dia da consciência negra

Arte: João Rodrigues/FAP

Gabriela Cruz: “Ações afirmativas nas instituições faz parte da luta antirracista"

João Rodrigues, da equipe da FAP

Após discutir temas como as conquistas do movimento negro, mulheres pretas na política e o combate ao racismo estrutural, a série de entrevistas em celebração mês da Consciência Negra chega ao seu quarto e último episódio. No programa anterior, o convidado foi o professor Ivair Augusto Alves dos Santos.

Para analisar a luta contra o racismo institucional, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) recebe Gabriela Cruz, presidente nacional do Tucanafro e integrante da direção da Federação PSDB-Cidadania. Ela é especialista em Educação e foi secretaria de Ações Afirmativas do Ministério dos Direitos Humanos - SEPPIR - Governo Federal.



A ampliação de pessoas negras em outros campos e estrutura de poder da sociedade, os caminhos para o protagonismo dos estados e municípios na luta antirracista e as perspectivas com a recriação do Ministério da Igualdade Racial também estão entre os temas do programa. O episódio conta com áudios do programa “Racismo estrutural e racismo institucional”, do canal oficial do Carrefour Brasil no Youtube, e do site oficial do Olodum.

O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google PodcastsAnchorRadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues.

RÁDIO FAP




Arte: João Rodrigues/FAP

Ivair dos Santos: “Combate ao racismo precisa ser prioridade do Estado"

João Rodrigues, da equipe da FAP

Hoje, 19 de novembro, a série de entrevistas da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) em celebração mês da Consciência Negra chega ao terceiro episódio. Com a participação da gestora pública e ativista social Raquel Dias, o último programa teve como tema mulheres negras e a política. O primeiro convidado foi o professor doutor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Ivanir dos Santos, que falou sobre as lutas do movimento negro nas últimas décadas.

Para analisar os desafios para a equidade racial no Brasil, o podcast Rádio FAP desta semana conversa com Ivair Augusto Alves dos Santos, doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília (UnB). Mestre em Ciência Política pela Universidade de Campinas (Unicamp), integrante do Conselho Curador da FAP, ele é ex-diretor do Departamento de Direitos Humanos da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.



Exemplos internacionais na luta antirracista, as conquistas do movimento negro e os porquês das dificuldades para eleição de candidatos negros também estão entre os temas do programa. O episódio conta com áudios da TV Senado e do site oficial do Olodum.

O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google PodcastsAnchorRadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues.

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Arte: João Rodrigues/FAP

Raquel Dias: “Mulheres negras não podem ser invisíveis na política”

João Rodrigues, da equipe da FAP

Estimular a reflexão sobre a luta do povo negro pela igualdade. Esse é um dos objetivos do Dia da Consciência Negra, comemorado em 20 novembro. Para celebrar a importância da data, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) iniciou na semana passada uma série de entrevistas especiais. O primeiro convidado foi o professor doutor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ivanir dos Santos.

Na sequência da série “Mês da Consciência Negra”, o podcast Rádio FAP bate um papo com a gestora pública e ativista social Raquel Dias. Integrante do Conselho Consultivo da FAP, ela é diretora de educação e articulação social da Àwúre Educa, plataforma educacional do Ministério Público do Trabalho (MPT), Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Fundo das Nações Unidas Pela Infância (UNICEF).



Apesar de 27% da população feminina se declarar negra, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mulheres negras representam apenas 2% do Congresso Nacional. Essa falta de representatividade é o principal tema do episódio. Cotas para mulheres na política, ações afirmativas e as perspectivas para o novo governo, liderado pelo ex-presidente Lula, também estão entre os temas do programa, que conta com áudios da Rede TVT e African Drums Company.

O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google PodcastsAnchorRadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues.

RÁDIO FAP




João Jorge: Ações afirmativas contra a desigualdade racial

Mestre em Direito Público pela UnB, João Jorge é o entrevistado desta semana no podcast Rádio FAP

João Rodrigues, da equipe da FAP

Lembrar a resistência do povo negro para avançar na luta por uma sociedade livre de toda forma de opressão. Esse é um dos principais objetivos do Dia da Consciência Negra, celebrado neste sábado, 20 de novembro. A data foi instituída oficialmente pela Lei nº 12.519, de 10 de novembro de 2011, e faz referência à morte de Zumbi, o então líder do Quilombo dos Palmares – situado entre os estados de Alagoas e Pernambuco, na região Nordeste do Brasil.

Para falar sobre a luta por igualdade racial no Brasil, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) desta semana conversa com o presidente do Olodum, João Jorge Santos Rodrigues. O programa tem, ainda, a participação do jornalista Sionei Ricardo Leão, membro do Conselho Curador da FAP, e de George Gurgel, professor da Universidade Federal da Bahia.
Ações de combate à discriminação social, a importância do incentivo a autoestima e ao orgulho dos afro-brasileiros e a batalha para assegurar os direitos civis das pessoas marginalizadas estão entre os temas abordados no programa. O episódio conta com áudios da banda Olodum e do canal oficial no Youtube de Michael Jackson.



O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google Podcasts, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues. A edição-executiva é de Renato Ferraz.

Em seu livro, o presidente do Olodum destaca que a luta pela igualdade é uma batalha de todos e destaca que a ideia é conscientizar a sociedade de maneira plural. Foto: Arquivo pessoal

Saiba mais
João Jorge Santos Rodrigues é mestre em Direito Público pela Universidade de Brasília. Desde de julho de 1983 faz parte do Grupo Cultural Olodum, atuando nas últimas décadas como presidente. É ex-membro do conselho curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e ex-diretor da Fundação Gregório de Mattos. Produtor cultural, poeta e escritor, João Jorge lançou o livro em setembro o livro “Fala Negão, o Discurso sobre a Igualdade”, segunda publicação do presidente do Olodum e militante da luta social negra. Trata-se de uma coletânea de textos escritos e publicados, além de registros de conferências e entrevistas realizadas no período de 1983 a 2021. No livro, o presidente do Olodum destaca que a luta pela igualdade é uma batalha de todos e destaca que a ideia é conscientizar a sociedade de maneira plural.




João Jorge, presidente do Olodum, fala sobre o Dia da Consciência Negra

Mestre em Direito Público pela UnB, João Jorge é militante da luta social negra há mais de 40 anos

João Rodrigues, da equipe da FAP

Lembrar a resistência do povo negro para avançar na luta por uma sociedade livre de toda forma de opressão. Esse é um dos principais objetivos do Dia da Consciência Negra, celebrado neste sábado, 20 de novembro. A data foi instituída oficialmente pela Lei nº 12.519, de 10 de novembro de 2011, e faz referência à morte de Zumbi, o então líder do Quilombo dos Palmares – situado entre os estados de Alagoas e Pernambuco, na região Nordeste do Brasil.
Para falar sobre a luta por igualdade racial no Brasil, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) desta semana conversa com o presidente do Olodum, João Jorge Santos Rodrigues.

Confira o vídeo da Fundação Astrojildo Pereira.




Reconhecimento de João Cândido como herói enfrenta resistência da Marinha

Força diz não reconhecer heroísmo no movimento que exigiu fim da chibata; projeto que o declara herói avançou no Senado

Fernanda Canofre / Folha de S. Paulo

"A Marinha me pediu que eu pedisse vistas, que ela me traria vários argumentos e documentos que eu não conheço", explicou o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), por videoconferência, em uma sessão da Comissão de Cultura, Educação e Lazer do Senado.

Na ocasião, no começo de outubro, era discutido o projeto de lei que propunha inserir o nome de João Cândido Felisberto, líder da Revolta da Chibata (1910), no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.

Duas semanas depois, em 28 de outubro, o senador deu voto favorável à proposta, aprovada por unanimidade na comissão, mas pediu licença para ler a nota enviada pela Marinha.

Nela, é defendida uma posição expressa há anos: a Marinha cita quebra de hierarquia e disciplina e diz não considerar o movimento —que teve cerca de 2.300 marinheiros amotinados pelo fim do castigo físico— "ato de bravura" ou de "caráter humanitário".

A nota da Marinha fala das ameaças de bombardeio à cidade do Rio e afirma que vidas foram sacrificadas, incluindo duas crianças, atingidas por projétil —historiadores dizem que os marinheiros juntaram dinheiro para ajudar as famílias delas.

A Marinha diz ainda não considerar que os castigos físicos estivessem corretos, mas salienta que reconhecer erros não justifica avalizar outros, citando a exaltação das ações dos revoltosos como exemplo.

​Caso o projeto avance na Câmara dos Deputados e seja sancionado, será a conclusão de mais de uma década de tentativas de reconhecer o "Almirante Negro", oficialmente, entre os nomes da história nacional.

Para que um nome seja gravado no Livro de Aço é preciso que uma lei ordinária seja aprovada nas duas Casas, por maioria simples, e sancionada pela Presidência da República. O livro tem hoje 49 nomes inscritos e outros 9 já aprovados —os mais recentes foram inseridos em 2018.

Relator do projeto na comissão do Senado, Paulo Paim (PT-RS) foi também o primeiro a propor o reconhecimento de João Cândido na Casa, por meio de um projeto de lei que acabou arquivado na Câmara. O atual é de autoria do ex-senador Lindbergh Farias (PT-RJ).

Ao ver a comissão aprovando, em setembro, a homenagem a Alberto Mendes Jr., tido como herói e patrono da Polícia Militar de São Paulo, ele diz que aproveitou para trazer a proposta sobre o marinheiro de volta à pauta.

"Se a Marinha tivesse pressionado senadores, não tenha dúvida que não teria essa votação unânime. Quando fui para a votação, tinha dúvidas se íamos conseguir aprovar", diz Paim. "Se a Marinha jogasse pesado, o projeto não seria aprovado. Eu não tenho dúvida".

A Marinha não respondeu às perguntas enviadas pela Folha.

Paim propôs reconhecer João Cândido como herói nacional em 2007, um ano antes de o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionar o projeto de Marina Silva (na época, PT-AC), que concedeu anistia póstuma a ele e aos outros marinheiros da revolta.

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O trecho que garantia todos os efeitos da anistia, citando promoções que os anistiados teriam tido direito caso tivessem seguidos no serviço ativo e pensão por morte, foi vetado. A justificativa do governo foi o impacto orçamentário que geraria para a União.

Na época da revolta, a anistia foi aprovada por unanimidade no Congresso, mesmo assim, marinheiros foram presos, outros expulsos da Marinha, alguns fuzilados.

O próprio João Cândido foi expulso, preso, morreu pobre anos depois e nunca foi promovido a almirante, apesar de ter sido chamado assim pela imprensa e pela população da época.

"Foi uma batalha enorme para fazer essa aprovação, e a razão é sempre de natureza política e ideológica", diz Marina. "Essa visão reacionária está dentro do Congresso desde sempre", afirma.

"Os atos de reparação por parte do Estado quando se comete erros, crimes, danos são previstos na lei. É justo que, da mesma forma que haja atos de reparação em relação às vítimas da ditadura militar, nesse caso também haja ato de reparação para os familiares", avalia.

Ainda em 2008, Lula inaugurou uma estátua de João Cândido no Rio, em um evento sem a Marinha ou representante do Ministério da Defesa.

"Precisamos aprender a transformar os nossos mortos em heróis", declarou. À Folha a Marinha afirmou que não reconhecia heroísmo no movimento, mas não se opunha à estátua.


Foto: AFP
Foto: AFP
Foto: Olivier Doullery / AFP
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas
Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas
Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas
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Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas
Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas
Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas
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"Como os rebeldes deixaram claro, tratava-se de uma revolta contra o uso de castigos físicos, contra as condições de trabalho e os baixos salários. Embora proibida pela Constituição, legislação paralela permitia a continuação das chibatadas na Marinha (no Exército, usavam-se as espadeiradas) e isto 22 anos depois da abolição da escravidão", aponta o historiador José Murilo de Carvalho.

"Na expressão usada pelos rebeldes, queriam uma Armada de cidadãos, não uma fazenda de escravos. A Marinha tinha tido tempo mais que suficiente para fazer as mudanças exigidas pelas novas tecnologias no recrutamento de praças, no treinamento de praças e oficiais, já adotadas em outras Marinhas e não o fez. Tínhamos os melhores encouraçados do mundo numa organização totalmente defasada".

Assessor de Marina Silva na época do projeto de lei, Erlando Melo conta que, tentando entender as dificuldades para a pauta avançar, ouviu de outros assessores petistas que a Marinha tinha objeções a ela.

​"Lá na Câmara, no Salão Verde, conversei com um assessor da Marinha, que não lembro do nome, e ele me externou a divergência deles com o que foi publicado nos livros de história sobre a Revolta da Chibata", lembra.

Mais de uma década depois, o deputado federal Chico D’Angelo (PDT-RJ), autor de um projeto semelhante ao aprovado no Senado, diz que recebeu duas vezes em seu gabinete pessoas da Marinha, contando sobre a história da corporação, depois de ter apresentado a proposta, em 2019.

"Eram pessoas com uniforme da Marinha, tinham um papel muito educado, conheciam a história do João Cândido, mas pediam que eu retirasse o projeto em função da quebra de hierarquia", diz ele.

"Eu sei a importância da Marinha, mas são coisas distintas. A história do João Cândido é muito importante para a história do Brasil."

Pouco depois de a proposta começar a tramitar, o então presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), apresentou requerimento para que o projeto fosse examinado na sua comissão —o senador Chico Rodrigues (DEM-RR) fez solicitação semelhante no Senado, retirada depois.

O texto do pedido diz que "a matéria está claramente inserida no campo temático" da comissão.

Longe do Congresso Nacional, João Cândido é reconhecido como herói estadual no Rio de Janeiro, e municipal em São João do Meriti, na Baixada Fluminense, onde morou a maior parte da vida, e, desde agosto, em Encruzilhada do Sul (RS), sua terra natal. Foto: Pedro Franca/Agência Senado

"Cabe destacar que o projeto de lei nada menciona sobre a subversão da hierarquia e da disciplina militares, dos assassinatos cometidos em pleno navio na cidade do Rio de Janeiro, vitimando inclusive crianças. Portanto, reconhecer erros não justifica avalizar outros, exaltando as ações dos revoltosos", segue.

Com o projeto parado desde então, porém, D’Angelo pediu à presidência que o texto voltasse à Comissão de Cultura, onde tradicionalmente tramitam propostas do tipo. "A expectativa é que na Comissão de Cultura a gente aprove isso, como foi aprovado o Senado", diz ele.

Longe do Congresso Nacional, João Cândido é reconhecido como herói estadual no Rio de Janeiro, e municipal em São João do Meriti, na Baixada Fluminense, onde morou a maior parte da vida, e, desde agosto, em Encruzilhada do Sul (RS), sua terra natal.

"Foi muito bem aceito aqui, inclusive pelos movimentos negros do nosso município, que sempre lutaram pelo reconhecimento do João Cândido", diz o vereador Adriano Horna (Republicanos), autor da proposta no município gaúcho de 26 mil habitantes.

O projeto aprovado na comissão agora segue para análise na Câmara, já que o prazo para recurso no Senado se encerrou no último dia 10.

"O que aconteceu há 110 anos não pode ser motivo, com a evolução dos tempos, de não reconhecer a bravura da história dele. Zumbi mesmo se levantou contra o poder da época, foi morto e está nos Heróis da Pátria, Tiradentes também", diz Paim.

"Se houve um erro naquela época —como houve, a Marinha reconhece que houve exagero— se tudo isso é verdadeiro, não há motivo de não dar a justiça pós-morte a alguém que já foi anistiado, homenageado."

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/11/reconhecimento-de-joao-candido-como-heroi-enfrenta-resistencia-da-marinha.shtml


João Cândido nunca existiu na Marinha, disse líder da Revolta da Chibata

Documentos sobre ele foram localizados apenas em 2008 por pesquisadores, no Arquivo Nacional

Fernanda Canofre / Folha de S. Paulo

Em 1968, um ano antes de morrer, João Cândido Felisberto, o homem que ficou conhecido como líder da Revolta da Chibata (movimento de 1910 que acabou com os castigos físicos na Marinha), concedeu uma entrevista onde recordava sobre o episódio e sua vida como marinheiro.

"João Cândido nunca existiu na Marinha", disse ele ao MIS (Museu da Imagem e do Som).

No fim de outubro, comissão do Senado aprovou proposta para incluir o nome do marinheiro no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. ​Caso o projeto avance e seja sancionado, será a conclusão de mais de uma década de tentativas de reconhecer o "Almirante Negro", oficialmente, entre os nomes da história nacional.

Revolta da Chibata, A bordo do navio São Paulo, Rio de Janeiro, 26/11/1910
Revolta da Chibata, a bordo do navio São Paulo, em 1910 - Reprodução

Há mais de 50 anos, o entrevistador questiona se é verdade que nos arquivos da Marinha não consta nada em seu nome.

"Foi sonegado. Sonegado mesmo. Pelo fato de haver tomado a posição que tomaram na revolta, pelo ódio. Muitos oficiais não conseguiam comandar o Minas Gerais [encouraçado] e eu tive o sobejo poder de dominá-lo, fazer o que eles jamais fariam na baía do Rio de Janeiro", conclui.

Documentos e a ficha funcional de João Cândido na Marinha vieram a público apenas em 2008, graças a pesquisa de um grupo de historiadores da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), no Arquivo Histórico Nacional.

reportagem da Folha na época registrou que a ficha do ex-marinheiro, que entrou em 1895, como grumete, apontava que ele foi castigado nove vezes com prisões, ficando de dois a quatro dias em solitária, e duas vezes rebaixado de cabo para marinheiro.

Não havia registro de castigo físico. Dos dez elogios recebidos por ele, o último por bom comportamento fora três meses antes da revolta.

O historiador José Murilo de Carvalho explica que João Cândido não foi o líder intelectual da revolta, posição de Francisco Dias Martins, paioleiro do Scout Bahia, mas salienta que a revolta começa pelo Minas Gerais, onde ele era o timoneiro, já que foi o último local onde a chibata foi aplicada como castigo — a punição de 250 chibatadas a um marinheiro foi o estopim.

O próprio João Cândido diz que era "um dos chefes", citando os comitês revolucionários que formaram na época, ainda antes da revolta, e diz que assumiu a liderança já indicado por eles.

"[Queríamos] combater os maus-tratos e má alimentação da Marinha, e acabar definitivamente com a chibata na Marinha. O causo era este. Nós que viemos da Europa, em contato com outras Marinhas, não podíamos mais admitir que, na Marinha do Brasil, um homem tirasse a camisa para ser chibateado por outro homem", diz João Cândido na gravação.

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Passados 111 anos da revolta, a Marinha diz não reconhecer "ato de bravura" no episódio, como afirmou em nota recente lida no Senado, chama a atenção para a quebra de hierarquia e disciplina, cita mortes e se posiciona contra exaltar os revoltosos.

"Aquilo foi uma pequena revolução social e toda revolução social é uma quebra de hierarquia. A Independência do Brasil foi uma quebra de hierarquia, a República também", diz Mário Maestri, historiador e autor de "Cisnes negros: uma história da Revolta da Chibata" (Ed. Moderna).

"O que incomoda é que João Cândido dirigiu uma revolta da mais poderosa Marinha de Guerra que já teve no Brasil, venceu contra os oficiais e as elites brasileiras, e ainda por cima era negro", avalia Maestri.

"Esses mais de 2.300 e tantos marinheiros sofreram uma repressão grande que ainda não foi devidamente calculada. Cerca de 1.300 foram expulsos da Marinha na época, um total de 30 e tantos foram processados pelo Conselho de Guerra, os que foram mortos e fuzilados não existe um levantamento completo, mas até onde levantei, pelo menos cerca de 30 se conhece o nome e como morreram — fuzilados em terra firme ou no mar. Houve um expurgo na Marinha", diz Marco Morel, um dos historiadores que localizou os documentos de João Cândido.

Ele é neto de Edmar Morel, jornalista e autor de "A Revolta da Chibata" (Ed. Paz e Terra), que batizou o movimento dos marinheiros com esse nome e trouxe o episódio e João Cândido de volta à memória com a publicação de seu livro em 1959.

O marinheiro João Cândido Felisberto, reconhecido como líder da Revolta da Chibata, de 1910 - Creative Commons

"O principal que ficou disso é que, tamanho o medo da repressão, tanto as pessoas queriam se proteger dela, que se criou um silêncio de memória sobre isso. Até hoje os descendentes dos marinheiros que participaram da revolta não sabem, porque ficou escondido", conta Morel.

Apesar da anistia aprovada na época, a anistia a João Cândido e outros revoltosos só foi reconhecida de fato, postumamente, em 2008.

Depois da revolta, ele foi expulso da Marinha, preso e, segundo o filho caçula, Adalberto Cândido, o Candinho, 82, sofreu perseguições quanto tentou entrar na Marinha mercante. Trabalhou por anos com peixes na Praça 15, no Rio de Janeiro.

"Meu pai nunca falou para a família [sobre a revolta], ele era uma pessoa muito discreta. Com o lançamento do livro, que foi um best-seller, que ele chegou a falar para mim", diz Candinho, que acompanhou o pai em homenagens e recebeu outras tantas, durante anos, em nome dele.

Morel conta que seu avô também pagou um preço apenas por ressuscitar a história da revolta: seus direitos políticos foram cassados após o golpe de 1964.

"A cassação encerrou a carreira dele de jornalista e foi causada pelo livro", diz. "O que eu ouvi contarem, colegas dele jornalistas, é que, depois do golpe, quando meu avô arranjava emprego em uma redação, ia lá um grupo de oficiais da Marinha, fardados, e ameaçavam, que ele tinha que ser demitido".

Aparício Torelly, o Barão de Itararé, chegou a ser agredido por oficiais da Marinha depois de publicar capítulos de um livreto sobre a revolta em seu jornal, em 1934.

Já durante a ditadura, Aldir Blanc teve de comparecer ao departamento de censura mais de uma vez, devido a música composta por ele e João Bosco em homenagem a João Cândido, "O Mestre-Sala dos Mares".

O título teve de ser mudado duas vezes, porque o censor achava que "O Almirante Negro" e "O Navegante Negro" eram apologia aos negros.

"Foi a maior manifestação de racismo que já vi", disse Blanc, que relatou ainda ter ouvido ameaças veladas do Cenimar (Centro de Informações da Marinha).

Naquele mesmo 1968 da entrevista de João Cândido, o regime militar baixou o AI-5, ato que marcou o endurecimento da ditadura.

Quatro anos antes, poucos dias antes do golpe, João Cândido participou de um encontro no Sindicato dos Marinheiros, em comemoração a associação, o que era visto como ilegal — a reunião foi proibida pelo ministro da Marinha da época.

Na gravação com o MIS, o ex-marinheiro chama o movimento militar que resultou no golpe de "movimento de salvação pública".

"A Revolta foi episódio traumático para os oficiais da Marinha. O trauma pode ter sido reforçado pela revolta dos marinheiros de 1964 e ainda não foi superado. A prova é que, 111 anos após a Revolta da Chibata, tenha havido a reação da corporação à colocação de João Cândido na lista dos heróis da pátria, mesmo sendo ela hoje uma instituição totalmente diferente da de 1910, e mesmo da de 1964", avalia o historiador José Murilo de Carvalho.

"Ele é um herói popular, não é da gente, porque a história dele é toda verídica, não tem farsa. Toda classe social aceita ele como herói e a família agradece por esse movimento que vem sendo feito para ele. É como a música do João Bosco e Aldir Blanc, vai passar séculos e ainda vão cantar ‘há muito tempo nas águas da Guanabara’", diz o filho Candinho.

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/11/joao-candido-nunca-existiu-na-marinha-disse-lider-da-revolta-da-chibata.shtml