Rodrigo Maia
O Globo: Barrados pelo STF, Maia e Alcolumbre planejam sucessão de forma independente
Decisão da Corte estremeceu relação e esvaziou chance de acordo conjunto
Julia Lindner, O Globo
BRASÍLIA — A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de barrar a reeleição no comando do Legislativo estremeceu a relação entre os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), enterrando a possibilidade de os dois trabalharem juntos nas suas respectivas sucessões. Segundo aliados, Alcolumbre está sem atender Maia desde o sábado passado, véspera do resultado final do STF. Ele trata as articulações de forma independente.
O presidente do Senado considera o chefe da outra Casa responsável por sua derrota na Corte, pois Maia, no comando da Câmara desde 2016, deixou no ar se seria candidato ou não. Para Alcolumbre, o clima era mais favorável para ele tentar a recondução sozinho, mas seu correligionário se recusou a fazer um gesto público neste sentido. Em entrevista ao GLOBO enquanto o julgamento se desenrolava, Maia afirmou que não diria “uma coisa nem outra” sobre a possibilidade de disputar o cargo mais uma vez.
Um integrante do DEM nega que tenha ocorrido um afastamento definitivo entre Maia e Alcolumbre, mas brincou que os dois “não estão melhores amigos no momento”. Pessoas próximas a Alcolumbre justificam que o presidente do Senado tem evitado Maia apenas por dificuldade de agenda. Focado na sucessão, Alcolumbre não presidiu nenhuma sessão na semana passada.
Em 2019, quando ambos saíram vitoriosos, as negociações foram individuais. Enquanto no Senado houve respaldo ao atual presidente pelo governo, especialmente pelo então ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, na Câmara o suporte a Maia só chegou quando ele já tinha maioria consolidada. Agora, Alcolumbre até fala em buscar um nome independente, mas se reuniu com o presidente Jair Bolsonaro na semana passada para debater o tema. Enquanto isso, Maia tem feito ataques sistemáticos ao governo.
Alguns partidos buscam negociações “casadas”. O PP, por exemplo, que tem o deputado Arthur Lira (AL) na disputa na Câmara, tenta convencer alguns partidos a apoiá-lo em troca de reciprocidade no Senado. O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), já ofereceu esse tipo de acordo ao MDB e ao DEM, dois partidos que almejam a presidência do Senado. Em ambos os casos, não houve resposta.
No Senado, o DEM trabalha no momento com a candidatura de Rodrigo Pacheco (MG), preferido de Alcolumbre. Na Câmara, o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA) ainda está oficialmente entre os que disputam o apoio de Maia, mas a tendência é que a escolha do atual presidente seja por Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) ou Baleia Rossi (MDB-SP).
No caso do MDB, do qual Baleia é presidente, a ideia é tratar o tema de forma independente. No Senado, há uma disputa interna entre pelo menos quatro parlamentares pela candidatura: os líderes do governo no Senado, Fernando Bezerra (PE), e no Congresso, Eduardo Gomes (TO); e os senadores Eduardo Braga (AM) e Simone Tebet (MS).
Ascânio Seleme: Os candidatos
Decisão do STF de barrar por serem inconstitucionais as reeleições de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre inaugurou o lançamento de candidaturas nas duas casas
O Congresso Nacional começa a viver os momentos de turbulência que antecedem a sucessão das mesas da Câmara e do Senado. A decisão do Supremo Tribunal Federal de barrar por serem inconstitucionais as reeleições de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre inaugurou o lançamento de candidaturas nas duas casas. Esta coluna não quer fazer juízo de valor, mas vai nomear cada um dos já lançados e acrescentar pequenas bios das suas trajetórias nas tramas da justiça. A elas.
CÂMARA
Arthur Lira (PP-AL), candidato do presidente Bolsonaro. Réu por desvio de dinheiro do erário e por enriquecimento ilícito; denunciado na Lava-Jato por lavagem de dinheiro; acusado pelo Ministério Público de Alagoas por desviar R$ 1 milhão através de rachadinhas durante mandato de deputado estadual; denunciado no STF por agressão à sua ex-mulher, que o acusou de participar de um esquema de corrupção em seu estado.
Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), foi ministro de Dilma e depois votou contra ela no processo de impeachment. Acusado pelo doleiro Alberto Youssef de receber mesada do PT para votar a favor das pautas do partido; citado na delação da Odebrecht por receber propina; denunciado pelo ex-procurador Rodrigo Janot por fazer parte da organização criminosa que assaltou a Petrobras.
Luciano Bivar (PSL-PE), presidente do partido que abriu as portas para Bolsonaro ser candidato em 2018. Em 2013, admitiu ter pago propina para a CBF para que o técnico da seleção Emerson Leão convocasse o jogador Leomar, que à época pertencia ao Sport, clube que Bivar dirigia; indiciado pela PF no esquema de laranjas do PSL nas eleições de 2018.
Marcos Pereira (Republicanos-SP), bispo licenciado da Igreja Universal, foi ministro do governo Temer. Ficou quase dois anos no cargo, mas se viu obrigado a renunciar ao posto quando seu nome apareceu na lista da Odebrecht como um dos beneficiários das propinas da empresa.
Elmar Nascimento (DEM-BA), deputado de segundo mandato. Acusado de ser um dos 81 parlamentares beneficiários do esquema da Odebrecht de distribuição de dinheiro para campanhas em caixa dois através da cervejaria Itaipava.
Baleia Rossi (MDB-SP), presidente nacional da sigla desde o fim da era de Romero Jucá. Foi acusado em 2016 pelo lobista Marcel Júlio como participante de um esquema de extorsão de fornecedores de merenda para escolas públicas de São Paulo. Mais tarde, o Coaf apresentou uma lista de envolvidos sem o seu nome.
Tereza Cristina (DEM-MS), ministra da Agricultura de Bolsonaro e deputada licenciada. Acusada de dar calote em cinco empréstimos que tomou de bancos e fundos de investimentos agropecuários, entre eles, um da JBS, para projetos rurais particulares.
SENADO
Fernando Bezerra (MDB-PE), ex-ministro do governo Dilma. Acusado de lavagem de dinheiro na Operação Turbulência para reeleição de Eduardo Campos em Pernambuco (parte do dinheiro teria sido usado na compra do avião que caiu em 2018 matando Campos); denunciado por receber propina da Camargo Corrêa nas obras da refinaria Abreu Lima; denunciado na Lava-Jato por receber R$ 20 milhões em propina.
Eduardo Braga (MDB-AM), ex-prefeito de Manaus, ex-governador do Amazonas, ex-ministro de Dilma. Suspeito na Lava-Jato por receber R$ 1 milhão em propina; acusado de ser dono oculto de um jato Citation de US$ 9 milhões (R$ 46,5 milhões), cujo prefixo é o sugestivo PP-MDB; denunciado pelo MP do estado por comprar terreno público por R$ 400 mil e vendê-lo três meses depois por R$ 13,1 milhões; conhecido nas planilhas da Odebrecht pelo apelido “Glutão”.
Nelsinho Trad (PSD-MS), ex-prefeito de Campo Grande. Teve R$ 101 milhões bloqueados em suas contas por envolvimento no maior escândalo do Mato Grosso do Sul, de desvios milionários da empresa de limpeza urbana da capital do estado, a Solurb; denunciado pelo MP estadual por fazer autopromoção com dinheiro público quando era prefeito.
Eduardo Gomes (MDB-TO), senador de primeiro mandato. Denunciado na Operação Sanguessuga por desvio de dinheiro do Ministério da Saúde destinado a compra de ambulâncias; acusado de fraudar licitações quando presidia a Câmara Municipal de Palmas; usou verbas indenizatórias do Senado para comprar “notícias” favoráveis a ele em jornais de Tocantins.
Antonio Anastasia (PSD-MG), ex-governador de Minas Gerais, ex-vice de Aécio Neves, a quem sucedeu. Citado na Lava-Jato como receptor de propinas. O ex-policial Jayme Oliveira Filho disse ter entregado dinheiro em BH a uma pessoa muito parecida com Anastasia. Alberto Youssef, de quem o policial era operador, negou que o dinheiro fosse para Anastasia. O processo acabou arquivado.
Simone Tebet (MDB-MS), senadora de primeiro mandato. Investigada por crime de responsabilidade em dois inquéritos que apuram fraude durante sua gestão na prefeitura de Três Lagoas (MS). Um deles foi arquivado por prescrição.
Rodrigo Pacheco (DEM-MG), senador de primeiro mandato. Defensor dos denunciados no mensalão, detrator da Lava-Jato e crítico do Ministério Público.
ATÉ HONDURAS
Com todo o respeito que aquele país da América Central merece, mas é bom notar que até mesmo a pequena Honduras (9,5 milhões de habitantes, PIB de US$ 49 bilhões e renda per capita de US$ 5,8 mil) vai começar a vacinação da sua população ainda este ano. Na capital, Tegucigalpa, as doses da vacina russa Sputnik começam a ser inoculadas na semana que vem. Alguém pode até dizer que a Sputnik não é segura, mas toda a família real de Dubai foi imunizada com ela.
O OSCAR BRASILEIRO
Daniel Day-Lewis leu cem livros sobre Lincoln para interpretar seu personagem no cinema. Assim que se trabalha. Quantos livros Bolsonaro e Pazuello leram sobre o coronavírus? O ator ganhou um Oscar por aquela interpretação. Que prêmio você daria ao presidente e ao seu ministro?
SAÚDE MENTAL
O governo resolveu revogar portarias que dão estrutura e recursos às políticas de saúde mental no Brasil. Parece que alguém mais, além do general Eduardo Paradão Pazuello, perdeu o juízo no Ministério da Saúde. Ou será que foi mais do mesmo?
HOTEL MUSEU
Nada contra um hotel no Jardim Botânico. Parques têm que ser usados e visitados pelas pessoas. São educativos e dão prazer e relaxamento aos visitantes. O maior parque do mundo, o Yellowstone, que se estende por três estados americanos em 8,9 mil quilômetros quadrados muito bem preservados, tem dez hotéis no seu interior. Todos geram renda e empregos e não atentam contra o meio ambiente. Agora, por que fazer logo no lugar do Museu do Meio Ambiente? Para reduzir o debate sobre a questão e suspender a movimentação de ideias e ideais preservacionistas. E para quê mais hotel no já abarrotado Rio de Janeiro? Aliás, Salles ajudaria muito se mandasse demolir o esqueleto do Gávea Tourist Hotel no Parque da Tijuca. Ou será que Eduardo Paes poderia se ocupar disso?
CANCÚN, NÃO
Por falar em hotel, é bom não se esquecer que ainda está muito bem viva a ideia maluca de Bolsonaro de querer transformar a baía de Angra dos Reis em uma “Cancún brasileira”. O que se quer fazer ali é uma agressão hedionda a um dos lugares mais preservados do planeta. A proposta é acabar com a estação ecológica e a APA de Tamoios e chamar investidores para erguer hotéis e resorts na área. Uma bobagem que não pode prosperar. E não vai, por que você acha que ainda tenha gente que acredite neste governo e invista numa furada dessas?
AINDA RODRIGO
O deputado Rodrigo Maia chegou a se coçar quando emissários de Bolsonaro o avisaram, há dois meses, que sua excelência pensava em lhe entregar um ministério. Poderia ser uma forma de agradecer ao presidente da Câmara por fazer nada com os mais de 30 pedidos de impeachment que recebeu. Mas, como revelou ontem o jornalista Fernando Rodrigues, do Poder 360, Paulo Guedes vetou Rodrigo num hipotético Ministério do Planejamento recriado. Pois é.
OS MITOS
Os políticos acreditam que o brasileiro gosta mesmo de líderes fortes e, melhor ainda, carismáticos. Muito provavelmente inspirados em outros modelos latinos, como o argentino, que até hoje vive sob a sombra de Juan Domingos Perón. Talvez seja por isso que políticos de direita (não falo do centrão das boquinhas, que não tem ideologia e está em qualquer governo) ainda acreditem em Bolsonaro, o mito de 2018. E esta também deve ser a razão para muitos bons quadros da esquerda continuarem teimando com Lula, o mito de duas décadas atrás.
NEGÓCIO NOVO
O mercado do direito autoral só se surpreendeu com o montante, não com a venda dos direitos autorais das músicas de Bob Dylan por US$ 300 milhões. No Brasil, investimentos no setor podem render até 13% ao ano, como mostrou em setembro a repórter Júlia Lewgoy, do Valor Investe. Significa quase cinco vezes mais do que paga a poupança. Mas é preciso saber como funcionam os direitos autorais de músicas para poder se movimentar por ali. Para isso é que estão sendo criados fundos específicos por bancos e fintechs. Trata-se de um novo negócio na praça.
AUDIÊNCIAS
A audiência da Fox News no verão americano foi a maior da história, superando todas as demais no cabo e ganhando até mesmo das emissoras de sinal aberto. Já por aqui, a Fox brasileira perdeu feio para a GloboNews.
IMPOSTOS E ARMAS
Bolsonaro vai zerar impostos para importação de armas a partir de 1º de janeiro. Neste caso, o presidente não surpreende mesmo. Agora, por que não zera também as alíquotas para seringas, já que os produtores locais dizem que não conseguem entregar o que o país precisa para a vacinação contra a Covid? Com a redução do imposto as indústrias poderiam contratar funcionários e produzir mais. Aliás, o que a Taurus, uma das maiores financiadoras da campanha de Bolsonaro em 2018, tem a dizer sobre a medida?
ULTRAJE
Não há outro nome para aquela ridícula exposição dos vestuários de Bolsonaro e Michelle no dia da posse.
O Estado de S. Paulo: ‘Demora da vacina é maior erro político de Bolsonaro’, diz Rodrigo Maia
Em entrevista ao ‘Estadão’, Maia diz que governo tenta comprar votos na Câmara para eleger seu sucessor
Andreza Matais, Felipe Frazão e Tânia Monteiro, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA – O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que o maior erro político cometido pelo governo até agora foi não se preparar para comprar a vacina contra o novo coronavírus. “Isso pode impactar o projeto de reeleição”, afirmou ele, numa referência aos planos do presidente Jair Bolsonaro para 2022. “Esse é o tema que pode gerar o maior dano de imagem. As pessoas estão começando a entrar em pânico, em desespero”.
Prestes a terminar seu mandato como presidente da Câmara, Maia disse ao Estadão que o governo está criando um “balcão” de negócios na Câmara para eleger o seu sucessor. Na sua avaliação, o ministro da Economia, Paulo Guedes, se engana ao imaginar que Bolsonaro interfere na disputa no Congresso, marcada para fevereiro de 2021, porque quer tocar as reformas. “Bolsonaro quer tocar a agenda ideológica”, observou.
O deputado contou ter ouvido o rival Arthur Lira (Progressistas-AL) chamar Guedes de “vendedor de redes” – alguém que fala muito, mas entrega pouco. Líder do Centrão, Lira é candidato ao comando da Câmara com apoio do Palácio do Planalto. “Uma vitória do candidato do Bolsonaro o recoloca no processo político”, afirmou Maia.
O senhor teve covid-19, pode contar como foi?
Passei alguns dias muito difíceis, com pulmão bastante contaminado, com muito cansaço. Fiz fisioterapia pulmonar todos os dias. Quase fui internado. Para quem tem sintomas, não é uma doença simples. E eu tive o atendimento de hospital privado, talvez da melhor médica do Brasil nessa área. Mas a maioria da população não tem a mesma estrutura. Por isso que todos os procedimentos de máscara, de álcool em gel, de algum isolamento em algum momento é importante para que a gente não tenha a rede pública de saúde sem estrutura.
O País assiste a uma briga política em torno da vacina e o governo não comprou uma seringa até agora. Como sair disso?
A vacina é o ponto mais crítico do governo, o mais grave até hoje na sua relação com a sociedade. A demora na compra da vacina é o maior erro político de Bolsonaro. Esse é o tema que pode gerar o maior dano de imagem para o presidente. Faz voltar na memória das pessoas todos os erros do governo, desde o início da pandemia. Isso pode impactar o projeto de reeleição. Certamente, ele (Bolsonaro) tem pesquisa. E, se ele tem, está com essa mesma informação. As pessoas estão começando a entrar em pânico, em desespero. E aí ele isenta a importação de armas. Precisa tratar sem paixão, sem ideologia, esquecer o conflito com o governador de São Paulo.
A Câmara pode assumir esse papel, como fez no início da pandemia, com relação aos recursos emergenciais?
Eu disse ao presidente que o Congresso e o governo deveriam construir um caminho sobre a questão da vacina. Não é possível que daqui a pouco vai ter brasileiro viajando ao exterior para tomar a vacina, e a maior parte da população aqui sem vacina, com os leitos lotados, com a taxa de letalidade aumentando por falta de leitos. Precisa de uma solução imediata, que o governo recupere os meses perdidos.
O senhor entende que será necessário algum tipo de lockdown nas festas de fim de ano?
Quando começar a crescer muito o número de internados na UTI, você tem que ter ações por parte dos municípios, estados e da União, para evitar a circulação. Reduzindo o número de pessoas nos hospitais, você pode reabrir. Eu não falo de lockdown, eu falo: se no Rio de Janeiro tem 99% dos leitos ocupados, você tem que ter uma ação do prefeito e do governador de mais restrições.
Mas aí o presidente da República diz que as pessoas são “maricas” porque elas se protegem. Como fazer com esse discurso negacionista da doença?
Você pode ter certeza que o que o Pazuello (o ministro foi contaminado pela covid) passou foi mais grave do que ele deve estar falando. As pessoas vão tendo, as famílias vão pegando, perdendo seus parentes. E ao longo do tempo, as pessoas vão vendo que o presidente tá errado. Tá errado desde o início, quando ele disse era uma gripezinha.
O presidente pode ser processado por crime de responsabilidade por causa das ações na pandemia?
Que ele pode ter influenciado um menor isolamento em momentos importantes, isso pode. Mas é uma questão muito técnica. Alguém vai ter que vincular o discurso dele as pessoas irem às ruas e isso ter gerado mais mortes. Não é uma coisa fácil de pegar.
O senhor deixará mais de quarenta pedidos de impeachment não analisados. Eles são mesmo improcedentes?
De forma nenhuma iria usar o poder do impeachment se não fosse um caso gravíssimo, ainda mais no meio de uma quarentena.
É a pandemia que impede um processo de impeachment?
Eu acho que, com a crise que nós já temos, se a gente fosse entrar pra esse tipo de conflito… E o impeachment é um julgamento político. Não é um julgamento jurídico. Querendo ou não, é a realidade. Ele não pode ser um instrumento para estar na gaveta e ser utilizado em cada conflito do presidente da Câmara com o presidente do governo.
O senhor externou temor de que uma vitória de Arthur Lira signifique uma agenda ideológica no País nos próximos dois anos. Faz parte do jogo político fazer esses alertas?
É muito óbvio que não é a pauta econômica que faz o presidente rasgar o que falou ao longo da campanha: que não iria interferir no outro Poder, que o Brasil foi destruído pelo toma-lá-dá-cá, pela troca de cargos, pelas as emendas, que isso levava à corrupção. Se você olhar os candidatos à presidência da Câmara, todos pelo menos votaram a pauta mais liberal na economia. Se todos dariam conforto ao governo em relação à pauta econômica, por que o presidente da República quer interferir? O governo deixa claro qual é sua prioridade, que não é a pauta econômica. Ele quer a pauta de costumes, do voto impresso, para desqualificar o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Ele quer essa pauta que foi travada nos últimos dois anos pela minha presidência e pelo apoio que eu tenho.
Como o plenário reagiria se o presidente da Câmara tentasse impor essa agenda?
Sempre há um limite para aquelas agendas que o governo quer e, às vezes, radicaliza no texto. A pauta de armas ele não tem voto, educação ele não tem voto, a regularização fundiária, o texto inicial do governo não passaria. Da forma como Bolsonaro está entrando, com o Palácio recebendo parlamentares, oferecendo emendas, dessa forma muito escrachada, ele vai acabar tendo, no pós-eleição, uma Câmara muito mais dividida do que ele tem hoje. Corre o risco de ter um ambiente muito menos confortável para as pautas que, de fato, são relevantes.
O que leva o senhor a crer que os deputados vão abrir mão de tantas benesses em nome de um discurso de independência?
A maioria dos parlamentares não quer voltar a um jogo do passado, onde a troca prevalecia à pauta. Tenho certeza que a maioria na Câmara entende que a valorização vale muito mais do que achar que parlamentares estão à venda. Porque essa deve ser a intenção. Se eles liberam emendas e acham que com isso o candidato do governo ganha, eles diminuem a importância dos parlamentares. Esse troca-troca tão criticado pelo Bolsonaro é um atraso.
O senhor entende que isso é uma tentativa de compra dos parlamentares?
Do ponto de vista do deputado, tenho certeza que não. Cada deputado tem o direito de ir atrás, de defender seus municípios. Do ponto de vista do governo, dá impressão que eles acham que, criando um balcão, vão conseguir eleger o presidente da Câmara. Se essas práticas prevalecerem – e tenho certeza que não vão prevalecer –, você terá um governo pressionado e chantageado de forma permanente, por trocas.
A eleição da Câmara, apesar de indireta, não é mais um teste da capacidade de união de uma frente da centro-direita à centro-esquerda, para o enfrentamento eleitoral ao Palácio do Planalto, em 2022?
Uma vitória do candidato do Bolsonaro o recoloca no processo político. A principal derrota dele, pra mim, foi a ruptura dessa rede populista nacionalista internacional com a derrota do Trump. Depois, a sinalização, das eleições municipais. E agora tem eleição da Câmara. O resultado vai ter um simbolismo, porque ele está inferindo mais do que a presidente Dilma Rousseff quando tentou eleger o deputado Arlindo (Chinaglia, PT) contra o deputado Eduardo Cunha (em 2015).
O governo entende que quem eleger o presidente da Câmara se fortalece para a eleição presidencial de 2022.
O que vai pesar em 2022 é a pauta do governo nos próximos seis meses. O governo é que vai ditar, porque ele é o incumbente, se quer ser popular ou populista. Faz mais de um ano que o governo anunciou que votaria a PEC Emergencial no Senado, decisiva para a manutenção da política de equilíbrio fiscal. Não é só política do teto de gastos. É isso que vai organizar os adversários do governo.
A sua relação com o ministro Paulo Guedes foi tensa nesses dois anos. O ministro agora aposta no deputado Arthur Lira, candidato do governo para sucedê-lo, para tocar sua agenda econômica. Acredita que será diferente com Lira?
Quem me deu a melhor frase sobre o ministro da Economia foi o próprio Arthur Lira. No início do governo a gente teve uma conversa e o candidato do Bolsonaro disse para mim: “Rodrigo, esquece o Paulo Guedes, o Paulo é um vendedor de redes.” De fato, tem que admitir que o candidato do Bolsonaro tem alguma visão de futuro. Parece que é um vendedor de redes mesmo, né? Nada acontece. O Paulo Guedes está errado. O Paulo Guedes está sendo ingênuo. O governo quer outro presidente da Câmara para interferir na pauta de costumes. Na pauta econômica não precisa interferir de forma nenhuma.
A reforma tributária foi para as calendas?
A pauta está atrasada pelo próprio governo. Tirando a Eletrobrás, que houve um problema grave com a nova proposta de modelagem do governo, as outras três privatizações devem estar no sonho do Paulo Guedes, porque até agora nenhuma delas chegou na Câmara. Ele deve sonhar dizendo que chegou na Câmara, que encaminhou, deve ser um sonho.
A esquerda será decisiva mais uma vez na eleição da Câmara?
A esquerda vai ficar contra o Bolsonaro por causa da pauta de costumes. Vai prevalecer a política.
O senhor pretende continuar no Legislativo ou experimentar o Executivo?
Eu posso participar de um governo em que eu confie e que eu participe do processo de construção, no ministério, numa coordenação, na articulação de alguma área. A Câmara me deu, e eu me dediquei a isso, a capacidade de conhecer muita coisa, muitos temas, muitas realidades. Em um país parlamentarista eu teria uma função muito forte.
Com quem que o senhor poderia se juntar?
Temos que juntar o Doria, o Huck, o Ciro Gomes, o PSB do Paulo Câmara, do Renato Casagrande. Todos os partidos queiram estar aqui nesse campo de centro. Até o PT.
E o senhor seria um bom vice?
Eu poderia coordenar essa articulação. O grande desafio desse campo de centro é o denominador da agenda econômica. Se a gente conseguir construir um denominador, a gente consegue fazer uma candidatura de centro que eu acho que vai mudar o Brasil. Muita gente fala: “Eu sou de centro”. Centro não é um ponto entre o número 10 e o número 1. Não é um ponto entre a esquerda e a direita. É um ambiente diferente, onde você tenta trazer pra política uma nova composição, uma nova realidade, onde segmentos que conversam pouco tenham a capacidade de construir em conjunto esse país que a gente espera.
Merval Pereira: A síndrome de Bolsonaro
A sucessão na Câmara dos Deputados está virando uma briga pessoal entre o deputado Rodrigo Maia e o presidente Bolsonaro, que não quer que Maia continue tendo influência política decisória. Atribui a Maia o fato de ter-se tornado uma espécie de refém dos deputados. Colocando um deputado do Centrão na presidência, com o apoio ao deputado Arthur Lyra, o presidente continuará refém, mas desta vez de um sequestrador escolhido por ele. Uma espécie de síndrome de Estocolmo antecipada.
Rodrigo Maia faz uma jogada inteligente, diz que o presidente quer colocar alguém de sua confiança na presidência da Casa para aprovar as pautas regressivas de costumes e meio ambiente. Pela economia, que é o principal no momento, não haveria problema de um deputado do grupo de Maia ser eleito, pois eles comungam das mesmas teses liberais que teoricamente levaram o ministro Paulo Guedes para o ministério da Economia.
É a maneira que ele tem de estabelecer a divisão entre os que vão apoiar o governo, e os que querem uma Câmara independente. Vale até mesmo para o PT, que está namorando Artur Lyra, candidato oficial do Planalto, pela promessa de acabar com a Ficha Limpa, o que agrada não só ao PT, mas também ao Centrão e a muita gente que está sendo investigada e pode ser condenada, e até ao próprio Bolsonaro, por causa dos filhos.
O PT alega que ter um lugar na Mesa Diretora é importante para guardar um posto institucional para o partido, mas isso Maia daria também. O compromisso contra a Lei da Ficha Limpa também não seria impossível de Maia aceitar, talvez não com tanto despudor. Para Lula, esse é um ponto fundamental na sua estratégia para chegar a disputar a presidência da República em 2022, e Maia e o DEM têm já lado nessa disputa, que pode ser o apresentador Luciano Huck, o governador de São Paulo João Dória, ou o ex-governador Ciro Gomes.
O PDT, por sinal, deve fechar com o grupo de Maia, assim como o PC do B. O PSB vai no mesmo caminho do PT, apoiar o candidato do Palácio do Planalto. Mas garante que continuará na oposição, como se houvesse lógica política nessa explicação estapafúrdia. Um governo que começou com o ex-juiz Sergio Moro no ministério da Justiça, como sinal de que apoiava o combate à corrupção, conforme defendeu na campanha que o levou ao Palácio do Planalto, no meio do mandato já aparelhou a Polícia Federal e outros órgãos de controle e investigação, tem um Procurador-Geral da República, Augusto Aras, que estrangula as forças-tarefas de Curitiba e Rio de Janeiro com mudanças burocráticas que praticamente inviabiliza as investigações, e tem como promessa de seu candidato à presidência da Câmara acabar com a lei da Ficha Limpa. Terá nessa tarefa ajuda até mesmo de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Um deles, Gilmar Mendes, já disse que a lei parece ter sido redigida por um bêbado.
Os dois grupos já lançados à campanha pela presidência da Câmara dos Deputados têm mais ou menos a mesma correlação de forças, com cerca de 160 deputados cada um, e a oposição, como era esperado, fica como fiel da balança. Maia tem mais apoios na esquerda, como no PC do B e no PDT.
O PSL, que tem a maior bancada na Câmara ainda em decorrência da eleição de Bolsonaro em 2018, está no grupo de Maia, mas rachado. Há muitos deputados que ainda querem apoiar Bolsonaro e, por conseguinte, votarão em Arthur Lyra. Podemos chegar à situação de o candidato do Planalto ser apoiado pelo PT e pelo PSB, que continuarão dizendo que não fazem parte da base bolsonarista, mas darão ao presidente uma de suas maiores vitórias políticas.
Só não será completa essa vitória porque vencer com o Centrão não é garantia de imunidade. Com a mesma ligeireza com que o grupo político aderiu a mais um governo, também o dispensará caso a economia nos leve a uma crise incontornável.
Com medo de que Rodrigo Maia pudesse retirar da gaveta um dos muito atos pedindo seu impeachment, Bolsonaro pode ter a desdita de ser impedido por uma ação do mesmo Arthur Lyra que está ajudando a chegar à presidência da Câmara. A política brasileira só tem a lógica do interesse pessoal, e não da política programática.
Bernardo Mello Franco: O candidato de Bolsonaro
O candidato de Jair Bolsonaro largou na frente na corrida pela presidência da Câmara. Líder do PP, Arthur Lira se lançou com o apoio do governo e de mais oito partidos. O grupo reúne um número sugestivo de deputados: 171.
Lira tem muito em comum com a família Bolsonaro. Segundo a Procuradoria-Geral da República, ele comandou um esquema de rachadinha na Assembleia Legislativa de Alagoas. As investigações apontaram o desvio de R$ 500 mil por mês para o bolso do parlamentar.
O caso veio à tona na semana passada em reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo”. Numa curiosa coincidência, o juiz Carlos Henrique Pita Duarte absolveu o deputado no mesmo dia em que a notícia foi publicada. O Ministério Público classificou a decisão como um “grave erro judicial” e anunciou que vai recorrer. Lira se diz inocente.
O aliado do Planalto ainda é réu em duas ações no Supremo. Numa delas, é acusado de receber propina para influir na Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). Na outra, é apontado como integrante de uma quadrilha que saqueava dinheiro da Petrobras.
Com esse currículo, o parlamentar se cacifou para chefiar o centrão. O grupo foi organizado pelo ex-deputado Eduardo Cunha para arrancar cargos e verbas do governo Dilma Rousseff. Depois rompeu com a petista, apoiou o impeachment e ascendeu ao centro do poder com Michel Temer.
Lira e Bolsonaro viraram amigos de infância em abril, quando o líder do PP começava a articular sua candidatura ao comando da Câmara. A aliança foi selada com um vídeo em que o deputado descreve os filhos como “grandes fãs” do presidente. Agora o governo promete milhões de incentivos para quem votar nele.
Antes de subir a rampa, o capitão não ostentava muito apreço pelo centrão. Na campanha de 2018, ele definiu o grupo como “a nata do que há de pior no Brasil”. O general Augusto Heleno classificou a turma como a “materialização da impunidade”. “Se gritar pega centrão, não fica um, meu irmão”, cantarolou, na convenção do PSL. No samba original, gravado por Bezerra da Silva, o termo “centrão” dá lugar a “ladrão”.
O Estado de S. Paulo: Ramos articula apoio a Lira e oferece emendas
Ministro recebe deputados em gabinete e acena a siglas da oposição, como PSB e PDT, por votos no candidato do Planalto à presidência da Câmara que se opõe a Maia
Felipe Frazão, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - É no gabinete do ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, no 4.º andar do Palácio do Planalto, que deputados têm participado de reuniões para ouvir os argumentos do governo em defesa da eleição do deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) para a presidência da Câmara. De lá, saem com promessas de emendas parlamentares, algumas além daquelas a que já têm direito, e de cargos a preencher em seus redutos eleitorais.
O Estadão apurou que ao PDT, por exemplo, teria sido oferecido um “extra” de R$ 5 milhões em emendas para cada deputado, que poderá indicar como o dinheiro será aplicado em seu reduto eleitoral. Além disso, um grupo do PSB foi chamado na quarta-feira, 9, à sala do general Ramos. O deputado Felipe Carreras (PSB-PE) participou do encontro. À tarde, foi um dos que puxaram o pedido de apoio a Lira na reunião interna do partido, que tem 31 deputados.
O Palácio do Planalto entrou em campo para angariar apoio à candidatura de Lira. A articulação política do presidente Jair Bolsonaro avança sobre partidos da oposição, numa tentativa de enfraquecer as conversas do grupo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que está disposto a apoiar a candidatura do deputado Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB).
Na segunda-feira, Bolsonaro recebeu Lira e o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do Progressistas, para uma conversa reservada, no Planalto. O encontro não constava da agenda oficial. Dois dias depois, a candidatura de Lira, chefe do Centrão, foi oficializada.
Ramos, por sua vez, passou a receber deputados de esquerda e a discutir o pagamento de emendas. Os 133 votos de partidos da oposição são o fiel da balança na eleição para a Câmara, marcada para 1.º de fevereiro de 2021. Os gabinetes da equipe de Ramos e do próprio ministro foram abertos a nomes do PSB e do PDT, em conversas que tratavam da destinação de recursos.
Circula entre integrantes da cúpula da Câmara a informação de que a oferta vai além da liberação de emendas individuais impositivas, que costumam ser reservadas em maior volume no fim do ano. O Planalto teria também acenado com recursos do orçamento de ministérios, que passariam a ser aplicados por indicação de deputados. Trata-se das chamadas “emendas extraorçamentárias”. O valor, para cada parlamentar, seria de R$ 5 milhões. O governo e os parlamentares negam.
Felipe Carreras confirmou que esteve anteontem no Planalto. Disse que foi tratar de “assuntos do interesse de seu Estado”, mas, questionado duas vezes com que se encontrou, se recusou a dizer. Carreras confirmou ter a intenção de apoiar Lira, mas negou que tenha tratado do assunto em sua visita. “Estive tratando de assunto de interesse do governo”, disse.
A deputada Lisiane Bayer (PSB-RS) também confirmou que esteve no fim da tarde de anteontem no Planalto, acompanhada de Carreras. Ao Estadão, disse que se encontrou “por acaso” com Ramos. “Não falamos sobre emendas. Nós nos cumprimentamos e só”, afirmou, ressalvando que aguarda a decisão do partido sobre quem apoia na disputa.
O presidente do PDT, Carlos Lupi, disse desconhecer qualquer negociação com o governo. “Não tenho conhecimento disso e também não concordo em apoiar candidatos do Planalto”, afirmou.
Bolsonaro foi eleito com discurso radical contra a troca de benesses. Desde quarta-feira, um grupo de ex-aliados fez circular nas redes sociais um vídeo de campanha em que o então deputado prometia combater o fisiologismo. “O nosso maior problema é o político. São as indicações políticas. É o ‘toma lá dá cá’ e as consequências desse tipo de fazer política são a ineficiência do Estado e a corrupção. Tem que jogar pesado nessa questão, valorizar a sua Polícia Federal, valorizar o seu Ministério Público, os homens que realmente vão atrás desses que teimam em roubar a Nação”, dizia Bolsonaro.
Nos bastidores do Planalto, a atuação de Ramos em prol de Lira é vista também como uma estratégia do general para se manter na articulação política do governo. O ministro está cotado para assumir a Secretaria-Geral da Presidência, no lugar de Jorge Oliveira, que deixará o Executivo no próximo dia 31 para assumir uma vaga no Tribunal de Contas da União (TCU). Embora seja homem da confiança de Bolsonaro, Ramos enfrenta desgaste no governo.

Na quarta, Marcelo Álvaro Antônio foi demitido do Ministério do Turismo após dizer em um grupo de WhatsApp de ministros que Ramos havia oferecido o seu cargo ao Centrão para influenciar na eleição da Câmara. Em sua defesa, o general costuma dizer que apenas cumpre ordens do presidente, servindo de escudo para ele.
Desde a última semana, passaram pela Secretaria de Governo Felipe Rigoni (ES), Felipe Carreras e Ricardo Silva, todos do PSB. Além deles, estiveram lá cinco nomes do PDT – Alex Santana (BA), Gil Cutrim (MA), Flávio Nogueira (PI), Mauro Benevides Filho (CE) e Eduardo Bismarck (CE) – este último, inclusive, acompanhado de um assessor especialista em Orçamento. As conversas constam na agenda de Ramos.
Bismarck disse que foi conversar sobre o Orçamento e recursos para o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, mas negou que tenha tratado de eleição. Santana observou que esteve no Planalto para discutir emendas individuais impositivas. “Se eu tivesse que falar sobre eleição na Câmara, a conversa não era com Jonathas (Jônathas Castro, secretário executivo do ministro), mas com o ministro Ramos.”
Lira declarou que tem mantido diálogos de campanha. “Como candidato, tenho a obrigação de conversar com todos os líderes e partidos. Não há qualquer tratativa em relação a indicação de cargos”, afirmou.
Ministério afirma que cumpre ‘papel institucional’
Em nota, a Secretaria de Governo (Segov), comandada pelo ministro Luiz Eduardo Ramos, afirmou que é “missão institucional e legal” do ministério receber parlamentares e realizar a interlocução do Palácio do Planalto com o Congresso.
“Isso ocorre ao longo de todo ano, com os parlamentares sendo recebidos na Segov, especialmente nos dias em que têm agenda em Brasília”, diz trecho da nota. “A retomada mais intensa das votações no Congresso e a maior presença dos parlamentares em Brasília, com maior frequência após eleições municipais, faz com que seja necessário a Segov exercer seu papel institucional de receber parlamentares e servir como elo com os demais ministérios, bem como dialogar e informar a posição do governo quanto as pautas em discussão no Congresso.”
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Ascânio Seleme: E agora, Rodrigo?
O deputado salvou o presidente. O presidente degolou o deputado
Não se pode negar que o deputado Rodrigo Maia teve momentos importantes e positivos no exercício da presidência da Câmara. Foi mérito quase exclusivo seu a reforma da Previdência, no segundo semestre do ano passado, quando chamou para si, tocou e fez aprovar o projeto, enquanto o governo fazia corpo mole. É verdade também que, durante todo o mandato, trabalhou incansavelmente pela sua reeleição. Fez os entendimentos possíveis e engoliu todos os sapos para ficar sempre pronto para ser reconduzido ao cargo, embora soubesse ser inconstitucional. O mais grave foi ter se sentado em cima de pelo menos 30 pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro.
O deputado sabe, como você e eu, que Bolsonaro cometeu uns dez crimes de responsabilidade nestes primeiros dois anos de mandato. Um deles poderia ser catalogado como hediondo, por atuar de maneira temerária em relação ao coronavírus. Crime em que agora está reincidindo com o retardamento do início da vacinação contra a Covid-19 por imprudência, inação e birra política. Também atentou contra a democracia ao dar apoio a manifestações públicas que pediam o fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional, inclusive em frente ao principal quartel do Exército. Numa delas, havia cartazes pedindo a prisão de Rodrigo Maia. E o que fez Rodrigo Maia? Nada.
Cabe exclusivamente ao presidente da Câmara dar início a um processo de impeachment. Embora ninguém pudesse exigir que desse andamento ao pedido de afastamento do presidente, o deputado ignorou sua atribuição constitucional. De maneira informal, repetiu a quem quisesse ouvir que não encaminharia o processo porque não daria em nada, já que não seriam alcançados os votos necessários para afastar Bolsonaro. Ora, deputado, convenhamos. Então, dane-se a Constituição? O presidente comete inúmeros crimes, e não se abre um processo porque faltam votos para ao final puni-lo?
Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Estados Unidos, abriu um processo de impeachment contra Donald Trump, mesmo tendo absoluta certeza de que ele não seria aprovado no Senado americano, que tinha maioria republicana. Corajosa, resoluta e politicamente responsável, cumpriu seu dever constitucional dando encaminhamento ao impeachment, que de fato acabou sendo barrado. Rodrigo Maia, não. Tratou de se preservar, talvez imaginando que, ao poupar Bolsonaro, não teria sua oposição quando chegasse a hora da eleição da Mesa da Câmara. Nancy Pelosi não perdeu um grama sequer de seu prestígio. Rodrigo Maia perdeu. Muito.
O deputado passou dois anos tratando de ficar bem com todos, inclusive com o Planalto. Embora vez por outra demonstrasse irritação com os arroubos do presidente e dos seus três zeros, jamais se distanciou de Bolsonaro. Só percebeu que estava tratando com um inimigo perigoso agora, quando o PTB bolsonarista arguiu a constitucionalidade da sua reeleição. Rodrigo ainda acreditou que o tribunal haveria de ver nele uma barreira contra a escalada autoritária de Bolsonaro, autorizando sua recondução. Não viu. E por que veria, se ele nada fez quando efetivamente pôde impedir o presidente?
Bolsonaro livrou-se de Rodrigo Maia. Descartou-o como se descarta uma garrafa vazia. O presidente queria e precisava livrar-se dele porque também só pensa na sua própria reeleição. O deputado seria uma sombra incômoda. Melhor ter um aliado incondicional no cargo, mesmo que seja um corrupto notório. Bolsonaro, que trabalha a favor de um segundo mandato desde que assumiu o governo, poderia ter sido afastado do primeiro, não fosse a inércia de Rodrigo Maia. O deputado salvou o presidente. O presidente degolou o deputado.
Rodrigo agora desce para a planície, volta ao chão do plenário que não pisa há cinco anos. Será, mesmo assim, um deputado influente, líder de um partido que se reinventou e que fez uma boa eleição municipal. Mas, no futuro, ainda terá de lidar com uma tarefa complicada, de explicar para a história por que não cumpriu a missão que a ele estava reservada.
Luiz Carlos Azedo: Tudo ou nada na Câmara
Arthur Lira tenta montar uma espécie de rolo compressor, já integrado por 205 deputados, para atropelar Maia, que ainda não tem candidato à própria sucessão
Troca de farpas pelas redes sociais e depois, um bate-boca na antessala do presidente Jair Bolsonaro, derrubaram antes da hora o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e podem resultar também no deslocamento do general Luiz Ramos, que sai desgastado do episódio, da Secretaria de Governo, ou seja, do cargo de articulador político do governo. A trombada entre ambos foi um efeito colateral das articulações de Ramos para fortalecer a candidatura do deputado Arthur Lira (PP-AL) a presidente da Câmara, da qual também faz parte a reforma ministerial em discussão no Palácio do Planalto. Marcelo Álvaro Antônio é ligado aos filhos de Bolsonaro, que vivem às turras com os militares do governo.
Ramos teria colocado o Ministério do Turismo na mesa de negociações com o Centrão, convidando para o cargo o deputado Roberto Lucena (Podemos-SP). O ministro ficou sabendo e partiu pra cima do general, acabou demitido por Bolsonaro. O presidente da Embratur, Gilson Machado, assumiu interinamente a pasta. Agora, cogita-se que Ramos vá para Secretaria-Geral da Presidência, entregando a Secretaria de Governo para o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PP),um dissidente do PP e aliado de Rodrigo Maia, que passaria a ser o novo articulador político do governo. Bolsonaro está indo para uma espécie de tudo ou nada no Congresso, que pretende controlar. Contava com a reeleição de Alcolumbre, mas o veto do Supremo Tribunal Federal (STF) à recondução atrapalhou seus planos; em contrapartida, a candidatura de Arthur Lira na Câmara está de vento em popa.
Não foi à toa que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM—RJ), que ainda não tem candidato à própria sucessão, acusou Bolsonaro de estar “desesperado” para controlar o Congresso. A pauta da Câmara é o ponto de partida para a agenda de Bolsonaro, cujo eixo é o desmonte da legislação relativa aos direitos humanos e ao meio-ambiente, e dos instrumentos de controle institucional da sociedade sobre o Executivo. Para levar adiante muitas de suas propostas, o presidente da República precisa do apoio do presidente da Câmara. Quando Maia diz que o Palácio do Planalto está jogando pesado, isso significa que não está economizando cargos e verbas para obter apoio parlamentar, o tradicional toma lá dá cá.
Rolo compressor
Arthur Lira anunciou sua candidatura ontem com apoio dos 135 deputados do Centrão — PL (41)), PP (40), PSD (33), Solidariedade (13) e Avante (8). De imediato, recebeu apoio do PL (41), do PTB (11), do PROS (10), do PSC (9) e do Patriota (6), ou seja, teoricamente, de mais 77 deputados. Tenta montar uma espécie de rolo compressor, já integrado por 205 deputados, aproveitando o fato de que a liderança de Maia se enfraquece, porque ainda não tem um candidato que atraia os votos da oposição e seu mandato está terminando. A expectativa de poder que Lira oferece não é a ocupação de espaços na própria Câmara, moeda de troca com a qual Maia não conta mais, são os cargos e verbas do governo federal, com os quais o presidente da Câmara aí é que não conta mesmo.
Para um presidente da República que chegou ao poder com uma narrativa antissistêmicas, que renegava o jogo parlamentar e o chamado presidencialismo de coalizão, a mudança de rumo só tem uma explicação: o fracasso na implementação da agenda de governo. As reformas de Bolsonaro não foram adiante , com exceção da previdenciária, que já estava com meio caminho andado no governo de seu antecessor, Michel Temer. Ontem, Maia chegou a ironizar o atraso na aprovação da PEC Emergencial, cuja tramitação o governo resolveu iniciar pelo Senado. Disse que vai encomendar um bolo para comemorar um ano de atraso da proposta do governo, que está parada até hoje.
Não se sabe ainda o custo das articulações para garantir a vitória de Lira, as negociações para isso são feitas no âmbito da pequena política, com todos os riscos que isso oferece do ponto de vista republicano. Na grande política, o governo Bolsonaro perdeu completamente o rumo, ninguém sabe em que direção pretende ir. A base que montou no Congresso tem um viés conservador nos costumes e populista na economia, o que vai complicar o enfrentamento da crise.
A propósito, ontem, o Banco Central (BC) manteve a taxa Selic em 2%, apesar da alta da inflação, interrompendo as especulações do mercado. Atribuiu a alta de preços ao impacto do dólar nas exportações e avaliou que a situação é sazonal, ou seja, os preços vão cair. No mercado, porém, as maiores preocupações são com a dívida pública, que chegará a R$ 1 trilhão, e com a segunda onda da pandemia, cujo impacto nas atividades econômicas vai depender da efetividade da campanha de vacinação contra o novo coronavírus.
Maria Cristina Fernandes: Uma disputa contaminada por 2022
Congresso precisa se diferenciar de JB para sobreviver
A Câmara dos Deputados terá a disputa mais contaminada pela sucessão presidencial da história. Não porque os pré-candidatos que aí estão venham a atuar na formatação das chapas em disputa. Nem que o quisessem, conseguiriam. A contaminação se dará pela necessidade de preservar o status quo parlamentar, a ser repactuado não apenas com o atual governo como também com aquele que vier a sucedê-lo.
O estado de coisas a ser mantido começou a ser construído cinco anos atrás por dois governos em busca de sobrevivência. Um (Dilma Rousseff) naufragou, o outro (Michel Temer) escapou. Como legado, deixaram as emendas impositivas (R$ 15,4 bilhões em 2020) e os fundos eleitoral e partidário (R$ 3 bilhões) num volume jamais visto. Esses recursos garantem a reprodução dos partidos como máquinas de mediação do poder.
Se em 2020, União, Estados e municípios dispuseram de dinheiro extra para a pandemia, as incertezas para o caixa de 2021 estão refletidas na ausência de uma Lei de Diretrizes Orçamentárias a três semanas do fim do ano. Ganha quem mantiver o que tem. É isso que está em jogo, antes de qualquer nome para 2022, por mais que a condução aloprada do combate à covid-19 do presidente torne premente a busca de alternativas.
A dramaticidade pública da disputa, se dá pelas farpas. Um lado desencava a ficha corrida do candidato que, em resposta, ameaça uma devassa nas contas da gestão que permaneceu mais de quatro anos no poder. Mas o nome real da briga é a liderança para preservar seu quinhão sob o teto de gastos.
Por isso, a disputa não favorece aventureiros ou aqueles que colecionam inquéritos no Supremo Tribunal Federal. Há muito em jogo e ninguém quer correr riscos com dublês de Eduardo Cunha. O ex-deputado só conseguiu se eleger para comandar a Câmara porque cultivava mais diferenças do que semelhanças com a ex-presidente Dilma Rousseff. Jair Bolsonaro está cada vez mais parecido com o Congresso. Por isso, também, os parlamentares precisam buscar alguém que se diferencie.
Maia manteve-se fiel aos seus princípios liberais, aprovou reformas fiscais (Previdência), sociais (Fundeb) e estruturantes (saneamento) e viabilizou o combate à pandemia com o Orçamento de guerra. Por outro, manteve os espaços conquistados pelos partidos, inclusive o seu.
Nos dois últimos anos, o DEM manteve um inédito domínio de ambas as mesas do Congresso, ocupou as Pastas da Saúde, Casa Civil e Agricultura, além de cargos-chave na execução de políticas públicas como o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e a Companhia de Desenvolvimento do Vale do Rio São Francisco (Codevasf).
Enfraquecido pela decisão do Supremo, Rodrigo Maia tentará preservar sua condição de interlocutor da pauta reformista, e do palanque presidencial de 2022. Só o fará se for capaz de eleger um aliado. Não é o caso de Arthur Lira. Cabe tudo na relação entre ambos, menos lealdade.
O líder do PP não abre para ninguém. Um velho parlamentar dizia que no Congresso não se joga xadrez, mas dama, jogo em que vence aquele que come as peças do outro. Lira joga com as pretas. Seus aliados ameaçam, por exemplo, intervir no diretório do PP da Paraíba e usar de sua influência no governo para deixar o prefeito eleito de João Pessoa, Cícero Lucena, à míngua se o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), aliado de Maia, resolver se lançar como candidato avulso.
Na miríade de candidatos que aí estão todos se apresentam como mais independentes do bolsonarismo do que Arthur Lira, ainda que usufruam de suas benesses. A vacinação contra a covid-19 é apenas a mais recente das trapalhadas de um governo cuja proximidade tem se tornado cada vez mais tóxica. Depois de anunciar que o PP estaria de portas abertas para a filiação do presidente, os aliados de Lira já dizem abertamente que pretendem mandá-lo pra casa daqui a dois anos.
A julgar pelo primeiro biênio, talvez seja, de fato, o melhor lugar que Jair Bolsonaro possa almejar. A postura, destinada a angariar votos da esquerda, tem enfrentado resistências. No encontro desta semana entre Lira e Paulo Câmara, governador de Pernambuco, capitania do PSB, só havia sete dos 31 parlamentares do partido.
Se o essencial é preservar os espaços do Legislativo num Orçamento que vai se apertar ainda mais, a credencial de parlamentares hoje licenciados para ocupar cargos no Executivo deveria valorizá-los. Só que não. O ministro das Comunicações, Fábio Faria (PSD-RN) é um parlamentar de primeiro mandato que nunca liderou bancada nem sequer relatou matéria na Câmara. É jeitoso, mas prescinde de todos os demais predicados para ocupar o cargo.
O outro ministro cogitado, Tereza Cristina (DEM-MS), da Agricultura, pode até deixar o cargo porque o presidente Jair Bolsonaro precisará recompor seu governo em função da disputa pela Mesa, mas não unifica nem mesmo a bancada ruralista. Resiste a encampar o chororô pela renegociação das dívidas eternas do campo.
Se a Câmara custa a encontrar um nome que ancore com responsabilidade o status quo dos parlamentares, no Senado o jogo é o inverso. Davi Alcolumbre (DEM-AP), senador de primeiro mandato, foi um azarão que construiu sua vitória porque do outro lado estava o senador Renan Calheiros (MDB-AL).
Ele é fruto de uma conjunção de astros hoje inexistente. Eleito graças aos votos da bancada lavajatista, Alcolumbre firmou maioria junto aos tradicionais feudos da Casa traindo os compromissos que firmara e assumindo a condição de despachante de interesses dos senadores junto ao governo.
As infrações da operação e o ocaso do ex-juiz Sergio Moro ofuscaram a bandeira lavajatista. Do outro lado da Praça dos Três Poderes, porém, a derrota da tese da reeleição nas Mesas do Congresso reavivou as divisões históricas entre garantistas e lavajatistas do Supremo, embora com os sinais trocados. Os coveiros da Lava-Jato não se preocuparam com as garantias das previsões constitucionais.
O que mudou da eleição de Maia e Alcolumbre para cá é que Bolsonaro mostrou a que veio. A imagem do Legislativo só melhorou, ao longo da pandemia, porque a Casa, apesar de sócia ocasional do bolsonarismo, mostrou-se um contraponto aos seus desvarios. Ganha quem mantiver isso aí.
O Estado de S. Paulo: Disputa pela Câmara já divide grupo ligado a Maia
Após STF barrar reeleição, siglas discutem nomes de candidatos, e Planalto entra na sucessão no Congresso; líderes querem evitar que um partido controle as duas Casas
Camila Turtelli, Daniel Weterman e Jussara Soares, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Uma disputa interna ameaça desidratar o bloco de aliados do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para a eleição da cúpula do Congresso, em fevereiro de 2021. Desde domingo, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu barrar a possibilidade de recondução de Maia ao comando da Câmara e de Davi Alcolumbre (DEM-AP) à presidência do Senado, as negociações entre os partidos se intensificaram e o Palácio do Planalto entrou no jogo com mais “tinta na caneta”. Agora, o vice-presidente da Câmara Marcos Pereira (Republicanos-SP), ameaça sair do grupo de Maia e lançar candidatura avulsa, abrindo um racha no bloco.
Pereira está insatisfeito com o que considera predileção de Maia por outros pré-candidatos à sucessão na Câmara, como os deputados Baleia Rossi (MDB-SP) e Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB). “Não aceito entrar em jogo jogado”, disse ele ao Estadão/Broadcast. Bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, Pereira preside o Republicanos e está sendo cortejado pelo deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), rival de Maia e pré-candidato à presidência da Câmara. Chefe do Centrão, Lira conta com o apoio do Palácio do Planalto.
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A reportagem apurou que na negociação para que Pereira apoie Lira entrou até mesmo a oferta de um ministério. O vice-presidente da Câmara foi ministro da Indústria e Comércio Exterior no governo de Michel Temer, mas negou que tenha sido convidado novamente para ocupar uma cadeira na Esplanada. “Não procede”, disse. Na semana passada, um dos quadros evangélicos do Republicanos no Maranhão ganhou a presidência da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
A ideia de Maia é lançar um candidato com apoio de um bloco formado por DEM, MDB, PSDB, Cidadania, além do Republicanos, PSL, PROS e partidos de oposição. Se todas essas legendas estivessem unidas, o bloco do presidente da Câmara reuniria aproximadamente 300 dos 513 deputados para enfrentar Lira e o Centrão. O problema é que, além de divergências entre os que já acompanham Maia há algum tempo, a esquerda também está dividida.
Com cerca de 130 votos, siglas como PT, PDT, PSB, PSOL e PCdoB são hoje consideradas como “fiel da balança” na eleição da Câmara. O PT e o PSB estão rachados e alegam que precisam saber quem será o candidato de Maia. Negociam, ainda, cargos em comissões e na Mesa Diretora, além de emendas ao Orçamento.
Antes do racha, o grupo de Maia havia acertado que a escolha do candidato do bloco à presidência da Câmara seria feita até o dia 15. Além de Pereira, que ameaça sair do grupo, estão nessa lista os deputados Baleia Rossi (MDB-SP), Elmar Nascimento (DEM-BA), Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-AL) e Luciano Bivar (PSL-PE). Ribeiro é do mesmo partido de Lira e sua eventual entrada no páreo poderia provocar outra crise política.
Maia não quis se manifestar sobre as defecções no grupo. Seus interlocutores, porém, disseram que já fazem as planilhas com previsão de quantos votos o bloco terá sem contar com a participação de Pereira.
Mesmo partido
Como se não bastassem as disputas internas, há também mais um impasse: líderes de partidos da Câmara e do Senado tentam evitar que os comandos das duas Casas fiquem mais uma vez nas mãos de um mesmo partido. Atualmente, o DEM tem a presidência da Câmara e do Senado.
A ideia, agora, é construir uma “solução casada”. Isso significa que, para o MDB conseguir o apoio de outras legendas a um candidato à sucessão de Alcolumbre no Senado, o deputado Baleia Rossi, que comanda o partido e é um dos cotados para presidir a Câmara, deve abrir mão da disputa.
Fora do jogo por determinação do Supremo, Alcolumbre é apontado como forte cabo eleitoral. O presidente do Senado dava como favas contadas que a Corte avalizaria sua entrada na eleição, embora a Constituição proíba a recondução na mesma legislatura. A solução jurídica estava acertada entre a maioria dos magistrados, mas a pressão da opinião pública pesou para a mudança.
Com 13 integrantes, o MDB vai reivindicar a presidência do Senado por ser a maior bancada. Os líderes do governo no Congresso, Eduardo Gomes (TO), e no Senado, Fernando Bezerra Coelho (PE), são citados para a vaga por auxiliares do presidente Jair Bolsonaro. O líder da bancada do MDB, Eduardo Braga (AM), também é pré-candidato a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Simone Tebet (MS), se apresentou para a disputa interna no partido.
Líder do DEM no Senado, Rodrigo Pacheco (MG) entrou na “lista” de Alcolumbre. Pacheco pretende se apresentar com um perfil independente. “Vamos encontrar um caminho que seja bom para o Senado e para o País”, afirmou. Na tarde de ontem, ele foi recebido por Bolsonaro para uma audiência no Planalto. Oficialmente, o encontro foi para tratar do nível da represa de Furnas, em Minas.
Segunda bancada no Senado, com 12 integrantes, o PSD também se movimenta para lançar candidatura no Senado. O líder da bancada, Otto Alencar (BA), e os senadores Antonio Anastasia (MG) e Nelsinho Trad (MS) são apontados como possíveis nomes. No PSDB, Tasso Jereissati (CE) é visto como “terceira via”, mas ainda não entrou no páreo. Correm por fora, na outra ponta, os senadores Major Olímpio (PSL-SP) e Álvaro Dias (Podemos-PR), que fazem oposição a Alcolumbre.
Vera Magalhães: Supremo expõe culpa de Maia
A culpa por Bolsonaro ter ligeira vantagem na disputa pela Câmara não é de outro senão de Rodrigo Maia.
É falacioso e perigoso o argumento segundo o qual a decisão da maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, ao ler a Constituição (não há que se falar de interpretação quando um dispositivo é tão literal quanto a sentença “Ivo viu a uva”) de proibir a reeleição da dupla Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Rodrigo Maia (DEM-RJ) ajudou Jair Bolsonaro. Diferentemente da eleição municipal, na qual resolveu colocar todas as suas digitais, até aqui o presidente joga parado na disputa pelo Congresso, que tem muito mais implicações para ele do que a anterior. O presidente não interferiu ali (nem tem interlocutores com abertura para isso neste momento).
A decisão de Gilmar Mendes de retorcer o princípio da reeleição era um arranjo que tinha Rodrigo Maia como beneficiário e um certo arranjo pensado de maneira torta para equilibrar as forças políticas para 2022. Ele contava para isso com uma aliança ocasional com ministros pelos quais tem profundo desprezo, mas que esperava que votassem pelo antibolsonarismo, como Edson Fachin, Roberto Barroso e Luiz Fux. A culpa por Bolsonaro ter ligeira vantagem na disputa pela Câmara não é de outro senão de Rodrigo Maia, que hesitou em organizar o grupo que está ao redor de si desde a queda de Eduardo Cunha e, ao sinalizar que iria para o tapetão, jogou o Centrão no colo do presidente, lá atrás, e desorganizou a própria sucessão, deixando de ser o protagonista dela.
Ao dar corda para vários postulantes à sua cadeira enquanto havia outro, Arthur Lira (PP-AL), colocado há anos e já com o apoio do Planalto, o deputado do DEM sempre deixou implícito que estava embarcado no plano do correligionário Alcolumbre, ainda que em público dissesse o contrário. Agora larga atrás para montar uma estratégia que mantenha o bloco em torno de si coeso e destaque entre os vários précandidatos alguém capaz de vencer a dupla Bolsonaro-lira.
É impossível? Não é. A economia patina, o governo não tem agenda na Câmara e a hesitação num assunto sensível à base dos deputados, que é a substituição do auxílio emergencial, joga contra o governo. Além disso, Lira é um candidato cheio de rolo, que não conta com a simpatia da opinião pública e que tem a imprensa, o Ministério Público e o STF nos calcanhares. Se souber, como já soube no passado, catalisar essas deficiências e organizar o jogo, Maia tem chance de eleger um sucessor. Precisará, ainda, fazer com que os partidos que se opõem a Bolsonaro – e aí têm de entrar PT e PSDB, além de parcelas do que se convencionou chamar de Centrão – entendam que dar a ele o comando da Câmara agora é facilitar sobremaneira seu caminho para 2022.
Precisa metabolizar a derrota vexatória que passou neste fim de semana, e à qual se submeteu porque foi excessivamente vaidoso e não soube sair de cena e construir um sucessor, e partir para a ação o mais rápido possível, porque só resta um mês e pouco para colocar uma nova estratégia em prática.