Revista online | Por que as políticas públicas de leitura são fundamentais

Muitas bibliotecas comunitárias trabalham o livro em locais de alta violência e vulnerabilidade social
Moça lendo livro | Foto: Andrii Kobryn/Shutterstock
Moça lendo livro | Foto: Andrii Kobryn/Shutterstock

Renata Costa*, especial para a revista Política Democrática online (46ª edição: agosto/2022)

“É preciso que a leitura seja um ato de amor”

– Paulo Freire

Imagine se o nosso país fosse um país leitor? Imaginou? E que imagem, palavra ou expressão vem à sua cabeça? Na minha, por exemplo, vem sempre empatia, pensamento crítico, consciência social. Sim, é isso mesmo. 

Acredito que a leitura é a maior forma de um ser humano absorver empatia, qualidade rara em nossa sociedade. O motivo é bastante simples: a leitura nos desloca para outra realidade, nos coloca obrigatoriamente em vivências de outras pessoas (personagens) e, em função disso, somos inseridos na empatia, de maneira intrínseca.

Em relação ao pensamento crítico, acredito firmemente no poder da leitura na absorção dessa qualidade. Começamos a pensar, a refletir a partir de realidades externas. Nosso cérebro recebe outras vivências de forma direta e com isso passamos a questionar mais e aceitar menos o que chamamos de senso comum. E isso nos leva à consciência social. Por isso, a leitura é a base de todas as artes, da cultura e da educação.

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A provocação do texto Ler devia ser proibido, da filósofa e escritora brasileira Guiomar de Grammont, é certeira: 

“Ler realmente não faz bem. A criança que lê pode se tornar um adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzindo a crer que tudo pode ser de outra forma. (…) Pais, não leiam para seus filhos, pode levá-los a desenvolver esse gosto pela aventura e pela descoberta que fez do homem um animal diferente.”

Segundo a pesquisa Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), “três em cada 10 brasileiros na faixa de 15 a 64 anos são considerados analfabetos funcionais – ou seja, apresentam limitações para fazer uso da leitura, da escrita e da matemática em atividades cotidianas.” Estamos falando de pessoas que possuem baixo letramento e daqueles com formação superior. Repare que nos referimos apenas a pessoas alfabetizadas, não as que não possuem o código da língua.

Confira, a seguir, galeria de fotos:

Mulher organizando estante de livros | Foto: Joa Souza/Shutterstock
Roda de leitura | Foto: Andrey_Popov/Shutterstock
Criança lendo gibi da Mônica | Foto: Mario Andrioli/Shutterstock
Lendo em sala de aula | Foto: Joa Souza/Shutterstock
Moça lendo livro na política | Foto: Prostock-studio/Shutterstock
2022 em livros | Foto: Maxx-Studio/Shutterstock
Políticas públicas para livros | Imagem: Iconic Bestiary/Shutterstock
Jovem lendo no parque | Foto: Manop Boonpeng/Shutterstock
Moça lendo livro | Foto: Andrii Kobryn/Shutterstock
Mulher organizando estante de livros
Roda de leitura
Criança lendo gibi da mônica
Lendo em sala de aual
Moça lendo livro na política
2022 em livros
Políticas públicas para livros
Jovem lendo no parque
Moça lendo livro
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Mulher organizando estante de livros
Roda de leitura
Criança lendo gibi da mônica
Lendo em sala de aual
Moça lendo livro na política
2022 em livros
Políticas públicas para livros
Jovem lendo no parque
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E o que isso tem a ver com as políticas públicas do livro e leitura? Tudo. Recentemente, profissionais da área e entidades do livro de todo o Brasil construíram uma carta-manifesto a todos os pré-candidatos deste ano de 2022, ao Legislativo e ao Executivo, solicitando que fossem inseridas em suas plataformas de governo dez ações voltadas à pauta. 

Os pedidos são inúmeros, desde acompanhar o Executivo na regulamentação e implementação, nos primeiros dias do novo governo, da Lei 13.696/2018, que institui a Política Nacional de Leitura e Escrita (PNLE) até apresentar programas e projetos para estimular, ampliar e fomentar a formação de mediadores(as) e promotores de leitura em plataformas digitais e fortalecer ações de estímulo à leitura e às tradições orais e de oralitura, passando por desenvolver medidas de incentivo e regulação do mercado editorial e regularização de pareceristas nas decisões sobre conteúdos editoriais.

Esta carta aberta já possui quase 13.000 assinaturas em um curto espaço de tempo, o que nos mostra a força do que chamamos de “o povo do livro”. A abrangência dessa política é o que a torna grande. Falamos de três cadeias fundamentais que a cerca: a cadeia criativa, que reúne escritores, poetas, ilustradores, cordelistas; a cadeia produtiva, que envolve todos os atores do mercado livreiro e editorial, desde os próprios editores aos diagramadores, revisores, profissionais do comercial, entre outros; até chegarmos à cadeia mediadora, que engloba professores e educadores, bibliotecários, mediadores de leitura, profissionais de bibliotecas públicas e comunitárias e os próprios leitores.

O Brasil está acordando para a importância da leitura e para o entendimento de que, de fato, ler é um ato político. Aliás, o professor Darcy Ribeiro já sabia disso há tempos, quando disse que “a crise na educação não é uma crise, é um projeto”. Não há interesse político na leitura e, por isso, existir um partido que hoje abrace uma Bancada do Livro é fundamental e inovador.

Recentemente, tivemos declaração do atual presidente da República “ameaçando” seus eleitores, dizendo que haverá bibliotecas no lugar dos clubes de tiro, caso não ganhe as próximas eleições. Isso diz muito sobre o “projeto” ao qual se referia Darcy Ribeiro. Diz muito, também, sobre a importância que a leitura tem para uma sociedade democrática de fato. 

É urgente que o país absorva e entenda que o livro, a leitura e as bibliotecas de acesso público, sejam públicas ou comunitárias, são o âmago de pautas não só de cultura e educação, mas, também, de direitos humanos, saúde, segurança, meio ambiente, dentre tantas outras.

Muitas bibliotecas comunitárias, por exemplo, trabalham o livro em locais de alta violência e vulnerabilidade social. Entendem que é necessário incidir em políticas públicas para democratizar o acesso ao livro e diminuir a violência em seus territórios. É a expressão “mais livros, menos armas” sendo feita na prática. É necessário abraçarmos essa causa e darmos visibilidade a esses espaços, que são, majoritariamente, geridos por mulheres que percebem a leitura nesse lugar fundamental. 

São as mulheres que estão no topo da pirâmide ao se tratar de leitura, que, por sinal, é um substantivo feminino. A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil aponta que “um em cada três leitores têm lembranças da mãe lendo algum livro, e 49% deles têm na mãe sua grande incentivadora no processo de ler por prazer”. Preciso dizer mais alguma coisa? 

No Estado do Rio de Janeiro, há um exemplo vivo do que as bibliotecas comunitárias são capazes. Na cidade de Nova Iguaçu, região da Baixada Fluminense, um coletivo chamado Baixada Literária trabalha há anos na construção de políticas leitoras para o município. Segundo informação da Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias (RNBC), “a Baixada Literária vem desempenhando papel significativo na descentralização da cultura literária e na formação de leitores nas comunidades em que atua. São bibliotecas vivas, dinâmicas e aconchegantes, com acervo de qualidade disponível a todos”. 

Além disso, foram elas as responsáveis por conseguir, em parceria com o poder público local, transformar o Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas de Nova Iguaçu em lei (4.439 de 19 de novembro), sancionada desde 2014. Hoje a cidade é referência na construção de políticas públicas para o setor em todo o Brasil e as bibliotecas que compõem a Baixada Literária, as maiores personagens desse livro.

Exposto tudo isso, respondemos, acredito, à pergunta feita no título deste artigo: Por que as políticas públicas de livro e leitura são fundamentais para uma sociedade mais democrática?

Sobre a autora

Renata Costa: ex-secretária do Plano Nacional do Livro Leitura (PNLL), gestora do projeto Palavralida e conselheira de Estado de Cultura do Rio de Janeiro

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de agosto de 2022 (46ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.

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*Título editado.

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