democracia

Motociata por igualdade racial | Foto: Prostock-studio/Shutterstock

Revista online | Representatividade negra na política

Kennedy Vasconcelos Júnior*, especial para a revista Política Democrática online (46ª edição: agosto/2022)

Como pode um deputado ou deputada não-negros (brancos) entenderem as demandas dessa população se nunca sofrem discriminação ou racismo na pele? Para iniciar qualquer conversa sobre o tema “representatividade”, é essencial definirmos o conceito do termo de modo que possamos partir do mesmo ponto.

De acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa e o Dicionário de Política, do filósofo e historiador Norberto Bobbio, a representatividade é a expressão dos interesses de um grupo (partido, classe, movimento, nação, etc.) na figura de um representante, de forma que aquele que fala em nome do coletivo o faz comprometido com as demandas e necessidades dos representados. 

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Portanto, falar de representatividade revela o sentido político e ideológico por trás do termo. Mesmo que seja possível imaginar o sofrimento do outro, só podem alcançar a compreensão plena do que seja a opressão racial aqueles que sofrem diretamente a violência desse contexto. Qualquer coisa diferente disso é achismo.

A maneira mais reveladora de se enxergar a falta de representatividade negra é nos números: Além de o Brasil ser o maior país em concentração de negros fora do continente africano, temos 125 deputados autodeclarados negros – soma de pardos e pretos, segundo critério do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – de um total de 513 parlamentares na Câmara dos Deputados, o que representa 24,36% da assembleia da Casa. 

Mesmo que pessoas negras constituam a maioria da população brasileira (cerca de 56%, de acordo com dados do censo do IBGE de 2018), a representatividade desse grupo está muito aquém da necessária, e isso não é um acidente. O racismo estrutural é fruto do caráter exploratório e excludente da colonização, bem como da desigualdade social que afeta majoritariamente negros e pardos no Brasil.

Veja, abaixo, galeria de imagens:

Mulher negra segurando papelão escrito igualdade | Foto: giuseppelombardo/Shutterstock
Mulheres negras enfileiradas e sorrindo | Foto: Nelson Antoine/Shutterstock
Motociata por igualdade racial | Foto: Prostock-studio/Shutterstock
Enquanto o presidente radicaliza sua retorica dentro do país sua política externa esta cada vez mais dócil | Foto: Vincenzo Lullo/Shutterstock
Mulher negra gritando no mega fone com a mão erguida | Foto: Prostock-studio/Shutterstock
Contra a desigualdade social | Foto: SB Arts Media/Shutterstock
Pela igualdade social | Foto: fizkes/Shutterstock
Protesto contra o racismo | Foto: AlessandroBiascioli/Shutterstock
Racism protest | Foto: Shutterstock/Drazen Zigic
Foto: Drazen Zigic/Shutterstock
Racismo é crime | Foto: Shutterstock/Angela_Macario
Mulher negra segurando papelão escrito igualdade
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Mulher negra segurando papelão escrito igualdade | Foto: giuseppelombardo/Shutterstock
Mulher negra segurando papelão escrito igualdade
Mulheres negras enfileiradas e sorrindo
Motociata por igualdade racial
Enquanto o presidente radicaliza sua retorica dentro do país sua política externa esta cada vez mais dócil
Mulher negra gritando no mega fone com a mão erguida
Contra a desigualdade social
Pela igualdade social
Protesto contra o racismo
Racism protest
Protesto com mega fone
Racismo é crime
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Jovens negros continuam sendo as principais vítimas da violência no Brasil, o que é facilmente constatado pelos dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2020. De acordo com a pesquisa, pessoas negras foram 76,2% das vítimas de mortes violentas intencionais. No mesmo ano, representaram 78,9% das vítimas de intervenções policiais. Além disso, 62,7% dos policiais assassinados eram negros.

Nada disso decorre de crimes diretamente caracterizados por ódio racial. No entanto, fazem parte de uma lógica histórica mais profunda, entranhada não só nas percepções individuais e no funcionamento das políticas públicas e das instituições.

Tudo isso, atrelado à falta de perspectivas e oportunidades, justifica a urgência da necessidade de falarmos sobre representatividade negra e diversidade, além da garantia de direitos fundamentais para que a vida de nossas crianças se desenvolva de forma segura, saudável e promissora, por meio de políticas compatíveis com as necessidades de um mundo real, partindo do entendimento de que nossa sociedade é múltipla e diversa. Aceitar e se aliar a essa pauta é uma oportunidade de reforçar o nosso desenvolvimento individual como seres humanos e como sociedade. 

A “violência simbólica" é o subproduto das relações de poder, trazendo à margem tudo que foge do padrão eurocêntrico preestabelecido desde as colonizações. O sociólogo francês Pierre Bourdieu define violência simbólica como um conceito social elaborado, o qual aborda uma forma de violência sem coação física, causando danos morais e psicológicos, muitas vezes sutis, e que estão arraigados na estrutura social. 

A única forma de combater o racismo estrutural nas instituições é por meio do despertar da consciência da comunidade negra, que precisa se reconhecer como tal e, assim, se empoderar da armadura ancestral de lutas, sacrifícios e vitórias. Os brancos precisam reconhecer seus privilégios e entender que é preciso microevoluções para grandes revoluções. Tudo isso é crucial para este momento de ameaça democrática. É preciso confiar nas instituições e no processo eleitoral e respeitar a luta de muitos que se foram para respirarmos liberdade e escolha.

Doze das 24 legendas com representação na Câmara dos Deputados não têm qualquer instância para debater igualdade racial ou sua organização política, o que fere profundamente a representatividade racial no Brasil, pois dificulta ainda mais que negros e negras disputem eleições no país.  

A Comissão de Igualdade Racial do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou neste mês de agosto de 2022 um relatório de financiamento de campanha eleitorais para impulsionar campanhas de pessoas negras  por meio do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e o Fundo Partidário, atribuindo a responsabilidade de empregar os recursos aos candidatos negros, aos órgãos geridos pela base nacional de cada partido, que também será responsável por fixar os critérios internos para o recebimento pelos candidatos, assim como sua prestação de contas ao TSE. 

Esses recursos deverão ser solicitados à base nacional do partido através de uma carta de autodeclaração racial. É importante fiscalizar o destino do dinheiro e se atentar a autodeclarantes que não possuem características negras.

A mensagem final que deixo é sobre o aquilombamento, um conceito muito bem abordado por Abdias do Nascimento, político brasileiro, poeta, artista e ativista do direito negro. A perspectiva do aquilombamento vem trazendo uma nova modalidade para a luta negra no Brasil, um lugar seguro de compartilhamento e fortalecimento. É um espaço de conexão e acolhimento com amor. 

Uma das maiores características dos quilombos é a união do povo. É preciso um espírito evoluído para olhar integralmente para as questões humanas e saber que a construção de um mundo melhor faz parte de nós. Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista.

Sobre o autor

*Kennedy Vasconcelos Júnior é coordenador do Igualdade23 de Minas Gerais. Primeiro Secretário na empresa Conselho Municipal de Cultura de Juiz de Fora - Concult-JF.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de agosto de 2022 (46ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Em defesa da democracia estampado na bandeira do Brasil | Foto: ThalesAntonio/Shutterstock

Movimentos populares voltam às ruas nesta quinta em defesa da democracia

Nicolau Soares*, Brasil de Fato

Nesta quinta-feira (11), as ruas de ao menos 19 capitais serão palco de manifestações pela democracia, em defesa de eleições livres e contra a violência política. Inicialmente convocados pelos movimentos populares, sociais e sindicais organizados na campanha "Fora, Bolsonaro" para o dia 6, os atos foram adiados para acontecerem na mesma data da leitura da "Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito", que já recebeu mais de 800 mil assinaturas até aqui.

"A campanha vem realizando, desde que Bolsonaro assumiu, atos em defesa da democracia, para pressionar pela questão da vacinação, denunciando a fome, o desemprego. E agora, voltamos às ruas contra a escalada do autoritarismo, da ameaça de não respeitar as eleições, ou seja, não respeitar a soberania popular do voto, anunciando ao mundo naquela reunião com os embaixadores que a urna eletrônica não é segura", afirma Raimundo Bonfim, coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP) e um dos organizadores da campanha, que inclui as Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, além de dezenas de entidades.

A organização da campanha já tem 22 atos confirmados em 19 estados, número que deve crescer até a quinta-feira. Em São Paulo, a manifestação pública acontece a partir das 17h, no vão livre do Masp, na Avenida Paulista. No Rio de Janeiro, o ato acontece na Candelária, região central da cidade, a partir das 16h.

Também está previsto ato em Brasília, em frete ao Congresso Nacional, a partir das 15h. Em Salvador, será realizada uma passeata saindo da praça do Campo Grande às 9h.

Ações simultâneas

A data marca o lançamento oficial do manifesto elaborada por ex-alunos e professores da Faculdade de Direito da USP, que acontecerá às 11h30, no Salão Nobre da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo.

Clique aqui para ler na íntegra e assinar o documento.

Mais cedo, às 9h30, será feita a leitura do manifesto Em Defesa da Democracia e da Justiça, de iniciativa da Fiesp e subscrito por 107 entidades de diversos setores, como a Febraban e organizações ligadas ao agronegócio. O documento já foi publicado em alguns dos maiores jornais do Brasil na semana passada.

A diversidade de setores mostra um amplo arco de forças na defesa da democracia, o que é comemorado por Raimundo. "Isso é importante, nós saudamos essa iniciativa puxada pela Faculdade de Direito da USP e por setores empresariais, mas nós achamos que o elemento rua é fundamental nessa luta em defesa da democracia para o povo brasileiro", afirma, ressaltando as diferenças entre os grupos.

"Nós defendemos a democracia, mas defendemos a democracia com direitos. Com políticas públicas. Não existe democracia com racismo, com desemprego, com fome, com miséria. Estaremos nas ruas fazendo a defesa da democracia, da soberania popular do voto, mas também levando a nossa pauta de denúncia, do desemprego, das más condições de vida do povo brasileiro", conclui.

Veja abaixo a lista de atos confirmados até aqui:

AL: 

Maceió: Praça Centenário, 8h 

AM:  

Manaus: Praça da Saudade, 15h 

BA: 

Salvador: Praça do Campo Grande, 9h 

CE: 

Fortaleza: Praça da Bandeira, 9h 

DF: 

Brasília: Congresso Nacional, 15h 

ES: 

Vitória: Praça Costa Pereira, 10h 

GO:  

Goiânia: Praça Universitária, 17h 

MA: 

São Luís: Praça Deodoro, 16h 

MG: 

Belo Horizonte, Praça Afonso Arinos, 17h 

MS:

Campo Grande: Câmara Municipal, 10h. 

PB:

João Pessoa: Lyceu Paraibano, 14h 

PE: 

Recife: Rua da Aurora, 15h 

PI:

Teresina: Praça Rio Branco, 8h30 

PR: 

Curitiba: Praça Santos Andrade, 18h30 

 RJ: 

Rio de Janeiro: Candelária, 16h 

RN:

Natal: Midway, 14h30 

SC:  

Florianópolis: Praça da Alfândega, 17h 

SE:  

Aracaju: Praça Getúlio Vargas. Bairro São José, 15h. 

SP: 

Santos: Praça dos Andradas, 10h 

São Paulo: MASP, 17h 

Ribeirão Preto: Esplanada do Teatro Pedro II, 17h

*Texto publicado originalmente em Brasil de Fato. Título editado.


Moça lendo livro | Foto: Andrii Kobryn/Shutterstock

Revista online | Por que as políticas públicas de leitura são fundamentais

Renata Costa*, especial para a revista Política Democrática online (46ª edição: agosto/2022)

“É preciso que a leitura seja um ato de amor”
- Paulo Freire

Imagine se o nosso país fosse um país leitor? Imaginou? E que imagem, palavra ou expressão vem à sua cabeça? Na minha, por exemplo, vem sempre empatia, pensamento crítico, consciência social. Sim, é isso mesmo. 

Acredito que a leitura é a maior forma de um ser humano absorver empatia, qualidade rara em nossa sociedade. O motivo é bastante simples: a leitura nos desloca para outra realidade, nos coloca obrigatoriamente em vivências de outras pessoas (personagens) e, em função disso, somos inseridos na empatia, de maneira intrínseca.

Em relação ao pensamento crítico, acredito firmemente no poder da leitura na absorção dessa qualidade. Começamos a pensar, a refletir a partir de realidades externas. Nosso cérebro recebe outras vivências de forma direta e com isso passamos a questionar mais e aceitar menos o que chamamos de senso comum. E isso nos leva à consciência social. Por isso, a leitura é a base de todas as artes, da cultura e da educação.

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A provocação do texto Ler devia ser proibido, da filósofa e escritora brasileira Guiomar de Grammont, é certeira: 

“Ler realmente não faz bem. A criança que lê pode se tornar um adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzindo a crer que tudo pode ser de outra forma. (...) Pais, não leiam para seus filhos, pode levá-los a desenvolver esse gosto pela aventura e pela descoberta que fez do homem um animal diferente.”

Segundo a pesquisa Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), “três em cada 10 brasileiros na faixa de 15 a 64 anos são considerados analfabetos funcionais – ou seja, apresentam limitações para fazer uso da leitura, da escrita e da matemática em atividades cotidianas.” Estamos falando de pessoas que possuem baixo letramento e daqueles com formação superior. Repare que nos referimos apenas a pessoas alfabetizadas, não as que não possuem o código da língua.

Confira, a seguir, galeria de fotos:

Mulher organizando estante de livros | Foto: Joa Souza/Shutterstock
Roda de leitura | Foto: Andrey_Popov/Shutterstock
Criança lendo gibi da Mônica | Foto: Mario Andrioli/Shutterstock
Lendo em sala de aula | Foto: Joa Souza/Shutterstock
Moça lendo livro na política | Foto: Prostock-studio/Shutterstock
2022 em livros | Foto: Maxx-Studio/Shutterstock
Políticas públicas para livros | Imagem: Iconic Bestiary/Shutterstock
Jovem lendo no parque | Foto: Manop Boonpeng/Shutterstock
Moça lendo livro | Foto: Andrii Kobryn/Shutterstock
Mulher organizando estante de livros
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Mulher organizando estante de livros | Foto: Joa Souza/Shutterstock
Mulher organizando estante de livros
Roda de leitura
Criança lendo gibi da mônica
Lendo em sala de aual
Moça lendo livro na política
2022 em livros
Políticas públicas para livros
Jovem lendo no parque
Moça lendo livro
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E o que isso tem a ver com as políticas públicas do livro e leitura? Tudo. Recentemente, profissionais da área e entidades do livro de todo o Brasil construíram uma carta-manifesto a todos os pré-candidatos deste ano de 2022, ao Legislativo e ao Executivo, solicitando que fossem inseridas em suas plataformas de governo dez ações voltadas à pauta. 

Os pedidos são inúmeros, desde acompanhar o Executivo na regulamentação e implementação, nos primeiros dias do novo governo, da Lei 13.696/2018, que institui a Política Nacional de Leitura e Escrita (PNLE) até apresentar programas e projetos para estimular, ampliar e fomentar a formação de mediadores(as) e promotores de leitura em plataformas digitais e fortalecer ações de estímulo à leitura e às tradições orais e de oralitura, passando por desenvolver medidas de incentivo e regulação do mercado editorial e regularização de pareceristas nas decisões sobre conteúdos editoriais.

Esta carta aberta já possui quase 13.000 assinaturas em um curto espaço de tempo, o que nos mostra a força do que chamamos de “o povo do livro”. A abrangência dessa política é o que a torna grande. Falamos de três cadeias fundamentais que a cerca: a cadeia criativa, que reúne escritores, poetas, ilustradores, cordelistas; a cadeia produtiva, que envolve todos os atores do mercado livreiro e editorial, desde os próprios editores aos diagramadores, revisores, profissionais do comercial, entre outros; até chegarmos à cadeia mediadora, que engloba professores e educadores, bibliotecários, mediadores de leitura, profissionais de bibliotecas públicas e comunitárias e os próprios leitores.

O Brasil está acordando para a importância da leitura e para o entendimento de que, de fato, ler é um ato político. Aliás, o professor Darcy Ribeiro já sabia disso há tempos, quando disse que “a crise na educação não é uma crise, é um projeto”. Não há interesse político na leitura e, por isso, existir um partido que hoje abrace uma Bancada do Livro é fundamental e inovador.

Recentemente, tivemos declaração do atual presidente da República “ameaçando” seus eleitores, dizendo que haverá bibliotecas no lugar dos clubes de tiro, caso não ganhe as próximas eleições. Isso diz muito sobre o “projeto” ao qual se referia Darcy Ribeiro. Diz muito, também, sobre a importância que a leitura tem para uma sociedade democrática de fato. 

É urgente que o país absorva e entenda que o livro, a leitura e as bibliotecas de acesso público, sejam públicas ou comunitárias, são o âmago de pautas não só de cultura e educação, mas, também, de direitos humanos, saúde, segurança, meio ambiente, dentre tantas outras.

Muitas bibliotecas comunitárias, por exemplo, trabalham o livro em locais de alta violência e vulnerabilidade social. Entendem que é necessário incidir em políticas públicas para democratizar o acesso ao livro e diminuir a violência em seus territórios. É a expressão “mais livros, menos armas” sendo feita na prática. É necessário abraçarmos essa causa e darmos visibilidade a esses espaços, que são, majoritariamente, geridos por mulheres que percebem a leitura nesse lugar fundamental. 

São as mulheres que estão no topo da pirâmide ao se tratar de leitura, que, por sinal, é um substantivo feminino. A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil aponta que “um em cada três leitores têm lembranças da mãe lendo algum livro, e 49% deles têm na mãe sua grande incentivadora no processo de ler por prazer”. Preciso dizer mais alguma coisa? 

No Estado do Rio de Janeiro, há um exemplo vivo do que as bibliotecas comunitárias são capazes. Na cidade de Nova Iguaçu, região da Baixada Fluminense, um coletivo chamado Baixada Literária trabalha há anos na construção de políticas leitoras para o município. Segundo informação da Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias (RNBC), “a Baixada Literária vem desempenhando papel significativo na descentralização da cultura literária e na formação de leitores nas comunidades em que atua. São bibliotecas vivas, dinâmicas e aconchegantes, com acervo de qualidade disponível a todos”. 

Além disso, foram elas as responsáveis por conseguir, em parceria com o poder público local, transformar o Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas de Nova Iguaçu em lei (4.439 de 19 de novembro), sancionada desde 2014. Hoje a cidade é referência na construção de políticas públicas para o setor em todo o Brasil e as bibliotecas que compõem a Baixada Literária, as maiores personagens desse livro.

Exposto tudo isso, respondemos, acredito, à pergunta feita no título deste artigo: Por que as políticas públicas de livro e leitura são fundamentais para uma sociedade mais democrática?

Sobre a autora

Renata Costa: ex-secretária do Plano Nacional do Livro Leitura (PNLL), gestora do projeto Palavralida e conselheira de Estado de Cultura do Rio de Janeiro

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de agosto de 2022 (46ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.

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*Título editado.


Bolsonaro durante reunião com empresários no Rio de Janeiro | Foto: Antonio Scorza/ Shutterstock

Nas entrelinhas: Jair Bolsonaro está em rota de colisão com a Fiesp

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

Fracassaram os esforços da cúpula da Fiesp, que articula o manifesto dos empresários em defesa da democracia e das urnas eletrônicas, para que todos os candidatos à Presidência assinassem o documento, numa espécie de pacto de respeito mútuo ao resultado das eleições. Ontem, o Palácio do Planalto anunciou que Jair Bolsonaro não subscreverá o documento, assinado por entidades empresariais e federações sindicais de trabalhadores, e cancelou a ida do presidente da República ao lançamento do documento, no dia 11 de agosto, na sede da Fiesp. Também foi cancelado o jantar com empresários que estava programado.

A ida de Bolsonaro à Fiesp fora antecipada para 11 de agosto a pedido do Palácio do Planalto. Para evitar mais constrangimentos, o recolhimento de assinaturas de apoio ao manifesto da federação ficou restrito às entidades empresariais e sindicatos de trabalhadores, para que as assinaturas dos candidatos dos presidentes fossem recolhidas antes de as pessoas físicas aderirem o documento. Ocorre que Bolsonaro não digeriu as manifestações em defesa da urna eletrônica, da Justiça Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal (STF), e torpedeou as iniciativas.

Na terça-feira, Bolsonaro atacou o documento da Fiesp, que considerou uma “carta política”. Chamou de “cara de pau” e “sem caráter” os empresários que assinassem o documento, o que provocou o cancelamento do jantar que estava marcado com eles. Também houve muita discussão entre os que já haviam aderido ao manifesto, se os empresários deveriam assinar ou não o documento como pessoa física. O texto em nenhum momento cita o presidente da República. Os candidatos Felipe D’Ávila (Novo), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB), que já estiveram na Fiesp, subscreveram o documento.

Sociedade civil

O episódio tende a aprofundar o confronto de Bolsonaro com a sociedade civil, a praticamente dois meses das eleições. Em termos gerais, esse é um espaço de organização e representação que não se confunde com o Estado, a família nem o mercado, que são os ambientes específicos e mais homogêneos onde Bolsonaro atua intensamente. A sociedade civil engloba instituições de caridade, grupos de autoajuda, associações profissionais, religiosas, sindicatos, entidades empresárias, movimentos sociais etc. É um universo complexo que, no Brasil, ganhou autonomia durante o regime militar, protagonizando movimentos de resistência em defesa da democracia e dos direitos humanos.

Os ataques de Bolsonaro às urnas eletrônicas, à Justiça Eleitoral e ao Supremo Tribunal Federal (STF), principalmente depois de seu encontro com diplomatas estrangeiros para levantar suspeitas sobre a segurança das urnas eletrônicas, despertaram forte e inédita reação da sociedade civil. A defesa das urnas eletrônicas até então estava sendo feita pelos ministros do Supremo, pela grande mídia e pela oposição. Esses ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral brasileiro, reconhecido internacionalmente por sua segurança e eficiência, funcionaram como um catalisador dessa reação.

Congresso

Ontem, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), na abertura da sessão do Plenário, reiterou sua confiança no sistema eleitoral. Disse que as urnas eletrônicas são motivo de “orgulho nacional”. Segundo ele, nestes 26 anos de uso no Brasil, trouxeram transparência, confiabilidade e velocidade na apuração do resultado das eleições. “Elas têm-se constituído em ferramenta poderosa contra vícios eleitorais muito frequentes na época do voto em papel. Representam, portanto, um verdadeiro aperfeiçoamento institucional”, enfatizou.

A fala de Pacheco coincidiu como a ida de militares do Ministério da Defesa ao Tribunal Superior Eleitoral (STF) para conferir a segurança dos códigos-fonte das urnas eletrônicas, um trabalho que poderia ter sido feito nos últimos 10 meses. O ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, vem reproduzindo à frente da pasta a narrativa de Bolsonaro sobre a segurança das urnas eletrônicas. Na verdade, a postura de Bolsonaro sinaliza temor de perder as eleições e suas intenções golpistas, o que acaba fortalecendo a oposição.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-jair-bolsonaro-esta-em-rota-de-colisao-com-a-fiesp/

Brasil vive 'mistura tóxica de ódio pessoal e polarização política'

Leandro Prazeres*, BBC news Brasil

Nem mesmo a experiência de quem acompanha a política e as eleições na América Latina há mais de 30 anos foi suficiente para evitar o espanto que o professor americano Scott Mainwaring sentiu ao saber da morte de Marcelo Arruda, um membro do PT morto a tiros por um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL).

"É um fato grave, não lembro de nada parecido no Brasil", disse à BBC News Brasil.

Scott Mainwaring é um dos maiores especialistas do mundo em política, democracias e ditaduras na América Latina. Ele já morou em países como a Argentina e o Brasil (onde fez pesquisa de campo para o seu doutorado) e fala português fluentemente. Nestes países, ele investigou a redemocratização na região e viu como, em alguns casos, esse processo envolveu casos de violência política.

Mainwaring foi professor na Universidade de Harvard, da qual é um membro associado. Em 2019, ele foi apontado como um dos 50 cientistas políticos mais citados em trabalhos acadêmicos do mundo. Atualmente, é professor de Ciências Políticas da Universidade de Notre Dame.

O americano é autor de dezenas de livros sobre a política da América Latina, entre eles: Decay and Collapse (Sistemas Partidários na América Latina: Institucionalização, Decadência e Colapso), Democracies and Dictatorships in Latin America: Emergence, Survival and Fall (Democracias e Ditaduras na América Latina: Surgimento, Sobrevivência e Queda), e Party Systems in Latin America: Institutionalization (Sistemas partidários na América Latina: Institucionalização).

É com essa experiência que ele analisa, com preocupação, a escalada de violência às vésperas das eleições deste ano no Brasil.

Em entrevista à BBC News Brasil, Mainwaring diz que a morte de Marcelo Arruda é resultado da "relação tóxica" entre a violência e poder político presente no país.

Segundo ele, o Brasil, assim como os Estados Unidos, vive um ambiente de "ódio pessoal e polarização política".

Para o professor, a polarização no Brasil não vai desaparecer e os principais pré-candidatos à Presidência da República, Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), precisam condenar atos de violência.

"Você não pode reduzir a zero a possibilidade de um cara desequilibrado atacar a outra pessoa. Mas a mensagem das lideranças é muito importante", disse o professor.

Confira os principais trechos da entrevista:

Scott Mainwaring
Scott Mainwaring é um dos principais pesquisadores do mundo sobre política, democracia e ditaduras na América Latina

BBC News Brasil - Nas últimas semanas, ocorreram alguns incidentes violentos no Brasil relacionados à campanha política. O último foi o assassinato de um membro do Partido dos Trabalhadores (PT) praticado por um apoiador do presidente Jair Bolsonaro. E isso lança algum tipo de alerta sobre o que está ocorrendo no Brasil?

Scott Mainwaring - Certamente. Não pode ter espaço para esse tipo de violência política. É um ato de criminalidade comum e, além disso, é um tipo de ato que atinge a democracia.

BBC News Brasil - Que sinal a morte de alguém nessas circunstâncias manda para a comunidade internacional?

Mainwaring - Para mim, é mais um indicador de uma relação tóxica entre violência e poder político. Como fato isolado, não acho preocupante. O que é preocupante é quando você combina isso com outros incidentes de violência.

Marcelo Arruda
Marcelo Arruda foi morto quando comemorava seus 50 anos numa festa com decoração do PT e imagens de Lula

Mainwaring - Me refiro a outros incidentes de violência. Estou pensando na relação da política com as milícias, com o crime organizado, nos assassinatos de candidatos a prefeitos, vereador. Quando você combina tudo isso, aí, sim, é preocupante.

BBC News Brasil - Considerando o histórico político do Brasil, quão grave é a morte de um militante político por um oposicionista?

Mainwaring - É um fato grave. Não lembro de acontecimentos parecidos no Brasil. Isso lembra, por exemplo, os brownshirts (camisas marrons) da Alemanha nos anos 1920 e começo dos 1930. Atinge de forma profunda a democracia.

[Nota: "camisas marrons" era o nome pelo qual ficaram conhecidos os primeiros integrantes de uma organização paramilitar nazista fundada por Adolf Hitler em 1921]

BBC News Brasil - O senhor mencionou os camisas marrons. Na sua avaliação, esse episódio lembra a Alemanha pré-nazismo ou a Alemanha nazista?

Mainwaring - Não quero exagerar. Na Alemanha pré-nazista isso era comum. Tanto os nazistas como os comunistas tinham milícias muito grandes, inclusive maiores que o Exército alemão naquela época. Mas vai nesse sentido. Vai nessa direção.

BBC News Brasil - Quais foram os fatores que levaram o Brasil a esse nível de animosidade que resultou, por exemplo, na morte desse membro do Partido dos Trabalhadores?

Mainwaring - Desde 2014, o Brasil sofre um processo muito grave de polarização política. E isso se acentua pela presença das mídias sociais, que exacerba a polarização política e cria uma animosidade. Elas levam essa polarização para um processo de animosidade, de ódio. É possível ter um processo de polarização que não se baseia em ódios pessoais. Mas no Brasil de hoje, como também nos Estados Unidos, você tem essa mistura tóxica de ódio pessoal e polarização política.

Bolsonaro
Em ato de campanha em 2018, Bolsonaro defendeu fuzilar a 'petralhada'

BBC News Brasil - Considerando essa escalada de violência, o Sr. acredita que o Brasil poderia ser palco de algo semelhante à invasão do Capitólio, nos Estados Unidos, caso um candidato não aceite o resultado das eleições?

Mainwaring - É um risco.

BBC News Brasil - É um risco alto, médio, baixo? Como o senhor classificaria?

Mainwaring - Não acho que seja grande, mas eu diria que é médio. O fato de Bolsonaro denunciar os mecanismos eleitorais brasileiros e dar sinais de que pode não aceitar o resultado caso ele perca as eleições, é aí que reside o maior risco. Isso, para a democracia, é muito grave.

BBC News Brasil - O Brasil tem sido descrito por especialistas como um dos países da terceira onda de democratização onde os fundamentos e funcionamento da democracia iam relativamente bem. Esses episódios violentos mais recentes indicam uma deterioração da democracia brasileira?

Mainwaring - Sem dúvida. A democracia brasileira entre 1985 e 2012 ou 2014, realmente, tinha muitos aspectos altamente positivos. Acho que a degradação da democracia brasileira nos últimos cinco ou seis anos é real.

A eleição de um presidente com perfil tão autoritário como o Bolsonaro é um sinal em si mesmo.

Quando você elege um presidente iliberal, com traços muito autoritários, isso já representa um perigo para a democracia.

Os problemas antecediam a eleição de Bolsonaro, como a corrupção, os problemas econômicos, o aumento da violência e a perda de credibilidade, por um lado, do PT, e por outro do establishment ao centro e à direita.

Bolsonaro
Bolsonaro já falou em 'fuzilar' petistas e usar 'granadinha' para matar Lula e políticos opositores

BBC News Brasil - Considerando a quantidade de armas circulando no Brasil, o Sr. teme que o país vá na direção de uma realidade em que atos de violência política sejam mais comuns? Há ambiente para uma deterioração ainda maior?

Mainwaring - Isso é possível e acho que não devíamos subestimar o quanto isso já aconteceu. O exemplo mais famoso é o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL). Mas também já aumentou o número de assassinatos de candidatos a prefeito e vereador. Isso é grave e poderia se acentuar, mas não vejo como algo inevitável.

BBC News Brasil - O nível de polarização tende a piorar ou melhorar até as eleições?

Mainwaring - Acho que vai piorar, porque a campanha política vai ser, certamente, entre Lula e Bolsonaro. E 40% do país tem ódio do Lula e outros 40% têm ódio do Bolsonaro. A tendência provável de Lula não vai ser polarizar. Ele vai polarizar contra o Bolsonaro, mas não vai assumir posições radicais. Mas Bolsonaro sempre polariza e certamente ele vai pintar Lula como um diabo. Eu acho quase inevitável que a polarização se exacerbe nos próximos meses. Agora, depois da eleição é um momento de possível diminuição da polarização. Os dois candidatos vão ter que costurar alianças para governar o país.

BBC News Brasil - Qual é a responsabilidade de Lula nesse cenário de polarização?

Mainwaring - Acredito que o Lula poderia polarizar contra Bolsonaro, mas buscar o eleitor médio. Lula, provavelmente, vai se posicionar para ganhar o centro do Brasil. A probabilidade de ele ganhar aumenta se ele pode capturar o centro do país. Para mim, a estratégia mais óbvia do Lula seria lógico denunciar o Bolsonaro, polarizar contra ele, mas se posicionar como uma alternativa sensata, uma alternativa viável ou uma alternativa que no governo não vai ser radical, não vai polarizar.

BBC News Brasil - O presidente Bolsonaro tem sido acusado por alguns críticos de incentivar os seus apoiadores contra esquerdistas. Por outro lado, alguns dias atrás, o presidente Lula agradeceu a um membro do Partido dos Trabalhadores que atacou um manifestante antilula. Na sua avaliação, é justo dizer que Lula e Bolsonaro são igualmente responsáveis por esse ambiente de tensão que a gente vê no Brasil?

Mainwaring - Teria que estar no Brasil para fazer uma avaliação mais equilibrada sobre essa pergunta.

Luiz Inácio Lula da Silva
Lula parabenizou um ex-vereador do PT que agrediu um empresário em 2018 num protesto contra o ex-presidente

BBC News Brasil - O presidente Bolsonaro tem questionado, ainda que sem apresentar provas, a legitimidade do sistema eleitoral brasileiro. Os militares, que são muito próximos do presidente, têm colocado a integridade do sistema em dúvida. O senhor acredita que as Forças Armadas brasileiras vão aceitar o resultado das eleições se Bolsonaro perder?

Mainwaring - Se Lula ganha por uma vantagem razoável, acho que a tendência dos militares, neste caso, é aceitar o resultado. E se a eleição for muito apertada? Aí, digamos, teria mais espaço para os militares não aceitarem. Acho, de qualquer maneira, pouco provável que os militares não aceitem [o resultado]. Mas essa possibilidade aumenta se a eleição for extremamente apertada.

BBC News Brasil - O senhor é um dos principais especialistas em democracia, ditaduras e ditaduras militares na América Latina. Na sua avaliação, existe algum espaço para uma ruptura democrática no Brasil hoje?

Mainwaring - Para a ruptura clássica via golpe militar, acho que não há espaço. Desde o fim da Guerra Fria, a maneira mais frequente de a democracia se romper é pela via do que chamamos de "executive takeover". Seria, digamos, quando o presidente, ao longo do tempo, degrada a democracia a tal ponto que ela deixa de ser um regime democrático. Um exemplo clássico é a Venezuela pós-Hugo Chávez. Outro exemplo claro é a Nicarágua e o regime de Daniel Ortega. Mas poderíamos pegar um caso como a Hungria de Viktor Orbán. Esse risco eu acho que é real, especialmente se Bolsonaro ganhar de novo. O risco de ele procurar concentrar mais o poder... os ataques dele ao STF são um indicador nefasto. Agora, Bolsonaro não deverá ter uma maioria no Congresso e isso dificulta as coisas para ele.

BBC News Brasil - Nos últimos anos, houve um relaxamento das normas no Brasil em relação à compra de armas e alguns especialistas dizem hoje que o Brasil tem mais armas circulando hoje do que no passado. Considerando todo esse ambiente de tensão das nossas eleições, quão preocupante é termos uma eleição neste ambiente?

Mainwaring - Não sei quão preocupante isso é para a eleição. Acho que (assassinatos como o de Marcelo) são um episódio raro e que não se repetem muito. O que é mais preocupante em termos do aumento de número de armas é a prática quotidiana da democracia nas áreas pobres do Brasil como as favelas do Rio de Janeiro. É o controle que as milícias e as organizações criminosas exercem nessas áreas e na região amazônica. Eu diria que aí a democracia brasileira sofre muito e isso não é uma novidade.

BBC News Brasil - O senhor sente que há uma preocupação maior neste ano, fora do Brasil, em relação às eleições deste ano na comparação com outros anos?

Mainwaring - Certamente. A preocupação não é porque o sistema eleitoral seja frágil, mas é que um dos candidatos, Bolsonaro, poderia não aceitar o resultado.

BBC News Brasil - Existe, na sua avaliação, algum sinal de que essa tensão que existe hoje possa se dissipar depois das eleições? Ou esse nível de polarização é algo que veio para ficar e que vai demorar um tempo para desaparecer, se é que vai desaparecer?

Mainwaring - Se Lula ganhar, vai depender de como ele governará. A polarização não vai se dissipar. Não há nenhuma forma para que isso passe, mas poderia diminuir. E de quê maneira? Se o governo de Lula for exitoso, a tendência é diminuir a polarização. Por outro lado, se ele toma posições mais moderadas, isso ajudaria a diminuir a polarização. Por outro lado, se se repetem os casos de corrupção, se a economia não retomar um caminho mais positivo, se a violência não diminuir, aí a polarização provavelmente não vai diminuir.

BBC News Brasil - O Sr. mencionou que a morte de Marcelo Arruda é mais um indicador de uma relação tóxica entre violência e poder político. O que é exatamente os atores políticos podem ou deveriam fazer para que episódios como esses não acontecessem?

Mainwaring - Para os candidatos Bolsonaro e Lula, sobretudo porque são os únicos que têm uma chance viável, eles têm que denunciar essa violência. Isso é muito importante. Você não pode reduzir a zero a possibilidade de um cara desequilibrado atacar a outra pessoa. Mas a mensagem das lideranças é muito importante. Você tem que renunciar o uso da violência.

BBC News Brasil - Numa declaração, o presidente Bolsonaro disse o seguinte: "Vocês viram o que aconteceu ontem? Uma briga entre duas pessoas lá em Foz do Iguaçu? Bolsonaro isso não sei o que ela. Agora ninguém fala que o Adélio", que é a pessoa que o esfaqueou em 2018 e que foi filiado ao PSOL. Nas suas redes sociais, ele não chegou a lamentar a morte do Marcelo e acusou a esquerda de violenta. Esse tipo de declaração ajuda a acalmar os ânimos?

Mainwaring - Evidente que não. Agora, eu não sabia do incidente no qual o Lula aplaudiu a agressão de um petista contra um Bolsonaro. E isso também, no meu ver, é lamentável. Os dois têm que se pronunciar contra o uso da violência.

*Texto publicado orginalmente em BBC news Brasil. Título editado.


Luiz Fux discursando em palanque | Foto: Joa Souza/Shutterstock

Nas entrelinhas: Supremo volta do recesso fortalecido

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, no discurso de abertura do semestre, reverberou o fortalecimento da Corte em razão do maciço apoio que recebeu da sociedade civil, nos dois manifestos anunciados na semana passada, um liderado por juristas ligados à tradicional Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, e o outro por empresários e banqueiros ligados à Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e à Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), respectivamente. Ambos foram uma resposta aos ataques feitos pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) às urnas eletrônicas, à Justiça Eleitoral e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em particular, aos ministros do STF Luís Roberto Barroso, Édson Fachin e Alexandre de Moraes — respectivamente ex, atual e futuro presidente da Corte eleitoral.

Fux reiterou que “nossa democracia conta com um dos sistemas eleitorais mais eficientes, confiáveis e modernos de todo o mundo” e “uma Justiça Eleitoral transparente, compreensível e aberta a todos aqueles que desejam contribuir positivamente para a lisura do prélio eleitoral”. O presidente do STF também condenou a violência nas eleições: “O Supremo Tribunal Federal anseia que todos os candidatos aos cargos eletivos respeitem os seus adversários, que, efetivamente, não são seus inimigos. Confia na civilidade dos debates e, principalmente, na paz que nos permita encerrar o ciclo de 2022 sem incidentes”, disse.

Na mesma sessão, o ministro Alexandre de Moraes, que presidirá o TSE durante as eleições de outubro, fez uma defesa enfática do atual sistema de votação: “Quem conhece as urnas eletrônicas, quem conhece o sistema de votação, se de boa-fé for, certamente vai verificar que nós podemos nos orgulhar do nosso sistema eleitoral”.

Entretanto, no mesmo dia de reabertura dos trabalhos da Corte, Bolsonaro exibiu os músculos, anunciando a indicação de dois ministros para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) que não estavam entre os preferidos da maioria do Supremo: Paulo Sérgio Domingues, juiz do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), que tem o apoio de Humberto Martins e da futura presidente do STJ, Maria Thereza de Assis Moura; e Messod Azulay Neto, juiz do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, indicado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente.

Queda de braços

Nos bastidores do Supremo, ontem, o mal-estar era grande. O preterido nas indicações foi o desembargador do Tribunal Regional Federal da Região (TRF-1) Ney Bello, cujo nome era articulado pelo ministro do STF Gilmar Mendes. Paulo Sérgio é ligado ao ministro Nunes Marques, aliado incondicional de Bolsonaro na Corte. Os dois nomes ainda precisam ser aprovados pelo Senado, o que deve ocorrer antes das eleições. Bello foi responsável pela decisão que tirou o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro da cadeia, mas isso não adiantou muito.

Mesmo fortalecido, outro sinal de que o Supremo não terá vida fácil foi o pedido de arquivamento do inquérito que apura se Bolsonaro vazou dados sigilosos de uma investigação da Polícia Federal (PF) ainda não finalizada, feito ontem pelo Ministério Público Federal (MPF). A vice-procuradora-geral, Lindôra Araújo, braço direto do procurador-geral, Augusto Aras, no texto do pedido, acusou nominalmente Alexandre de Moraes de violar o sistema acusatório ao determinar novas medidas na apuração.

Lindôra saiu em defesa da atuação de Aras, ao pedir o encerramento da investigação. Segundo ela, seu chefe atuou de forma técnica, jurídica, isenta, sem intenção de “prejudicar ou beneficiar determinadas pessoas”. O inquérito foi aberto porque Bolsonaro, em agosto de 2021, divulgou nas redes sociais a íntegra de um inquérito da PF que apura um suposto ataque ao sistema interno do TSE, em 2018. Segundo a Corte, não houve risco às eleições.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-supremo-volta-do-recesso-fortalecido/

Tenho fome Brasil | Foto: Joa Souza/Shutterstock

A urgência da fome é a urgência pela democracia

Denise De Sordi*, Brasil de Fato

“Geografia da fome”, de Josué de Castro é um livro que nos chama à ação. Daqueles que lemos e nos sentimos atordoados. Tem um sentido de urgência, de chamado da história. Foi este livro que nos explicou – e segue nos lembrando - que a fome não é natural, é um “fenômeno” social, é “marcante”, é “regular”, é “gritante” e é “extensa”. Um “problema” que, na década de 1940 – quando foi publicado, demandava uma “nova perspectiva” ofertada pelas ciências humanas e sociais, que estava ali, pelas mãos do autor, articulada num “método geográfico”, permitindo o estudo do problema sem “arrebentar as raízes que o ligam subterraneamente a inúmeras manifestações econômicas e sociais da vida dos povos” (p.16). A publicação deste livro, mais do que alertar para a fome, permitiu ainda dizer em alto e bom som que o acesso aos alimentos está ligado à renda dos trabalhadores.  

Como nos alertou Milton Santos na Apresentação, se a fome fosse algo da “natureza” a culpa seria “de ninguém”, o livro subverte, a partir de extenso estudo, este entendimento. Há uma culpa que está relacionada à organização da sociedade, aos “sistemas econômicos e sociais” (p.30). A pobreza generalizada da população explicava – e ainda explica – a fome mais do que outros fenômenos.  

Não à toa, a publicação do livro potencializou um debate que já corria ao longo dos anos da década de 1930 e que se estenderá para a concretização do salário mínimo como forma de garantia de acesso aos mínimos de sobrevivência aos trabalhadores. “Geografia da Fome” revirou as discussões políticas no período em que foi lançado e abriu um campo de discussões no qual a dimensão do que conhecemos por segurança alimentar foi incorporada ao campo das políticas públicas que começavam então a se desenhar e ser implementadas.  

Entretanto, é preciso lembrar que a fome hoje, esta que se alastrou pelo país desde 2016 e que se acentuou entre 2021 e 2022 provocando o retorno do país ao Mapa da Fome (FAO) não tem o mesmo sentido histórico que possuía em 1940, ou nos anos que seguiram, cortados por um intervalo histórico sombrio que travou as iniciativas, por exemplo, de programas alimentares. Período que foi finalizado pelas mobilizações populares e pela conquista da democracia, materializada como o pacto social que firmamos em 1988. Foi justamente por meio do acúmulo de experiências históricas derivado de inúmeras mobilizações populares engajadas na construção da redemocratização do país que a democracia brasileira tomou forma como prática de Estado e, assim, as políticas públicas sociais em nível nacional foram gradativamente conquistadas, ao longo dos anos da década de 1990, enquanto uma das principais formas de operacionalizar o pacto democrático.

Políticas e programas sociais não são, portanto, ações voltadas apenas para aqueles que são caracterizados pelo Estado como “pobres” – figura técnica e institucionalmente definida nos anos 2000 por linhas de corte de renda - políticas e programas sociais são parte orgânica da forma que assume a relação entre Estado e sociedade, são para todos nós. A experiência do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) – extinto em 1995, retomado em 2003 e extinto novamente em 2019 - talvez seja o exemplo mais claro de como esta relação pode se concretizar e ampliar a democracia.


Uma das características do projeto Cozinhas Solidárias é o plantio de hortas para aproximar as comunidades dos cuidados e usos dos alimentos / Foto: Isabelle Rieger / Amigos da Terra Brasil

Programas e políticas sociais não resolvem todas as questões sociais, mas indicam os termos do pacto social para lidarmos com a educação, a saúde, a pobreza, a fome, o emprego, o consumo, o acesso aos alimentos, a cultura, a política e assim por diante. Desde 2016 vivemos uma virada discursiva que intenciona resumir as políticas e programas sociais ao papel de “atenção aos pobres”. Esta é uma estratégia de “redução do Estado”, por meio da qual, cada vez mais, os Direitos Sociais deixam de ter como horizonte a universalização e são cada vez mais restringidos, isto é; focalizados.

Mais recentemente, no desaguar das consequências deste discurso, programas sociais construídos tendo em vista a complexidade da sociedade brasileira, foram desmanchados e/ou tornados inoperantes para atender ao processo de aprofundamento da exploração e expropriação dos trabalhadores. É uma agenda política e econômica que não só reproduz o empobrecimento e a pobreza como condição de vida majoritária, mas para a qual a permanência da pobreza no país é favorável.  

Dentre os programas extintos estão o Programa Bolsa Família (PBF) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Ambos nos remetem à conquista histórica da democracia no Brasil contemporâneo. A existência deles só foi possível porque o jogo democrático permitiu, ao longo dos anos de 1990 e 2000, a confluência de interesses diversos, a soma de diferentes perspectivas sobre quais são os melhores caminhos para se gerir o ritmo do empobrecimento, equilibrando as agendas econômica e social. Enquanto expressão das relações entre Estado e sociedade, não foi sem pressão e sem olhar para as práticas dos movimentos sociais e dos sujeitos organizados nas áreas urbanas e rurais, que estas políticas e programas foram formulados. É um tipo de dinâmica das relações entre Estado e sociedade que, para ser legítima e duradoura, deve contar com movimentos de baixo para cima que se traduzam em políticas e programas que os traduzam de cima para baixo.   

É esta dinâmica que é também preventiva da corrosão democrática, por isto, a reconstrução destas políticas e programas sociais parece demandar novamente um olhar para compreender o que está a ocorrer nas cozinhas solidárias, na constituição dos bancos de alimentos, e nas formas pelas quais movimentos sociais têm se organizado para garantir a sobrevivência da população, a partir de concepções que estão fincadas na solidariedade social. Isto é, a solidariedade como um valor democrático e um projeto de sociedade.  

Não se trata de uma agenda de ações emergenciais, mas de práticas para o agora que auxiliam na formulação política do futuro. A formulação de agendas deste tipo é algo que, historicamente – basta olharmos para as mobilizações ao longo dos anos de 1990 –, se potencializa quando emerge pelas mãos dos movimentos sociais, a exemplo das dezenas de cozinhas solidárias espalhadas pelos estados brasileiros pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, o MTST. As cozinhas solidárias - diferentes das comunitárias – oferecem uma experiência social inédita, revisitando a ideia das cozinhas coletivas das próprias ocupações urbanas para que se promova, no cenário de agora, um elo entre a produção dos alimentos e seus produtores, o consumo e a distribuição. É um tipo de ação que ganha relevo mediante o fim do PBF e a desarticulação do PAA em seu papel social.  

A soberania e a segurança alimentar andam junto com práticas democráticas. Lidar com a condição de insegurança alimentar, caracterizada por sua dimensão da fome, é também um compromisso histórico com a democracia. Ambas são tarefas urgentes. Há 33 milhões de nós impacientes e com fome.

*Texto publicado originalmente no site Brasil de Fato.


Bolsonaro discursa com semblante de raiva | Foto: NANCY AYUMI KUNIHIRO/Shutterstock

Nas entrelinhas: O establishment se mexe em defesa das urnas

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

O encontro do presidente Jair Bolsonaro com diplomatas estrangeiros para falar mal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e levantar suspeitas de que haveria fraudes nas urnas eletrônicas virou uma espécie de “efeito borboleta”, uma variante da Teoria do Caos, que consiste em grandes acontecimentos provocados inicialmente por pequenas alterações. O conceito passou a ser usado quando certas escolhas provocam desastres, principalmente depois do filme Efeito Borboleta, lançado em 2004, pela dupla Eric Bress e J. Mackye Gruber.

Evan Treborn (Ashton Kutcher), um jovem de 20 e poucos anos, em luta contra as memórias traumáticas de sua infância, descobre uma técnica que pode levá-lo de volta ao passado e passa a alterar diversos acontecimentos, com objetivo de mudar para sempre o seu futuro. Porém, o “efeito borboleta” trará consequências inesperadas para sua vida e daqueles que estão ao seu redor. Na tentativa de ficar com a namorada, Kayleigh, cria realidades alternativas que não terminam como gostaria. Entretanto, o que nos interessa não é um “spoiler”, mas o fenômeno ligado à Teoria do Caos.

Em 1952, o escritor de ficção científica norte-americano Ray Bradbury publicou o conto O som do trovão, no qual um personagem pisa em uma borboleta, provocando graves consequências, inclusive a chegada de um líder fascista ao poder. Em 1961, o que era ficção virou realidade científica. O meteorologista norte-americano Edward Lorenz desenvolveu um modelo matemático para a previsão do tempo, processando dados como temperatura, umidade, pressão e direção do vento no seu computador. Depois de observar os resultados, repetiu a operação. Inesperadamente, a segunda previsão foi completamente diferente da primeira.

Quanto mais o modelo avançava no tempo, as diferenças entre os dois resultados se tornavam maiores. O computador de Lorenz havia arredondado os dados de algumas casas decimais. Para Lorenz, isso equivalia a dizer que o vento provocado pelo bater de asas de uma borboleta no Brasil poderia ocasionar um tornado no Texas, nos Estados Unidos. Assim nasceu a Teoria do Caos, com seu “efeito borboleta”. É mais ou menos o que conseguiu o presidente Jair Bolsonaro com o seu inusitado e espantoso ataque às urnas eletrônicas na reunião de presentantes de quase 70 países, que provocou a forte reação da sociedade civil.

Manifestos

O establishment jurídico e empresarial resolveu dar um basta aos ataques de Bolsonaro à democracia. Suprapartidariamente, saiu em defesa do Supremo Tribunal Federal (STF). A iniciativa partiu de ex-ministros da Corte, professores e estudantes da tradicional Faculdade de Direito do Largo do São Francisco (USP), com uma declaração que começou com três mil assinaturas e já soma mais de 300 mil signatários. Outro manifesto, organizado pela poderosa Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), mobilizou o grande empresariado nacional, inclusive a Febraban. Recebeu apoio da Central Única dos Trabalhadores (CUT), da Força Sindical e de outras centrais sindicais. Os principais banqueiros do país assinaram os dois manifestos, como pessoa física.

Enquanto o establishment se mexia, o governo divulgava dados positivos sobre a economia, entre os quais a redução do preço da gasolina, a geração de emprego e a distribuição do Auxílio Brasil. O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, tentava minimizar a importância dos manifestos. Segundo ele, os banqueiros assinaram os documentos porque perderam R$ 40 bilhões com o PIX. O lucro dos bancos não condiz com essa tese. A adesão também é resultado da PEC das Eleições, que agrediu a institucionalidade da economia e a segurança jurídica.

Protagonista do rolo compressor governista montado no Congresso, com recursos das emendas secretas ao Orçamento da União (somam R$ 16,5 bilhões), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foi ao Twitter como se nada houvesse: “Má notícia para os pessimistas de plantão! Estamos na contramão do mundo, mas isso é bom! Inflação em baixa, PIB em alta”. Levou um banho de água fria com a divulgação do DataFolha de ontem. O pacote de bondades do governo ainda não mudou os humores dos eleitores. Na pesquisa estimulada, Lula (PT) tem 47% e Bolsonaro (PL), 29%; Ciro (PDT), 8%; Simone (MDB), 2%; Janones (Avante), Marçal (Pros)n e Vera Lúcia (PSTU) têm 1%. Branco/nulo/nenhum: 6%. Não sabe: 3% (4% na pesquisa anterior). Os demais candidatos não pontuaram. Lula venceria no primeiro turno.

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Simone Tebet em comissão especial do Impeachment | Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Nas entrelinhas: Simone Tebet completa a fila de largada da campanha

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

A confirmação da candidatura de Simone Tebet, ontem, pela convenção nacional do MDB e da coligação que a apoia, integrada pela federação PSDB-Cidadania, completou a fila de largada das eleições deste ano. O cenário mantém como tendência principal a polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 44% das intenções de voto, e o presidente Jair Bolsonaro (PL), com 35%, segundo a pesquisa XP/Ipespe divulgada na segunda-feira. O que pode alterar esse quadro, ou consolidá-lo, será a propaganda eleitoral de rádio e tevê, que começa em 16 de agosto.

O ex-ministro Ciro Gomes (PDT), com 9%, a senadora Simone Tebet (MDB), com 4%, e André Janones (Avante), com 2%, são os candidatos mais bem posicionados para construir uma terceira via, alternativa muito difícil. Nenhum dos três, até agora, definiu o vice. Simone contava com o apoio do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), mas o tucano histórico, mais uma vez, movimenta-se em função da política do Ceará. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-AM) pleiteia a vaga. Pablo Marçal (Pros) e Luiz Felipe d’Avila (Novo) têm 1%. Vera Lúcia (PSTU), Sofia Manzano (PCB), Luciano Bivar (União Brasil), Eymael (DC) e Leonardo Péricles (UP) completam a fila de largada, com menos de 1% cada.

Votos nulos ou que não votariam em nenhum dos candidatos somam 4%. Não sabem/não responderam representam apenas 2% dos entrevistados, o que indica um cenário de grande participação eleitoral. Ontem, o Datafolha divulgou uma pesquisa entre jovens eleitores, que confirmou o que já se previa: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem a preferência no eleitorado adolescente e jovem nas 12 maiores capitais do país, com 51%. Jair Bolsonaro (PL) tem 20%. Depois, vem Ciro, com 12%. São jovens de São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Salvador, Fortaleza, Recife, Porto Alegre, Curitiba, Goiânia, Brasília, Manaus e Belém. A margem de erro é de três pontos para mais ou para menos. A pesquisa eleitoral completa do DataFolha sobre as eleições presidenciais deve ser divulgada hoje.

Nenhuma grande alteração no quadro deve ocorrer até o horário eleitoral, pois a prioridade dos candidatos agora é a articulação dos palanques regionais, resolvendo conflitos e recolhendo náufragos das alianças. Como o registro das candidaturas deve ocorrer até 5 de agosto, muita água vai rolar ainda nos estados, e os candidatos terão de conciliar as articulações de campanha com a própria movimentação eleitoral. Lula passa a ter a segurança sob responsabilidade da Polícia Federal. Como ex-presidente, já tinha esse direito, mas, agora, o esquema será reforçado em razão dos riscos de atentado.

Regras do jogo

Bolsonaro passa à desvantagem de ter que se comportar de acordo com as regras eleitorais, ou seja, será tratado como os demais candidatos, estando sujeito a punições toda vez que sair das regras do jogo. Como está em guerra com o Supremo Tribunal Federal (STF), pode ser que queira esticar a corda, para passar por vítima e ilustrar a narrativa de que não existe imparcialidade da Corte. Entretanto, essa postura aumenta seu risco eleitoral, porque a opinião pública confia na Justiça Eleitoral, e isso gera grandes desgastes políticos.

Por exemplo, o manifesto em defesa do Estado de direito organizado por juristas e estudantes da tradicional Faculdade de Direito do Largo do São Francisco (USP), berço da elite política e jurídica paulista, com apoio de empresários, intelectuais e artistas, subscrito por três mil personalidades, em 24 horas obteve a adesão de mais de 100 mil representantes da sociedade civil. Entre os signatários estão os ex-ministros do STF Carlos Ayres Britto, Carlos Velloso, Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Eros Grau, Marco Aurélio Mello, Sepúlveda Pertence, Sydney Sanches, além de artistas, intelectuais, executivos, empresários e até banqueiros. É o tipo de fato político que pode impactar negativamente a candidatura de Bolsonaro em que ela é mais forte: os eleitores com renda acima de 10 salários mínimos.

No rastro do encontro com diplomatas no qual levantou suspeitas sobre a urna eletrônica e atacou a Justiça Eleitoral, Bolsonaro vive, também, a rebordosa da reação negativa da comunidade internacional. A mais importante foi o pronunciamento do secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, na terça-feira, durante a 15ª Conferência de Ministros da Defesa das Américas, em Brasília: “Os nossos países não estão ligados apenas pela geografia. Também somos atraídos pelos interesses e valores em comum, pelo nosso profundo respeito pelos direitos humanos e pela dignidade humana, pelo nosso compromisso com o Estado de direito e por nossa devoção à democracia”, disse.

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Tanque passa em frente ao Congresso | Foto: reprodução

Revista online | Em busca do Exército cidadão na república democrática

Ricardo José de Azevedo Marinho*, especial para a revista Política Democrática online (45ª edição: julho/2022)

O que pensam os oficiais do Exército Brasileiro1 é um livro que aparece no percurso da pandemia do coronavírus e tem o propósito de discernir o principal marco da percepção dos oficiais do Exército Brasileiro (EB) em face da instituição em que atuam e da nossa democracia

Veja todos os artigos desta edição da revista Política Democrática online

Fruto de uma pesquisa, patrocinada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), no âmbito de convênio celebrado entre o Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e o Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP-FDC), da Diretoria de Educação Técnica Militar (DETMil) do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx), na linha do Edital do Programa de Apoio ao Ensino e à Pesquisa Científica e Tecnológica em Defesa Nacional (Pró-Defesa) de 2008, tratou-se de um survey em âmbito nacional, que envolveu questionário a 20.435 oficiais da ativa, o que possibilitou a construção de um banco de dados contendo os retornos de 2.423 respondentes. 

Este livro oferece instigante interpretação sobre o EB, colocando seu foco nos oficiais. Trata-se de um retrato deles, obtido a partir do uso de potente zoom. O alcance destas lentes não deixa de lado sequer as forças que impelem o EB a tentar redefinir, tanto seu formato, como suas funções, sobretudo, após a Constituição de 1988. Assim, ainda que se possa sustentar que se trata de um "retardatário", quando comparado com outras instituições, também o EB se vê convidado a adaptar-se a um novo contexto democrático. 

Duas ordens de questões são analisadas: de um lado, a questão institucional propriamente dita e, de outro, a característica das demandas que chegam até eles. E o resultado encontrado foi: um oficialato compassivo na avaliação do sistema de educação continuada que caracteriza sua formação; o deslocamento da ideia de vocação para a carreira militar em favor da ideia de sua estabilidade; a ênfase na capacitação profissional, com sua exigência correlata por melhor formação; e a demanda por acesso a vantagens conferidas a outras carreiras de Estado, dimensões que apontam para a ideia de profissão. 

Veja, a seguir, galeria de fotos:

Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
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Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
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O novo formato institucional assumido pelo EB é, como sustentam as autoras e o autor, menos o efeito de uma política desejada por estes do que uma consequência de um complexo processo de transição para a democracia. 

Além do texto coletivo que dá corpo ao livro, ele conta ainda com um prefácio do professor Francisco Fonseca – Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e Centro de Estudos em Administração Pública e Governo da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV EAESP) –, uma apresentação do nosso imortal da Academia Brasileira de Letras José Murilo de Carvalho e posfácio do Eduardo Raposo, onde fazem a ponte da publicação com o contexto em que a vê surgir, aludindo que o 38º presidente do Brasil tenta usar os militares para forçar a barra na disputa política. 

Isso não retira a importância do EB na balança política de 2022, ainda que seus oficiais não estejam majoritariamente dispostos a apoiar políticas momentâneas que alterem o curso de suas preferências, como revela a pesquisa em tela. 

Importa reter que, quando entendeu que a pandemia não cabia na securitização e nas metáforas dos conflitos armados, o Ministério da Defesa (MD) oportunizou, para os profissionais civis e militares da área de saúde, treinamento para mitigar o coronavírus no Brasil. A capacitação dos profissionais vem sendo realizada em unidades de saúde militares, a exemplo do Hospital das Forças Armadas (HFA), em Brasília, e da Escola de Saúde do Exército (EsSEx), o estabelecimento de ensino militar responsável pela seleção e formação do Quadro do Serviço de Saúde do EB, no Rio de Janeiro. 

Por tudo isso, O que pensam os oficiais do Exército Brasileiro realiza a tarefa de mostrar quem são eles, e o faz com maestria, traçando o perfil demográfico e social desses oficiais, sua trajetória profissional e suas atitudes em face de questões atinentes ao seu exercício profissional, ao sistema político e à sociedade. O livro é mais do que um simples retrato, sem consequências. É um retrato que, ao conferir estatura a esse grupo profissional, fornece elementos para a discussão tanto de questões relativas à própria corporação como dos desafios de uma democracia em busca de equalizar sua jornada. 

1 Raposo, Eduardo, Carvalho, Maria Alice Rezende de e Schaffel, Sarita. O que pensam os oficiais do Exército brasileiro. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio. São Paulo: Hucitec Editora, 2022. 152 p. 

Sobre o autor

*Ricardo José de Azevedo Marinho é professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da UniverCEDAE.

** O artigo foi produzido para publicação na revista Política Democrática online de junho de 2022 (44ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Bolsonaro e embaixadores: vexame internacional e atentado à democracia

Roberto Freire, presidente nacional do Cidadania*

Entre atônitos e perplexos, embaixadores de dezenas de países assistiram a um espetáculo tão deprimente quanto ridículo protagonizado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, que perdeu qualquer compostura que ainda pudesse ter pelo cargo que ocupa.

Bolsonaro expôs o Brasil e os brasileiros diante do mundo. Colocou abaixo de seus interesses mais paroquiais a pátria que no seu slogan estaria acima de todos. Tal desequilíbrio se explica pelo verdadeiro pavor que tem de ser preso pelos crimes que, no íntimo, sabe ter cometido.

As urnas eletrônicas que deram a ele e a seus filhos diversos mandatos tirarão de Bolsonaro em outubro não apenas o cargo, mas o foro especial por prerrogativa de função. E o poder e a influência que hoje detém sobre os órgãos de controle.

Mas isso não exime o Congresso Nacional de cumprir o seu papel e abrir um processo de impeachment. Senão pelo conjunto da obra, pelos crimes contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais e contra o livre exercício dos Poderes constitucionais praticados hoje aos olhos do mundo.

Bolsonaro está usando o poder federal para impedir a livre execução da Lei Eleitoral e incitando militares à desobediência à lei e à infração à disciplina. Os presidentes da Câmara e do Senado precisam evitar a mais completa desmoralização não de Bolsonaro, essa já consumada, mas do Brasil.

*Nota oficial publicada originalmente no site Cidadania


O ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela fala aos visitantes em 8 de março de 1999 em sua residência em Houghton, um subúrbio de Joanesburgo, África do Sul/ Per-Anders Pettersson/Getty Images

Dia de Nelson Mandela é celebrado hoje; relembre a trajetória do líder sul-africano

Tiago Tortella*, CNN

“Está em suas mãos tornar o mundo um lugar melhor”. Há 104 anos nascia o autor da frase: Nelson Mandela, ex-presidente sul-africano, ganhador do Nobel da Paz e um dos principais líderes na luta contra o Apartheid, um regime de discriminação racial na África do Sul.

Defensor dos direitos humanos, Mandela foi preso diversas vezes, enfrentou quatro julgamentos e passou 27 anos na prisão. Ele foi o primeiro presidente democraticamente eleito na África do Sul.

Ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1993, é descrito pela Organização das Nações Unidas (ONU) como alguém que “dedicou sua vida a serviço da humanidade”.

Desde novembro de 2009, o dia 18 de julho é reconhecido pela ONU como o Dia Internacional de Nelson Mandela. “Em reconhecimento à contribuição do ex-presidente sul-africano para a cultura de paz e liberdade e luta pela democracia internacionalmente”, justificou a ONU sobre a celebração.

A organização ressalta ainda que a data é “uma ocasião para todos agirem e inspirarem mudanças”.

Em 2015, a data também foi reconhecida para promover “condições humanas de reclusão, consciencializar para que os presos sejam uma parte contínua da sociedade e valorizar o trabalho dos agentes penitenciários como serviço social de particular importância”.

Abaixo, relembre a história de Nelson Mandela:

"É fácil quebrar e destruir. Os heróis são aqueles que fazem a paz e constroem." Nelson Mandela

Mvezo, África do Sul

Rolihlahla Mandela nasceu no dia 18 de julho de 1918, na vila de Mvezo, na África do Sul. O nome “Nelson” foi adicionado durante a escola primária por uma professora, em Qunu. Era um costume dar às crianças na escola um “nome cristão”.

Seu pai, Nkosi Mphakanyiswa Gadla Mandela, morreu quando ele tinha 12 anos.

Ele começou um curso de bacharelado em Artes na Universidade de Fort Hare, mas não o concluiu, pois foi expulso por participar de um protesto estudantil.

Mandela chegou a Joanesburgo, capital do país, em 1941, e trabalhou como oficial de segurança de minas. Ele completou o bacharelado na Universidade da África do Sul e voltou para Fort Hare para sua graduação em 1943.

Ele se casou pela primeira vez em 1944, com a enfermeira Evelyn Mase, com quem teve dois filhos e duas filhas (a primeira delas morreu durante a infância). Mandela e Mase se separaram em 1958.

Mandela também começou a estudar um curso de Bacharel em Direito na Universidade de Witwatersrand. Porém, deixou a universidade em 1952, sem se formar.

"Nossa marcha para a liberdade é irreversível. Não devemos permitir que o medo fique em nosso caminho." Nelson Mandela

Apartheid

O Apartheid passou a existir formalmente após a Segunda Guerra Mundial no país, quando o Partido Nacional, liderado por descendentes de colonos europeus, chegou ao poder na África do Sul.

Entre 1949 e 1953, os legisladores sul-africanos aprovaram uma série de leis cada vez mais opressivas, que regulavam até atividades cotidianas.

Havia a proibição de casamento entre negros e brancos, divisões da população por cor, reservando os melhores equipamentos públicos para brancos, e a criação de um sistema de educação separado e inferior para negros.

Outro ponto imposto pelo regime era que negros também tinham que usar praias e banheiros públicos diferentes. Os salários também eram desiguais.

Foi contra este regime que Nelson Mandela lutou.

Vida política

Em 1944, o líder ajudou a criar a Liga da Juventude do Congresso Nacional Africano (ANCYL, em inglês). Ele foi eleito secretário nacional do grupo em 1948.

Conforme explica a Fundação Nelson Mandela, através de seus esforços, a Casa adotou o Programa de Ação, em 1949, que visava uma política de massa.

Em 1952, foi lançada a Campanha Desafio. Ela instigava desobediência civil e resistência popular contra seis leis consideradas injustas. Mandela foi eleito Voluntário-Chefe Nacional, com Maulvi Cachalia como seu vice.

“Ele e outros 19 foram acusados ​​pela Lei de Supressão do Comunismo por sua participação na campanha e sentenciados a nove meses de trabalhos forçados, suspensos por dois anos”, diz a fundação.

Um diploma de dois anos em direito, além de seu bacharelado, permitiu que Mandela exercesse a advocacia e, em agosto de 1952, ele e Oliver Tambo fundaram o escritório de advocacia Mandela & Tambo.

Ele foi banido pela primeira vez em 1952, e a Carta da Liberdade foi adotada em 1955

"Verdadeiros líderes devem estar prontos para sacrificar tudo pela liberdade de seu povo." Nelson Mandela

Acusação de traição e prisão

Em 1956, Nelson Mandela foi acusado de traição. Em 1958, ele se casou pela segunda vez, agora com Winnie Madikizela, com quem teve duas filhas. Se separaram em 1996.

O julgamento só terminou em 1961, com ele e seus colegas sendo absolvidos.

Antes disso, em 1960, 69 pessoas foram mortas e outras 200 ficaram feridas pela repressão policial em um protesto em Sharpeville. Em seguida, o governo declarou estado de emergência e baniu o Congresso. Cerca de 18 mil manifestantes foram presos durante o período, entre eles, Mandela.

Com o fim do julgamento, “Mandela passou à clandestinidade e começou a planejar uma greve nacional para 29, 30 e 31 de março”. Porém, a ideia foi cancelada devido à forte repressão governamental.

Em 1961, foi criado o movimento armado da ANC, o Umkhonto we Sizwe (Lança da Nação, em tradução livre), com Mandela sendo escolhido líder. Em dezembro daquele ano, o grupo começou ataques com uma série de explosões.

Em janeiro 1962, ele sai secretamente da África do Sul com um passaporte etiópio, viajando pela África e Europa para obter apoio para a luta armada, retornando em julho do mesmo ano.

Mandela foi preso meses depois, em agosto. Ele foi acusado de deixar o país sem permissão e incitar greve e insurreição, condenado a cinco anos de prisão.

Em 1963, líderes da ANC foram presos, e Mandela foi acusado junto a eles por sabotagem. A apuração das autoridades ficou conhecida como “Julgamento de Rivonia”, no qual ele corria risco de pena de morte.

Em seu discurso no tribunal, disse:

"Lutei contra a dominação branca e lutei contra a dominação negra. Acalento o ideal de uma sociedade democrática e livre, na qual todas as pessoas vivam juntas em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal pelo qual espero viver e alcançar. Mas, se for preciso, é um ideal pelo qual estou disposto a morrer." Nelson Mandela

Em junho de 1964, Nelson Mandela e sete outros foram condenados à prisão perpétua. Ele percorreu três prisões: Robben Island, Pollsmoor e Victor Verster.

Durante o cárcere, em 1968 e 1969, sua mãe e filho mais velho morreram, mas ele não foi autorizado a comparecer aos enterros.

Conversas com o governo e liberdade

Em 1985, em meio a recorrentes protestos em massa contra o regime do Apartheid, a ANC iniciou conversas com o governo sul-africano.

“Em 12 de agosto de 1988, ele foi levado ao hospital, onde foi diagnosticado com tuberculose. Depois de mais de três meses em dois hospitais, ele foi transferido em 7 de dezembro de 1988 para uma casa na Prisão Victor Verster, perto de Paarl, onde passou seus últimos 14 meses de prisão”, diz o site da Fundação.

“Ele foi libertado no domingo, 11 de fevereiro de 1990, nove dias após a retirada do banimento do ANC e quase quatro meses após a libertação de seus camaradas restantes de Rivonia. Ao longo de sua prisão, ele rejeitou pelo menos três ofertas condicionais de libertação”, complementa.

Em junho de 1990, Mandela compareceu pela primeira vez à ONU, no Comitê Especial Contra o Apartheid, no Salão da Assembleia-Geral, em Nova York.

Em 1991, foi eleito presidente do ANC e manteve negociações para “acabar com o governo da minoria branca”.

"Diz-se que ninguém conhece verdadeiramente uma nação até que esteja dentro de suas prisões. Uma nação não deve ser julgada pela forma como trata seus cidadãos mais elevados, mas sim os mais baixos." Nelson Mandela

Nobel da Paz

Em 1993, Nelson Mandela ganhou o prêmio Nobel da Paz, “pelo seu trabalho pelo fim pacífico do regime do Apartheid e por lançar as bases para uma nova África do Sul democrática”, de acordo com a descrição no site da instituição.

Ele dividiu o prêmio com “o homem que o libertou, o presidente Frederik Willem de Klerk, porque eles concordaram com uma transição pacífica para o governo da maioria”.

Eleito presidente

Em 1994, foram realizadas as primeiras eleições “multirraciais” na África do Sul. Mandela pôde votar pela primeira vez em sua vida.

A ANC ganhou com grande maioria e, em 10 de maio, Nelson Mandela assumiu como o primeiro presidente democraticamente eleito do país. Porém, ele afirmou que não buscaria reeleição e, após um mandato, deixou o cargo.

Em 1998, se casou pela terceira vez, com Graça Machel.

Nelson Mandela faleceu em 5 de dezembro de 2013, em sua casa em Joanesburgo.

"Nossa liberdade não pode ser completa enquanto outros no mundo não são livres." Nelson Mandela

Outras partes de seu legado

O ex-presidente sul-africano fundou algumas organizações sociais. Em 1995, o Fundo para a Infância Nelson Mandela, que “se esforça para mudar a forma como a sociedade trata suas crianças e jovens”.

Fundação Nelson Mandela, por sua vez, foi criada logo depois que ele deixou a presidência, em 1999. Ela é focada no diálogo e legado do líder, tendo também o Centro de Memória dedicado a ele, inaugurado em novembro de 2013.

Há também a Fundação Mandela Rhodes, que fornece bolsas de pós-graduação para estudantes em um Programa de Desenvolvimento de Liderança na África do Sul. Ela foi fundada em 2003.

"Se eu tivesse a vida novamente, faria o mesmo de novo, assim como qualquer homem que ouse se chamar de homem." Nelson Mandela

*Texto publicado originalmente na CNN.