, apesar de estatisticamente o setor entrar na conta com um sinal negativo.

Um dos pontos positivos será manter a recuperação do consumo. As famílias vão consumir mais pela soma de vários fatores positivos: a inflação está baixa, está havendo aumento discreto da renda mesmo com o quadro do desemprego. Os dissídios estão conseguindo reajuste acima da inflação. Haverá nova queda do comprometimento da renda das famílias com o pagamento de dívidas. E, como já foi dito aqui, isso significa um aumento de R$ 100 bilhões liberados para o consumo ou poupança, segundo projeção do BNP Paribas.

Uma coisa são os índices agregados, outra é o que os empresários sentem na ponta da produção. Pegue-se por exemplo embalagem para margarina. O Brasil consome 220 milhões de embalagens de margarina por mês. Um número espantoso, mas é esse mesmo. Segundo a empresa Fibrasa, um dos produtores dessas embalagens, com duas fábricas, no Espírito Santo e em Pernambuco, o consumo está parado e até teve uma pequena queda na demanda em fevereiro. A saída desta recessão será assim, com idas e vindas.

Prova disso é a indústria. Ela dará um susto na semana que vem. Na terça-feira, será divulgada uma queda na produção industrial de janeiro e há projeções de tombo de 3%. Na língua própria dos economistas, ela vai “devolver a surpresa positiva de dezembro”. Mas ela está saindo do buraco, como mostra a redução da capacidade ociosa. A indústria caiu 13 trimestres consecutivos e terminou 2017 em zero, mas teve números positivos a partir de meados do ano passado. A previsão é de que suba 4,6% no ano, segundo o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita. Serviços, também pela previsão do Itaú, ficará em 3%.

Os investimentos devem voltar para o azul, depois de quatro anos consecutivos de recuo. A expectativa é de alta de 5%. Só que estará longe de recuperar-se da perda de mais de 25%. Os empresários não farão grandes investimentos porque não confiam que esteja se iniciando um período de crescimento sustentado, mas pelo menos estão substituindo máquinas e equipamentos que ficaram antigos e sofreram o desgaste de uso.

Certas consultorias e bancos preveem um crescimento do PIB até maior do que 3%. A MB Associados, por exemplo, acredita que a alta será de 3,5%. O Itaú estima uma taxa mais forte em 2019, de 3,7%, mas no seu cenário conta com a eleição de um governo que aprove a reforma da Previdência no primeiro ano de mandato.

Esse é o grande problema das estimativas para o crescimento. O impulso que vai ganhar corpo em 2018 pode se transformar em voo de galinha se o problema fiscal não for resolvido. Os economistas explicam que a recuperação, neste momento, é “cíclica”, ou seja, está apenas repondo o que foi perdido pela crise. Por isso, não é sustentável sem que o governo enfrente o problema do rombo em suas contas. O raciocínio de economistas como Fernando de Holanda Barbosa Filho, da FGV, que entrevistei esta semana na Globonews, é que até aqui o estímulo monetário empurrou a economia para fora da recessão, mas a política fiscal precisa fazer parte do esforço de crescimento e, para isso, o ajuste das contas é fundamental. Ele arrumará a casa para um novo período de crescimento.