STF

Míriam Leitão: Dia de ontem derrubou a tese de que acusados são perseguidos

O dia de ontem derrubou o argumento de todos os acusados de que são perseguidos. O presidente Temer foi ao Supremo Tribunal Federal com sua tese de ser alvo de perseguição pelo procurador-geral. E seu agravo não foi acolhido. O ex-presidente Lula e seus seguidores continuam defendendo a teoria da perseguição. Mas o fato é que ontem havia fatos acontecendo contra pessoas em campos opostos na política.

O dia começou com a prisão preventiva de Wesley Batista decretada pela Justiça por insider trading (informação privilegiada). Na mesma ação, seu irmão Joesley passou à prisão sem data para terminar. É a primeira vez que alguém é preso no Brasil por manipulação de mercado, e o fato inicia uma outra frente de combate ao crime no país. Sempre houve rumores de compra e venda de ação por vários agentes quando há uma grande operação de mercado. Investiga-se, mas ou não se chega a nenhum resultado ou o suspeito recebe punição leve. Usar informação privilegiada para manipular o mercado ou ter lucro indevido são crimes punidos pesadamente em países em que o mercado de capitais é levado a sério. A Polícia Federal e o MPF se basearam em relatórios da CVM e da PF que constataram a venda e compra atípica de dólar e ações.

O JBS, dias antes da divulgação da delação dos seus donos, fez uma compra alta de dólar e vendeu ações. O dólar disparou e as ações caíram, o grupo então recomprou as ações a um preço bem menor. Com as operações, eles tiveram um lucro indevido de US$ 100 milhões pelos cálculos da PF e do MPF. Essa foi a primeira suspeita de que eles haviam quebrado as regras do acordo de delação, porque quem assina uma colaboração premiada se compromete e não cometer mais nenhum crime sob pena de perder os benefícios. Enquanto assinavam a colaboração, a empresa já manipulava o mercado usando essas informações. A pena de prisão, por ser inédita, leva a outro patamar a repressão ao crime de insider trading. Eles ainda respondem a processo na CVM e podem ter que pagar multas altas e que foram recentemente majoradas. Mas agora ficou claro para os espertos do mercado que a Polícia Federal pode investigar, e o crime, levar à prisão.

A coincidência do presidente Temer estar no STF pedindo a suspeição de Janot, no mesmo dia em que o ex-presidente Lula está de novo no banco dos réus, mostra que ambos não têm razão de se dizer perseguidos políticos. O que está em andamento desde o começo da Operação Lava-Jato é um processo de combate ao crime de corrupção.

O chefe da delegacia de crime financeiro, Vitor Hugo Alves, explicou que, ao venderem suas ações antes da delação para recomprar por preço menor, os irmãos Batista empurraram o prejuízo para os outros acionistas:

— Os Batista detêm 42% da JBS: a maior parte do prejuízo portanto ficou com outros acionistas. O BNDESpar, inclusive, que detém 30% da JBS. As ações caíram até 37% e houve a maior desvalorização do dólar desde 1999, 9%.

Em Curitiba, o ex-presidente Lula chegou de carro, em vez do avião do ex-ministro Walfrido dos Mares Guia. Seus seguidores acorreram em menor número mas sustentaram a mesma tese de que Lula é um perseguido político. Outro argumento une os defensores de Lula e Temer. No Palácio se diz que as acusações contra o presidente podem atrapalhar a recuperação econômica, em Curitiba um dirigente da CUT sustentou o argumento, não se sabe baseado em que, de que cada prisão da LavaJato leva à perda de 22 mil empregos.

A monótona repetição dos acusados, quaisquer que eles sejam, de que são vítimas de perseguição do Ministério Público, do próprio Rodrigo Janot, dos procuradores de Curitiba, ou do juiz Sérgio Moro, foi sendo desmontada a cada nova etapa das investigações. Hoje a Lava-Jato se expandiu por várias cidades e varas, está nas mãos de outras forçastarefas, decisões são tomadas por outros juízos. Como disse a presidente do STF, Cármen Lúcia, quem conduz as investigações não são as pessoas, mas as instituições.

O dia ontem que levou à prisão o ex-governador Anthony Garotinho mostrou mais uma vez que não se trata de ataque a um partido, a um político, ou a uma empresa, mas do combate à prática que inundou as relações entre o setor público e o setor privado e dominou a política brasileira.

 


Luiz Carlos Azedo: Supremo deu o recado

Cármen Lúcia disse que o Ministério Público continuará o trabalho de combate à corrupção, mesmo após a saída de Janot da PGR

Ao manter o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, à frente das investigações sobre o presidente Michel Temer, neste fim de mandato, o Supremo Tribunal Federal mandou um recado para o mundo político: restaure-se a moralidade. Nove ministros da Corte rejeitaram o pedido de afastamento: Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Cármen Lúcia. Não participaram da decisão os ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes.

Em seu voto, a presidente do STF, Cármen Lúcia, disse que o Ministério Público continuará o trabalho de combate à corrupção, mesmo após a saída de Janot da PGR, e que as “instituições são mais importantes que as pessoas”. Não foi uma declaração descontextualizada da troca de guarda na PGR, porque sinaliza o que já se esperava: Raquel Dodge, que substituirá Janot a partir da segunda-feira, não será complacente com os malfeitos apurados na Operação Lava-Jato.

“Há instituições sólidas hoje no Brasil, o Ministério Público é uma delas. O Supremo não permitirá que a mudança de um nome, o afastamento de um nome, altere os rumos”, disse a presidente da Corte. Cármem Lúcia foi explícita quanto ao fato de que todos os processos que se referem à matéria penal não serão interrompidos, apesar das pressões. Esse foi o teor da recente conversa entre a presidente da Corte e a nova procuradora-geral. “O processo penal e a busca de apuração de erros praticados no espaço público, como se tem no espaço privado, não vão parar”, ressaltou.

A expectativa agora é quanto à segunda denúncia contra Michel Temer. O caminho ficou aberto para que isso ocorra nas próximas 48 horas, porque a segunda decisão da Corte, sobre essa possibilidade, foi adiada para a próxima semana, por causa da apreciação do Código Florestal. A sessão foi encerrada por Cármem Lúcia sem que os ministros do STF analisassem o pedido de Temer para impedir Janot de apresentar uma nova denúncia. Outro pedido era para que a Corte examinasse a validade das provas entregues pelos delatores da J&F, que embasam as investigações, mas o relator da Lava-Jato, ministro Luiz Edson Fachin, manifestou-se contra a apreciação da validade das provas no momento.

A sessão do Supremo surpreendeu pelo estilo pessedista (a cúpula do antigo PSD só se reunia quando tudo já estava resolvido). O ministro Gilmar Mendes, crítico implacável da Lava-Jato e desafeto declarado de Janot, permaneceu no seu gabinete na primeira votação. Em nota, disse que “possui posição consolidada a respeito da interpretação restritiva das regras de suspeição e impedimento previstas na legislação brasileira”. Barroso, principal defensor de Janot e da Lava-Jato, não compareceu porque estava num seminário na Universidade de Yale, nos Estados Unidos.

Janot também não compareceu, foi representado pelo vice-procurador-geral da República, Nicolau Dino, que chamou de “absolutamente infundadas” as acusações. Ele foi o mais votado na eleição interna do Ministério Público para o cargo de procurador-geral, mas foi preterido por Temer, que indicou Raquel Dodge. “Nada, absolutamente nada autoriza a conclusão de que haveria inimizade capital entre o procurador e o presidente da República”, afirmou.

Enquanto isso, segue o baile. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestou depoimento ontem, em Curitiba, perante o juiz Sérgio Moro, e não foi preso, como temiam os petistas. Continuará respondendo ao processo em liberdade. Lula foi agressivo, mas o magistrado não caiu na armadilha e evitou polêmicas. Uma nova denúncia foi feita por Janot no fim da tarde, desta vez contra o presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), cujo teor foi mantido em sigilo.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ontem, suspendeu a carteira do ex-procurador Marcelo Miller, por 90 dias. Desde março, Miller é investigado pelos colegas por sua atuação no escritório Trench, Rossi, Watanabe, que defendia a JBS no acordo de leniência. O escritório informou à coluna que não foi responsável pela entrega da gravação da conversa entre Joesley Batista e o executivo Ricardo Saud ao Ministério Público, como publicamos na terça-feira. Quem entregou a gravação foi a defesa na “delação premiada”, o processo criminal.

Seminário
Começa hoje, no Hotel Maksoud Plaza, em São Paulo, o seminário internacional “Desafios políticos de um mundo em intensa transformação”, organizado pela Fundação Astrojildo Pereira (PPS) e o Instituto Teotônio Vilela (PSDB). Entre os palestrantes, Adrian Wooldridge, Stefan Folster e Gianni Barbacetto, além de políticos dos dois partidos, como Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin, Cristovam Buarque, Roberto Freire e José Aníbal. A grande ausência será o prefeito de São Paulo, João Doria, que está em Buenos Aires

 

 


Merval Pereira: A voz do STF  

A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, foi fundamental para desarmar os espíritos na sessão de ontem. A ausência do ministro Gilmar Mendes e do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, na primeira parte, em que foi tratado o pedido da defesa de Temer de suspeição de Janot, permitiu que a discussão se desse em termos estritamente técnicos. Gilmar mesmo disse que assistiu de seu gabinete à sessão e, como não havia divergência, não se pronunciou.

Logo no início, Cármen Lúcia também desarmou uma pequena manobra do advogado de Temer, Antonio Cláudio Mariz, que queria que os dois assuntos, suspeição e suspensão da segunda denúncia, fossem julgados ao mesmo tempo.

O advogado já antevia que o pedido de suspeição não seria aceito e pretendia encurtar o julgamento. Chegou a dizer que, se pudesse, desistiria da suspeição, mas não conseguiu evitar que o plenário se manifestasse a favor do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por unanimidade dos presentes: 9 a 0, já que o ministro Luís Roberto Barroso também não estava no plenário.

Por fim, ao encerrar a sessão antes que o segundo tema fosse julgado, a presidente do Supremo jogou um balde de água fria para acalmar os ânimos de seus pares, deixando para a próxima semana a discussão sobre se uma segunda denúncia deve ser sustada até que se encerrem as investigações sobre as delações de Joesley Batista e seus executivos na JBS, as quais o procurador-geral da República quer rescindir com base em novos áudios.

A nova denúncia, assim, pode ser apresentada sem problemas por Janot antes que ele saia do cargo, na sexta-feira, mas dificilmente terá andamento antes que o pleno do Supremo decida a questão de ordem que está em pauta. O relator da Lava-Jato no Supremo, ministro Luiz Edson Facchin, provavelmente receberá a denúncia, mas não dará andamento a ela, aguardando a decisão do Supremo. Não precisa nem sobrestá-la, basta que a analise com atenção, até a próxima sessão.

Mesmo que decidisse enviar a denúncia à Câmara, o que pode fazer, pois não há decisão sobre o assunto que o impeça, seria um ato inócuo, já que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, que tem maioria governista, alegaria que não pode decidir sobre o tema sem que o STF se pronuncie.

O importante na sessão de ontem foi o comprometimento de uma maioria firme do plenário, com nove ministros se pronunciando a favor da Operação Lava-Jato e do trabalho do Ministério Público. Certamente o ministro Barroso, que está em viagem nos Estados Unidos, seria o décimo voto.

A presidente Cármen Lúcia salientou que não importa quem esteja à frente da Procuradoria-Geral da República: “Há instituições sólidas hoje no Brasil, o Ministério Público é uma delas. O Supremo não permitirá que a mudança de um nome, o afastamento de um nome, altere os rumos, porque as instituições são mais importantes que as pessoas, evidentemente”, disse.

Esse foi o recado mandado ontem pelo Supremo Tribunal Federal para o cidadão brasileiro, o da garantia de que as investigações continuarão, sob sua supervisão, mesmo com o fim do mandato de Rodrigo Janot, que será substituído pela procuradora Raquel Dodge na próxima segunda-feira, e com a provável substituição do diretor-geral da Polícia Federal, que está sendo coordenada pelo ministro da Justiça, Torquato Jardim.

Como este nosso processo de crise política sofre reviravoltas a todo momento, a tentativa de postergar ou mesmo inviabilizar uma segunda denúncia acaba sendo, no atual cenário, mais prejudicial a Temer do que parecia anteriormente.

Com a possibilidade de seu ex-ministro Geddel Vieira Lima fazer uma delação premiada, quanto mais demorar o processo na Câmara, pior para o governo, pois, mesmo que não estejam na denúncia de Janot, eventuais acusações de Geddel contra o presidente, de quem é íntimo há 30 anos, terão o mesmo efeito do depoimento de Antonio Palocci sobre o ex-presidente Lula. Criarão um ambiente político que certamente afetará negativamente a tramitação do processo na Câmara.

 

 


Merval Pereira: Parte da crise

O Supremo Tribunal Federal está no centro da crise política brasileira, e agora não mais como instância mediadora, mas como parte dela. O ministro Gilmar Mendes já demonstrou ontem o tom que levará ao plenário hoje, quando será discutido o pedido da defesa do presidente Michel Temer de suspeição do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, e de suspensão de uma eventual segunda denúncia contra o presidente baseada nas delações premiadas de Joesley Batista e do doleiro Lucio Funaro.

Ontem, o ministro Gilmar, que tem denunciado irregularidades na delação dos donos da J&F e quer anular como prova a gravação que Joesley fez com Temer no Palácio Jaburu, classificou de “gestão de bêbado” o período em que Janot esteve à frente da Procuradoria-Geral da República e disse que o Supremo está “numa situação delicadíssima. O STF está enfrentando um quadro de vexame institucional.”

Ele está certo de que o ex-procurador Marcelo Miller, que ontem teve seu registro de advogado suspenso pela OAB, atuou ajudando a delação premiada dos executivos da J&F e constrangeu o ministro Luiz Facchin, relator da Lava Jato, que deu o aval para as delações da JBS que se mostraram fraudulentas no mínimo por omissão de fatos importantes: “Nesse caso, imagino seu drama pessoal. Ter sido ludibridado por Miller ‘et caterva’ deve impor um constrangimento pessoal muito grande (…) certamente tão poucas pessoas na história do STF correm o risco de ver o seu nome e o da própria Corte conspurcado por decisões que depois vão se revelar equivocadas”, disse Gilmar em uma reunião da 2ª Turma.”

Fachin não entrou no clima de confronto proposto por Gilmar, disse que sua alma “está em paz” e reiterou o voto que proferiu “com base naquilo que entendo que é a prova dos autos”. O escritórioTrench, Rossi & Watanabe, que demitiu o ex-procurador Marcelo Miller pouco depois de tê-lo contratado, mantém uma associação com o escritório norte-americano Baker & Mackenzie, considerado o maior do mundo, há 50 anos. Está colaborando com as investigações de maneira espontânea, certamente orientado pelos americanos, entregando todos os documentos que uma auditoria interna reuniu, demonstrando que o ex-procurador já atuava no caso JBS antes mesmo de pedir demissão da Procuradoria.

Um e-mail trocado entre Marcello Miller e a advogada Esther Flesch – que também foi demitida - indica que o escritório Trench, Rossi e Watanabe pagou uma passagem aérea entre Rio e São Paulo para Miller enquanto ele ainda era procurador, o que caracteriza a prestação de serviço.

O contrato entre o escritório Trench, Rossi e Watanabe e a J&F foi assinado no dia 6 de março, um dia antes de Joesley Batista gravar Michel Temer no Palácio Jaburu. O ministro Gilmar Mendes quer demonstrar que o procurador Marcelo Miller atuou ativamente na delação premiada de Joesley, o que, na sua concepção, invalidaria a gravação, mesmo que Rodrigo Janot não soubesse, no que o ministro não acredita.

Ele chegou a insinuar que o método usado contra o presidente Temer foi o mesmo das gravações do ex-senador Delcidio do Amaral e de Sérgio Machado, presidente da Transpetro, sugerindo que esse era um método utilizado por Marcelo Miller no Ministério Público.

O que está por trás da importância da reunião de hoje do STF é justamente essa disputa para a anulação das provas apresentadas pela Procuradoria-Geral da República contra o presidente Temer e o senador do PSDB Aécio Neves. Não parece haver uma maioria disposta a tomar essa decisão, mas a cada prova que surge contra o procurador Marcelo Miller, mais o ministro Gilmar Mendes reafirma sua suspeita de que tudo não passou de uma armação contra o presidente, e considera que o STF está sofrendo um desgaste institucional com a crise provocada pelas irregularidades registradas na delação premiada da JBS.

Se o clima da sessão de hoje for o que está se armando, porém, sairá prejudicado o próprio Supremo Tribunal Federal como instituição que assegura a democracia brasileira.

 

 


Marco Antonio Villa: Os privilégios do STF  

O Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição (artigo 102). Diz a ministra Cármen Lúcia, no relatório de atividades de 2016, que buscou “racionalizar o gasto de dinheiro público.” Será? Dinheiro não faltou. Em 2016, a Corte recebeu R$ 554.750.410,00. E achou pouco. O pedido inicial era de R$ 624.841.007,00. Desta fortuna, R$ 206.311.277,11 foram reservados ao pagamento do pessoal ativo. E mais R$ 131.300.522,83 para os aposentados e pensionistas. São 1.216 funcionários ativos (554 com função gratificada), 306 estagiários e 959 terceirizados. Há variações nos dados mas o total geral não é inferior a 2.450, o que dá a média de 222 funcionários por ministro. Fica a preocupação de que todos os funcionários não podem comparecer aos locais de trabalho sob pena de colocar em risco as estruturas dos prédios.

Somente entre os funcionários terceirizados (gasto total de R$ 5.761.684,88) é possível encontrar incríveis distorções. É de conhecimento público que algumas sessões são tensas, mas como explicar a existência de 25 bombeiros civis? E as 85 secretárias, média de oito por ministro? Vivemos uma crise de segurança, mas não é exagero a existência de 293 vigilantes? Somos um país cordial mas lá foi levado ao extremo. São necessárias 194 recepcionistas? Divulgar as ações é importante, mas são precisos 19 jornalistas? Com a informatização, como justificar 29 funcionários cuidando da encadernação? Encadernam o quê? Limpar os prédios é importante.

Mas será que o TOC também atingiu o STF? É a única conclusão possível tendo em vista constar na folha de pagamentos 116 serventes de limpeza. A boa etiqueta manda receber bem os convidados, mas pagar a 24 copeiros e 27 garçons não é um pouco demais? Para que oito auxiliares em saúde bucal? É um tribunal ou um consultório odontológico? Preocupar-se com a infância é meritório, mas como justificar 12 auxiliares de desenvolvimento infantil? E os 58 motoristas (ao custo anual de R$ 3.853.543,36)? Sem esquecer os sete jardineiros, seis marceneiros e os dez carregadores de bens — bens? Quais? A imagem da Corte anda arranhada. Esta deve ser a razão para pagar a cinco publicitários. Estes são apenas alguns exemplos entre os milhares de funcionários terceirizados ou concursados que nós pagamos todo santo mês.

A casta trabalhadora é muito bem tratada. O programa Viva Bem patrocinou cursos de ioga, massagem laboral e oficina de respiração. Somente com assistência médica e odontológica foram gastos R$ 15.780.404,89. Ao auxílio-moradia, uma espécie de Minha Casa Minha Vida da Corte, foram reservados R$ 1.502.037,00. Para ajuda de custo (ajuda de custo?) R$ 1.040.920,00. Preocupado com a educação pré-escolar, a Suprema Corte destinou R$ 2.162.483,00. Mas, como ninguém é feliz de barriga vazia, não foi esquecida a alimentação: R$ 12.237.874,00. Preocupados com a vida eterna e com o futuro, suas excelências alocaram R$ 204.117,00 para auxílio-funeral e auxílio-natalidade. Com tantas benesses, dá para entender por que o programa “educação para aposentados” teve apenas dois participantes.

Pesquisando no relatório, alguns gastos de manutenção chamam a atenção, como a rubrica no valor de R$ 1.852.355,49 destinada às reformas e manutenção. O transporte não foi esquecido. São 87 veículos (dos quais três caminhões) que representam um custo de manutenção de R$ 5.420.519,10 (só de lavagem foram gastos R$ 109.642,48). Transparência é um dever constitucional, mas reservar R$ 32.236.498,26 para este fim não é um exagero? Em ações de informática foram torrados R$ 10.512.950,00. Em segurança institucional — a expressão é do relatório — foram alocados R$ 40.354.846,00. Nesta rubrica é possível concluir que a senhora ministra quis adotar o pleno emprego: “a meta física prevista era a manutenção de 487 postos de trabalho. Devido às restrições orçamentárias em 2016, houve necessidade de redução de postos de trabalho vinculados a vários contratos, sendo mantidos 404 postos.” Sim, apenas 404 pessoas para cuidar da “segurança institucional”. Poucos?

Mas, devemos reconhecer, o STF tem seu lado ONG. O setor de “responsabilidade social” organizou a exposição “Eu catador”. Segundo o tribunal, a “mostra de fotos produzidas por catadores de lixo que trabalham no aterro da Cidade Estrutural aconteceu no período de 18 a 25 de novembro de 2016 e pretendeu incentivar a reflexão crítica e sensibilizar a toda a Comunidade do Supremo Tribunal quanto ao impacto do lixo que produzimos.” Parabéns! Em tempo: o relatório informa também que a Corte vem reduzindo o consumo de água.

Nota-se também o excesso de viagens dos senhores ministros. Alguns se ausentaram do trabalho por duas semanas consecutivas. Isto pode explicar que somente 3.373 decisões tenham sido tomadas no plenário contra 102.900 monocráticas. Cabe indagar se o STF é formado por 11 ministros ou temos 11 tribunais federados em um mesmo local? Cada magistrado julga, em média, 10.675 processos. Se subtrairmos as férias forenses, os finais de semana, os feriados prolongados, as viagens nacionais e internacionais, é provável que suas excelências tenham realizado, com louvor, cursos de leitura dinâmica.

Porém, o relatório trouxe três boas notícias. Por falta de recursos orçamentários foram adiadas as construções do centro de treinamento e capacitação de servidores, de mais um anexo e da ampliação da garagem do Anexo II. Tudo orçado — inicialmente — em R$ 1.338.640,00. Resta parodiar o belo hino do Santos Futebol Clube: “nascer, viver e no STF morrer, é um privilégio que nem todos podem ter.”

* Marco Antonio Villa é historiador

 


Fernando Gabeira: Banho de rio, cabeça fria 

-LARANJAL DO JARI- Tenho viajado pelo interior do Amapá, divisa com o Pará, para conhecer melhor a região que Temer quer abrir às empresas mineradoras. Não estava satisfeito com o debate. É preciso ver de perto. Tenho falado com geólogos, pilotos extrativistas, garimpeiros, para ouvir suas opiniões.

Devo refletir um pouco sobre algumas experiências decisivas do Amapá. Uma delas foi a extração de manganês na Serra do Navio. A outra é o projeto Jari, do famoso Daniel Ludwig, que aconteceu a poucos quilômetros do lugar onde estou baseado. Elas deixaram um rastro de decepção.

Navegando num calor de rachar, vi algumas pessoas no rio, à sombra de uma árvore, apenas com a cabeça fora d’água. Invejei seu conforto. Gostaria de estar assim no momento em que escrevo sobre a semana no Brasil. É preciso muito sangue-frio para falar de alguns temas, como as Olimpíadas de 2016 e as malas cheias de dinheiro de Geddel Vieira Lima, ou mesmo os diálogos de Joesley Batista.

As Olimpíadas foram desastrosas para a imagem do Brasil. No princípio, argumentávamos que elas foram pensadas num momento de euforia econômica. A chegada da crise iria mostrar ao mundo nossa vulnerabilidade. Depois, surgiu o debate sobre a Baía de Guanabara e a poluição nas lagoas do Rio. Era ingênuo supor que, ao se revelar para o mundo, os observadores não iriam descobrir que ainda estamos no século XIX em termos de saneamento.

Passados os jogos, reacendeu a discussão sobre o legado. Piscinas abandonadas, velódromo em chamas. Percebemos ali que a tendência era perder muitas das construções, algumas delas superfaturadas.

Quando o “Le Monde” denunciou o suborno para que o Rio fosse escolhido, emergiu de novo a figura de Arthur Soares, o Rei Arthur da corte de Sérgio Cabral. Mas o tema caiu num certo vazio. Era muito constrangedor para nós. Alegrei-me quando Malu Gaspar fez um perfil de Rei Arthur na revista “Piauí”. Pensei: agora sim, não só o enigmático personagem viria à tona como vai ficar mais claro o mal que esse gente fez ao Rio e o tremendo desgaste que os dirigentes, eufóricos com a escolha, impuseram à imagem do Brasil.

A Operação Unfair Play, em colaboração com investigadores franceses, confirma a denúncia do “Le Monde”. E mostra que além de Cabral e do Rei Arthur, contaram também com Carlos Nuzman. Os dirigentes esportivos disputam hoje com os políticos quem joga mais baixo a imagem do Brasil. Nuzman está proibido de participar do sorteio das Olimpíadas. A polícia não o deixa mais sair do país. O presidente da CBF também não deixa o país, com medo de ser preso lá fora.

Devem olhar para as cadeiras vazias do Brasil e lamentar como um país de importância internacional tenha chegado a esse ponto. A medalha de ouro no constrangimento nacional foi a descoberta das malas e malas de dinheiro no apartamento usado por Geddel Vieira Lima, em Salvador.

R$ 51 milhões, horas de trabalho contando o dinheiro nas máquinas. A imagem dessas malas cheias de dinheiro correu mundo, um político de segundo escalão no Brasil tornou-se uma espécie de Tio Patinhas. Creio que o melhor caminho para contornar o constrangimento no exterior é o que usamos aqui dentro para nós mesmos: tudo isso está acontecendo porque há uma competente investigação policial, que conta com o apoio da maioria da população.

Os mecanismos de justiça ainda não parecem à altura do desafio quando vemos que Geddel estava solto, sem tornozeleira, porque não havia dinheiro público para comprá-las. A um quilômetro dali, Geddel acumulava dinheiro para comprar todas as tornozeleiras do país. Suspeito que o dinheiro daria para comprar a fábrica. De qualquer forma, o dinheiro foi recuperado, e, segundo ouvi no rádio, Geddel ocupa hoje o sétimo lugar no ranking de maior assalto no mundo.

Ao pensar nas gravações de Joesley Batista, enquanto descia o rio de volta para Laranjal, tive inveja de novo dos meninos mergulhando no rio Jari. A delação de Joesley foi o ponto mais vulnerável da LavaJato, e por ele entraram também os adversários que querem enfraquecer o combate à corrupção e deixar tudo como está. Há sempre tempo, numa operação complexa como essa, para reparar erros. O melhor caminho, creio, é o de anular a delação de Joesley, mantendo as provas que ele entregou.

Lula, Dilma e o dirigentes do PT foram denunciados. A situação do partido se agrava, e seguem numa caravana pelo Nordeste que lembra um pouco a Caravana Rolidei, numa espécie de despedida. Apesar de o filme de Cacá Diegues “Bye Bye Brasil” ser mais poético e complexo; por isso foi tão discutido por ensaístas no exterior.

A aposta do PT em negar as acusações, reduzilas a uma perseguição política, continua de pé. Mas vai transformá-lo em algo mais próximo da religião. Será preciso acreditar neles, apesar de todas as evidências, supor que a crise econômica nasceu com o governo Temer, que os assaltos gigantescos à Petrobras não aconteceram.

Benza Deus, como se dizia em Minas. A semana merecia um banho de rio.

 


Merval Pereira: O fim próximo 

O pedido de prisão preventiva de Joesley Batista, de seu assessor Ricardo Saud e do ex-procurador Marcello Miller é o desfecho natural de uma aventura de empresários que se aproveitaram do sistema capitalista selvagem e corrupto que estava instalado no país, à medida que os governos petistas, secundados pelo PMDB, institucionalizaram a propina como instrumento de decisões governamentais.

Embora seja reconhecido que o PT não inventou a corrupção na política brasileira, ele se aproveitou dela para montar um projeto de governo que fosse eterno enquanto durasse, e que durasse o máximo que fosse possível alcançar. O Estado brasileiro estava entregue a grupos corporativos e a empresas, como a J&F e a Odebrecht, que estivessem dispostas a jogar o jogo da maneira estabelecida pelos novos donos do poder.

A prisão em flagrante teve sua interpretação ampliada em diversos casos durante a Operação Lava-Jato, ora em final de temporada, já previsto, aliás, pelo próprio procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e pelo juiz Sergio Moro. Foi assim que o ex-ministro Geddel Vieira Lima foi parar na Papuda novamente, depois de descoberto seu bunker milionário. A simples existência desse dinheiro escondido é uma demonstração de que ele continuava delinquindo.

No caso dos irmãos Batista, rescindidos os benefícios do acordo de colaboração premiada pela quebra de confiança promovida por Joesley, que confessou em uma autogravação que não contaria toda a verdade para o Ministério Público, o processo contra o grupo volta à vida nos autos. A prisão preventiva torna-se possível pelo risco que oferecem na destruição de provas e na atividade de conspiração contra as instituições, revelada no tal autogrampo.

O tempo do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin é naturalmente diferente do do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que corre para reparar o erro cometido ao dar imunidade total a delatores que, se vê agora, não mereciam tanta confiança.

Antes de ressaltar eventuais trapalhadas da PGR, a denúncia de Janot mostra que ele foi apanhado de surpresa pelos indícios de que fora enganado em sua boa-fé, e sua atitude deve ter o apoio da sociedade, que reclamava da complacência abusiva com que os delatores foram tratados.

Janot repetia que faria tudo novamente, diante das provas de crimes em curso que a gravação da conversa de Joesley Batista com o presidente Michel Temer proporcionou ao Ministério Público, mas, frente às evidências de que fora ludibriado, não teve dúvidas em recuar e pedir a rescisão do contrato de colaboração firmado com os executivos da JBS.

O Supremo Tribunal Federal (STF) está agora com a bola do jogo, e terá três decisões importantes a tomar. A suspeição do procurador-geral da República para processar o presidente, pedida pela defesa de Temer, está na pauta da próxima quarta-feira, e quase certamente não será aceita pelo plenário.

Mais adiante, terá que decidir se suspende a segunda denúncia contra o presidente Temer até que seja definida a questão das provas contra ele. O ministro Fachin já pediu pauta para esta decisão, que pretende dividir com seus companheiros. Se decidir a favor da defesa do presidente, não quer dizer que o procurador Janot não possa oferecer a denúncia, significa apenas que ela não deverá ser encaminhada à Câmara.

Por último, o Supremo deverá decidir pela validade ou não da gravação feita no Jaburu como prova contra o presidente.

Se existe uma dúvida com relação a isso, pois o pedido de prisão do ex-procurador Marcello Miller significa que a PGR está convencida de que ele ajudou a JBS a fazer a delação premiada, parece haver maioria a favor da manutenção das demais provas, inclusive do depoimento de Joesley que repete e esclarece trechos do diálogo mantido com o presidente Temer.

Como se vê, o Supremo Tribunal Federal (STF) está mais uma vez protagonizando o cenário político. Sem falar no fato de que os pedidos de processos contra as cúpulas partidárias do PT, PMDB e PP englobam os principais políticos do país, além dos demais processos contra senadores e deputados de distintos partidos.

A Lava-Jato parece deslocar-se de Curitiba para Brasília, inclusive nos desdobramentos das denúncias contra o ex-presidente Lula. Será nos tribunais superiores que sua sorte será jogada.

 


Fernando Gabeira: Os medalhistas brasileiros  

A competência dos bandidos do Brasil é ouro em qualquer olimpíada da corrupção

Aqui onde estou, no interior do Amapá, as coisas me parecem confusas. Creio que parecem confusas em toda parte. Mas é sempre difícil de alcançá-las quando as conexões são pobres.

Rodrigo Janot deverá apresentar uma segunda denúncia contra Michel Temer. Teremos de ouvir tudo de novo, cada um com seu voto. Espero que seja menos dramático e que o mercado não leve tão a sério um enredo previsível. Afinal, a economia segue adiante.

Não conheço a delação de Lúcio Funaro. Sei apenas que é o réu mais violento no nível verbal: ameaça literalmente comer o fígado de adversários. Funaro já enrolou a Justiça uma vez. Deve ser uma pessoa cheia de truques, como parecem ser os irmãos Batista.

Janot afirmou que, enquanto houver bambu, vai lançar suas flechas. É uma afirmação quantitativa. Sabemos que a última flecha tem de ser mais certeira e eficaz. Isso se levarmos a sério a analogia com os índios. Não tenho conhecimentos antropológicos para afirmar, apenas suponho que os índios não gostem de errar a última flecha, porque depois dela ou o bicho pega ou o adversário ataca.

A delação da JBS é um dos pontos mais vulneráveis da Lava Jato, embora nada tenha que ver com o trabalho em Curitiba. Foi na esteira do acordo com Joesley que os adversários da operação bateram pesado.

Mesmo quem se coloca abertamente a favor do desmonte do grande esquema de corrupção no Brasil custa a entender não só a liberdade de Joesley Batista, mas também o fato de os procuradores não terem mandado periciar o gravador antes de desfechar o processo.

No front da Lava Jato no Rio de Janeiro avançou, finalmente, o tema denunciado pelo Le Monde há alguns meses: a escolha do Rio para a sede da Olimpíada foi comprada. E reaparece um personagem chamado Rei Arthur. Tive de falar dele em 2010. Suas empresas faturavam bilhões durante o governo Sérgio Cabral. Ele mandava nas escolhas do governo para contratar serviços. Daí o apelido Rei Arthur.

O que aconteceu com os Batista pode ser uma lição. Rei Arthur andou pelo Rio e escapou para Miami, onde vive. Ele certamente vai usar ao máximo sua presença nos EUA para dificultar a prisão. Quando preso, Rei Arthur já deverá saber com antecedência o que falar e o que esconder - a velha tática de oferecer os anéis para salvar os dedos.

A quadrilha montada por Sérgio Cabral, com inúmeras ramificações, tinha alcance internacional, comprou uma Olimpíada. Seu combate se deu com a ajuda decisiva de investigadores franceses.

Os donos da JBS mostraram, também, alto nível de audácia, na medida em que tinham a chave do BNDES, projetavam um crescimento internacional, enquanto no País compravam quase 2 mil políticos. Era inverossímil esta história de que decidiram colaborar porque tiveram uma espécie de epifania e descobriram que trilhavam o caminho do crime.

É importante que a Lava Jato não aceite os anéis para salvar os dedos, não por uma vocação repressiva. Os adversários são fortes. A história da repressão aos tráfico de drogas na Colômbia está cheia de cooptação dos investigadores pelo crime. Os próprios repressores transformavam-se em chefes de segurança dos esquemas do tráfico. Não eram simplesmente subornados, mas contratados pelo seu conhecimento técnico.

No campo político, no Brasil, não houve nenhuma reforma. O máximo possível é acabar com coligações proporcionais e criar a cláusula de barreira. Os passos dados não neutralizam a tendência em não votar em quem tenha mandato. E isso não é garantia nem de uma modesta renovação. Muitas pessoas novas entraram no Congresso e, ao cabo de algum tempo, estavam falando a velha linguagem. É o que acontece quando as regras do jogo não mudam.

Aqui, no interior do Amapá, observei algo comum em outros pontos do Brasil. Em quem confiar?, perguntam uns aos outros ao verem a sucessão de escândalos. A ideia de que a lei vale para todos foi fortalecida com a prisão de alguns poderosos. Não pode haver brechas nela, caso contrário, o desânimo será ainda maior.

Janot precisa avaliar o impacto da delação premiada de Joesley Batista. Afinal, valeu a pena? Quantas informações importantes ele deu? Até que ponto as investigações seriam incapazes de chegar a elas sem prêmio a Joesley?

Possivelmente, a última flecha de Janot ele vai arrancar de seu próprio corpo. Nada de excepcional numa longa batalha.

Pode ser que avance para compreender que errou ao não periciar as gravações, mas encontrar nelas o caminho da reparação.

O quadro geral é mais inquietante quando a desconfiança transborda o universo da política e se expande pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

As mais recentes pesquisas já apontam nessa direção. Certamente, foram influenciadas pela atuação de Gilmar Mendes, mas não se esgotam nele.

A iniciativa de Cármen Lúcia de pedir uma rápida e esclarecedora investigação sobre referência ao STF nas gravações de Joesley vai numa boa direção. No entanto, ela deve saber que a crise na dimensão da Justiça é corrosiva.

Quanto a Geddel Vieira Lima, ele foi solto e voltou para Salvador. As pessoas estão, agora, estupefatas com a descoberta de milhões de reais num apartamento que ele usava. O Estado não tinha dinheiro para a tornozeleira eletrônica de Geddel. Geddel tinha dinheiro para comprar todas as tornozeleiras eletrônicas do Brasil. Por isso é que vale a pena considerar que estamos diante de quadrilhas extremamente capazes e ousadas, não só prontas para assaltar, mas também dispostas a dar uma volta na repressão.

Tantos inocentes, tantos arrependidos, tantos falsos colaboradores - a competência dos bandidos brasileiros é medalha de ouro em qualquer Olimpíada em que tenha a corrupção como modalidade.

Não será fácil vencê-los, embora a Lava Jato tenha alcançado um nível superior e seja o melhor instrumento que encontramos para isso em toda a nossa história.

* Fernando Gabeira é jornalista

 


Murillo de Aragão: O inacreditável mora aqui  

O realismo fantástico se incorporou à rotina do país. Gabriel García Márquez e o seu Cem anos de solidão são fichinha perto do que acontece por aqui. Macondo, a cidade fictícia do romance onde aconteciam coisas estranhas, não é nada perto do que acontece em Brasília e na política nacional.

O Brasil deveria ganhar o Nobel de Literatura por transformar ficção em realidade. Nada supera nossa capacidade de transformar fantasia em pesadelo. Alguns fatos que vieram à tona nos últimos dias comprovam nossa condição inusitada: as novas gravações do empresário Joesley Batista, da JBS, e o achado de milhões em um apartamento de Salvador.

Começo pelo segundo fato. Encontraram mais de 51 milhões de reais acondicionados em malas e caixas em um apartamento da capital baiana. O imóvel seria de um amigo de Geddel Vieira Lima (PMDB), ex-ministro da Secretaria de Governo de Michel Temer e hoje sob prisão domiciliar. Em tempo, o amigo já disse na Polícia Federal que o apartamento estava emprestado para Geddel.

Quem guardaria tanto dinheiro em um apartamento vazio? Como se consegue recolher milhões em dinheiro vivo e transitar pelo país? O que justificaria alguém ganhar 51 milhões e esconder em um apartamento? Que logística foi empregada para tirar o dinheiro dos bancos e fazê-lo chegar ao apartamento?

Ora, quando achávamos que a corridinha com a mala dos 500 mil reais era um escândalo, superamos tudo e a todos com a maior apreensão de dinheiro vivo da história do Brasil!!! As malas – supostamente – de Geddel humilham as malas do Mensalão.

Poucas horas antes, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, veio a público expor outro fato inacreditável. A entrega equivocada à Procuradoria, pela defesa da JBS, da gravação de um diálogo impensável entre Joesley Batista e seu executivo Ricardo Saud sobre o conturbado e polêmico acordo de leniência assinado com os donos da empresa. O que já foi revelado é espantosamente sério. E tragicamente hilário quando se ver o volume de besteiras e grosseiras ditas pela dupla.

Caso se aplique a teoria do domínio do fato ao episódio, na versão do ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa, Janot estaria em sérios apuros por conta da participação de seu ex-braço-direito, Marcelo Miller, no episódio. No mínimo, é tudo muito estranho.

Como um acordo de leniência de tamanha relevância é conduzido de forma tão descuidada e desastrada? Por que, nos diálogos gravados, Joesley diz que a Odebrecht moeu o Legislativo e que ele entregaria à PGR o Judiciário e o Executivo, para, na sequência, defender-se candidamente dizendo que não era bem isso que ele queria dizer?

A trama exposta nos diálogos desmoraliza o acordo de leniência, enfraquece Janot, atinge a reputação do Judiciário e revela que houve um brutal açodamento, um grave descuido e muita imperícia na condução da questão. Tudo ao mesmo tempo aqui e agora.

Também é inacreditável a entrega do material sem a conferência de seu conteúdo. Como as gravações foram entregues? Considerando o grau de maldade dos atores envolvidos, teria sido de propósito? O episódio também comprova que não existe segredo de justiça e que as provas vão sendo sucessivamente vazadas sem que se descubra quem anda vazando.

Ao tempo dos dois episódios mencionados, descobriu-se também que o Brasil teria subornado membros do Comitê Olímpico Internacional em esquema que envolve o ex-governador Sérgio Cabral para que o Rio de Janeiro fosse a sede das Olimpíadas. Cabral... que já é acusado de receber mais de 260 milhões de reais em propinas do pessoal dos transportes públicos do Rio!!!

As revelações de que dois próceres do PMDB – Cabral e Geddel – podem ter amealhado milhões em esquemas de corrupção causa nojo e indignação naqueles que lutaram pela redemocratização do país sob as cores do velho MDB. E que foram perseguidos e prejudicados na luta pela democracia. Que fim triste.

Na mesma leva de acontecimentos dos últimos dias, também sobrou para o PT, supostamente o partido da moral e dos bons costumes políticos: os ex-presidentes da República Lula e Dilma Rousseff foram denunciados no Superior Tribunal Federal, com fartura de provas, sob a acusação de liderarem uma organização criminosa. Para piorar, Antonio Palloci afirmou ao juiz Sergio Moro que Lula participou dos esquemas de corrupção da Petrobras!

A corrupção no Brasil é democrática: vai da direita à esquerda sem maiores constrangimentos e atinge políticos de grande, médio e pequeno porte.

Tempos atrás, o ministro do Supremo Luís Roberto Barroso disse que o sistema político brasileiro era indutor da criminalidade. Estava certo. Mas não é apenas isso. O poder do Estado e sua opacidade permitem que muitos daqueles que dirigem os negócios públicos possam se apoderar da máquina pública para fazer negócios de interesse pessoal, subverter as corridas eleitorais e perpetuar esquemas de poder e de corrupção. Tudo sob as barbas de uma elite omissa, interesseira, ideologicamente doente e incompetente.

Em tempo: a palavra Macondo, nome da cidade fictícia de Gabriel García Márquez, vem do dialeto africano Kituba e quer dizer “bananas”. Se somos mais do que Macondo, seremos mesmo uma República das Bananas e com uma elite de bananas? Cartas para a redação.

* Murillo de Aragão é cientista político


O Globo: Maioria do STF é contra anulação de provas de delação da JBS

A eventual revisão dos benefícios acertados na delação premiada de Joesley Batista e Ricardo Saud não deve invalidar as provas já apresentadas pelo dono e o executivo da JBS. Dos 11 ministros do STF, pelo menos seis são contra a anulação de todas as provas. Decano do STF, o ministro Celso de Mello disse que há, no mínimo, três precedentes nesse sentido na Corte. O ministro Luiz Fux defendeu a prisão de Joesley e Saud após a divulgação da gravação da conversa dos dois, que pode levar à anulação dos benefícios da delação. Para Fux, os delatores deveriam ir do “exílio nova-iorquino para o exílio da Papuda”.

Ao menos seis dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a maioria, são contrários à anulação de todas as provas e indícios apresentados pelos executivos da JBS em delação premiada. Na próxima semana, a Procuradoria-Geral da República (PGR) deverá suspender a imunidade penal de Joesley Batista e do executivo Ricardo Saud, segundo duas fontes que acompanham o caso de perto. Será a conclusão do processo de revisão do acordo aberto na segunda-feira, com suspensão da imunidade penal. Em seguida, o procurador geral da República, Rodrigo Janot, vai levar o caso para discussão no plenário do STF.

Os ministros querem discutir não só a retirada de benefícios dos delatores, mas também a validade das provas. A imunidade penal é o maior benefício previsto no acordo de delação dos executivos da JBS. Sem proteção, os dois poderão ser processados e punidos inclusive com prisão. Para a maioria da Corte, os benefícios dos colaboradores, como o direito de não serem processados, podem ser suspensos sem necessariamente invalidar as provas.

A anulação de parte do acordo será feita porque o áudio entregue à PGR na semana passada pelos próprios delatores revela fatos que não haviam sido mencionados antes. O acordo de delação veda omissões.

Antes de jogar a discussão no plenário do tribunal, a PGR ouvirá Joesley e Saud. Os depoimentos estavam marcados para amanhã na sede da PGR, com a subprocuradora-geral Cláudia Marques. Ela poderá convidar integrantes do grupo de trabalho da Lava-Jato para participar do interrogatório. Diante de um pedido de urgência da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, os depoimentos serão antecipados para hoje de manhã.

No áudio, entre outros assuntos, os delatores mencionam integrantes do STF. O ministro Luiz Fux, o mais feroz nas críticas aos colaboradores da JBS — ele sugeriu a prisão de Joesley e Saud —, defendeu a manutenção de parte das provas. Os depoimentos podem deixar de valer, mas outros elementos deverão ser aproveitados:

— Acho que as provas que subsistem autonomamente podem ser aproveitadas. A prova testemunhal dele não pode valer, mas os documentos que subsistem por si sós, eles têm de ter vida própria.

USO ATÉ MESMO CONTRA DELATORES
O ministro Marco Aurélio Mello desenvolveu um raciocínio diferente: a manutenção da validade dos depoimentos, que ele chamou de “indícios de provas”:

— Anular a delação, não. O que se torna insubsistente é a cláusula dos benefícios. Só isso. O que é a delação? Um depoimento. E depoimento prestado não se vai para o lixo.

O ministro Celso de Mello, o mais antigo do Supremo, defendeu o uso das provas obtidas até mesmo contra os próprios delatores, dependendo do rumo da apuração.

— Se, a partir do depoimento do agente colaborador, sobrevier a corroboração daquelas provas a partir de uma fonte autônoma e independente de prova, então, até mesmo contra ele próprio poderá haver essa utilização — afirmou Celso.

Em caráter reservado, outro ministro do STF defendeu a possibilidade de uso das provas nas investigações porque a rescisão do acordo foi causada pelos delatores e não pelos investigadores. Um quinto integrante afirmou que a Corte deve manter a validade de pelo menos parte das provas. No entanto, depois do escândalo, elas perderiam a força nas investigações, ou seja, não teriam tanta credibilidade.

Anteontem, em Paris, o ministro Gilmar Mendes deu entrevista dizendo que a questão da invalidade das provas terá que ser examinada em cada tópico. Mas apontou um fato que poderá ter reflexo sobre todas as provas produzidas.

— Tudo indica que os delatores receberam treinamento da Procuradoria muito antes de fazer aquela primeira investida. Sobre isso, eles terão que responder. E obviamente vai surgir a discussão sobre prova ilícita ou não — disse Gilmar na terça.

Apesar da menção, não há, na conversa dos delatores, indicação de qualquer irregularidade cometida pelos ministros do STF. Joesley e Saud comentam também sobre aproximação com o então procurador Marcello Miller para, a partir daí, chegarem até o procurador-geral. Miller teria até orientado Saud a preparar os anexos da sua delação. Em nota divulgada, Joesley e Saud dizem que nenhuma referência aos ministros do STF era verdadeira.

NO STF, TENDÊNCIA DE PUNIÇÃO EXEMPLAR
Cresce, também dentro do Supremo Tribunal Federal, a pressão indireta para que o procurador-geral peça a prisão dos dois executivos da JBS. A maioria dos ministros entende que as provas obtidas a partir da delação dos executivos são válidas. Mas, ainda assim, avaliam que, pela desenvoltura nas tratativas do pré-acordo, os dois precisam sofrer algum tipo de punição.

Desde segunda-feira, quando o caso da gravação involuntária chegou ao Supremo, os ministros têm conversado sobre o assunto. Eles demonstram indignação e querem punição exemplar do dono da JBS. A defesa dos executivos tem dito que os dois tiveram, na verdade, uma “conversa de bar”. Argumentam ainda que foram os dois que entregaram à Procuradoria-Geral da República a gravação das conversas desfavoráveis a eles próprios.

Com isso, os colaboradores teriam cumprido a promessa de entregar todos os documentos disponíveis relacionados à delação no prazo estabelecido pelo STF, ou seja, não destruíram provas e nem se omitiram sobre fatos conhecidos sobre o caso.

 

 


Folha de S. Paulo: Supremo sofre agressão inédita, diz ministra Cármen Lúcia

A presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministra Cármen Lúcia, informou na noite desta terça-feira (5) que pediu à Polícia Federal e à PGR (Procuradoria-Geral da República) uma investigação imediata para apurar as declarações feitas pelos executivos da JBS Joesley Batista e Ricardo Saud em conversa gravada acidentalmente.

"Agride-se, de maneira inédita na história do país, a dignidade institucional deste Supremo Tribunal Federal e a honorabilidade de seus integrantes", diz Cármen Lúcia.
A ministra diz que os investigadores devem informar datas de início e fim para o trabalho.

Ela informou que exige "investigação imediata, com definição de datas para início e conclusão dos trabalhos a serem apresentados, com absoluta clareza, a este Supremo Tribunal Federal e à sociedade brasileira, a fim de que não fique qualquer sombra de dúvida sobre a dignidade deste Supremo Tribunal Federal e a honorabilidade de seus integrantes."

Para a ministra, "impõe-se, pois, com transparência absoluta, urgência, prioridade e presteza à apuração clara, profunda e definitiva das alegações, em respeito ao direito dos cidadãos brasileiros a um Judiciário honrado", afirmou.

Nos grampos entregues pela J&F na semana passada, aparece um áudio em que Joesley Batista e Ricardo Saud, executivo da empresa, falam sobre um diálogo com o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que teria sido gravado.

Na conversa entre os dois delatores, Saud cita ainda pelo menos três ministros do STF: Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.

O nome "Marco Aurélio" aparece na conversa, mas não é uma referência ao ministro do STF Marco Aurélio Mello e sim, a Marco Aurélio de Carvalho, advogado e sócio do ex-ministro da Justiça em um escritório.

JBS
Em nota, a JBS pediu desculpas pelas declarações dos delatores e disse que as afirmações não eram verdadeiras.

"A todos que tomaram conhecimento da nossa conversa, por meio de áudio por nós entregue à PGR, em cumprimento ao nosso acordo de colaboração, esclarecemos que as referências feitas por nós ao Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral da República e aos Excelentíssimos Senhores e Senhoras Ministros do Supremo Tribunal Federal não guardam nenhuma conexão com a verdade. Não temos conhecimento de nenhum ato ilícito cometido por nenhuma dessas autoridades", diz o texto.

"O que nós falamos não é verdade, pedimos as mais sinceras desculpas por este ato desrespeitoso e vergonhoso e reiteramos o nosso mais profundo respeito aos Ministros e Ministras do Supremo Tribunal Federal, ao Procurador-Geral da República e a todos os membros do Ministério Público."

 


Míriam Leitão: Conversa sórdida revelou quem é o empresário que se sente acima da lei

Nojo. É o que se sente ao ouvir o empresário Joesley Batista discorrer na intimidade e em conversa regada a bebida sobre o Brasil, o MP e o STF, e até sobre a própria advogada. É uma conversa sórdida. Mas, para além da repulsa, há ainda o fato de que ele se sente inatingível. Joesley é o delator a quem foi dada a imunidade penal. Ele se sente inimputável e por isso garante que não será preso e salvará a empresa.

O que vazou é uma conversa desqualificada sobre ministros e ministras do Supremo, comentários machistas até sobre a própria advogada que os defende. O que existe de mais sólido envolve o procurador Marcelo Miller. O resto é o lixo de um homem sem limites e sem parâmetros que fala com deboche até sobre pessoas de sua intimidade.

É o momento mais delicado da Lava-Jato porque a tentativa dos adversários do combate à corrupção será a de aproveitar a situação, desmoralizar o processo de investigação e de delação premiada. A situação toda é tão irregular que os áudios já estavam circulando, e o ministro Edson Fachin ainda não os havia recebido. O protocolo do STF abriu às 11h30m, depois os áudios foram oficialmente encaminhados ao STF.

Mas, na verdade, essa é a grande chance de a PGR se livrar do peso de ter concedido o inaceitável aos irmãos Joesley e Wesley e aos executivos da JBS. A certeza da impunidade que Joesley e Ricardo Saud demonstram não convive bem com os pilares da democracia. A concessão de tão grande benefício foi o momento mais fraco do procurador-geral. Ele poderia ter aproveitado o medo que os empresários e executivos tinham da chegada dos “capa preta”, como Joesley diz, e obter todas as informações que teve oferecendo em troca uma punição branda porém aceitável.

Ficou claro durante todo o processo da Lava-Jato que a delação premiada tem a vantagem de trazer as informações que revelaram o que o Brasil sabe hoje sobre o poder político e as empresas. Agora ficou claro também que ela tem mecanismos contra os erros eventualmente cometidos. As cláusulas do acordo cobriam a possibilidade que acabou se confirmando, de que Joesley tinha escondido parte das informações. Mas qual parte? A parte que se volta contra o próprio Janot. Ele trabalhou três anos ao lado de pessoa que acabou virando um agente duplo. Marcelo Miller colaborava com os delatores estando ainda no Ministério Público e ninguém percebeu.

O mercado financeiro, que tem uma forma muito torta de pensar, comemorou pela manhã. A bolsa subiu e o dólar caiu porque os investidores concluíram que tudo isso mantém o presidente Michel Temer no cargo e, portanto, o cronograma das reformas. Na verdade, ninguém se fortalece com situação tão confusa, esse emaranhado institucional. À noite, o Ibovespa devolveu os ganhos e fechou estável. Ontem foi um dia particularmente horroroso. Malas de dinheiro encontradas na Bahia, operação internacional para apurar se houve corrupção na escolha do Rio como sede das Olimpíadas, os áudios dessa conversa repulsiva e denúncia contra o PT, incluindo, pela primeira vez, a ex-presidente Dilma. O Brasil nas edições online era o retrato de um país devastado.

O procurador-geral tem o poder de decidir o destino dessa delação. Ele abriu o procedimento para reavaliar o acordo de colaboração. Pode anular, rescindir ou apenas rever os termos do acordo retirando benefícios concedidos. Depois que tomar a decisão, ela será levada ao ministro relator.

O ministro decidiu ontem que não caberia atender ao pedido do procurador-geral de manter em sigilo as fitas que levaram ao procedimento de reabertura do acordo. Pode ter tomado a decisão apenas pela constatação de que não adiantava decretar o sigilo de algo que já estava na rua. Mas Fachin foi além e argumentou em favor da publicidade do processo, informando que ele deve ter precedência até sobre o direito da intimidade. Portanto, o episódio confirma a tendência de adotar o sigilo apenas em raros casos, porque deve prevalecer o interesse público.

O curioso desse lance inesperado é que ele revela que Joesley passara a grampear tanto que chegou até a se gravar inadvertidamente. E mais, entregou o material à PGR sem sequer ouvir as fitas. Seu afã era de arrebanhar provas e indícios contra seus interlocutores para ser aquele que dá o último tiro e um dia poder dizer à mulher: “querida, sabe aqueles nossos amigos...”

(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)