Rodrigo Maia

Maia diz que se vê como alternativa presidencial no longo prazo

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), reconheceu ontem, em entrevista ao programa do jornalista Roberto D'Ávila, na GloboNews, que pode alçar voos mais altos na político no longo prazo. Perguntado diversas vezes ao longo da conversa se não teria intenção de assumir a Presidência do Brasil, no lugar de Michel Temer, o deputado federal disse que seu papel atual é presidir a Câmara e que jamais faria algo para prejudicar Temer.

"O político, quando entra na política, sempre sonha com o máximo. Isso aí seria besteira não admitir. Mas neste momento, não", descartou o parlamentar. "A longo prazo, é óbvio, chegar onde eu cheguei já me coloca, daqui a duas ou três eleições, como uma alternativa", acrescentou.

Maia reafirmou que como parlamentar apoia o presidente Michel Temer, mas como presidente da Câmara dos Deputados vem mantendo posição de neutralidade em relação às denúncias feitas contra o mandatário.

"Uma coisa é o presidente da Câmara, outra é o deputado eleito pelo DEM que apoia o governo do presidente. Esse deputado vai ser sempre leal", afirmou Maia, acrescentando que manterá distância em relação ao governo, respeitando a Constituição Federal e o regimento interno da casa na tramitação das denúncia contra Temer.

A entrevista com o deputado federal foi gravada na tarde de ontem, no Rio de Janeiro.

Maia afirmou que o ideal para o Brasil seria que não tivesse havido o fatiamento das investigações contra o presidente Michel Temer, mas que respeita as decisões neste sentido tomadas por outros Poderes. Para o presidente da Câmara, o fatiamento enfraquece a posição de Temer em votações na Casa.

"O ideal para o Brasil é que tivéssemos apenas uma denúncia. Mas esse é um papel que cabe ao procurador-geral [da República] e ao ministro [do Supremo Tribunal Federal Luiz Edson] Fachin. O ministro Fachin já desmembrou o inquérito em dois. Então, ele mesmo viu motivos para separá-los", disse Maia, acrescentando que não tinha qualquer intenção de fazer críticas a outras instituições. "Não estou aqui para fazer críticas a outras instituições. Inclusive acho que no Brasil de hoje nós precisamos repactuar as relações entre os Poderes."

O presidente da Câmara criticou o que considera um excesso de declarações feitas por fontes não identificadas sobre assuntos do alto escalão do governo. "O Palácio [do Planalto] tem que falar menos", disse Maia, queixando-se das inúmeras "bocas" que falam pelo governo. Na avaliação dele, essa multiplicidade de fontes que falam sem se identificar acaba por atrapalhar o bom andamento da administração. "Pelo Palácio fala o presidente e seu porta-voz", acrescentou.

Rodrigo Maia reconheceu que as denúncias de corrupção contra Temer são graves. No entanto, minimizou o suposto uso de emendas parlamentares pelo presidente para garantir a rejeição na Câmara de Constituição e Justiça (CCJ) do relatório favorável à autorização para que o Supremo Tribunal Federal analise a denúncia contra ele. "Se cada emenda resolvesse o problema, Dilma ainda seria presidente do Brasil", argumentou. Com relação à troca de parlamentares na CCJ, para produzir um placar favorável a Temer, Maia afirmou que a instância definitiva será a votação da denúncia em plenário.

Maia afirmou que vem cobrando diariamente do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, a assinatura definitiva do acordo de recuperação fiscal entre a União e o Estado do Rio de Janeiro. "Nós perdemos completamente o controle da segurança pública no Rio", disse o deputado federal ao jornalista Roberto D'Ávila.

O presidente da Câmara frisou ainda que defende a implementação imediata do Plano de Segurança Nacional no Estado do Rio. Segundo o parlamentar, suas tentativas de acelerar a ajuda ao Rio de Janeiro mostram que, mesmo apoiando o presidente Michel Temer, ele e o governo federal divergem em alguns pontos.

Por Rodrigo Carro | Valor Econômico


Alon Feuerwerker: Dois pontos na análise política: 1) o bom senso e 2) a possibilidade de ele não resolver o problema

Método bom na observação da política: cogitar também o oposto do que indicam o bom senso e a lógica linear. No mínimo, relativizam-se os impulsos vindos do desejo do analista. A política é teatro, e ser brechtiano ajuda. O saudável distanciamento crítico. É sempre prudente pensar que pode acontecer exatamente o contrário do previsto, ou desejado.

O que diz o senso comum? Que a cada denúncia apresentada será mais penoso aos deputados federais bloquearem o processo no Supremo Tribunal Federal contra o presidente, pois o desgaste deles vai ser cumulativo. Isso faz sentido. Apoiar caninamente o governante de popularidade residual tem tudo para virar um problema na hora de pedir o voto do eleitor.

Mas, e o outro lado? A maioria dos deputados elege-se por um sistema quase distrital. Vale o apoio de prefeitos, vereadores, cabos eleitorais. O eleitor vota num número, sem muitas vezes saber de quem é. Os CNPJs estão proibidos nas campanhas. Candidatos dependem cada vez mais de algum orçamento público. E portanto dependem cada vez mais de algum governo.

Um movimento inteligente do poder é tratar de maneira bem distinta amigos e inimigos. Se dois deputados de certo estado ambicionam o Senado, e se recebem do governo tratamento igual, ou parecido, o risco é perder o apoio de ambos. Mas se a traição tem custo alto acaba funcionando o dilema do prisioneiro. O primeiro a fechar tem vantagem.

Se estar de bem com o Planalto é um ativo, ele fica mais valioso à medida que cresce o desgaste do político. Quanto maior o passivo do deputado por ter votado com o governo numa tese impopular, mais dependente ficará desse mesmo governo para manter uma base eleitoral que reproduza seu mandato e lhe garanta mais quatro anos de vida política ativa.

Não se deduz daí que a base reunida por Temer para barrar a primeira denúncia lhe garanta tranquilidade nas seguintes. Será preciso trabalhar, inclusive porque as forças opostas não ficarão paradas, e o fluxo de fatos novos parece garantido. Mas o sistema de estímulos e incentivos é mais complexo do que indicam o bom senso e a lógica linear.

#FicaaDica

O Planalto está mais próximo de bloquear a primeira denúncia do que a oposição de autorizar o STF a receber. O governo tem uma base firme entre 220 e 250 deputados, bem acima do mínimo para sobreviver, 172. Mas os adversários reúnem hoje força suficiente para manter o assunto pendurado, pois o presidente da Câmara decidiu que só tem sessão com 342 presentes.

O ponto fraco do governo é a capacidade de a oposição prolongar o impasse, e manter portanto um sofrimento político que faça crescer no chamado mercado a dúvida sobre o futuro da ambicionada agenda liberal. E o ponto fraco da oposição é que o governo pode jogar com duas táticas para conseguir derrubar a primeira denúncia em plenário.

Há a maneira light de um deputado ajudar Temer agora. Dando quórum. Poderá depois votar a favor do processo, pois é baixa hoje a probabilidade de a autorização conseguir bater 342. Em todo caso, será fácil medir a correlação de forças: descubra quem está obstruindo e você saberá que o outro lado está com a confiança em alta. Ainda que não votar seja hoje a melhor maneira de todo mundo se proteger.

A ampla frente

A Lava-Jato é uma potência e continua com momentum. Mas está cercada. Mais ou menos como o PT e Lula. São de longe o partido e o candidato com maior apoio e prestígio. Para, entretanto, voltar ao poder, precisam de aliados e estão sem. A frente mais ampla do momento é dos que querem se livrar, ao mesmo tempo, da Lava-Jato agora e de Lula e o PT em 2018.

Esse bloco está no Parlamento, na imprensa, nas redes sociais. Temer é sua expressão cristalizada, e aí reside sua força. Como pode sustentar-se um governo alvejado por seguidas acusações e com simpatia popular de um dígito? Por ele ocupar o centro do tabuleiro. E poder, inclusive, aliar-se taticamente à Lava-Jato contra o PT e ao PT contra a Lava-Jato. É o que acontece.

Falta um detalhe

O governo Dilma Rousseff caiu quando Michel Temer chamou os políticos para finalmente repartir o poder. Rodrigo Maia ainda não começou a fazer isso. Quem aliás faz só isso é Temer. Que assim se protege do próprio Maia. Que depende cada vez mais de sua excelência, o fato novo.

* Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação


O Globo: Um cenário de perigos para Temer

Temer e seu grupo conseguem contornar resistências na CCJ, mas a demora para que o pedido de licença seja votado no plenário funciona contra o presidente

Editorial O Globo

Sem conseguirem colocar em plenário o mínimo regimental de 342 deputados para votar o relatório aprovado, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), sobre o pedido de licença da Procuradoria-Geral da República para que o presidente seja processado no Supremo por corrupção, restaram a Temer e a seu grupo aceitar o calendário fixado por Rodrigo Maia (DEM-RJ), para a apreciação da matéria no dia 2 de agosto, uma quarta-feira, na volta do recesso.

Frustrou-se, assim, a ideia do Planalto de votá-lo a toque de caixa. E, para justificar a derrota, forjou-se a “narrativa” de que quem precisa obter o quórum é a oposição. Mas esta avisa que no dia 2 ficará à espera da bancada da situação.

Na verdade, estava — e continua a estar — correta a avaliação do governo de que, quanto mais o tempo passa, maior o risco de desgaste do presidente.

Há munição de razoável poder destrutivo na PGR. Considera-se, por exemplo, a possibilidade de Rodrigo Janot, procurador-geral até setembro, ainda desfechar pelo menos mais uma denúncia contra Temer. Poderá ser por obstrução da Justiça, comprovada por gestões junto a Josley Batista, do grupo JBS, para comprar o silêncio de Eduardo Cunha e Lúcio Funaro, inquilinos da Lava-Jato, nas carceragens de Curitiba.

O assunto é tratado de forma dissimulada na conversa com Temer que o empresário gravou, em horas avançadas de uma noite de março, no porão do Palácio do Jaburu, no qual Batista entrou dando nome falso e sem mostrar documento de identificação.

Os fatos tendem a andar de forma mais lenta na Câmara, na tramitação desta denúncia, a de corrupção. E deve vir por aí a delação premiada de Lúcio Funaro, uma testemunha com potencial de ser tão perigosa quanto Rodrigo Rocha Loures, deputado suplente pelo PMDB do Paraná.

Loures foi indicado pelo próprio Temer a Joesley Bastista, para tratar de “tudo” com ele, representante seu de extrema confiança. Logo depois, Loures foi filmado, em ruas de São Paulo, puxando às pressas a tal maleta com R$ 500 mil. Os indícios são de que seriam para o presidente.

Já Funaro, operador financeiro das sombras de Eduardo Cunha e de outros do PMDB — Temer? — já antecipou em conversas antes da delação propriamente dita que entregava malas de dinheiro a Geddel Vieira, ex-ministro de Temer, outro muito próximo do presidente.

Por sinal, na conversa que Joesley gravou com o presidente, ele reclama que, com Geddel fora do governo e investigado pela Lava-Jato, perdera um intermediário privilegiado para comunicar-se com Temer. O presidente, então, indicou Loures.

O tempo não corre mesmo em favor do Planalto. Um indicador pouco risonho para o governo foi a rodada de pressões e de fisiologismo para trocar 13 deputados na CCJ, e conseguir derrubar o relatório anti-Temer.

A oposição também não deverá conseguir colocar 342 deputados em plenário, em 2 de agosto. Diz, inclusive, que não deseja. Há, então, o perigo de Temer continuar exposto às intempéries.

 


Valor Econômico: Aos poucos, Temer perde o controle da base governista

 

As condições políticas para o presidente Michel Temer se manter no cargo estreitam-se a cada dia. Depois do primeiro pedido de inquérito feito pelo procurador Rodrigo Janot contra ele - e outros dois estão a caminho - a couraça de proteção do presidente no Congresso começou a rachar. Já não há tanta segurança de que Temer vá conseguir 172 deputados que votem contra a abertura de inquérito no Supremo Tribunal Federal. Mas ainda é mais provável que passe nesse teste.

Acuado, o grupo de Temer está perdendo rapidamente apoio de sua antes gigantesca base governista. As manobras com o objetivo de solidificar uma maioria e escapar do afastamento do cargo feitas por Temer resultam em mais insatisfações e desgastes. O PSDB as condensa até o paroxismo de não conseguir definir se permanece ou sai do governo. Os sucessivos avisos de que poderá desembarcar a qualquer momento não são exatamente proveitosos para as expectativas de Temer.

A troca em massa de deputados na Comissão de Constituição e Justiça, que votará pela admissibilidade do pedido de abertura de inquérito, mostrou que a desconfiança em torno da própria base de apoio se ampliou. A escolha de um deputado pemedebista independente, como Sérgio Zveiter (PMDB-RJ), para a relatoria do caso na CCJ, tornou-se um revés antecipado para Temer. O voto de Zveiter, de que há indícios sólidos de crime e materialidade no pedido da PGR e de que os casos narrados necessitam de investigações, complicou um jogo que deveria ser tranquilo para o governo.

A tentativa de liquidar o primeiro pedido rapidamente também não está dando muito certo. A CCJ permitirá manifestação de 172 parlamentares, o que deve levar a votação final em plenário a ultrapassar 17 de julho, data marcada para o recesso do Congresso. Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara e governista, disse que atuará como árbitro, seguindo o regimento da Casa, sem se dispor a executar truques de todo tipo, como seu antecessor, Eduardo Cunha.

Maia é o sucessor constitucional de Temer caso ele seja afastado para responder a processo no STF e tornou-se alvo da rede de intrigas que naturalmente se tece em torno de um presidente em queda. Em reunião com Temer, o presidente da Câmara falou o óbvio, mas que, na situação em que se encontra seu interlocutor, soou assim mesmo desagradável. Maia teria dito que Temer poderia ser vitorioso contra a primeira denúncia da PGR agora, mas que o apoio às próximas acusações se tornaria muito mais difícil e decrescente.

Maia não faz mais nada para beneficiar o governo por um cálculo óbvio. Como sucessor, não gastará todo seu cacife político para apoiar um presidente que perde aceleradamente as condições de governar. Se a Presidência lhe cair no colo, Maia provavelmente fará mais do mesmo - continuará a defender a equipe econômica, a política econômica que ela executa e procurará contar com a mesma base de apoio que foi de Dilma, depois de Temer e por fim, sua.

Um presidente em apuros perde o controle do processo. O presidente da CCJ é do PMDB, assim como o relator que pediu a admissibilidade do processo. Mesmo a aprovação da reforma trabalhista anteontem no Senado não veio acompanhada só de aplausos. Um acordo para impedir a modificação do projeto e sua volta à Câmara foi dado como inexistente para o presidente do Senado, Eunício Oliveira, também do PMDB, e por Maia, escolhido para liderar a Câmara com o apoio de Temer.

O antecessor de Maia, Eduardo Cunha, organizou o centrão: cativou com a perspectiva de poder um amontoado de partidos oportunistas, sem programa ou ideologia. A fraqueza de Temer resulta no início da debandada do baixo clero - primeiro aos poucos, como acontece agora, depois em massa. A chance de o Planalto reaglutiná-los é remota, embora possível. O fatiamento das denúncias promoverá a paralisia do governo por um longo tempo, sem qualquer garantia de que Temer continuará no poder. Nessas circunstâncias, procura-se o próximo detentor da caneta e os olhos encontram Maia.

O cerco das denúncias contra Temer e seu círculo palaciano, que será prolongado, torna-o não só incapaz de encaminhar as reformas, mas de governar plenamente. Maia tem, em tese, mais chances de fazê-lo e dar à transição o signo da normalidade até as eleições de 2018. Ainda assim, Maia foi mencionado em delações da Lava-Jato e pode ser alvejado, cedo ou tarde.


É normal que Rodrigo Maia sinta 'comichão' para assumir Presidência, diz FHC

Segundo FHC, presidente da Câmara é 'mais que humano, é político'; ex-presidente também disse, em entrevista à GloboNews, que Temer deve deixar posição defensiva e partir para o ataque se quiser contribuir para solução da crise política

João Paulo Nucci, O Estado de S.Paulo

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ser "muito difícil" que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não sinta um "comichão" com a possibilidade de assumir a presidência da República. "Suponho que seja uma pessoa correta, não vai fazer nada contra o presidente. Mas ele é humano. Mais que humano, é político", disse o tucano em entrevista ao programa Roberto D'Ávila, da GloboNews, nesta terça-feira, 11. "Na vida pública, por mais que as pessoas queiram ser leais, há interesses pessoais e políticos que se sobrelevam."

Para o líder tucano, o presidente Michel Temer deve deixar a posição defensiva e partir para o ataque se quiser contribuir para a solução da crise política. "O poder começa a erodir. Não importa se as denúncias são corretas ou erradas. Não adianta fazer uma guerra de trincheira, parado", disse na entrevista gravada na tarde desta terça-feira, 11, e exibida à noite.

FHC comparou a posição atual do peemedebista à fracassada Linha Maginot, criada pelos franceses para tentar se defender da invasão da Alemanha na Segunda Guerra Mundial. "Os alemães fizeram a guerra de movimento, a blitzkrieg (na Segunda Guerra Mundial)."

O ex-presidente usou a metáfora bélica para defender que a gestão Temer precisa demonstrar à população que ainda tem condições de governar ou de propor saídas para o impasse - nem que seja a abreviação do mandato ou a realização de uma reforma política. "O Temer ainda teria condições de abrir uma página nova no Brasil, (fazer) um gesto de grandeza." A atual postura do presidente, segundo o tucano, poderá até levá-lo a permanecer no cargo até o fim do mandato, mas com o poder esvaziado. "Pode ficar no governo, mas não governa mais. (Temer) está preocupado com o que a Câmara vai fazer. Amanhã, com o que a Justiça vai fazer."

Sobre a permanência do PSDB na gestão Temer - o partido comanda quatro ministérios -, FHC reiterou que ainda não há uma decisão formal sobre o assunto e que a reunião no Palácio dos Bandeirantes na noite desta segunda-feira, 10, que reuniu líderes do partido, não tinha como deliberar sobre o assunto. O tema será discutido oficialmente em uma reunião da Executiva do partido no mês que vem.

Do ponto de vista prático, no entanto, o ex-presidente diz que a relação entre Temer e o partido fica "muito difícil" a partir do momento em que os deputados tucanos votarem pela aceitação da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Temer. "Creio que maioria dos deputados (do PSDB) vai dizer sim, a opinião pública está muito comovida. Aberto o processo (contra Temer no Supremo Tribunal Federal), como fica o partido?"

O ex-presidente confirmou durante a entrevista que escreveu uma carta a Temer em junho, após a divulgação da gravação que o empresário Joesley Batista, da JBS, fez do diálogo que manteve com Temer. "Escrevi o que eu achava que era possível fazer dada a situação que está criada." FHC não obteve resposta de Temer. "Não era pra responder, era para ele refletir."

O líder tucano voltou a dizer que o melhor cenário para a saída da crise é a realização de eleições diretas. "Mas não sou qualquer apressado. Diretas já não pode, é copiar o passado. Precisa ter reforma política, avançar nas reformas."

A entrevista ao jornalista Roberto D'Ávila foi concedida no apartamento de FHC em São Paulo, pouco antes do ex-presidente embarcar para a Europa - viagem que o impediu de ir à Brasília, a pedido de Temer, para uma reunião. "Nunca me neguei e nunca me negaria (a dialogar). Pensei que iria à casa dele, em São Paulo. Mas pegar avião para Brasília é mais complicado."

FHC voltou a dizer que não tem mais pretensões de ocupar cargos públicos - seu nome é sempre lembrado para a eventualidade de uma eleição indireta à Presidência. "Não é que eu não queira, mas tenho 86 anos. (...) Ser presidente é um esforço extraordinário."

Mais do que questões políticas, o que mais o preocupa é o País, segundo Fernando Henrique. "Temos 14 mihões de desempregados, criminalidade enorme. Sessenta mil homicídios no ano. E tem desconforto político, é muito problema." Ainda assim, é preciso avançar no processo que está passando "a limpo o Brasil", disse o presidente. "Destampou a panela e as pessoas viram que tem coisa podre aí. Não vai acabar a Lava Jato, não deve acabar."

 

 


Roberto Freire: 'A base governista está mais aguerrida'

Amanda Almeida | O Globo

Michel Temer fica ou cai?
– O termômetro está muito mais difícil de ser aferido do que no processo do impeachment. Porque, naquele caso, havia um componente: povo na rua. Hoje, pode haver rejeição alta, mas não há manifestação. Além disso, a base governista está muito mais aguerrida.

A saída do presidente vai gerar instabilidade?
– Não. Se for vitorioso o afastamento, a transição continua. Até porque Rodrigo Maia é base do processo do impeachment e da transição, homem de confiança da base governista.

E qual a sua posição e a do PPS?
– A maioria da bancada é favorável à aceitação da denúncia. Respeitaremos todo e qualquer voto diferente. Não quero falar ainda minha posição. Qualquer que seja a decisão, o PPS continuará a apoiar a transição até 2018 nos termos da Constituição e a favor da reforma.

 


Marco Antonio Villa: Adeus, Temer. E depois?

Impeachment deu a falsa ilusão de que tudo estaria resolvido com a mera substituição do titular do Planalto por Temer

Não há na nossa história republicana nenhum caso de um presidente que tenha tido uma agonia política tão longa como a de Michel Temer. No início da República, Deodoro da Fonseca, após ter fechado o Congresso Nacional, permaneceu mais uma quinzena no poder antes de ser obrigado a renunciar, após a rebelião da Marinha, entregando o governo a Floriano Peixoto. Mais de meio século depois, Getulio Vargas resistiu 19 dias até a tragédia do 24 de agosto de 1954. A crise de novembro de 1955 foi resolvida no próprio mês, mesmo tendo três presidentes em um curto espaço de tempo. Já em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros, em duas semanas, fundamentalmente, foi possível encontrar uma solução para o impasse sucessório. Três anos depois — e, neste caso, com a decisiva presença militar — em alguns dias foi construída uma nova situação política. Agora, mesmo tendo instituições um pouco mais sólidas do que nos momentos históricos citados, nada indica que seja possível encontrar, a curto prazo, um caminho que retire o país da mais profunda crise da nossa história.

Com a redemocratização, foi construído um estado democrático de direito que não conseguiu lançar os fundamentos de uma República democrática. Pelo contrário, a institucionalidade acabou — graças à sua complexidade e ausência de controle público — dando guarida segura àqueles que conspiraram sistematicamente contra os valores republicanos. O que deveria servir como um instrumento de defesa da cidadania acabou, ao longo de três décadas, sendo utilizado para garantir legalmente — por mais paradoxal que pareça — uma República apodrecida pela corrupção.

Os republicanos passaram por diversos momentos de desilusão política. A cada aparente ruptura, vinha — em seguida — a desilusão. E isso desde o 15 de novembro de 1889, passando por 1930, 1945, 1964, 1985 e, especialmente para a conjuntura que vivemos, 1988 e a sua “Constituição cidadã.” De Saldanha Marinho, lá no início do governo Deodoro, até a atual sociedade civil — participante, ativa, que transformou as redes sociais em instrumentos de combate político — todos dizem que não vivemos na República dos nossos sonhos.

A cada dia fica mais profundo o fosso que separa o cidadão comum da elite dirigente — elite dirigente, entenda-se, dos Três Poderes da República. O poder continua petrificado, de costas para a sociedade. Não quer saber de mudança. Quer manter, na essência, tudo como está. Basta recordar que estamos a cerca de um ano das eleições presidenciais e nada indica que haverá uma profunda alteração do que vivemos no processo eleitoral de 2014. Ou seja, teremos o habitual jogo sujo, com os mesmos partidos políticos, com os marqueteiros de sempre, os eternos candidatos e os ridículos debates. E no segundo turno, se houver, teremos dois candidatos representando frações eventualmente distintas do grande capital. E a cidadania? Ah, esta pouco importa — ou melhor, importa só como eleitor, naqueles segundos em frente à urna eletrônica.

Desta forma, a crise do governo Temer é muito mais profunda. Que o presidente não está à altura do momento histórico, disso não há dúvida. Poderia liderar o país até o processo eleitoral de 2018, mas se apequenou, seduzido pelas benesses financeiras do poder. Resta agora, desesperadamente, se manter à frente do governo, manobrando da forma mais vil. Contudo, nada indica que deva permanecer até 31 de dezembro de 2018.

Mas se o problema fosse somente Michel Temer, tudo poderia facilmente ser resolvido. A questão é mais complexa, é estrutural. Não estamos passando por uma crise política, o que não é pouco, como tantas outras na História do Brasil. Agora há uma crise sistêmica que atinge os Três Poderes. Temer, Lava-Jato, JBS, Dilma, Odebrecht, Lula, Aécio et caterva são faces conhecidas de um sistema que entrou em colapso.

O processo do impeachment deu a falsa ilusão de que tudo estaria resolvido com a mera substituição do titular do Palácio do Planalto. Ledo engano. Tanto que, no “novo governo”, grande parte da base parlamentar é a mesma da antiga situação e, inclusive, teve — e ainda tem — no Ministério Leonardo Picciani, que votou contra a autorização para a abertura do processo contra Dilma Rousseff.

Entre as principais forças políticas com representação no Congresso, há um relativo consenso de que tudo o que ocorreu nos últimos anos não passou de mero acidente de percurso. Algo inevitável, típico de uma jovem democracia. Insistem na falácia de que as instituições estão funcionando, mesmo em meio aos escândalos que transformaram o Brasil no país mais corrupto do mundo ocidental. É a velha conciliação, sempre presente na nossa história, principalmente nos momentos de tensão política.

Desta vez, dada a profundidade e magnitude temporal da crise, é provável que a conciliação fracasse. Isso só poderá ocorrer se a sociedade civil tiver uma ação ativa e propositiva. E aí mora um dos problemas. Fazer o quê? Como? Quais são as propostas? De que forma encaminhá-las? Como combinar a institucionalidade vigente com ideias de reorganização do aparelho de Estado? E de que forma construir o novo em meio a uma estrutura arcaica, que impede as mudanças?

Michel Temer deve logo abandonar o Palácio do Planalto. Mas a crise sistêmica vai permanecer. Ela é muito mais profunda do que a mera substituição do presidente. E se for seguido o velho figurino brasileiro — o que é mais provável — permaneceremos em meio à turbulência nos próximos anos, com reflexos diretos na economia e na sociedade.

* Marco Antonio Villa é historiador

 


Angela Bittencourt: Empresários e efeito riqueza bancam Maia

 

Três forças conduzem o deputado carioca Rodrigo Maia, filiado ao DEM, à Presidência do Brasil: o apoio de parlamentares de distintas colorações, a aposta do empresariado em sua capacidade de defender as reformas e restabelecer prioridades no Congresso e o efeito riqueza que a inflação de 3% em 12 meses até junho - piso da meta vigente no país - devolve à classe média.

Nesse período, o Ibovespa rendeu 18,5% acima da inflação, as aplicações em renda fixa mais de 13%, a caderneta 4,7% e o dólar, na lanterna, 0,2%. Também em 12 meses até junho o montante de dinheiro aplicado cresceu cerca de 6% em termos reais. As cadernetas ainda registraram mais saques que novos depósitos em R$ 10,4 bilhões no período - resultado excelente se comparado aos saques que ultrapassaram R$ 57 bilhões em 12 meses imediatamente anteriores. A Caixa, que abre 2.015 agências mais cedo nesta segunda para resgate de contas inativas do FGTS, nos últimos cinco meses, entregou a 22 milhões de trabalhadores R$ 38,2 bilhões.

Nada disso, porém, favoreceu a popularidade do presidente Michel Temer ou impediu que se desenhasse, na última semana, uma transição para o comando do país. A imagem de Temer, duramente abalada com a denúncia por corrupção passiva feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR), está sujeita um desgaste talvez irreparável se a Câmara autorizar que o Supremo Tribunal Federal (STF) investigue o presidente. Essa autorização depende da aprovação do pedido da PGR na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) cujo processo tem início hoje seguida da aprovação no Plenário.

Entre sexta-feira e domingo, a coluna conversou com cinco especialistas em economia, finanças e relações institucionais - três da área privada e dois do serviço público, que falaram sob anonimato. Nenhum deles vê condições de o presidente Temer permanecer no cargo, seja acolhida ou rejeitada pelos deputados a denúncia apresentada pela Procuradoria.

Os especialistas descrevem uma delicada e incomum transição em curso no Brasil, em que o presidente da República não tem condições para continuar e sua equipe econômica não tem condições de deixar o governo. "A agenda a ser cumprida está aí e todo mundo sabe qual é", diz um dos entrevistados, para quem Rodrigo Maia é o sucessor natural de Temer - presidente da Câmara é o primeiro na linha de sucessão presidencial -, embora considerado, por esse interlocutor, politicamente menos capaz que Temer para negociar com seus pares no Congresso.

"Rodrigo Maia é o Michel Temer que ainda não está publicamente enrolado, mas pode vir a estar", explica outro entrevistado que reconhece, porém, ter Maia a seu favor ser visto como "um político novo, que começa sua carreira, e a quem a sociedade não tem como julgar". O momento em que seu nome surge como opção para governar também é favorável ao deputado. "O Congresso está convencido de que a Reforma da Previdência é imprescindível. Rodrigo Maia toma o bonde andando. Não é exagero dizer que Temer já fez o trabalho sujo. Convenceu ou ao menos negociou condições que devem favorecer a aprovação das reformas."

Para outro profissional não há dúvida de que Maia oferece mais possibilidades de avanço ao país do que Temer. "O presidente deverá usar todo o seu capital político para se defender de denúncias. Maia não está nessa situação e deverá manter a atual equipe econômica porque precisará de gente competente para tocar o dia a dia que continuará dando trabalho, mesmo se aprovada a idade mínima para as aposentadorias".

Assim que aprovado o projeto, ainda que em sua versão minimalista, estender de imediato a reforma aos militares terá um efeito importante a se reverter em combustível para empurrar o Brasil até as eleições presidenciais de 2018. E caberá ao presidente que emergir das urnas a responsabilidade de ampliar a reforma previdenciária, inclusive, se desejar governar por oito anos. Sem essa reforma, o próximo presidente dura quatro anos no cargo - tempo estimado até a implosão das contas públicas por impossibilidade de pagar os aposentados.

A pressão temporal e financeira que deve recair sobre o presidente em 2019 é inédita. Não foi experimentada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou pela ex-presidente Dilma Rousseff. Nos governos petistas, a Previdência não estava no limiar do esgotamento. Agora está.

Contudo, até outubro de 2018 tem chão e condições internacionais a aproveitar. "O cenário externo não é configurado por um conjunto de bancos centrais que assume um discurso mais conservador do que o mercado esperava. Não há constrangimento para o Brasil. E devemos lembrar também que esses mesmos bancos centrais ameaçaram com aperto monetário no passado recente sem que a ameaça fosse realizada", avalia Tony Volpon, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central e agora economista-chefe do UBS no Brasil.

Eventual transição para um governo Rodrigo Maia teria, internamente, as seguintes vantagens, enumera Sérgio Goldenstein, ex-chefe do Departamento de Operações de Mercado Aberto do BC e agora sócio e gestor da Flag Asset Management: "Redução da turbulência política, o que ajudaria na retomada da atividade e na queda do prêmio de risco dos ativos domésticos; alguma chance de aprovação de algo proposto para a Previdência, pois a base de Temer se enfraquece a cada dia; e menor chance de medidas populistas."

Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi, entende que não seria simples a conformação do poder com Rodrigo Maia na presidência, mas lembra não existir "prioridade maior que manter a economia funcionando ainda que minimamente". A classe política está totalmente desacreditada na sua opinião. "Para viabilizar uma agenda mínima será necessário uma costura política e a equipe econômica dá credibilidade no exterior. É conhecida e já acumulou vitórias em 12 meses. Temos um ano e meio de transição e o mais importante é manter a solidez da direção da política econômica. Há chance de termos um bom governo e podemos ingressar em novo ciclo de crescimento sustentável. É necessário manter a rota até que se saiba quem será o presidente em 2019", diz Tingas.

Angela Bittencourt, do Valor Econômico

 


Marco Aurélio Nogueira: Especulações e possibilidades

O que era especulação abstrata virou possibilidade concreta. Rodrigo Maia poderá substituir Michel Temer na Presidência. Juras de amor e lealdade jorram em profusão. Mas quanto mais ambos desmentem, mais gente se movimenta.

Mudará o quadro? Fará diferença?

Sim e não.

Dado o andar da carruagem, um novo governo pilotado por Maia terá de se valer da mesma articulação parlamentar que hoje sustenta Temer ou que já o sustentou. Não há como alterar isso, especialmente porque o PT e os que seguem suas diretrizes não irão se converter em “situacionistas”, posicionados como estão com os olhos fixos nas urnas de 2018.

Maia, além disso, teria os mesmos problemas de credibilidade de Temer, e não consta que se distinga por uma habilidade política fora do comum, embora saiba se conduzir com competência, tenha boa articulação política e trânsito institucional. Mas não é do tipo que dialogará com a sociedade e tenderá a sofrer muitos vetos da opinião pública.

No entanto, tem uma carta na manga. Poderá afastar a banda podre do atual governo e compor um ministério com perfil mais qualificado, preservando até mesmo a banda saudável de Temer (os ministros do PSDB, por exemplo). Poderia trazer para o governo figuras representativas da sociedade civil. E celebrar um pacto com o “alto clero” do Congresso, tendo em vista uma reforma política, a despolarização e a preparação das eleições do próximo ano. Agindo assim, atrairá apoios importantes e aparará arestas. Ganhará corpo.

Seria como que um reinício da prometida “transição” que alimentou o impeachment de Dilma e que foi naufragando conforme avançaram as denúncias contra Temer e seu ministério.

Se nada disso for feito, fica difícil imaginar de onde viriam a redução da turbulência e a “pacificação” do país.

A turbulência, aliás, talvez não seja o problema principal. Ela não assusta nem incomoda a sociedade, desencantada com os políticos e convencido de que aquilo que se faz em Brasília é sempre mais do mesmo. Também não perturba excessivamente a economia e o mercado, que só estão interessados na continuidade e na blindagem da equipe econômica. A economia, afinal, tem razões próprias, não se dobra a eventuais crises políticas.

Alguns dizem que a continuidade da turbulência — com ou sem Temer — somente serve para jogar água no moinho do PT. Pode ser. Mas é sempre bom não esquecer que avanços e vitórias não dependem prioritariamente do fracasso dos adversários, mas sim da mobilização das virtudes dos que desejam avançar.

Área em que o PT está devendo, e muito.

 


O Estado de São Paulo: Falastrão e enganador

O chefão do PT, que enxerga na sua candidatura à Presidência a melhor maneira de se livrar da cadeia, está como sempre no palanque disposto a fazer pouco da inteligência e do discernimento dos brasileiros

A estratégia lulopetista de sobrevivência está focada no quanto pior, melhor, que visa a manter o Brasil paralisado e a crise econômica e social se agravando. É uma lógica irresponsável e socialmente cruel, mas que oferece aos salvadores da Pátria nostálgicos do poder – ou ameaçados pela Justiça – o falacioso argumento de que é necessário lutar para que “os trabalhadores continuem com os seus direitos”, como declarou Lula, na quarta-feira passada, em entrevista a uma rádio da Paraíba. Na entrevista, o ex-presidente até falou em conspiração, mas para levantar a suspeita de que o governo norte-americano esteve por trás do afastamento do PT do governo.

O chefão do PT, que enxerga na sua candidatura à Presidência a melhor maneira de se livrar da cadeia, está como sempre no palanque disposto a fazer pouco da inteligência e do discernimento dos brasileiros. Em franca campanha, sabe que eleições diretas serão realizadas, de acordo com a lei, em outubro do ano que vem. Mas, para manter o discurso populista, continua defendendo “Diretas Já”. Não será de estranhar, portanto, que, quando as urnas se abrirem em outubro de 2018, proclamará tratar-se de conquista sua. E insiste também no “Fora Temer”, para manter coerência com sua própria história: com maior ou menor empenho, esteve por trás do “Fora Sarney”, do “Fora Collor”, do “Fora Itamar” e do “Fora FHC”. Ou seja, mesmo que outros sejam eleitos, só o PT tem legitimidade para governar o País.

A quarta-feira passada foi pródiga em oportunidades para o falastrão, que se proclama “o homem mais honesto do País”, se comportar como se o Brasil não tivesse passado pela experiência de tê-lo, e a sua pupila Dilma Rousseff, na chefia do Executivo. Na entrevista à emissora paraibana, Lula começou atacando o alvo preferencial do revanchismo petista, a quem responsabiliza por todos os males que afligem os brasileiros: “Ninguém quer mais o afastamento do Temer do que nós. Queremos a saída do Temer e eleições diretas porque queremos fazer com que os trabalhadores continuem com seus direitos”. Quer dizer: até a chegada de Lula ao Planalto, os trabalhadores não tinham direitos. A partir de então o Brasil tornou-se um campeão dos direitos civis, um verdadeiro “protagonista internacional”: “Nenhum país conseguiu fazer o que o Brasil fez em 12 anos. Acho que tinha interesse americano que o Brasil não desse certo”. Aí vieram os “golpistas”, derrubaram Dilma e seguiu-se o “governo ilegítimo” de Temer, que conspira contra os direitos dos brasileiros e as eleições diretas.

Embora a estratégia lulopetista de conquista e manutenção do poder tenha sido, desde sempre, a de dividir o País em “nós” contra “eles” – uma reprodução tosca da luta sindical da qual Lula copiou os fundamentos de sua ação política –, o estadista de Garanhuns condenou na entrevista o clima de “ódio e intolerância” que domina a política brasileira, atribuindo a responsabilidade por isso, especialmente, a Michel Temer e Aécio Neves. E acrescentou, em tom irônico, que ambos estão agora experimentando o “próprio veneno”.

Na mesma quarta-feira, ao falar em Brasília na solenidade oficial de posse da senadora Gleisi Hoffmann (PR) na presidência nacional do PT, Lula partiu para cima do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que “deve estar se preparando para ser o próximo presidente da República como seguidor do golpe, e não podemos achar que um golpista é melhor do que outro”. Logo, se for o caso, “Fora Maia”. E emendou, como se as eleições diretas para presidente tivessem sido abolidas: “A mudança que queremos é que o povo brasileiro volte a ter o direito de escolher o seu presidente. Errando ou acertando é o povo que tem o direito de tirar e colocar pessoas”.

É verdade. Errando ou acertando, foi o povo quem elegeu Dilma Rousseff e seu vice, Michel Temer, que agora é presidente porque os senadores e deputados nos quais o povo votou livremente em 2014 cassaram o mandato da titular.

Editorial

Fonte: http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,falastrao-e-enganador,70001880053

 


Alberto Aggio*: O pós-PT e o retorno da política

A conjuntura política do País segue normalmente seu curso, sem contramarchas, desde a admissão do processo de impeachment pelo Congresso, o afastamento de Dilma Rousseff e a assunção de Michel Temer ao comando interino do governo da República. Malgrado temores de uns e desejos de outros, não há recuo no sentido que se impôs ao processo. Apesar das críticas e das indefinições iniciais do governo interino, das ocupações de prédios públicos e das manifestações de rua, nenhum abalo expressivo foi produzido. Aguardam-se para agosto os lances finais do processo de impeachment e poucos são os que creem na volta da presidente afastada. Crescem a aprovação do governo interino e a esperança na recuperação econômica, enquanto é visível o isolamento político de Dilma e do PT.

As avaliações do cenário político feitas pelos intelectuais petistas, salvo raras exceções, reiteram ad nauseam o paradigma do “golpe de novo tipo” (Opinião, 8/6). Algumas delas, sem nenhuma razoabilidade, beiram a alucinação. A favor do novo governo também houve manifestações destoantes de impaciência, desconsiderando as condicionantes da governabilidade nesta fase de interinidade.

Mesmo premido por uma herança dramática, Temer tomou iniciativas administrativas importantes. As medidas econômicas de restrição de gastos, de difícil implementação, ainda dependem de aprovação do Congresso. Elas compõem um ajuste fiscal de perfil estrutural, necessário e realista para recolocar o País nos eixos. Dilma tem argumentado que tais medidas não foram aprovadas pelas urnas e jamais seriam caso fossem apresentadas. Trata-se de uma crítica vazia e sem sustentação, uma vez que Dilma abandonou seu discurso eleitoral para adotar um ajuste fiscal mitigado, que não se concretizou por tibieza sua e por oposição do seu próprio partido. Traindo a si mesma e ao País, Dilma cometeu um “estelionato eleitoral” que lhe custou a confiança da sociedade. Agora, o País precisa enfrentar a crise sem tergiversações.

As mudanças mais significativas verificaram-se, contudo, no âmbito político. A renúncia de Eduardo Cunha e a eleição de Rodrigo Maia para a presidência da Câmara dos Deputados são sinais de um “retorno da política” e apontam para uma valorização da representação, para a superação das crispações decorrentes da clivagem “nós versus eles” e para mais autonomia, articulação política e eficiência do Parlamento.

A renúncia de Cunha e suas derrotas subsequentes nas Comissões de Ética e de Constituição e Justiça da Câmara jogam por terra mais uma falácia petista. Afirmava-se que o afastamento de Dilma levaria a um governo Temer/Cunha e aprovar o impeachment era colocar Cunha na Presidência da República, razão por que o ex-presidente da Câmara havia posto em pauta o processo de impeachment, “vingando-se” de Dilma. Mas essa fábula se foi e Cunha, neste mesmo agosto, poderá perder o mandato de deputado.

Os primeiros lances do “retorno da política” exigiram que o PT negociasse seus votos na eleição para presidência da Câmara, mesmo com a condenação de alguns de seus intelectuais e parlamentares, evidenciando mais uma vez sua crise de orientação. O PT ainda não é capaz de admitir que sua decaída, cristalina pelo fracasso de Dilma e pela montanha de casos de corrupção, é a base da imagem negativa que o partido criou para si mesmo, uma consequência que não pode ser enfrentada com escapismos do tipo “o PT é atacado por suas virtudes, e não por seus erros”.

É uma situação dramática para um partido que, longe de ser revolucionário, promoveu um reformismo débil e instrumental com o objetivo de se perpetuar no poder. O PT fracassou porque não conseguiu combinar reformismo social e democracia política de maneira progressista, o que lhe bloqueou a possibilidade de se tornar uma esquerda simultaneamente “transformadora” e “de governo”. A consequência foi a perda da vocação majoritária e a regressão a um discurso de “resistência” a tudo: ao suposto “golpe”, ao governo Temer, ao imperialismo e ao capitalismo.

Somado ao pragmatismo de sempre, o PT vive hoje envolto pela sedução de um regresso a posições remotas da esquerda do século 20, em companhia desajeitada daqueles que creem num “movimentismo” permanente.
No mundo político fora do PT, os resultados da débâcle petista são diferenciados. Um deles foi o ressurgimento de um anticomunismo anacrônico e obtuso, idêntico ao seu objeto de rechaço. O outro foi abrir espaço para o liberalismo voltar a ocupar o centro da cena e, renovado, apostar suas fichas num programa para sair da crise e retomar o crescimento. Na bússola do liberalismo constam a contração do Estado e o estímulo à economia privada, que parecem convencer o conjunto da sociedade.

Embora divididos, os liberais passaram a ser tratados como o núcleo de articulação de uma nova proposta hegemônica. Em nossa História contemporânea, a aliança entre esquerda e liberais operou em defesa das liberdades: foi assim no Estado Novo e na luta contra o regime militar. Não há razão para que ela não seja perenizada e ganhe novos patamares, novos direitos.

Luiz Sérgio Henriques publicou neste espaço artigo sobre a crise do PT e a possibilidade de uma “outra esquerda”, democrática e reformista, fundada nos valores da Constituição de 1988 e no Estado Democrático de Direito. Certamente, ela deverá também buscar uma maneira justa e progressista de combinar reformismo social e democracia política. Assim, além de perenizar a aliança com o liberalismo em defesa das liberdades, na quadra que atravessamos será preciso avaliar os termos de uma nova concertação que possa empreender uma reforma histórica do Estado brasileiro, rompendo privilégios e corporativismos, sem eliminar sua presença reguladora, solidária e em defesa da cidadania. Seria um grande desafio e um belo destino.


*Alberto Aggio é historiador, é professor titular da Unesp

Publicado no Estadão em 31/07/2016