PIB

Cristovam Buarque: Narrativas falsas

Dois mil e dezessete foi o ano em que o mundo descobriu o poder e o risco das “fake news”, mas há décadas os brasileiros têm sido vítimas de narrativas falsas que corrompem nossa maneira de pensar. Uma narrativa falsa generalizada diz que o governo pode gastar o quanto quiser, com Copa do Mundo e escolas, aumentar salários dos que recebem pelo topo e daqueles que recebem salário mínimo. Para corromper a verdade da aritmética, fizemos a falsa narrativa da moeda, com a inflação dando-lhe um valor menor do que o indicado na cédula.

Quando a verdade surgiu, criamos a falsa narrativa de que a industrialização enriqueceria todos os brasileiros. Acreditou-se que bastava esperar o PIB crescer para todos terem bons empregos e altos salários e o Brasil chegar ao Primeiro Mundo. O resultado foi o crescimento da riqueza nas mãos dos poucos ricos e a persistência da pobreza na vida da multidão de pobres.

No momento em que essa narrativa mostrou sua cara perversa, no lugar de reorientar o progresso, optou-se pela falácia de que a transferência de R$ 170 em média por mês seria suficiente para tirar uma família da pobreza e levá-la para a classe média. Decretou-se o fim da pobreza, independente da verdade.

O falso discurso da ascensão dos pobres à classe média se espalhou pelo mundo, ao ponto de que o impeachment legal, embora discutível se correto politicamente, é visto no exterior sob a falsa narrativa de golpe. Todas as prescrições constitucionais foram seguidas, todas as regras democráticas se mantêm, as instituições continuam funcionando, o novo presidente tinha sido escolhido como vice duas vezes pela presidente impedida (mesmo sabendo então das suspeitas de corrupção que pesavam sobre ele).

Além disso, os novos ministros colaboravam com o governo dela e a ex-presidente mantém todas as prerrogativas constitucionais dos presidentes que concluíram seus mandatos. Ela pode ser candidata já este ano (imagine se o golpe tivesse deixado Goulart ser candidato dois anos depois de 1964?), mas a falsa narrativa de golpe se mantém no imaginário dos apoiadores dela e de seus simpatizantes no exterior.

A mesma falácia que impedia ver os problemas já anunciados desde 2011 (veja o livro de minha autoria “A economia está bem, mas não vai bem”), agora mostra os problemas herdados como sendo criados pelo novo governo que, por seu desprezo à opinião pública, sua falta de credibilidade, sua imersão na corrupção, contribui para fortalecer a falsa narrativa de que ele é o culpado do desastre, mesmo quando a economia mostra recuperação.

Da mesma forma, está prevalecendo a falsa narrativa de que a Lava Jato vai salvar o Brasil esquecendo-se que um juiz pode prender político corrupto, mas não elege político honesto; e que o fim da corrupção no comportamento de políticos não eliminará a corrupção nas prioridades da política. Depois da Lava Jato, os políticos poderão continuar a construir obras de luxo, desde que não recebam propina.

Criou-se a narrativa da Lei da Ficha Limpa de que a política acabou com a corrupção, mesmo deixando soltos e elegíveis os políticos e juízes que constroem edifícios palacianos, ainda que roubados de escolas, de saneamento, de teatros, da ciência, desde que sem desvio para bolsos privados.

É também falsa a narrativa de que a cassação do direito político de um corrupto a candidatar-se vai educar o eleitor, quando poderá até acomodá-lo. Todos que não forem condenados serão vistos como igualmente bons. Depois do “rouba, mas faz”, cairemos no “se não rouba, já é bom”, não importando suas prioridades e competência. O Brasil vai continuar igual se não nos educarmos como eleitores.

Quando se discutia a Lei da Ficha Limpa, defendi que o ficha-suja deveria poder ir à campanha, como os cigarros vão à venda, com o aviso de que “este candidato foi condenado como corrupto, é ladrão de dinheiro público; ele faz mal à saúde nacional”. A Justiça condenaria, mas caberia ao eleitor cassá-lo nas urnas. Não se tiraria a soberania do povo e, certamente, educar-se-ia melhor o eleitor.

Mas, não foi assim que a lei foi aprovada, com apoio dos que não aceitaram a sugestão, e hoje reclamam dela. A Lei da Ficha Limpa deu à Justiça o poder de condenar e cassar. Vamos ter de conviver com ela esperando educar o eleitor por outros meios, mas alertando que acreditar plenamente em narrativas falsas não educa.

 


Merval Pereira: Cenário aquecido

A recuperação econômica e a eleição de 2018. Começaremos o ano eleitoral de 2018 sem sequer saber quais serão os candidatos a presidente da República em outubro, o que é fato inédito e explicita a crise moral e política que vivemos. Ao mesmo tempo que estamos superando aos trancos e barrancos a crise econômica, saindo da maior recessão já ocorrida no país, o fator político deve ganhar peso na formação das expectativas.

Sob esse ponto de vista, o economista Carlos Geraldo Langoni, ex-presidente do Banco Central e atual diretor do Centro de Economia Mundial da FGV, montou os cenários possíveis para o ano que começa amanhã, prevendo um crescimento do PIB na faixa de 3%. Haverá, segundo Langoni, uma reação lenta do mercado de trabalho, gerando percepção de alguma melhora social, sendo possível que, no meio do ano, a taxa de desocupação volte a um dígito.

Esse reaquecimento, combinado com ganhos reais na massa salarial, deve influenciar positivamente as expectativas da classe média, com importantes desdobramentos para as eleições presidenciais. Para Langoni, “será feita uma escolha crucial entre o populismo irresponsável — mas com a atração fatal das soluções mágicas — e a continuidade do ciclo de reformas — de implementação duvidosa”.

Apesar deste contexto complexo, para Langoni permanece alta a probabilidade de um cenário econômico positivo que combine expansão mais rápida com inflação baixa e maior mobilidade social. A visibilidade dessa recuperação multidimensional tornará mais difícil a desconstrução da estratégia macro com viés liberal, minimizando as opções radicais. Para ele, a esperada maior volatilidade nos índices de confiança, acompanhando as pesquisas eleitorais, deve ser compensada pela aceleração do ritmo de crescimento em ambiente de inflação baixa.

Esse crescimento será alavancado pela economia mundial, pois, segundo Langoni, o PIB mundial deve sustentar expansão sincronizada liderada pelo comércio internacional. A China, mesmo com restrições do endividamento excessivo, contribuirá para o avanço rápido dos emergentes e para a estabilização das commodities. Por outro lado, os efeitos da “Trumpeconomics”, a economia da era Trump nos Estados Unidos, pode trazer problemas internos. Langoni vê na reforma tributária dos Estados Unidos, pelo viés expansionista, uma ameaça ao gradualismo do Fed, o banco central americano. Na sua análise, eventual alta mais brusca nos juros poderia levar o dólar a novo patamar global de valorização, com impactos negativos sobre as moedas emergentes, inclusive o real.

O maior desafio do governo Temer é o ajuste fiscal incompleto, e o rumo da reforma da Previdência no 1º trimestre será o grande teste de consistência da política econômica. “Será crucial para definir a tendência de risco-país — hoje na faixa de 200 pontos-base (spreads do CDS) — ampliando ou amortecendo as tensões eleitorais”.

Em contraste, “com expectativas ancoradas” na definição de Langoni, a inflação deve permanecer abaixo da meta (IPCA em torno de 4%). Esse é importante trunfo que deve viabilizar a continuidade, pelo Banco Central, de uma política monetária expansionista com a taxa básica de 7% e juros reais de 3%.

No cenário mais provável de Langoni, o avanço mais rápido do PIB será acompanhado de desempenho setorial mais homogêneo, com avanço da indústria e serviços e menor dependência da agricultura. Haverá também maior equilíbrio sob a ótica da demanda: a saída da recessão foi liderada pelo consumo das famílias. Com a melhora da confiança, marcos regulatórios consistentes e juros reais historicamente baixos, Langoni prevê que o investimento deverá reagir, apontando para a sustentação da retomada.

O ajuste externo bem-sucedido deverá estender-se a 2018: o megassuperávit deste ano (US$ 65 bi) dificilmente será repetido, até porque espera-se maior crescimento das importações, acompanhando o aquecimento do mercado interno. O cenário externo continuará favorecendo as exportações, mas o ritmo será mais lento, de 18% para cerca de 10%. Relativa estabilidade do câmbio deve ser mantida, o ajuste externo com trajetória benigna: alta apenas moderada no déficit em contacorrente, para US$ 30 bi, financiado com facilidade, por capitais de longo prazo. O investimento direto estrangeiro permanecerá estável em US$ 80 bi.

A solidez das contas externas deverá sustentar o atual patamar da taxa de câmbio (R$ 3,30/US$), apesar da maior volatilidade associada à evolução das pesquisas eleitorais. Deve-se levar em consideração, entretanto, o viés de desvalorização, refletindo o “efeito Trump” no cenário internacional e o “efeito Lula” no país.

Um feliz ano novo a todos.

 


Monica De Bolle: Grandes expectativas tortas

 

Na realidade, as expectativas podem estar a revelar apenas o viés e os anseios políticos de cada um

“Não faça perguntas e não ouvirás mentiras”,
Charles Dickens,
Great Expectations

Em economia o termo “expectativas” refere-se às previsões e cenários que tomadores de decisão formam em relação à evolução dos preços, do consumo, da atividade econômica, das contas públicas, das contas externas. Expectativas podem ter impacto significativo nas decisões das empresas e dos consumidores: visões pessimistas sobre a economia podem levar firmas a desistir de investir, afetando empregos, a arrecadação futura do governo, a capacidade de consumo das famílias. Expectativas também influenciam a política econômica – se os formadores de preço acreditam que a inflação continuará a aumentar, provável será que o aumento necessário de juros para estabilizar preços tenha de ser maior do que o antecipado. Por fim, as expectativas têm papel político importante. Quantas vezes já não se ouviu dizer que “a melhora das expectativas mostra que o governo de xxx está fazendo um excelente trabalho”? Não à toa, muitas vezes as expectativas viram mote de campanha. O que poucos sabem é que as expectativas raramente são imaculadas. Em mundo cada vez mais polarizado, as expectativas estão crescentemente contaminadas pelo viés político de cada um, e isso é um problema para qualquer economista que queira delas extrair informações sobre o futuro da economia.

Como são apuradas as expectativas? De modo geral, são elas derivadas de pesquisas de opinião. Nos EUA, uma das fontes de expectativas mais utilizadas por economistas é a da Pesquisa de Consumidores da Universidade de Michigan. Nela, faz-se perguntas como “olhando à frente, o que você diria ser mais provável: que o país continuará bem nos próximos 5 anos, ou que haverá períodos de desemprego alto e recessão?”. Em seguida, respostas são compiladas e metodologias são aplicadas para transformá-las em algo mensurável que reflita relativo otimismo ou pessimismo. No Brasil, o Banco Central conduz a pesquisa Focus com participantes do mercado onde questionários são enviados para que cada instituição forneça sua visão sobre a inflação, os juros, o PIB, além de outros indicadores.

Pesquisas mais parecidas com a da Universidade de Michigan são feitas pela Fundação Getulio Vargas, além de outras instituições, onde o alvo é o público geral, não apenas o conjunto de pessoas que atuam no mercado financeiro. Essas informações são utilizadas para dar aos gestores de política econômica e para o resto da sociedade uma noção do estado da economia e de como deve ela evoluir nos próximos meses ou anos. Para que tal relação entre as revelações das pesquisas e o quadro econômico seja estabelecida, é necessário presumir que a amostra selecionada de indivíduos não contém qualquer viés que possa ser prejudicial às conjecturas formadas sobre a economia a partir das expectativas reveladas.

A premissa da ausência de viés nas expectativas é verdadeira? Estudos recentes feitos para os Estados Unidos e punhado de outros países onde o aumento da polarização política recente é visível revelam que não. Em artigo acadêmico publicado há poucos meses, três autores mostram que hoje, nos EUA, o viés político influencia diretamente e de forma crescente as expectativas sobre a economia (ver Mian, Sufi, e Khoshkhou, 2017, Partisan Bias, Economic Expectations, and Household Spending). Republicanos são mais otimistas em relação às perspectivas de crescimento, desemprego, inflação, enquanto democratas revelam o oposto. A eleição de Donald Trump em 2016 exacerbou essa tendência. Os autores também concluem que apesar das expectativas tortas, enviesadas, não há qualquer relação entre elas e a maneira como os consumidores se comportam. Ou seja, um republicano é capaz de dizer-se otimista com a economia sem que isso o torne um ávido consumidor. Tais evidências contradizem a tese dos economistas de que expectativas trazem informações valiosas sobre o futuro da economia. Na verdade, expectativas podem estar a revelar apenas o viés e os anseios políticos de cada um, sem qualquer relação com o andamento da economia ou com a avaliação de impacto da política econômica.

Não há, ainda, estudos semelhantes para o Brasil. Mas não é difícil imaginar que algo semelhante esteja ocorrendo no País e que as expectativas estejam prestes a ficar ainda mais enviesadas com as eleições que se aproximam. Para os economistas ansiosos em extrair da opinião pública “verdades econômicas” para justificar seus cenários, vale a advertência de Dickens, epígrafe desse artigo.
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* Monica De Bolle é economista, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University

 


Míriam Leitão: O começo da volta

A economia está se recuperando. Há indicadores positivos mostrando que o país saiu do fundo do poço, mas há ainda um grande caminho a andar até chegar ao ponto do qual o país caiu na recessão. A produção industrial em outubro ficou 5,3% maior do que a de outubro do ano passado, mas ainda esta 17% abaixo do melhor momento, em 2013. A queda já chegou a ser de 21%. O caminho de volta só está começando.

Nada será como em outras recuperações. A volta será trilhada passo a passo e no meio do caminho haverá não apenas uma, mas várias pedras. Esta recessão não foi provocada por uma crise externa, foi feita aqui mesmo. Quando começou, o país já estava em desordem fiscal e ela se aprofundou pela queda forte da arrecadação. A dívida bruta subiu 20 pontos percentuais do PIB, desde o começo do governo Dilma. O cenário político é confuso, o governo não inspira confiança. Tudo isso é fator desestabilizador que dificulta o crescimento. Mesmo assim, há dados mostrando que a recuperação já começou.

No final de 2016, a economia estava 9,2% menor do que no final de 2014. Com os três trimestres consecutivos de alta este ano, ela está 5,8% menor, na mesma comparação. Ou seja, ainda não é o que era, mas está reduzindo o PIB perdido. O consumo das famílias está em queda de 6,6%, e os investimentos, apesar de terem voltado a crescer, estão 22% menores.

No mercado de trabalho, a situação é mais preocupante. O Brasil chegou a ter apenas 6 milhões de desempregados em 2013, mas viu o número disparar para 14,1 milhões no pior momento deste ano, em março. Em outubro, havia diminuído para 12,7 milhões. Mesmo assim, ainda é muita alta a quantidade de brasileiros procurando empregos sem encontrar.

O mercado financeiro vem revisando para cima as projeções para o PIB deste ano e do ano que vem. O chefe de economia e estratégia do Bank of America no Brasil, David Beker, passou de 0,6% para 1% a estimativa para 2017 e prevê alta de 3% em 2018, puxada pelo consumo. Mas ele define a recuperação como gradual e diz que há vários fatores impedindo uma retomada mais forte.

— Esta não é uma recuperação como as outras. Temos uma crise fiscal ainda não solucionada, com endividamento crescente do governo, desemprego alto, e muitas empresas também endividadas. Além disso, o Brasil perdeu produtividade. Nossa capacidade de crescer hoje é menor — explicou.

Ontem, o Bank of America lançou um relatório anual com perspectivas para a economia mundial em 2018. De um lado, a expectativa é de mais um ano de forte crescimento, o que ajudará o Brasil. Mas, por outro, o banco espera condições financeiras mais apertadas, com aumento de juros nos Estados Unidos e diminuição dos estímulos monetários na Europa. Com isso, os mercados emergentes, e principalmente os países com risco fiscal, como o Brasil, poderão ter mais dificuldades para atrair investimentos.

— A reforma tributária de Trump vai pressionar os gastos do governo americano. Com isso, o Banco Central dos EUA pode ter que elevar mais os juros do que o mercado previa. Isso afetará os emergentes — disse.

Uma das mudanças favoráveis do quadro brasileiro é o ajuste externo. O país chegou a ter um déficit em conta-corrente de 4% do PIB e hoje é de 0,4%. O Banco Central tem alto volume de reservas e o Investimento Estrangeiro Direto continua forte. Por isso as oscilações externas poderão ser enfrentadas. O Bank of America acredita que o Banco Central poderá manter os juros baixos durante todo o ano que vem. A expectativa dos economistas para hoje é que o Copom reduzirá a Selic para 7%, a menor taxa da série histórica. Dependendo do comunicado, o Banco Central poderá indicar novas quedas, para a casa de 6% no ano que vem.

— O Brasil poderá ter juros menores do que os do México, que está com a taxa em 7%. Isso vai ajudar na recuperação — explicou Beker.

A percepção da população é diferente da visão do mercado financeiro e do que dizem os índices. Apesar da melhora nos indicadores, a sensação de crise permanece porque o país melhorou mas está distante ainda do ponto em que estava. Quando um indicador sobe, como a produção industrial de outubro, divulgada ontem, consegue apenas reduzir a dimensão da queda.

 

 


Míriam Leitão: O terceiro passo

O resultado do PIB do terceiro trimestre se saberá na próxima sexta-feira e há uma expectativa entre quem acompanha os dados de que a economia tenha crescido 0,3%. Mas o mais importante é que as projeções indicam que o investimento voltou a crescer, apesar de todas as incertezas políticas. A alta do PIB pelo terceiro trimestre será puxada pela compra de máquinas e pelo consumo das famílias.

O Banco Central divulgou, dias atrás, um resultado positivo para a atividade no terceiro trimestre, mas há vários outros sinais de recuperação em vendas do varejo, emprego formal e, principalmente, arrecadação. Com os dados antecedentes disponíveis, os economistas acreditam que haverá um novo número positivo no PIB, após as altas de 0,2% no segundo trimestre e de 1% entre janeiro e março. No começo de ano o protagonismo esteve com a agropecuária, agora a reação da economia é mais abrangente. Pelo índice de difusão da consultoria GO Associados, 77,1% das séries acompanhadas pelo IBGE estão no terreno positivo. Inclusive o investimento no período entre julho e setembro, após uma sequência de 14 quedas em 15 trimestres. No ano passado, ele havia encolhido 10,2% depois de ter retraído 14% em 2015. A estimativa da GO é que a Formação Bruta de Capital Fixo tenha crescido 2,2% na comparação com o segundo trimestre.

— Esse avanço não é sazonal, parece mais consistente. As vendas de máquinas e equipamentos estão crescendo. A construção, que é outro segmento relevante do investimento, ainda não reagiu porque os estoques estão altos. Mas a queda nos juros tende a destravar as obras. Os setores de energia e de óleo e gás já têm dados interessantes — conta Gesner Oliveira, da GO.

Essa saída da recessão é lenta, mas tem ficado mais consistente, apesar de ter sido um trimestre conturbado na política. O governo dedicou seu tempo e sua influência para barrar as denúncias contra o presidente Michel Temer. A primeira delas foi rejeitada pela Câmara em agosto. O Planalto continuou fazendo concessões nos meses seguintes para travar as investigações da segunda ação da Procuradoria-Geral da República. Esse foi o foco do governo até outubro. Apesar disso os indicadores apontam que a economia real conseguiu reagir.

O Santander espera alta de 0,3% do PIB na comparação com o segundo trimestre. A virada fica mais clara quando se compara com o mesmo período de 2016. Por esse recorte, a economia avança a um ritmo mais forte, de 1,4% pela estimativa do banco. No segundo trimestre, pela mesma comparação, a alta foi de apenas 0,3%.

Os especialistas explicam que a economia teve uma reação em cadeia neste ano, daí vem o otimismo com os próximos meses. O clima ajudou e a supersafra de grãos derrubou a inflação. Isso provocou um ganho real de renda e os consumidores foram às compras, impulsionadas também pela liberação do FGTS. Estima-se que o consumo das famílias, responsável por mais de 60% do PIB, avançou ao ritmo de 2% no terceiro trimestre. A demanda maior aqueceu o mercado de trabalho; a massa de rendimentos cresceu 2,4%. E o IPCA comportado permitiu ao BC reduzir os juros.

— O efeito dos juros menores ainda não foi totalmente refletido na economia. A redução vai continuar ajudando às empresas e famílias. E já é possível ver pequenos pontos de melhora. A parcela da renda dedicada ao pagamento de juros, por exemplo, caiu de 24% para 23%. Mas é como se a renda dos consumidores tivesse crescido 1% nos últimos meses — conta Mauricio Molan, economista-chefe do Santander.

Os dados da atividade levaram especialistas a rever estimativas. A consultoria Tendências agora espera alta de 0,4% no PIB do trimestre, mais que o 0,2% original. O diagnóstico é semelhante ao de outras consultorias. O consumo reagiu e os investimentos pararam de cair. A expectativa para o PIB do ano está sendo revista para algo próximo a 0,9%.

— A economia começa a pegar tração. No último trimestre do ano, a taxa deve chegar a 2% na comparação com 2016, e vai continuar subindo em 2018. Trimestre a trimestre, as estimativas são revisadas para melhor — conta Bruno Levy, da Tendências.

Há projeções mais otimistas para 2018, de até 3,2% de alta no PIB. O problema continuará sendo a absoluta incerteza política.

 


Cristovam Buarque: Comemoração incompleta

Daqui a cinco anos, o Brasil ingressará no terceiro centenário de sua história como país independente. Neste 7 de setembro, aos 195 anos de nossa independência, é possível comemorar o que nossos antepassados conseguiram.

Atravessamos quase 200 anos consolidando um imenso território soberano e unificado por redes de transporte, de comunicações, de distribuição de energia, a economia brasileira está entre as maiores do mundo no valor do produto, passamos de 200 milhões de habitantes. Não há dúvida de que temos que comemorar os primeiros dois séculos.

Mas se, no lugar de olharmos para a história, olharmos ao redor, a festa perde seu brilho. Comemoramos um elevado PIB, o oitavo do mundo, mas 84º por habitante, por causa de nossa baixa produtividade.

Igualmente grave, nossa economia se concentra em bens agrícolas e minerais ou indústrias tradicionais, porque somos um país de baixa capacidade de inovação.

Do ponto de vista social, carregamos a vergonha de sermos campeões em concentração de renda, temos formidáveis ilhas de riqueza e um trágico mar de pobreza.

Chegamos ao nosso terceiro século divididos tão brutalmente que podemos nos considerar um sistema de apartação, um país onde a população está dividida e separada por “mediterrâneos invisíveis” intransponíveis.

Somos um país integrado fisicamente e desintegrado socialmente. Por isso, somos hoje, em parte, campeões de violência urbana com mais de cem mil mortos por ano, 50 mil assassinatos e 45 mil vitimados por acidentes de trânsito.

Na política, apesar de comemorarmos o aniversário com um sistema democrático e instituições funcionando, em nenhum outro momento tivemos uma classe política tão desacreditada.

As promessas foram descumpridas, a corrupção se alastrou, os partidos se desfizeram, as finanças públicas foram quebradas, as estatais arrombadas, as corporações dividiram o país em republiquetas sem sentimento nacional.

A sensação é de que o país entra no seu terceiro século desagregando-se, sem coesão social, sem rumo histórico.

O mal-estar se explica por muitas causas, mas certamente a principal está no descaso com a educação de nossa população, desde a primeira infância. Chegamos ao nosso terceiro século com 13 milhões de compatriotas adultos incapazes de reconhecer a própria bandeira da República, por não saberem ler o lema “Ordem e Progresso”.

Além destes, segundo o IBGE, são quase 28 milhões de adultos analfabetos funcionais, apenas um pequeno número de jovens recebe formação necessária para construir a economia e a sociedade do conhecimento que vai caracterizar o século adiante.

Passados dois séculos, ainda somos um país com baixíssimo grau de instrução e com abismal desigualdade no acesso à educação conforme a renda da família.

E não seria difícil fazer com que, bem antes do quarto século, o Brasil conseguisse ser um país com educação de qualidade para todos: os filhos dos mais pobres em escolas com a mesma qualidade dos filhos dos mais ricos; uma sociedade que não dispensaria um único talento intelectual de sua população. Sem isso, certamente não teremos o que comemorar quando o quarto centenário chegar.

 

 

http://noblat.oglobo.globo.com/artigos/noticia/2017/09/comemoracao-incompleta.html


Samuel Pessoa: Não há no Brasil expansão fiscal autofinanciável

Política contracíclica de 2009 e 2010 não trouxe os resultados esperados

Por muito tempo acreditei que a política contracíclica fiscal e parafiscal praticada entre 2009 e 2010 no Brasil tinha sido bem-sucedida. Houve excessos, mas o resultado em geral teria sido positivo.

Hoje penso diferente. Acho que, se não tivéssemos feito nenhuma política contracíclica fiscal e parafiscal, teria sido melhor.

E o motivo é que a ausência desse tipo de política contracíclica teria produzido forte queda da inflação, o que permitiria um ciclo sustentável de queda da taxa de juros -forma mais eficiente de política contracíclica em economias com juros reais e inflação elevados.

Uma forma de avaliar a política contracíclica realizada no biênio 2009-2010 é comparar o desempenho econômico do Brasil com nossos pares, os países da América Latina excluindo o Brasil, grupo que chamarei de AL-ex.

Entre 1985 e 1994, o crescimento da AL-ex foi de 3%, ante 2,8% do Brasil. De 1995 até 2002, foi de 2,1%, ante 2,4% para o Brasil; e de 2003 até 2008, de 5%, ante 4,2% para o Brasil. Com exceção do período FHC, rodamos um pouco abaixo da AL-ex, mas próximos.

No biênio 2009-2010, a AL-ex andou a um ritmo anual de 1,6%, enquanto o Brasil cresceu 3,6% em média. Esses números sugerem que a política contracíclica que praticamos no biênio foi bem-sucedida. No entanto, quando olhamos um período um pouco mais longo, entre 2009 e 2014, a AL-ex cresceu 2,9% na média anual, comparado a 2,6% do Brasil.

Ou seja, com todo o ativismo observado entre 2009 e 2014, nosso desempenho foi pior do que o de nossos pares. A comparação é ainda pior, pois no final de 2014 o Brasil tinha acumulado desequilíbrios que comprometeram ainda mais o crescimento posterior.

Senão, vejamos. O Brasil registrava, no final de 2014, inflação de 6,5% e com forte inércia, pois a média da inflação entre 2010-2014 fora de 6,1%; represamento dos preços administrados de 20%, o que viria a adicionar cinco pontos percentuais na inflação (de um ano); e deficit externo de 4,5% do PIB, o que viria a requerer ajuste do câmbio, novamente com efeitos inflacionários; além de um deficit primário, somente da União, de 1% do PIB.

O ativismo não compensa. Rapidamente chega uma conta bem salgada.

Há uma crença - principalmente entre economistas heterodoxos brasileiros - de que o ativismo fiscal é autofinanciável. Isto é, que o ganho de crescimento promovido pelo aumento do gasto público é tão intenso que, no médio prazo, o ativismo fiscal produz redução da relação dívida-PIB: a elevação da dívida pública que financia o ativismo fiscal é mais do que compensada pelo crescimento econômico adicional.

Os professores J. Bradford DeLong, da Universidade de Berkeley, e Lawrence H. Summers, da Universidade Harvard, no artigo "Fiscal Policy in a Depressed Economy", publicado no Brookings Papers on Economic Activity, no fascículo da primavera de 2012, derivaram a condição para que o ativismo fiscal seja autofinanciável.

O leitor curioso pode conferir a expressão matemática número (7) à página 239. Em economias de juros reais elevados, não há a menor possibilidade de a condição ser atendida: não há no Brasil expansão fiscal autofinanciável.

Se alguém discordar e conseguir provar o contrário, terá em mãos um excelente trabalho acadêmico, que com certeza será publicado em um "top journal" (isto é, no seleto grupo das melhores revistas acadêmicas de economia do mundo).

O desafio está lançado.
* Samuel Pessôa é físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador associado do Ibre-FGV.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa/2017/06/1893791-nao-ha-no-brasil-expansao-fiscal-autofinanciavel.shtml


Denis Lerrer Rosenfield: O impasse

Analisando o cenário político, torna- se inevitável utilizar conceitos militares: a elite da classe política está sendo dizimada. Os mais importantes partidos estão envolvidos nas delações agora vazadas e tornadas públicas. PT, PMDB, PSDB, PRB, PP e outros foram delatados, em depoimentos bastante verossímeis, cujas provas serão logo apresentadas.

Ex-presidentes entraram também na lista, com grande destaque para Lula e Dilma Rousseff. O primeiro terá pouquíssimas chances de ser candidato novamente, apesar de sua demagogia e da estridente defesa de seus advogados, diretos ou indiretos. Oito ministros do presidente Michel Temer foram acusados, levantando uma pesada sombra sobre seu governo. Seu afastamento da sociedade tende a aumentar se mantiver o status quo. Um terço do Senado foi acusado, bem como expressivo número de deputados, embora proporcionalmente menor.

Como pode um país seguir adiante com tal falta de representatividade de sua classe política? A sociedade não se reconhece em seu governo nem em seus parlamentares. Na verdade, nem os considera “seus”, mas deles mesmos, por estarem envolvidos na corrupção, agindo de costas e à revelia do conjunto da Nação. Desconhecem o significado de bem coletivo, do que é a coisa pública.

É bem verdade que estamos na etapa de abertura de inquéritos, ainda vai ser decidido quem é culpado ou inocente. Não se pode prejulgar juridicamente o desenlace das denúncias e dos posteriores julgamentos. Todavia a defesa dos envolvidos é por demais precária, todos repetem o mesmo mantra de que são inocentes ou ainda não foram julgados… Poucos se voltam para o real esclarecimento dos fatos que os incriminam.

Um olhar desavisado levaria a acreditar que todos são santos e os delatores, mentirosos, como se estes não corressem o risco de perder os benefícios da colaboração premiada se não respeitarem a verdade. Os políticos só aumentam a sua falta de credibilidade. Não transmitem confiança à sociedade. E assim propiciam um julgamento político, irreversível, de que são culpados. Seriam péssimos atores. A sociedade clama por mudanças e reafirma com força a moralidade pública, valor que ela percebe como inexistente em nossos governantes e representantes.

Acontece que o País não pode parar. Se o fizer, acoplar-se-á a essa enorme crise política, agravando a crise econômica e social, isso quando começamos a observar certas tendências que estão revertendo a curva no que diz respeito a inflação, PIB, investimento e desemprego. Tudo é ainda muito incipiente, continuando tributário das turbulências políticas. Em pouco tempo o novo governo muito fez na área socioeconômica, embora pouco tenha apresentado no quesito da moralidade pública. Vivemos um impasse que se pode traduzir tanto num avanço quanto numa reversão das expectativas.

As reformas aprovadas pelo governo Temer, como as do teto do gasto público e da terceirização, são estruturantes no que diz respeito ao presente e ao futuro do País. Devem ser necessariamente complementadas pelas da Previdência e da modernização da legislação trabalhista. Se estas não forem feitas por causa da crise política, não só o governo se fragiliza, como o País terá sérios problemas, ainda mais agudos, nos próximos anos. E qualquer que seja o próximo presidente, de “esquerda” ou de “direita”, terá inevitavelmente de enfrentar essas questões. Melhor fazê-lo agora, pois seu custo será menor; caso contrário vai aumentando com o correr do tempo e com a inércia governamental, política e partidária. O resto é mera encenação demagógica.

Dentre os sérios problemas do atual governo está o seu déficit de comunicação, pois não tem conseguido transmitir à sociedade a necessidade dessas mudanças. Termina se consolidando na opinião pública a ideia de que elas ferem “direitos” e seriam de natureza “neoliberal”. Os eleitores, capturados pela desinformação, exigem de seus parlamentares, por exemplo, que votem contra a reforma da Previdência. Tal discurso acaba por disseminar essa percepção, como se tudo dependesse de vontade política na distribuição dos recursos públicos.

Na perspectiva da esquerda e de uma direita irresponsável, toda a discussão passa a ser focada na estrita esfera distributiva, não levando em conta a produtiva. Discute-se a ampliação dos benefícios sociais, os ditos “direitos” das corporações, a criação de novos privilégios, e assim por diante, como se os recursos do Tesouro fossem inesgotáveis. Daí, pode vir a tornar-se encarniçada a luta entre as corporações incrustadas no Estado e o restante da população, que não goza os mesmos benefícios. Assim sendo, os dispêndios do Estado logo se tornarão muito superiores às suas receitas, levando a uma situação de insolvência que, por sua vez, aguça ainda mais os conflitos sociais.

As políticas públicas, e os partidos, deveriam estar mais voltados para as condições de produção de riquezas, de tal modo que os recursos à disposição do Estado possam também aumentar. Quanto mais rica for a sociedade, maior será a sua capacidade distributiva. Quanto mais insistir num distributivismo social sem amparo produtivo, menor será a sua própria capacidade distributiva, além de hipotecar a riqueza presente e a futura. Criam-se, dessa forma, condições de asfixia da capacidade produtiva, que seriam concretizadas por aumentos de impostos e contribuições voltadas para financiar os déficits previdenciários.

O Estado de bem-estar, também dito previdenciário, deve enfrentar o problema de financiamento da sua Previdência, uma vez que o seu crescimento exponencial não cabe mais dentro de suas disponibilidades de financiamento. Não se trata, como se alardeia, de um problema de “direitos”, mas de como o Estado é capaz de gerir os seus recursos. O bolo é limitado. Uma fatia maior para a Previdência significa fatias menores para saúde, saneamento, educação e habitação.

 

Fonte: O Estado de S. Paulo – 17/04/2017

Foto: Antonio Cruz/EBC


Roberto Freire: Cultura tem papel central na economia do futuro

Dois primeiros volumes do Atlas Econômico da Cultura Brasileira foram lançados em cerimônia realizada no Itaú Cultural, em São Paulo; obra completa, com seis livros, tem conclusão prevista para abril de 2018

Com a presença do ministro Roberto Freire, foi apresentado nesta quarta-feira (5) um trabalho inédito no país e que pode ser fundamental para a compreensão da importância da cultura na composição do PIB (Produto Interno Bruto) nacional. Em evento realizado no Itaú Cultural, em São Paulo, o MinC (Ministério da Cultura) promoveu o lançamento dos dois primeiros volumes da Coleção Atlas Econômico da Cultura Brasileira. Ao todo, serão seis obras que pretendem, utilizando metodologia e critérios unificados de aferição, dimensionar o impacto da cultura na economia.

Além de Freire, participaram do lançamento o secretário de Economia da Cultura do MinC, Mansur Bassit, o secretário de Articulação e Desenvolvimento Institucional, Adão Cândido, e o professor Leandro Valiati, da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul). O diretor do Departamento de Promoção Internacional do ministério, Adam Muniz, e a chefe da representação do MinC em São Paulo, Haifa Madi, também estiveram presentes.

“Precisamos entender tudo isso que está acontecendo. A economia da cultura talvez seja o futuro que estamos discutindo aqui. A cultura será cada vez mais central na economia do futuro. Daí a importância de um Atlas como este que apresentamos hoje”, afirmou Freire. “A história nos ensina muita coisa. O mundo está passando pela maior revolução que a aventura humana já experimentou.”

Segundo o ministro da Cultura, “vivemos mudanças e isso afeta todas as instituições e também as relações humanas”. “Essa sociedade do futuro ainda não tem nome. Não sabemos bem o que vai acontecer, mas temos de nos preparar porque algo acontecerá.”

Investimento e metodologia

Com investimento de R$ 1,3 milhão por parte do MinC, a obra completa da coleção tem conclusão prevista para abril de 2018. Em junho deste ano, deve ser lançado o terceiro volume. Também serão publicados cadernos setoriais contendo informações específicas sobre a cadeia produtiva de setores que compõem a economia da cultura.

Os dois primeiros volumes, que trazem o marco referencial teórico e metodológico que será usado para aferição dos dados, esclarecem que o estudo será apoiado em quatro eixos: empreendimentos culturais, mão-de-obra do setor cultural, investimentos públicos e comércio exterior. O Atlas aponta ainda para algumas das cadeias produtivas que serão estudadas de forma prioritária: audiovisual, games, mercado editorial, música e museus e patrimônio.

Elaborado em parceria com a UFRGS, o Atlas conta com a colaboração de instituições como a Organização das Nações Unidades para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento e Econômico e Social), a Apex-Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), a Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) e o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas).

(Fábio Matos/Assessoria do Ministro)


Paulo Alcantara Gomes: Sem pesquisa, não há futuro...

Há pouco tempo, num artigo publicado nesta coluna (Blog do Noblat, O Globo), mencionei que um dos maiores problemas que temos é a profunda dificuldade em compreender o valor da ciência e da tecnologia para a construção do desenvolvimento.

Na última semana, o Globo mostrou as dificuldades atualmente encontradas por cientistas em dar continuidade aos seus projetos de investigação, muitos deles com expressiva relevância para o nosso crescimento, pois da ciência e da tecnologia surgem as novas oportunidades de geração de emprego e renda, o aumento da competitividade das empresas, a formação de novos quadros de pesquisadores e, consequentemente, um comportamento melhor da nossa economia.

A dimensão da economia brasileira, mesmo vivendo a crise atual, exige que se dê mais atenção ao financiamento às atividades de desenvolvimento científico. Estima-se que hoje estamos investindo pouco mais de 1% (1,28%) do Produto Interno Bruto em Ciência e Tecnologia. A Coreia do Sul, por outro lado, aplica 4,5% do PIB em C&T. Resultado: no início dos anos 70 a renda per capita da Coreia do Sul não chegava a US$ 250, cerca de metade da brasileira na época, e o nosso PIB era quatro vezes maior que o da Coreia. Hoje o PIB per capita deles (US$ 36 mil) é mais do que o dobro do nosso (US$ 15 mil).

Como isto foi conseguido?

Priorizando a educação, promovendo a articulação universidade-empresa, apoiando a iniciativa privada, subsidiando áreas estratégicas para o seu desenvolvimento, facilitando o crédito, criando novos postos de trabalho e, evidentemente, estimulando a tecnologia e a inovação. A Coreia do Sul transformou-se numa das líderes na tecnologia da informação e na indústria eletrônica.

A atividade científica depende de dois parâmetros: a garantia de continuidade e o aporte financeiro necessário para a sua manutenção. Quando tais parâmetros não são seguidos adequadamente, alguns cientistas com reconhecimento internacional são obrigados a tomar a difícil decisão de deixar o país, na medida em que desaparecem os insumos para os seus laboratórios, os equipamentos se tornam obsoletos e, consequentemente, muitos resultados são perdidos. Outros tentam dar andamento aos seus projetos e esbarram em dificuldades para aceitação de seus trabalhos em revistas científicas com credibilidade internacional.

A longo prazo, os danos à ciência serão incalculáveis, pois os reflexos sobre os cursos de doutorado, que dependem da qualidade das teses produzidas e dos trabalhos publicados, serão imensos.

Sofrem as universidades e os institutos de pesquisa e também sofrem as empresas que, cada vez mais, utilizam em seus quadros mestres e doutores em áreas estratégicas.

É fácil e é triste imaginar o que vai ocorrer, pois, além da falta de recursos no que sobrou do Ministério da Ciência e Tecnologia, muitas Fundações de Amparo à Pesquisa, como a do Rio de Janeiro, já anunciaram que não vão sequer honrar compromissos anteriormente assumidos.

A diminuição dos recursos também é responsável pela perda da mobilidade internacional, traduzida por pesquisadores visitantes nos laboratórios universitários ou pela participação de pesquisadores nacionais em laboratórios estrangeiros.

No que concerne ao apoio às empresas torna-se imperioso revitalizar as agências de fomento, assegurar o financiamento na modalidade “subvenção econômica”, estimular, utilizando a capacidade instalada nas universidades, a geração de redes laboratoriais que deem apoio aos projetos das empresas (as centrais analíticas) e de centrais de insumos, facilitadoras da importação de materiais de consumo e de componentes.

Na prática, tudo isto significa dar a verdadeira e merecida dimensão ao trabalho dos cientistas e empreendedores que inovam, de forma a garantir o nosso crescimento.
Em caso contrário, o ajuste fiscal, determinante para a recuperação econômica, estará comprometido.

* Paulo Alcantara Gomes é ex-reitor da UFRJ e ex-presidente do SEBRAE/RJ


Fonte: http://noblat.oglobo.globo.com/artigos/noticia/2017/01/sem-pesquisa-nao-ha-futuro.html


Banco Central

BC prevê inflação dentro da meta neste ano e alta menor do PIB em 2017

O Banco Central estimou um comportamento melhor da inflação em 2016 e 2017, retornando para o limite do sistema de metas, e também que a economia brasileira terá um “encolhimento” maior neste ano e uma recuperação mais contida no próximo. As informações constam no relatório de inflação do quarto trimestre, divulgado nesta quinta-feira (22).

Para o PIB (Produto Interno Bruto), o BC estimou um “tombo” de 3,4% neste ano, com piora em relação à previsão anterior, feita em setembro, que era de um recuo de 3,3%.

Se confirmado esse cenário, será a segunda retração seguida da economia brasileira, que já despencou 3,8% no ano passado – a maior queda em 25 anos. Dois anos seguidos de recuo do PIB não acontecem desde o início da série histórica do IBGE, em 1948.

Para 2017, também houve uma revisão da estimativa. Em setembro, a autoridade monetária esperava que o PIB crescesse 1,3% no próximo ano. Agora, prevê um crescimento mais moderado, de 0,8%, ainda acima da estimativa de alta de 0,58% do mercado financeiro.

De acordo com o BC, essa redução, na projeção de crescimento para o próximo ano, é consistente com a “probabilidade maior de que a retomada da atividade econômica seja mais demorada e gradual que a antecipada previamente”. (Com informações do G1)


Fonte: www.pps.org.br


Carlos Henrique de Brito Cruz: Investimento empresarial em P&D no Brasil

Para haver impacto econômico da pesquisa são imprescindíveis empresas inovadoras

Muitas nações conseguem obter substancial impacto econômico com atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em ciência e tecnologia (C&T). No Brasil há muitos casos reconhecidos e claramente a economia brasileira sem P&D seria muito mais atrasada e frágil. Exemplos: produção de energia, extração de petróleo, o maior caso mundial de uso extensivo de bioetanol para transporte, equipamentos e sistemas para telecomunicações, aviões, serviços de software e informática, a agricultura e a pecuária, que fazem do País o celeiro do mundo, todos criados por gente que estudou em nossas melhores universidades, trabalhando em empresas inovadoras. Esses sucessos mostram que vale a pena buscar continuamente os caminhos que façam a economia cada vez mais competitiva, pois vários países parecem obter mais impacto econômico de P&D que nós.

Nos países que têm conseguido os maiores efeitos da pesquisa em sua economia há intensa atividade de P&D realizada por empresas. Essa característica é frequentemente esquecida no debate brasileiro, no qual se consideram universidades como o único lugar da pesquisa. Esse engano prejudica as estratégias nacionais, pois desvia o foco do real problema: a debilidade das atividades de P&D em empresas no País.

Nos EUA, dos US$ 456 bilhões aplicados em P&D em 2013, 71% (US$ 323 bilhões) foram executados por empresas. Desse total o governo federal entrou com apenas 9%, o restante foram recursos das próprias empresas. Na Coreia do Sul, dos US$ 68 bilhões (PPP) aplicados em P&D, a fatia empresarial foi 78% (US$ 53 bilhões – PPP). Na Alemanha o porcentual empresarial representou, no mesmo ano, 68% do total; no Reino Unido, 64%; e na China, 77%.

No Brasil, em 2013, a participação de empresas no dispêndio em P&D foi apenas 40% do total nacional, de US$ 40 bilhões PPP (indicadores do MCTI em https://goo.gl/cRveWf). Pior, o porcentual empresarial vem caindo: em 2000 foram 47%. Indicadores de C&T do MCTI mostram que em 2000 havia 44.183 pesquisadores trabalhando para empresas. Em 2010, após uma década de esforços de apoio e incentivos, esse número caiu a 41.317, parecendo refletir a queda precoce da participação da indústria no PIB nacional.

Enquanto cada vez mais lideranças empresariais defendem a necessidade de mais P&D e inovação, as regras da economia brasileira criam um ambiente hostil para tal. Não são só crises ética, fiscal, política e econômica instaladas nos últimos anos. Trata-se, além e antes disso, de protecionismo em excesso, do fechamento da economia, da autoexclusão do Brasil dos grandes acordos comerciais mundiais, dos altos custos trabalhistas, da complexidade tributária, que beira a irracionalidade. O baixo esforço privado em P&D no Brasil não é resultado – como é comum ouvir no meio acadêmico – de certo desvio de conduta das lideranças empresariais; é a resposta lógica a uma economia em que a tecnologia raramente é determinante para a posição da empresa no mercado.

Ao lado do tímido esforço de P&D empresarial, um óbice adicional à realização de mais impacto econômico é a falta de ousadia das empresas, que, em geral, se concentram em atividades adaptativas locais. Veja-se o número de patentes internacionais que as empresas no Brasil obtêm. A revista Pesquisa Fapesp(https://goo.gl/jmkUE7), tratando exclusivamente de patentes obtidas por empresas (não universidades ou institutos), mostra que, de 2011 a 2015, para cada 10 mil pesquisadores empregados as empresas do Brasil obtiveram 32 patentes no Escritório de Patentes dos EUA (USPTO). Para as empresas da China, os mesmos 10 mil pesquisadores criaram 47 patentes; na Coreia do Sul, 519; na Alemanha, 648; e nos EUA, 1.082. No Brasil, entre os 10 maiores solicitantes de patentes há apenas 3 empresas (sendo a primeira uma multinacional), os outros 7 são universidades e institutos de pesquisa. Nos EUA, entre os 10 maiores solicitantes, 10 são empresas; na Alemanha, 9.

Outro equívoco comum no debate brasileiro sobre impacto da pesquisa é supor que a pesquisa colaborativa com universidades será uma peça essencial para superar esse quadro. A colaboração com universidades e laboratórios públicos é importante e tem sido muito estimulada, mas vai bem além da pesquisa colaborativa, seja na formação de pessoal, seja no acesso ao conhecimento público produzido pela pesquisa acadêmica. Nos EUA, dos US$ 270 bilhões gastos por empresas (de seus próprios recursos) para P&D, apenas 1,3% foi dirigido a contratar P&D em universidades. Não é a colaboração com universidades, sozinha, que faz a empresa dos EUA ser inovadora, é o esforço próprio das empresas em seus laboratórios e centros de P&D, onde empregam gente educada nas universidades.

Universidades podem ser determinantes para criar impacto econômico na sociedade e para isso é preciso uma instância mediadora ligada ao mercado, a empresa. Podem ser empresas já bem estabelecidas com vigorosos esforços próprios de P&D ou empresas iniciadas por estudantes ou professores universitários, também com esforços próprios de P&D. Para criar prosperidade empresas precisam de pessoas capazes de ter ideias e de desenvolvê-las – pessoas educadas em universidades com referenciais acadêmicos elevados e atividades intensas de pesquisa, onde desenvolvem sua capacidade intelectual e aprendem a enfrentar problemas usando o método da ciência.

Sem empresas com expressiva atividade própria de P&D o Brasil não conseguirá ser competitivo e criar riqueza com base em conhecimento. Para que as empresas no País possam dedicar-se à inovação é necessário um ambiente econômico que favoreça a competição. Não se trata apenas de haver incentivos explícitos, subvenções e financiamentos, trata-se de algo bem mais sofisticado e complexo: criar no País, para o bem do interesse público, um ambiente estimulante à inovação empresarial.

*  Carlos Henrique de Brito Cruz - Diretor Científico da Fapesp


Fonte: http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,investimento-empresarial-em-ped-no-brasil,10000090668