Alberto Aggio

Por que a manifestação no Chile? Alberto Aggio responde à Política Democrática online

Em artigo exclusivo publicado na nova edição da revista da FAP, professor da Unesp diz que os chilenos colocaram a raiva para fora

Cleomar Almeida, da Ascom/FAP

Os chilenos colocaram para fora toda a raiva frente ao mal-estar resultante do “modelo econômico”, que ordena o país desde os tempos da ditadura do Pinochet, durante as manifestações de outubro. A análise é do historiador, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e diretor da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), Alberto Aggio. Em artigo publicado na nova edição da revista Política Democrática online, ele afirma que “o Chile explodiu”.

» Acesse aqui a 13ª edição da revista Política Democrática online

Todos os conteúdos da revista podem ser acessados, gratuitamente, no site da FAP, que produz e edita a publicação. A fundação é sediada em Brasília vinculada ao Cidadania. Em artigo de sua autoria, Aggio lembra que, por vários dias, milhares de pessoas saíram às ruas em marchas de protesto que invariavelmente se tornaram violentas. “Estavam no foco dos manifestantes o Metrô de Santiago, as empresas de energia, os bancos controladores das famosas AFPs, que ‘garantem’ a aposentadoria da maior parte dos trabalhadores chilenos, dentre outras”, afirma.

No artigo exclusivo produzido para a revista Política Democrática online, o professor da Unesp diz que, assim como no Brasil de 2013, a repressão fez com que os protestos se amplificassem até chegar à manifestação de 25 de outubro, que reuniu mais de 1,2 milhão de pessoas no centro de Santiago. “Foi um sinal eloquente de que a estratégia do governo havia naufragado. Piñera recuou, propôs algumas reformas paliativas, procedeu a mudanças parciais em seu gabinete e, por fim, suspendeu o ‘estado de emergência’”, acentua ele.

Na avaliação do diretor da FAP, a modernização do país é atestada em números. Segundo ele, é notável também a sofisticação e até o luxo das estações do Metrô de Santiago em bairros pobres integram o cenário de um país dividido. “Sinais materiais de modernização em contraposição às carências domesticas cotidianas, às expectativas de futuro dos jovens em situação de ameaça, com a recorrente elevação dos custos de educação, além do nível das pensões dos mais velhos frente ao que trabalharam e contribuíram durante toda a vida, tudo isso formou um ‘caldo de cultura’ de raiva diante da flagrante desigualdade e de medo da regressão ao status quo anterior, vivenciado nos anos de crise, quando se implantou o modelo”, analisa.

O Chile que explodiu, de acordo com o artigo publicado na revista Política Democrática online, nada mais expressa do que a reação a décadas de “estado de mal-estar social”. “Os termos em que se deu tal explosão, com sua violência costumeira, agora triplicada, confirma o paradoxo de uma democracia ainda sustentada numa ordem político-jurídica (a da Constituição de 1980) que carece de legitimidade”, avalia Aggio.

 

Leia mais:

» ‘Patrão manda passar motosserra na Amazônia’, diz garimpeiro de Serra Pelada

» ‘Óleo nas praias brasileiras mostra incapacidade do governo’, diz Anivaldo Miranda à Política Democrática

» Constituição deve nortear reformas no Brasil, diz Gilvan Cavalcanti de Melo à Política Democrática online

» ‘Tinha escravos nos Palmares’, diz Antonio Risério à revista Política Democrática online

» ‘Sinais da economia brasileira são alentadores’, afirma Sérgio C. Buarque na nova edição da Política Democrática online

» Nova edição da Política Democrática online analisa desastre do petróleo no litoral brasileiro

 


Revista Política Democrática || Alberto Aggio: A história volta a pulsar no Chile

Chilenos colocaram para fora toda a raiva frente ao mal-estar resultante do “modelo econômico”, que ordena o país desde os tempos da ditadura do Pinochet, durante as manifestações de outubro

Em outubro, o Chile explodiu. Por vários dias, milhares de pessoas saíram às ruas em marchas de protesto que invariavelmente se tornaram violentas. Estavam no foco dos manifestantes o Metrô de Santiago, as empresas de energia, os bancos controladores das famosas AFPs, que “garantem” a aposentadoria da maior parte dos trabalhadores chilenos, dentre outras. O aumento das passagens do Metrô, a partir de determinado horário, foi o estopim da grande explosão. Mas, como no Brasil de 2013, os chilenos também gritaram “não é só pelos 30 centavos”. E, de fato, não era. Nesse “octubre violento y caliente”, os chilenos colocaram para fora toda a raiva frente ao mal-estar resultante do “modelo econômico”, que ordena o país desde os tempos da ditadura do Pinochet.

O governo de Sebastian Piñera reagiu às manifestações impondo “estado de emergência” e “toque de recolher”, além de convocar o Exército para enfrentar os manifestantes. Para Piñera, o Chile estava “em guerra contra inimigos poderosos”. O resultado de vários dias de confrontos entre forças militares e manifestantes foram mais de 20 mortos, milhares de feridos e centenas de detidos. Olhando o conjunto dos acontecimentos, sua magnitude, os atos violentos dos manifestantes, que chegaram a destruir 70% do Metrô de Santiago, e a violenta repressão, pode-se dizer que não havia ocorrido nada similar em tempos de democracia e que as causas dessa explosão são realmente mais profundas.

Como no Brasil de 2013, a repressão fez com que os protestos se amplificassem até chegar à manifestação de 25 de outubro, que reuniu mais de 1,2 milhão de pessoas no centro de Santiago. Foi um sinal eloquente de que a estratégia do governo havia naufragado. Piñera recuou, propôs algumas reformas paliativas, procedeu a mudanças parciais em seu gabinete e, por fim, suspendeu o “estado de emergência”.

Mesmo assim, a tensão não se dissipou por completo. O mal-estar dos chilenos parece que vai demorar a passar, e muitos falam de um “novo despertar” ou mesmo de uma “nova oportunidade”, para alterar a vida da sociedade em seu conjunto. Há efetivamente um sentimento de esperança no ar, esperança de mudança, e uma confiança difusa de que o que se passou nesses dias foi efetivamente histórico.

Analistas e boa parte da opinião pública doméstica e internacional se surpreenderam com os acontecimentos chilenos. Afinal, o Chile está longe de ser um país desorganizado economicamente, vive anos de crescimento significativo e de melhoria de diversos índices que qualificam sua vida social. O Chile está integrado à globalização, o que o torna um dos países mais cosmopolitas do continente. Enfim, números favoráveis não lhe faltam, inclusive no que toca à renda per capita da região, na qual se sobressai com grande distância diante de outros países. Mas então que pasó?

Tanta surpresa talvez venha da crença de que o Chile sempre foi visto nas ciências sociais e no jornalismo, por chilenos e estrangeiros, como um país “modelar”, por seu pioneirismo ou por sua especificidade frente a outros países do continente. Foi assim que, no passado, se falou da “grande democracia” chilena durante a maior parte do século XX, ao passo que os outros países latino-americanos viviam as desventuras do “populismo”.

Mais tarde foi possível ver que a democracia chilena não era tão inclusiva como se imaginava. O Chile aristocratizante sempre foi uma densa sombra sobre a democracia política que lhe dava fama. Foi apenas em 1958, depois de reformas eleitorais importantes, que o grau de participação aumentou. Entretanto, em pouco mais de 15 anos, o golpe militar de 1973 colocaria por terra aquela experiência de ampliação da democracia chilena. Ela ruiria diante de uma polarização irredutível que castigaria o país por outros longos 15 anos.

Contrapondo-se à imagem da “grande democracia”, foi surpreendente notar que a ditadura de Pinochet encontrou apoio significativo durante sua vigência. Surpreendeu porque a “refundação” da sociedade chilena, sustentada por um projeto econômico neoliberal, aparecia em combinação perfeita com a ditadura de Pinochet que, baseado em sua estrita autoridade, funcionou sem ordem constitucional até o plebiscito que daria ao país a Constituição de 1980, ainda vigente. Foi durante esse regime, quase dois anos depois do golpe, que começaram as privatizações da educação, da saúde e da previdência, acompanhadas por uma abertura integral da economia. O único setor que se manteve estatizado foi a exploração do cobre, principal riqueza do país. Nascia aí o “modelo chileno dos Chicago boys”, outra imagem modelar que iria perdurar no tempo, no país e fora dele.

Uma revisão desse período não tardou a ser feita. O período Pinochet não pode, em absoluto, ser visto como um momento tranquilo e feliz do país. Nele emergiram diversas crises sociais graves, em especial quando da implantação do novo modelo. Com ele vieram a quebra de empresas e o desemprego massivo. O que provocou imagens de desolação, com jovens “pateando piedras” pelas cidades mais importantes do país, algo imortalizado na canção da banda de rock Los Prisioneros, no início dos anos 80. Foi também o período do chamado “segundo exilio” chileno, um exilio econômico, já que o primeiro havia sido político, nos meses e anos que se seguiram ao golpe de 1973.

A manutenção da estatização do cobre manchava a natureza do modelo que tinha como centro o afastamento integral do Estado da vida econômica. A persistência da repressão política do regime comprometia, de alguma forma, sua fachada “liberal” perante o mundo. Para o sociólogo chileno Eugenio Tironi, o liberalismo realmente existente no Chile guardava a mesma relação de antagonismo com a liberdade que o socialismo estatizado da ex-URSS.

O fato é que o modelo neoliberal chileno deixava muitas zonas cinzentas e muitos silêncios para trás. A derrota de Pinochet no plebiscito de 1988 recolocaria as coisas em novos patamares. A partir da vitória da Concertación (uma coalizão de centro-esquerda) na primeira eleição presidencial pós-Pinochet, governos democratizadores se sucederiam por mais 20 anos.

Sem confrontar o modelo privatizador que havia sido implantado, a Concertación acabou por consagrar o modelo neoliberal. O êxito dos governos concertacionistas, com a integração do país à globalização, deu o suporte para uma nova etapa de sucesso relativo da economia, melhorias nos aspectos sociais, avanços na educação, na inovação e na competitividade do país. Contudo, o êxito econômico não alterou a sensação de que se vivia num “estado de mal-estar social”, com salários e pensões ao nível latino-americano e custos de bens e serviços ao nível dos europeus ou norte-americanos.

A notável modernização do país, atestada em números, como notável também é a sofisticação e até o luxo das estações do Metrô de Santiago em bairros pobres – quase todas destruídas, total ou parcialmente – compõem o cenário de um país dividido. Sinais materiais de modernização em contraposição às carências domesticas cotidianas, às expectativas de futuro dos jovens em situação de ameaça, com a recorrente elevação dos custos de educação, além do nível das pensões dos mais velhos frente ao que trabalharam e contribuíram durante toda a vida, tudo isso formou um “caldo de cultura” de raiva diante da flagrante desigualdade e de medo da regressão ao status quo anterior, vivenciado nos anos de crise, quando se implantou o modelo.

O Chile que explodiu nada mais expressa do que a reação a décadas de “estado de mal-estar social”. Os termos em que se deu tal explosão, com sua violência costumeira, agora triplicada, confirma o paradoxo de uma democracia ainda sustentada numa ordem político-jurídica (a da Constituição de 1980) que carece de legitimidade.

Os “modelos” que foram cultivados sobre o Chile em sua trajetória histórica estão agora todos em xeque, e, nas ruas, o povo declara que quer vê-los superados. Ao que parece, não haverá volta atrás, a história voltou a pulsar no Chile e está aberta!

 


Alberto Aggio: Aporias da ‘frente democrática’

A competição eleitoral não deverá obstar uma unidade reformista em favor da Nação

A queda de popularidade do presidente Jair Bolsonaro fez com que se abrissem especulações a propósito do quadro sucessório, que, por sinal, ainda vai longe. Diante das dificuldades de governança cada vez mais evidentes, o próprio presidente não se furtou a estimular o desvelamento do quadro de oponentes, fosse ele composto pelo que resta da oposição derrotada na eleição que lhe garantiu o poder ou por aqueles que, vendo os problemas de largo calado do governo, passaram a buscar um espaço para iniciar a órbita em direção a uma possível candidatura futura.

Sem um projeto claro a perseguir como marca de seu governo, além da confusa intenção de destruir o que “a esquerda impôs ao País” durante as três últimas décadas, a Bolsonaro interessa que a questão eleitoral permaneça flutuando como tema a possibilitar-lhe uma contraposição retórica com seus possíveis adversários. Sua sucessão passou a ser um instrumento usado pelo presidente para medir a temperatura em relação aos seus apoios, sem necessitar, mais uma vez, ceder à articulação com o mundo político. Bolsonaro continua investindo suas fichas nas correias de transmissão que lhe garantiram a vitória eleitoral, com prevalência nas redes sociais.

Permanecer com o porcentual de apoio que lhe garanta a passagem para o segundo turno em 2022 parece ser o objetivo que está por trás dessa estratégia.

Ao admitir que disputará sua própria sucessão, contraditando discurso de campanha, quando defendeu o fim da reeleição, Bolsonaro aferra-se à ideia de que o melhor cenário seria não permitir o surgimento de novos postulantes, consolidando a contraposição eleitoral com o PT, o que lhe garante um público cativo e, supostamente, poderia dar-lhe novamente a vitória. Contudo, como se viu, emergiram alguns nomes, uns mais e outros menos abertamente, que procuraram aproveitar-se da oportunidade para se colocarem como protagonistas dessa precoce contenda. No cenário que se instalou, podem-se identificar alguns “dissidentes” em velada campanha. Outros, na oposição derrotada, pleiteiam uma nova identidade para esse campo, mas há ainda aqueles que acalentam uma confrontação entre “mitos” e continuam a reiterar os velhos bordões de antes. De novidade apenas uma reaparição, até certo ponto esperada, a prometer superar o “último” dos vários “ciclos de erros” vividos pelo país nos últimos tempos.

Em razão da fraqueza da oposição, voltou-se a especular sobre a necessidade de articulação de “frentes” para se contraporem a Bolsonaro. De imediato se propôs uma “frente de esquerda”, antigo mote de uma esquerda ancilosada. Uma opção pela afirmação ideológica e pelo isolamento político, sem nenhuma chance eleitoral verdadeira. De outro lado, fala-se numa “frente democrática”, repondo, de certa maneira, os termos do enfrentamento virtuoso contra a ditadura militar nas décadas de 1970 e 1980. Trata-se de uma proposição mais realista, de memória positiva, bastante complexa nos tempos atuais, que carrega, é preciso dizer, uma certa coloração passadista.

É verdade que foi Bolsonaro quem passou a enfatizar um certo apadrinhamento de seu governo com o regime militar (1964-1984). Mas Bolsonaro expressa mais um setor ou facção reacionária daquele regime do que o seu conjunto. Essencialmente reacionárias, suas declarações e ações políticas guardam um tom de ameaça ao regime democrático da Carta de 1988, o que justificaria a união de forças em defesa da democracia. Sob Bolsonaro boa parte da Nação começa a dar-se conta de que não pode permanecer sob tutela de uma facção insidiosa e deve buscar o diálogo entre diferentes setores político-ideológicos.

No passado, a existência de um “partido-frente”, como foi o MDB, facilitou o sentimento de unidade e a construção daquela “frente democrática”. Atualmente, os partidos e atores políticos estão abertamente em competição eleitoral e isso dificulta a reposição daquele sentimento, bem como sua articulação política num ator relevante. Depois do êxito do PT e de Lula, abriu-se uma fase de “democracia de audiência”, na qual a combinação de interesses com os da mídia, sancionados por pesquisas quase diárias, se estabeleceu como critério decisivo para os atores políticos. Daí partidos e lideranças se terem tornado essencialmente pragmáticos, além de midiáticos, o que acabou por redefinir os termos da competição política. É de perguntar se uma “frente democrática”, baseada numa perspectiva defensiva, encontrará passagem no tipo de política que vivenciamos.

Uma “frente democrática” contra o reacionarismo bolsonarista necessitará apresentar propostas de reformas concretas à Nação, como exposto na entrevista do cientista político José Álvaro Moisés ao Estado (30/9), na qual se postulam temas de qualificação da nossa democracia, como a implantação imediata do voto distrital misto. Certamente outras pautas, de caráter econômico-social, poderiam ser agregadas a essa.

A decisão do STF cancelando a prisão em segunda instância e a soltura de Lula jogam o PT no centro da cena política, complicando mais ainda o quadro eleitoral. Em certo sentido, dá falsas esperanças a uma “frente de esquerda”, que dificilmente se agregará em torno de Lula. Além disso, não dilui a tese da divisão de três terços, acentua a polarização e, por fim, coloca barreiras intransponíveis à fórmula da “frente democrática”.

A rearticulação do centro político em torno de ações políticas renovadoras em sentido democrático talvez seja o novo nome da “frente democrática”. O cenário latino-americano é, como sabemos, de crispação. O Brasil pode se afastar disso forjando um programa comum que se apresente como alternativa a este governo reacionário de facção que aí está. A competição eleitoral, como na Espanha, não deverá obstar uma unidade reformista em favor da Nação, para espantar as divisões e o facciosismo.

 


Alberto Aggio: Lula não pacificará o país

A decisão do STF cancelando a prisão em segunda instância realiza uma intervenção radical na conjuntura política. A soltura de Lula e José Dirceu da prisão, condenados a crimes de corrupção, joga o PT novamente no centro da cena política. Quem imaginava que tudo caminhava morosamente com a divisão de três terços (direita, centro e esquerda) deve ter gostado do resultado da decisão do STF. Isso porque agora o PT sai da defensiva. Não sabemos os movimentos de Bolsonaro. Talvez fique na mesma toada, agitando seus cones ideológicos. O centro deve permanecer no mesmo lugar, em busca de uma identidade mais clara e consolidada para um perfil democrático-liberal, mais progressista ou menos, em oposição aos chamados “dois extremos”.

Pelos discursos dos dois próceres petistas atendidos pela decisão do STF, o PT deve radicalizar sua posição, situando-se em oposição a Bolsonaro (quem imaginava outra coisa estava fora do mundo), mas, mais do que isso. Parece que Lula e o PT irão levantar a bandeira da identidade de “esquerda e socialista”. Com isso, Lula e José Dirceu imaginam que podem “retomar o governo”; na linguagem mais direta de Dirceu: “tomar o poder”. Considerando discursos desse tipo, fica claro que a tal teoria dos três terços, feita para ser superada, não encontrará no PT e em Lula seu algoz já que um discurso assim vai distanciar o PT do centro, necessário para a empreitada de retomada do poder.

Com o PT indo mais à esquerda – sabemos que isso é mais retórica do que outra coisa – revela-se que uma das preocupações de Lula é com o Psol, que cresceu significativamente nesse processo. Trata-se, portanto de uma retomada. Não creio que falar em socialismo a essa altura possa atrair Ciro Gomes e o PDT, aferrados a um nacionalismo ancilosado (o mesmo me parece que se pode dizer do PSB). Essa retomada do discurso petista me parece que só pode vingar nos termos e no campo movediço do lulismo. E ai nós ja sabemos como as coisas se movem, juntando maneirismos e malandragem, no limites, a corrupção. Se não for isso, esquece: não haverá condições de ampliar seus apoios.

Muito provavelmente essa esquerda não se unirá, a não ser pela lógica perversa da corrupção. Outros segmentos de esquerda, a democrática e liberal, está fora de qualquer compromisso como esse e fora desse suposto terço, parte da divisão politica e ideologicamente da sociedade brasileira. Ela ja abandonou qualquer veleidade socialista e não voltará atrás. Esses terços imaginários dificilmente se unirão. A situação também é complicada no campo das direitas e das correntes e partidos ao centro. O futuro de todos eles será decidido democraticamente na competição eleitoral.

Uma coisa é clara. Lula imagina equivocadamente que o tempo passou em vão. Sua libertação ajudará a compreender melhor que a teoria dos três terços só faz sentido dentro de uma lógica de irredutibilidade das estratégias políticas. Ela foi imposta por Bolsonaro e isso lhe garantiu até agora a inciativa política; há grandes cientistas sociais que acreditaram nisso. Mas a realidade não é idêntica a esse desejo, o Brasil é mais complexo. A libertação de Lula ajudará a colocar por terra também a tese de que com Lula na prisão o país não encontraria paz. Como se pode ver pelos discursos dos próceres que estão no centro da cena, trata-se de uma sandice, bem ao gosto do Sr. Fernando Haddad.

Lula não pacificará o Brasil. Bolsonaro é a antítese da paz e da democracia. O Brasil precisa encontrar um rumo novo.


Alberto Aggio || Um lugar errado no mundo

Um nacionalismo anacrônico manchado de reacionarismo não nos serve

Se com Lula já era claro que a política interna vivia fortes condicionamentos externos, particularmente no que se refere a uma inserção do País na globalização, marcada por tensões ideológicas, sem considerar o nível de criminalização que em paralelo se praticou, com o governo Bolsonaro, excetuando aparentemente esta última ponderação, a dimensão internacional parece ser inescapável. O episódio da indicação do filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), é ilustrativo dessa evidência.

Com Bolsonaro acentua-se a percepção de que nos encontramos imersos naquilo que Giuseppe Vacca define como “conflito econômico mundial”, uma situação sistêmica que caracteriza o mundo desde a superação da guerra fria, posicionando-nos definitivamente no tempo da globalização. Trata-se de um conflito perene e global que envolve múltiplos atores em torno de decisões geopolíticas, econômico-financeiras, do mundo do trabalho e da cultura, questões tecnológicas, ambientais, etc.

Torna-se conveniente, assim, analisar o governo Bolsonaro a partir dessa perspectiva. Seu nacionalismo e seu notável reacionarismo são equivalentes ao que ocorre em diversos países e traduzem o lugar que Bolsonaro vê para o Brasil no contexto global. O que se apresenta nos EUA sob Trump ou na Hungria sob Orbán tem lógica similar aos posicionamentos de Bolsonaro, embora este possa talvez ser considerado o mais despreparado dentre tais líderes, tanto em termos pessoais como de assessoria imediata.

O momento que vivemos não recoloca na agenda mundial o retorno da guerra fria, mesmo porque não há duas potências orientando os vetores do “conflito econômico mundial”. A guerra fria foi um conflito forjado de dentro para fora das duas potências rivais, os Estados Unidos e a União Soviética, e representou um equívoco de ambas, já que nenhuma delas seria capaz de suplantar a outra e estabelecer um domínio efetivo a partir de uma suposta vitória militar sobre a adversária (G. Vacca, La Sfida de Gorbaciov – Guerra e Pace nell’Era Globale, no prelo).

Parece não haver espaço também para outros retornos cultivados no imaginário de muitos que ambicionam combater a extrema direita como um conflito do tipo “comunismo versus fascismo” – por evidente anacronismo, além do erro de avaliação que julgava ser tal disjuntiva a única alternativa que existia na década de 1930 –, ou uma confrontação do tipo “frente popular versus nazi-fascismo”, como sucedeu no século passado.

O bipolarismo morreu com a guerra fria, mas um multilateralismo compartilhado pelos principais países ainda não se consumou. O momento evidencia um avanço da extrema direita, até mesmo com a formação de entidades autônomas de orientação internacional de que participam representantes do governo Bolsonaro. Na outra ponta há forte desorientação da esquerda, com inclinações incompreensíveis para uma política de autoisolamento; a exceção surpreendente fica por conta da esquerda dita tradicional, que tem buscado uma renovação, ainda precária e inicial, mas que já dá alguns frutos, como os avanços eleitorais da social-democracia em alguns países europeus. Liberais, conservadores e liberal-democráticos vivem cada um sua própria crise, fustigados pelo iliberalismo da extrema direita, que põe em xeque os fundamentos da democracia liberal representativa. Nas recentes eleições europeias, a novidade foi a emergência de núcleos ecológicos, especialmente os verdes alemães, que difusamente atuam em busca de expressivas alternativas futuras, mas sem ainda alcançar capacidade orgânica e/ou institucional de se conformarem num peso forte no cenário mundial.

Mesmo de forma errática, Bolsonaro se posiciona claramente contra o globalismo e, pela via de um nacionalismo anacrônico, aposta na sua capacidade de anular a dinâmica e os efeitos da globalização entre nós. Trata-se de um equívoco: não há país que possa ficar de fora do “conflito econômico mundial”, que se expressa de forma global. O alinhamento ativo diante dessas circunstâncias – que Bolsonaro por seu viés ideológico de extrema direita não contempla – é a defesa de uma perspectiva de cooperação entre os países, advinda de uma nova orientação estratégica, isto é, de uma política de interdependência que favoreça a convivência entre diferentes e a busca de um destino comum para a humanidade. O regressismo de Bolsonaro é uma escolha que leva o País para o pior dos lados do “conflito econômico mundial”, numa posição subalterna ao atual governo norte-americano, além de vinculá-lo ao que há de mais reacionário na política europeia.

Por um lado, é inútil afirmar uma visão apologética ou catastrófica do novo cenário criado pela globalização. Por outro, no caso brasileiro não se trata apenas de retomar uma política externa equilibrada, uma das marcas da nossa História diplomática, mas de enfrentar politicamente o “conflito econômico mundial” e apresentar ao mundo uma orientação nova diante de um cenário novo. O passado pode, certamente, nos ajudar, mas não será a chave para um futuro de ampla cooperação, suplantando os vetores ideológicos.

É preciso politizar, em termos democráticos, tanto externa quanto internamente, o quadro de conflitos que se estabelece no mundo atual. Isso significa superar a noção tantas vezes mencionada de que vivemos um tempo em que “a política está morta”. Ao contrário, é preciso ultrapassar a antiga noção territorial de soberania nacional e buscar uma perspectiva inovadora para conectar cidadania, nação, interdependência e cooperação. E, com isso, avançar no sentido de recolocar a modernidade em novos termos, com seus ricos avanços e aberturas ilimitadas a novas subjetividades.

O regresso a um nacionalismo anacrônico manchado de reacionarismo não nos serve e pode malograr todas as expectativas de um lugar generoso no mundo para os brasileiros.

*Historiador, é professor titular da UNESP


Alberto Aggio: O espectro do iliberalismo

Eleitores não buscam a derruição da democracia liberal-representativa, mas alternativas a ela

Há uma dificuldade notável em caracterizar a chamada “onda conservadora” ou de “extrema-direita” que varre o mundo. Em alguns países ela se instalou como novo regime político, em muitos como governo e ainda em outros como movimento político de proeminente expressão. Viktor Orbán, um dos seus principais representantes, chamou seu regime de “democracia iliberal”, ao estabelecer controle quase absoluto sobre as instituições do Estado húngaro. Conceito polêmico, muitos dizem que o adjetivo “iliberal” não combina com democracia. Mas não seria despropositado assumi-lo para pensar esse tipo de política.

A agenda iliberal é basicamente reacionária ante as instituições da democracia representativa, com questionamentos aos institutos de controle do Estado Democrático, desqualificação dos partidos políticos e deslegitimação dos atores políticos, sociais e culturais, em confrontação com o pluralismo político. Na disputa política, busca se sustentar a partir da construção mítica de um líder, carismático ou não, como o “verdadeiro” representante da Nação, enquanto os outros atores políticos são tratados como “inimigos do povo”. Essa visão se expande para o plano internacional, no qual grupos e organizações autônomas em diversos setores, mesmo instituições tradicionais como a ONU ou a Unesco, são tratados como representantes de interesses supostamente escusos e seus parceiros internos qualificados como “traidores”.

Trata-se de uma política deliberada, mas não se deve supor que seja um modelo que vai sendo aplicado país a país. O iliberalismo não nasceu de um movimento arquitetado intelectual ou politicamente, como fora no passado o que, em geral, se denomina de neoliberalismo. Reconhece-se quase consensualmente que se trata de uma ampla contestação à democracia e a todos os atores que dão e deram sustentação à sua consolidação e expansão no século 20, especialmente depois da Segunda Grande Guerra.

Conforme amplamente reconhecido, a perspectiva iliberal carrega alguns horizontes utópicos, mas não expressa um programa econômico claro e inovador em nível mundial. Nem afirma a proposição de uma “nova sociedade”, mesmo que faça retórica sobre isso, ilustrando seu discurso com algumas características do próprio liberalismo ou mesmo do neoliberalismo, como a preponderância integral do individuo como “pagador de impostos” e a ideia de uma “sociedade de mercado”.

Talvez o problema analítico mais visível a respeito da política iliberal esteja no fato de alguns dos seus intérpretes a considerarem populista, mobilizando um conceito com acentuada carga histórica, em especial na América Latina, que tem muito pouco que ver com o que se propõe realizar a perspectiva iliberal, notadamente em termos econômicos e sociais. Como no passado a polissemia do conceito de populismo acabou por dificultar uma equilibrada compreensão dos processos que se caracterizavam como populistas, bem como do próprio conceito, hoje, quase do mesmo modo, uma polissemia muito mais alargada vem afetando a visão dos analistas diante de fenômenos tão dispares como Viktor Orbán, na Hungria, Donald Trump, nos EUA, Tayyip Erdogan, na Turquia, Matteo Salvini, na Itália, ou Jair Bolsonaro, no Brasil. Mais do que isso, a admissão de que diante do sucesso do chamado “populismo de direita” a resposta mais efetiva seria apoiar um “populismo de esquerda” (Chantal Mouffe), o que acabaria jogando o tema democrático para fora de qualquer articulação política, subtraindo perspectivas para o futuro. Por esse caminho, ao contrário do que se deseja, o resultado seria embarcar na previsão de Steve Bannon, segundo a qual o “populismo é o futuro da política”.

O caso mais emblemático é certamente o da Hungria, onde o iliberalismo avançou celeremente e não é mais possível deixar de reconhecer que se instalou um regime antidemocrático e antiliberal. O mesmo parece acontecer na Polônia, na Rússia e na Turquia. Na Itália de Matteo Salvini, o iliberalismo se fixa na sua liderança, mas não se constituiu ainda num novo regime. O mesmo pode-se dizer do Brasil no governo de Jair Bolsonaro.

Contudo, pode-se afirmar que, ao contrário dos exemplos acima sumariados, o iliberalismo não tem como prosperar nos EUA, e sabemos qual a razão: a força e a solidez das instituições democráticas do Estado liberal-representativo, bem como a cultura política aberta que marca a sociedade norte-americana. E isso a despeito de os iliberais considerarem Trump a maior liderança mundial dessa corrente política.

Apesar das ameaças da extrema-direita iliberal na Europa, as forças políticas da democracia, nas quais se incluem a direita democrática, a esquerda social-democrática e o centro liberal-democrático, além dos Verdes, se batem contra ela política e eleitoralmente. Estão aí a resiliência da autoproclamada “geringonça”, em Portugal; o fenômeno Macron, na França, mesmo que tenha sido derrotado na recente eleição para o Parlamento europeu; o crescimento dos Verdes, na Alemanha; e as vitórias do PSOE na Espanha e da social-democracia na Finlândia e na Dinamarca, todos resistindo ao avanço da extrema-direita. A recente eleição ao Parlamento europeu mostrou a resistência do projeto democrático da União Europeia contra o iliberalismo da extrema-direita. Assim como a vitória do PD italiano no norte da Itália, retomando cidades históricas da famosa zona rossa.

Não se pode negar a crise da democracia liberal-representativa, mas os eleitores buscam alternativas, e não a sua derruição. Tampouco há espaço para a convocação de “rebeldes” para confrontar o iliberalismo. A alternativa passa por um “compromisso histórico” com a democracia dos contemporâneos, para usar uma expressão cara aos atores políticos que entenderam, em seu tempo e no seu país, que essa alternativa poderia, entre outras coisas, barrar a volta do fascismo.

*Historiador, é professor titular da Unesp


Alberto Aggio analisa identidade do Cidadania na nova edição da Política Democrática

Professor da Unesp e diretor da FAP diz que deve-se saudar o espírito de abertura a novas sensibilidades políticas que emergiu nesse processo

Cleomar Almeida

O iliberalismo expresso por Bolsonaro tem laços internacionais e, como expressão da direita, institui lógica extremista buscando deslegitimar a lógica de coesão e consenso que o país veio trilhando desde a redemocratização. A avaliação é do historiador, professor titular da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo) e diretor da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), Alberto Aggio, em artigo de destaque da sétima edição da revista Politica Democrática online.

» Acesse aqui a sétima edição da revista Política Democrática online

“O que ocorreu para o PPS mudar sua denominação para Cidadania?”, questiona o autor, para responder, em seguida: “Há certamente inúmeras respostas, mas está claro que o PPS (sucedâneo do PCB) não havia conseguido, na sua curta trajetória, construir os pilares que estabeleceriam nova função histórica para o partido”.

De acordo com Aggio, o partido tardou demasiado para assumir uma postura claramente reformista, como ator político.   “Aparentemente, assumiu a versão de que a ‘revolução tecnológica’, que varre o mundo, não necessitaria mais nem de política e menos ainda de atores políticos. A ‘revolução’ em curso se bastaria e varreria tudo o que representou a política e a esquerda nos últimos dois séculos”, analisa. 

O Brasil, conforme escreve o Aggio, está submerso por uma esquerda atrasada e sem futuro, ao mesmo tempo em que emerge o espectro do iliberalismo, com força jamais vista, ganha a contenda eleitoral de 2018 e polariza mais ainda o ambiente político nacional e internacional. “O iliberalismo expresso por Bolsonaro tem laços internacionais e, como expressão da direita, institui lógica extremista buscando deslegitimar a lógica de coesão e consenso que o país veio trilhando desde a redemocratização”, assinala.

O autor também questiona se, diante dessa forte irrupção da política de direita, pode uma mudança como essa que o PPS assumiu, passando a ser o Cidadania, garantir-lhe uma nova função histórica, uma nova identidade, reconhecível pelas outras forças políticas e pela sociedade. Em outros termos, pergunta: “o novo nome o PPS resulta de uma renovação, é uma refundação ou trata-se de algo realmente novo diante da conjuntura dramática que vivemos em termos não só nacionais?”.

Como se reconhece generalizadamente, nas palavras do historiador, a questão não é a mudança de nome e tampouco se resume à dimensão eleitoral, ainda que, segundo ele, isso seja importante e decisivo. “Deve-se saudar o espírito de abertura a novas sensibilidades políticas que emergiu nesse processo, o que gerou novos ares e novas expectativas diante da mudança de nossos costumes políticos”, diz ele.

O problema do contato e da inteiração de culturas políticas diferenciadas passou a ser colocado no âmbito do partido, na avaliação do professor da Unesp. “Abriu-se um espaço de intercâmbio entre os pós-comunistas, os socialdemocratas, os nacionalistas, os liberal-democráticos, os liberais, e assim por diante. Se essa inteiração for vivida com pluralismo, liberdade, realismo e espírito de futuro, essa nova situação poderá dar um novo destino à mudança de denominação proposta pelo PPS”, afirma.

Leia mais:

» Política Democrática online faz raio-x da pobreza na maior favela do Brasil 

» Roberto Abdenur critica política externa de Bolsonaro

» Política Democrática analisa identidade política do Cidadania

 


Revista Política Democrática: “Não há o que celebrar pelo 31 de março”, diz Alberto Aggio

Em artigo na sexta edição da revista Política Democrática online, analista político critica postura do presidente Jair Bolsonaro de querer celebrar o golpe militar no Brasil

Cleomar Almeida

“Cinquenta e cinco anos após o Golpe Militar de 1964 essa postura sinistra é retomada, evidenciando um anacronismo insuportável. Não há o que celebrar pelo 31 de março”. A avaliação é de Alberto Aggio, em artigo publicado na sexta edição da revista Política Democrática online. Segundo ele, o golpe militar de 1964 realizado há 55 anos alterou a história do país, e os brasileiros viveram 20 anos sob um regime autoritário. A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), vinculada ao Cidadania, novo nome do PPS (Partido Popular Socialista).

» Acesse aqui a sexta edição da revista Política Democrática online

“Depois de 1968, com o AI5, ele quase se tornou fascista. Tanto quanto possível houve oposição a esse regime, antes e depois de 1968”, afirma Aggio. “Hoje, o presidente Bolsonaro quer celebrar esse regime, e seus apoiadores falam em uma 'verdadeira narrativa' sobre o que aconteceu a partir de 1964. O que vem a seguir é apenas uma 'memória' que registra apenas um capítulo, em micro, do que foi aquele regime. Cheguei a São Paulo no final de 1970 e ingressei no ano seguinte numa das escolas estaduais mais importantes na Zona Leste: O IEE Nossa Senhora da Penha”, acrescenta.

De acordo com o autor do artigo, em 1970, mesmo sob intervenção, os alunos conseguiram reabrir o Grêmio Estudantil VI de Setembro. Uma das iniciativas dos estudantes foi organizar um grupo de teatro. Na periferia da cidade, segundo ele, a escola era excepcional por vários aspectos, dentre os quais se destacava um teatro para 400 espectadores e uma piscina de tamanho médio, infelizmente já desativada.

“O grupo de teatro que se formou escolheu uma peça para ensaiar e se apresentar ao restante da escola. Tratava-se de 'Somos todos do Jardim da Infância' de Domingos de Oliveira, falecido recentemente. Posteriormente, a Rede Globo faria um especial com a peça, ainda em preto e branco. O texto tratava de um grupo de jovens e suas experiências pessoais e intelectuais no momento em que eles terminavam o colégio e estudavam para passar no vestibular”, lembra Aggio.

Leia mais:

» Política Democrática online: Como os mais pobres poderão ser atingidos pela reforma da Previdência

» Demonização da esquerda já se aproxima de uma escalada muito perigosa, avalia Davi Emerich

» Raul Jungmann é o entrevistado especial da sexta edição da Revista Política Democrática Online

» Sérgio C. Buarque analisa a crise da Previdência em artigo na Revista Política Democrática

» Política Democrática mostra reforma da Previdência como desafio para destravar governo


Alberto Aggio: Do fantasma Pinochet ao risco Savonarola

Bolsonaro mantém seus apoios, mas já vê uma parte deles fugir por entre os dedos

Não foi preciso esperar cem dias para se admitir que os brasileiros elegeram um líder político com agudas dificuldades para o exercício do posto maior da República. Desde janeiro os atropelos se seguem, com bate-cabeça de auxiliares, recuo de ministros, demissão de dois deles, vários disse-desdisses do presidente, causando estupefação e desorientação. Tudo isso sem que houvesse influência direta da oposição.

Jair Messias Bolsonaro carrega um passivo de bravatas que lhe rendeu a imagem de homofóbico, racista, antiparlamentar, anti-institucional, antirreformista, antidemocrata, e assim por diante. Essa imagem negativa afeta o presidente da República e parece ser de difícil superação. Mesmo porque Jair Bolsonaro faz questão de se apresentar como o líder de um governo de “destruição” de tudo o que se havia construído nos 30 anos de vigência da Constituição de 1988, durante os quais se implementou, reformou e inovou, tanto quanto possível, o que previa a Carta Magna.

Não há sentido em sustentar a impostura de vincular os governos Fernando Henrique Cardoso ou mesmo os de Lula da Silva ao socialismo. Foram governos de políticas semelhantes e distintas entre si, dentre elas uma inclinação à privatização das empresas públicas e à manutenção do equilíbrio fiscal, pautas liberais que marcam os últimos decênios em nível mundial. Os problemas advindos do modelo de relação do Estado com a economia, que abrange excesso de estatização, controle de preços, hipertrofia fiscal, centralização de recursos, etc., vem de muito antes desses governos, em especial do período militar, que Bolsonaro louva tanto.

Quem bloqueou a adoção do modelo bolivariano no Brasil, que muitos petistas vocalizavam, foram a sociedade, a imprensa, a opinião pública e, em especial, os institutos políticos que emanam da Carta Constitucional de 1988. Isso precisa ficar claro, para que os bolsonaristas percam a ilusão de que foram eles que barraram a continuidade do petismo e também para que não imaginem que será fácil construir no Brasil, a partir da “destruição” a que se refere Bolsonaro, um novo regime político, fazendo sucumbir a nossa institucionalidade democrática perante uma plataforma de tipo iliberal. Bolsonaro admira um Donald Trump iliberal, mas se esquece de que os Estados Unidos permanecem uma democracia liberal institucionalmente consolidada.

Do governo Bolsonaro emanam vetores que se entrecruzam e até se opõem. Os claros e cada vez mais evidentes conflitos entre os generais que compõem o governo (o vice-presidente Hamilton Mourão incluso) e o grupo “palaciano” comandado pelos filhos do presidente, especialmente em relação ao tema da Venezuela, não são de pouca monta e podem provocar uma quebra irreparável na sustentação política do governo.

Mas o ponto mais agudo advém da reforma da Previdência, alcunhada de “Nova Previdência”. O ministro da Economia, Paulo Guedes, faz blague com a noção de “revolução”. Mas se a inspiração de Paulo Guedes é Chicago e sua aplicação no Chile de Augusto Pinochet, não deixa de haver sentido. Pinochet liderou uma “revolução neoliberal” inversa ao programa socialista em vigor nos anos de Salvador Allende.

Enquanto Pinochet vocalizava que seu governo “não tinha prazos, mas metas”, seus ministros e intelectuais falavam de “revolução silenciosa”. Não há que estranhar a obsessão com a palavra. Contudo o cenário brasileiro é de democracia, sustentada pela Carta Constitucional e suas instituições, situação inteiramente distinta da do Chile nos anos Pinochet.

Imaginar uma ruptura política no Brasil está, por enquanto, apenas no plano das utopias e os militares parecem pouco inclinados a uma aventura como essa. No governo federal são poucos os que percebem que há que fazer política e que se trata de uma maratona de quatro anos, e não de poucos meses.

Na chamada área dos “costumes” ou mais “ideológica”, na qual predomina uma orientação católica ultramontana combinada com um pentecostalismo radical que se fia na letra da Bíblia como orientação para toda a vida social, institucional, educacional e pessoal – o que carrega uma boa dose de hipocrisia –, o governo Bolsonaro se faz parecer mais com o franquismo e o salazarismo, que tiveram a Igreja Católica como apoiadora essencial, do que com o fascismo e o nazismo, que se fundamentavam mais em dimensões econômicas do moderno.

Há, ainda, uma menção mais remota que se pode fazer, a título de reflexão, ressalvando os anacronismos. Se a dimensão religiosa se fixar como conduta central ou ponto de referência maior do governo, Bolsonaro, por seu evidente plebeísmo, poderá ser aproximado ao monge Girolamo Savonarola, que liderou, em 1494, uma revolta contra o poderio oligárquico dos Médicis em Florença.

Savonarola instaurou uma “República popular” fundada na religião e na condenação das artes e da vida social das elites, que, para ele, representavam a decadência de Florença. Savonarola adotou medidas drásticas, como um índex de livros proibidos e a queima deles em praça pública. Seu destino não foi propriamente feliz. Maquivel, em O Príncipe, diz que Savonarola “fracassou na sua tentativa de reforma quando o povo começou a não lhe dar crédito. E ele não tinha meios para manter firmes aqueles que haviam acreditado, nem para fazer com que os incrédulos acreditassem”.

Eleito democraticamente, Jair Bolsonaro mantém seus apoios, mas já vê uma parte deles fugir por entre os dedos. É ilusória sua fé obsessiva nos milhões de apoiadores das redes sociais, sem articulação política e sem que os resultados econômicos se produzam, e desastrosa sua desconfiança em relação aos membros do seu próprio governo, com exceção dos próprios filhos.

 


Alberto Aggio: Bolsonaro, a oposição necessária

Palestra do professor (UNESP, FRANCA, SP) Alberto Aggio, no dia 11 de dezembro de 2018, no grupo Reformistas.

O tema é o Governo Bolsonaro e a oposição necessária.

A palestra é densa, profunda, contextualizada historicamente.

Define e defende a oposição democrática.

São 32 minutos da reflexão desse intelectual engajado, professor, escritor, articulista, da direção da FAP (Fundação Astrojildo Pereira - FAP) e membro do Diretório Nacional do PPS (Partido Popular Socialista).

 

https://www.facebook.com/reformistas.br/videos/276390049706909/


Alberto Aggio: A irrupção da antipolítica

A ‘não realização’ da democracia aos olhos, ouvidos e coração dos cidadãos é sua origem

Desde 2013 a sociedade brasileira vem sendo impactada pela antipolítica. Por diversas formas, um sentimento negativo em relação à política foi se avolumando até atingir o coração da disputa eleitoral de 2018. O que era latente acabou sendo promovido a uma espécie de paradigma, moldando uma verdadeira revolta da sociedade contra a política.

Da erosão do sistema de representação avançou-se celeremente para o rechaço integral à atividade política, considerada nosso grande mal. Capturada pelo sistema de Justiça, a corrupção sistêmica que se realizou durante os governos petistas, promovida pelo partido majoritário e por seus aliados, é considerada sua causa maior. Mas é necessário incluir aí o até então principal partido de oposição ao PT, o PSDB, que não ficou distante desse descalabro, como vem sendo comprovado dia após dia.

No processo eleitoral recente, a antipolítica assumiu o papel de irmã gêmea do antipetismo, ampliando sua negatividade para a esquerda, a social-democracia e mesmo para a democracia. O rechaço acabou se espraiando, fazendo emergir até um anti-intelectualismo que levou de roldão intelectuais, artistas e jornalistas, especialmente aqueles que tiveram algum protagonismo na sociedade desde os anos da redemocratização. Todos passaram a ser vistos como atores contaminados pela corrupção ou por interesses mesquinhos ou mesmo partidários.

A antipolítica estabeleceu, independentemente da cor ideológica de quem a vocalizava, uma solução impostergável: a ideia de que sem mudar, já e radicalmente, não haveria alternativa para o País. E mudar significava deslocar a “velha classe política” e pôr em seu lugar “o novo”, o que quer que isso pudesse significar.

Essa narrativa de condenação dos últimos 30 anos sustentou a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro (PSL) e de alguns governadores de Estado que, aparentemente, sugiram do nada, selando a reviravolta. Em cinco anos se passou da consigna “sem partido” à sedução generalizada de seleção das novas elites governamentais em setores externos à política organizada, chegando ao extremo de um governador eleito pretender encaminhar a escolha dos quadros de primeiro escalão por meio de empresas headhunter.

O casamento da antipolítica com o pensamento que sustentou regimes totalitários não é raro na História. Não há como negar que o pensamento marxista, desde suas origens e na vigência do chamado “comunismo histórico”, expressou uma fragilidade intrínseca em relação à política, em especial à política democrática. Por outro lado, é largamente conhecida a ojeriza do nazismo à política tout court. A assertiva de J. Goebbels, para quem os partidos seriam o grande mal, já que eles “vivem dos problemas da política e não buscam resolvê-los”, não deixa dúvidas. Ambos exemplificam a temeridade incrustada em opções estratégicas sustentadas na antipolítica.

Cenários de crise e de degradação favorecem a antipolítica na conquista de espaços de poder. Na Europa, por exemplo, a crise da democracia tem origem no colapso fiscal do Estado de Bem-Estar Social, concomitante ao avanço da globalização. Isso propagou uma onda negativa de questionamento dos Estados nacionais e depois da União Europeia. A crise da democracia transformou-se, então, numa crise da política. É aí que surgem os atores da antipolítica do nosso tempo, chamados de forma ligeira de “populistas”.

O problema é, contudo, mais profundo e complicado. Envolve aspectos essenciais a respeito da crença na democracia e em suas possibilidades de reinvenção. O pano de fundo de onde emerge a antipolítica é, na verdade, a “não realização” da democracia aos olhos, ouvidos e ao coração dos cidadãos. Isso porque, como demonstrou Tocqueville, a democracia quer garantir a todo ser humano tudo o que se deseja, teoricamente sem nenhum limite – essa a sua “promessa”. Contudo ela funciona unicamente se os desejos estiverem dentro de certos limites. Em outras palavras, a democracia constrói e reforma instituições para mediar desejos, apetites e sentimentos para garantir seu funcionamento. Mas, no essencial, empurra os indivíduos a desejarem para além dos seus limites e assim põe em perigo constante a própria sobrevivência daquele tipo de cidadão que ela não pode dispensar. Em síntese, o espectro da antipolítica espreita permanentemente o percurso de construção da democracia moderna.

Mesmo numa conjuntura problemática, a democracia tem possibilitado aberturas tanto ao que se poderia chamar de hiperdemocracia (a democracia como critério para tudo) quanto ao hiperpluralismo (uma ampliação ilimitada de sensibilidades que invadem o espaço público). Mas, conforme Giovanni Orsina (La Democrazia del Narcisismo, 2018), a emergência de uma cultura narcísica, ao subjetivar todas as atividades, vem alterando o sentido do individualismo moderno. Essa cultura é uma obsessão baseada na incapacidade de perceber a própria pessoa e a realidade como duas entidades separadas e autônomas, de distinguir o que está dentro do que está fora, em suma, o objetivo do subjetivo.

A repercussão disso na política é devastadora. O cidadão, o individuo democrático, fechado em si mesmo, passa a não escutar mais, refuta interpretações e avaliações da realidade que venham de fora dele. Sua relação com o mundo é inteiramente determinada pelo filtro de uma perspectiva subjetiva não educada nem amadurecida pelo confronto. Onipotente, é incapaz de imaginar o futuro a não ser como espelho do desejo, sem mediações, avesso à política.

A irrupção da antipolítica nas sociedades contemporâneas, e no Brasil em particular, não pode ser reduzida ao “fantasma do populismo” nem ao maniqueísmo do embate entre democracia e fascismo. Recuperar a política como um desígnio moderno, sem polarizações estéreis, é o desafio do tempo presente.


Alberto Aggio: Depois das eleições, oposição democrática

Jair Bolsonaro (PSL) venceu o segundo turno das eleições presidenciais com mais de 10 milhões de votos de diferença contra Fernando Haddad (PT). Não foi uma vitória esmagadora, mas foi incontestável e, sobretudo, legítima. Em janeiro de 2019, com a alternância democrática de poder, prevista na Constituição, Bolsonaro assumirá o posto maior da República.

Na democracia, a quem vence cabe a tarefa de governar; a quem perde, fazer oposição. A vitória eleitoral de Bolsonaro não significa a imposição de uma única força política ao país, numa visão simplista de alguns de seus apoiadores, segundo a qual o vencedor “leva tudo”. Os pilares da democracia brasileira, assentados na Constituição de 1988, continuam a dar os parâmetros para a nossa convivência política e social.

Não há dúvida que essa vitória representa uma mudança política significativa na história recente do país. Fala-se do esgotamento ou do final de um período da política brasileira e do advento de uma nova fase. Superando as forças políticas que lideraram a democratização, o presidente eleito traz novamente a direita ao poder depois de décadas em que ela havia sido alijada, com o fim da ditadura militar. O resultado eleitoral em seu conjunto representou a condenação das oligarquias políticas que controlaram o poder nos últimos anos e o rechaço ao conluio entre a “coisa pública” e os interesses dos grandes grupos econômicos.

A direita que se expressa por Bolsonaro não é a mesma dos idos de 1964 e nem poderia ser. Permanece nela, é verdade, um certo ranço e uma retórica anticomunista obtusa e anacrônica face ao fato de que o fim de “comunismo histórico” carrega quase 30 anos nas costas, não havendo nenhuma sinalização do seu reaparecimento ao redor do mundo. Nessa eleição, a direita emergiu travestida de um “populismo iliberal”, seguindo a vaga planetária, além de expressar inclinações reacionárias e autoritárias. O novo presidente é um personagem, a um só tempo, pragmático e midiático – sem ser carismático –, que se utiliza mais de uma retórica instrumental de caráter pentecostal do que propriamente fascista. Tudo isso não é pouco para nos alertar quanto aos riscos que corre a democracia. Contudo, a vitória de Bolsonaro não deve ser vista como um retorno ou uma condenação antecipada do país aos “anos de chumbo”.

Na montagem do governo, com uma reforma administrativa em curso que reduz o número de Ministérios, o presidente eleito parece visar mais a composição de um quadro de referência de mudanças – no qual estão indicativos neoliberais, mas também da democracia política –, do que a emulação de um líder que prepara a instalação de um regime fascista ou de uma ditadura, mesmo que seja de forma gradual. Será certamente um governo de direita porque essencialmente apela à ordem de maneira ameaçadora e quase brutal, pensa mudanças econômicas a partir da régua neoliberal, com poucas ou nenhuma concessão de caráter social, além de ser regressivo, restritivo e anacrônico no plano cultural e ambiental, sem falarmos no plano comunicacional, até agora o mais tenebroso no seu comportamento.

Uma das tarefas essenciais da oposição democrática – que precisa ainda ser construída e articulada – é a de agir para evitar que o estilo (de um violentismo performático) e as inclinações autoritárias do presidente eleito e do seu entorno se transformem em regime político. Os atores políticos que se perfilam no campo oposicionista terão uma árdua tarefa pela frente, em particular a esquerda que terá que se reconstruir uma vez que a linguagem da antipolítica que predominou nessas eleições a atingiu profundamente em suas lideranças, ideias e valores.

Derrotado nas eleições, o PT parece não ver razões para alterar seu posicionamento, fixando-se numa posição de antagonismo irredutível. A considerar o discurso de Fernando Haddad na noite em que se deram a conhecer os resultados, o PT se mantém no interior da célebre divisão “nós versus eles” instituída pelo partido desde os governos Lula. Para o partido, a oposição a Bolsonaro deverá assumir a representação política de uma “outra nação”, aquela que lhe rendeu 46 milhões de votos, na qual a palavra-chave é a da “resistência” a uma espécie de “governo de ocupação”, na infeliz expressão do Wanderley Guilherme dos Santos. Aqui abro um parêntesis: de fato, “resistência” é uma noção cuja origem é a ocupação nazista na França e Itália, que se conformou num referente histórico para a esquerda; na luta contra a ditadura no Brasil, aqueles que haviam aderido à luta armada, ao retornarem à luta política, formularam a “narrativa” da resistência com o intuito de legitimarem essa mudança sem contudo realizarem nenhuma autocrítica; hoje, como se vê, o PT prepara uma nova artimanha, evitando rever seu passado recente com rigor e a devida autocrítica.

A perspectiva de “resistência” que o PT apresenta à oposição vive da expectativa de que o governo Bolsonaro fracasse rotundamente e, quanto mais rápido melhor. Lembra vivamente um retorno às origens e, com isso, uma vocação para o isolamento. O PT não compreende que o tempo não passou em vão, que a sociedade amadureceu e que as forças políticas já não se deixam enredar por artimanhas. Considerando os resultados eleitorais, a situação da esquerda é claramente defensiva e de recomposição. O antagonismo irredutível do PT é condenação ao isolamento.

Claro está que o PT é um ator problemático para oferecer uma estratégia de oposição democrática ao governo Bolsonaro. Além da sua leitura obtusa da nova conjuntura política, o PT ainda se vê acorrentado à miragem da libertação de Lula e das fábulas (o golpe de 2016) que contaminam sua visão a respeito do que se passou no país desde 2013. O PT não reconhece que o partido, e em particular o lulismo, são vistos hoje pela sociedade como duas expressões consagradas da corrupção que o eleitorado condenou nessas eleições. É largamente reconhecido que o principal fator que deu a vitória ao representante do PSL foi o antipetismo, sem mencionarmos os milhões de desempregados que emergiram e cresceram assustadoramente desde o governo Dilma Rousseff.

Para ser crível e não se lançar à luta de olhos vendados, os democratas devem começar por saber o que fazer diante de suas circunstâncias, com realismo e uma perspectiva generosa de futuro. (Esse artigo, finalizado em 04/11/2018, foi publicado originalmente em Política Democrática Online 2, novembro de 2018, p.18-19)