Paulo Guedes

Eliane Cantanhêde: Sujeito (não tão) oculto

Talvez fosse melhor Jair Bolsonaro trocar a metafísica do distante Olavo de Carvalho pelos critérios de Paulo Guedes

Assim como o “Escola sem Partido” significa na verdade trocar um partido por outro, a nova ordem está trocando a “ideologização da esquerda” pela “ideologização da direita”, sob a mesma inspiração, grandiloquência, antipetismo, atingindo em cheio duas das áreas mais sensíveis: Relações Exteriores, com o diplomata Ernesto Araújo, e Educação, com o filósofo Ricardo Vélez Rodríguez.

A inspiração vem de fora, do também filósofo Olavo de Carvalho, ideólogo da direita brasileira, que mora desde 2005 nos Estados Unidos, tem Twitter em inglês e já avisou que até topa um cargo no governo do qual ele é mentor, mas com uma condição: que seja lá, nos EUA, como embaixador. O PT já era e Jair Bolsonaro está chegando, mas bom mesmo continua sendo a Virgínia.

Assim como Ernesto Araújo causou enorme perplexidade ao ver o “globalismo” como complô interplanetário liderado pela “China maoista” para exterminar o Ocidente e os valores cristãos, Vélez Rodríguez se coloca como um Dom Quixote na guerra pela preservação do “valores tradicionais de nossa sociedade”. Ambos, aliás, pelo mesmo veículo: seu blog anti-PT e pró-Bolsonaro.

Professor emérito da Escola de Comando do Estado Maior do Exército e professor colaborador de Pós-graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora, o futuro ministro da Educação se destaca por ser contra o PT, o Enem, as cotas, a ideologia de gênero e, claro, a favor do “Escola sem Partido”, mas sem pressa.

Nascido na Colômbia, está convencido de que as escolas brasileiras vêm sendo usadas para impor à sociedade uma doutrinação marxista e desmontar os valores tradicionais “no que tange à preservação da vida, da família, da religião, da cidadania, em suma, do patriotismo”.

Ou seja: na visão do novo governo, o Itamaraty e as escolas estão infestados de comunistas, contaminados pela ideologia marxista, servindo de instrumentos para o “climatismo” e o “antinatalismo”, conceitos criados por Araújo para explicar como os ambientalistas, abortistas e ateus se articulam para, ardilosamente, destruir o mundo.

No “Novo Brasil”, portanto, há o risco de expurgos, dedos em riste, dossiês, acusações, suspeitas, danças estonteante de cadeiras, sabatinas para apurar a ideologia de servidores e professores concursados e “depurar” o Estado. Ou é só impressão, um temor delirante? Tomara que sim.

Num campo mais concreto: assim como o futuro chanceler deve explicações sobre como projetar a imagem do Brasil, atrair investimentos, melhorar as condições de comércio e fortalecer parcerias, espera-se que o ministro da Educação diga com clareza o que ele pretende fazer pela... educação.

Pela valorização dos professores, qualidade do aprendizado, a escola como fator de igualdade de oportunidades, a qualificação dos jovens, a excelência das universidades. No primeiro texto depois de anunciado, ele prometeu focar nos municípios, na perspectiva individual e nas diferenças regionais. E terminou com a saudação bolsonarista: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.

Com Mozart Neves, sabia-se o que ele significava e pretendia, porque ele não divaga sobre ideologias e ameaças fantasmagóricas e é, sim, uma reluzente referência do Instituto Ayrton Senna. Precisa dizer mais? Por isso, foi descartado com tanta ligeireza e escorraçado pela bancada evangélicas, que testou forças e ganhou.

Talvez fosse melhor Jair Bolsonaro trocar a metafísica do distante Olavo de Carvalho pelos critérios de Paulo Guedes. Vamos combinar que as escolhas do ministro da Fazenda para salvar a economia do País estão sendo bem mais pragmáticas, úteis e consensuais do que as do filósofo erudito para salvar o mundo e o Brasil dos próprios demônios dele.


Adriana Fernandes: Maia no caminho de Guedes

Maia acumulou nas mãos um conjunto de projetos econômicos de peso

Sem conseguir o apoio que esperava do presidente eleito, Jair Bolsonaro, para a sua reeleição ao cargo em 2019, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deu nos últimos dias sinais de que pode colocar muitas “pedras” no caminho das votações dos projetos mais importantes para o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, diminuir alguns dos problemas que o aguardam assim que assumir o cargo no dia 1.º de janeiro.

Já não há mais nenhum comprometimento com a agenda de votações.

Maia segue o caminho do presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), que manobrou para uma votação relâmpago do reajuste dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), com custo fiscal elevado para todo o setor público, e atrapalhou a apreciação do projeto de lei que permitirá a assinatura do contrato aditivo da cessão onerosa entre a Petrobrás e a União. Em público, cumprimentos e gentilezas. As articulações de bastidores, porém, mostram o oposto. De ambas as partes.

Com a bandeira de “menos Brasília e mais Brasil”, com descentralização de recursos da União para Estados e municípios, Paulo Guedes acabou caindo na armadilha montada por Eunício de vincular a votação do projeto de lei da cessão onerosa à partilha da arrecadação do dinheiro do leilão com Estados e municípios. E mais: atrelou o acordo a outro projeto que está na pauta de votação da Câmara, sob o domínio de Maia, que altera a divisão de recursos do Fundo Social do Pré-sal.

O baile duplo complicou a votação do projeto, que é “porta da esperança” para o futuro ministro conseguir cumprir a promessa de campanha de zerar do déficit primário das contas do governo federal até dezembro de 2019.

Maia deu seu recado. Tratou de dizer que “não estava sabendo” de acordo nenhum para que o texto da cessão onerosa não seja alterado e tramite mais rapidamente, em troca da votação na próxima terça-feira de projeto que reformula o Fundo Social do Pré-sal com mais recursos para Estados e municípios.

Tenta-se agora construir uma saída com a edição de uma medida provisória, como antecipou o Estado na quarta-feira, para fazer a divisão dos recursos com os governos regionais.

As articulações conduzidas nos últimos dias atropelaram a votação do projeto da cessão onerosa, que estava praticamente pronto para votação. É a velha tática de complicar para conseguir mais.

Maia acumulou nas mãos um conjunto de projetos econômicos de peso que potencializam o seu poder de atrapalhar. É o que acontece com as propostas de autonomia do Banco Central, securitização da dívida dos Estados e tantos outros.

Uma briga, por enquanto, silenciosa também avança em torno das emendas do Orçamento. A disputa é entre aqueles que querem garantir as emendas no ano que vem, mesmo dos parlamentares que não se reelegeram, e os que brigam por espaço para os novos deputados e senadores. Em 2014, o senador Romero Jucá (MDB-RR) conseguiu incluir no Orçamento uma brecha para emenda dos novos parlamentares eleitos. Há preocupação que apoiadores de Bolsonaro consigam o mesmo, com prejuízo para as emendas já acertadas.

Ainda aprendiz do jogo político que será obrigado a lidar com o Congresso, Guedes avisou que Estados e municípios poderão receber uma fatia maior de recursos repassados pela União “quanto mais rápida for a aprovação das reformas”. Recado dado, mas ainda não compreendido.

O alerta do futuro ministro mostra que ele pode ouvir os conselhos da equipe atual e condicionar a ajuda aos Estados e municípios a medidas de ajuste e reformas. Nesse cenário tão conturbado, talvez o melhor a fazer seja deixar a votação do projeto da cessão onerosa e a decisão da partilha para o próximo Congresso.

O acerto poderia ser mais bem costurado com os novos governadores e parlamentares em 2019. Até porque, ao contrário do que muitos do mercado tentam passar adiante como certo para consolidar suas apostas milionárias, ainda há muitos acertos a serem feitos para que o leilão ocorra e o dinheiro entre nos cofres de todos.

A discussão em torno da mudança do regime de partilha para a concessão nas regras do pré-sal, proposta pela nova equipe econômica, pode atrasar ainda mais o leilão.

Num retrospecto do que aconteceu no último ano, vale lembrar que, ao pé da letra, era para o leilão ter acontecido em 30 de abril. Esse era o cronograma anunciado pelo governo.


Claudia Safatle: A reforma da Previdência ou o caos

"É cortar, cortar e cortar", dizem fontes do novo governo

Aprovar a reforma da Previdência no primeiro semestre de 2019 é a prioridade do presidente eleito, Jair Bolsonaro. A importância desse prazo pode ser detectada no comentário de um dos economistas da transição: "Ou aprovamos a reforma da Previdência até junho ou será o caos", disse. Por mais que se possa considerar essa afirmação um exagero de retórica sustentado na suposição de que esse será o período da lua de mel do mercado com o novo governo, o fato é que os agentes econômicos internos e externos estão à espera da reforma. Sua aprovação será um sinal de determinação e sustentação política do governo decisivo para a expansão dos investimentos no país.

Sem novos investimentos, a recuperação da economia terá vida curta, minando a confiança e o emprego. Este seria o início de um processo de deterioração das expectativas que fatalmente enfraqueceria o governo de Bolsonaro.

Técnicos da transição foram despachados para o Rio de Janeiro, na semana passada, para se inteirar da proposta de reforma elaborada por especialistas em Previdência Social sob a coordenação de Arminio Fraga. O ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Investimentos enviou ao futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, um projeto completo e inovador de previdência que está sendo avaliado, juntamente com algumas outras propostas. Os emissários de Guedes conversaram com Paulo Tafner, um dos autores da proposta.

À reforma da Previdência se seguem dois outros objetivos que compõem o plano de voo para a economia: a redução da conta de juros com o uso das receitas de privatizações para abatimento da dívida do setor público; e a reforma do Estado, centrada na busca de um modelo menor e mais eficiente.

Por onde se olha, há sobreposições de estruturas e tarefas, diagnosticam os assessores recém-chegados na transição. Um pequeno detalhe confirma essa visão mais geral. Para tratar das empresas estatais há a secretaria das estatais do Ministério do Planejamento, uma área que também cuida do tema no Ministério da Fazenda e o PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), ligado à Presidência da República, com um conselho e uma secretaria.

Ao reformular as estruturas do Estado, o governo poderá economizar de 20% a 30% dos gastos com cargos de confiança ou comissionados. Atualmente são mais de 23 mil cargos que recebem DAS (Diretoria e Assessoramento Superiores) ou funções comissionadas do Poder Executivo.

Para consertar o forte desequilíbrio fiscal, é crucial investir na reforma da Previdência, hoje o maior gasto do Orçamento. São R$ 591,45 bilhões em pagamento de benefícios, que devem gerar déficit de R$ 201,6 bilhões este ano só no regime geral (RGPS), segundo dados oficiais divulgados ontem pelo Ministério do Planejamento. Considerando a previdência do servidor público, esse déficit sobe para a casa dos R$ 300 bilhões.

Em seguida vem a conta de juros da dívida consolidada do setor público e a folha de pessoal da União. Nos últimos 12 meses até outubro, os juros nominais somaram R$ 401 bilhões (5,9 % do PIB) e a folha de salários consumiu cerca de R$ 300,6 bilhões (4,4% do PIB).

O déficit nominal, que inclui a conta de juros, alcançou R$ 488,8 bilhões (7,2% do PIB).

Os três gastos - benefícios previdenciários, juros e salários - estão na mira da nova gestão. "É cortar, cortar e cortar", enfatizou um assessor do futuro ministro da Economia, que adiantou: "Não dá mais para fazer remendos. Agora temos que ir na raiz dos problemas".

O drama dos "rombos" nas contas públicas é que a dívida bruta - compreendida por governo federal, INSS e governos estaduais e municipais - superou os R$ 5,24 trilhões e cresce a uma trajetória explosiva. Atualmente, a dívida equivale a 77,2% do PIB. Cabe ao novo governo interromper o crescimento e reduzir o endividamento como proporção do PIB para evitar o desastre de um "calote" futuro.

O Ministério da Economia está sendo montado segundo a perspectiva da reforma do Estado. Ele será resultado da fusão de três ministérios (Fazenda, Planejamento e Indústria e Comércio). Deverá comportar de quatro a seis secretarias, e isso eliminará as estruturas triplicadas. Ampliará substancialmente o raio de poder do futuro ministro Paulo Guedes, que terá sob a sua área de domínio todas as receitas e despesas da União.

O que norteia esse trabalho é, segundo assessores da área de gestão, construir de forma incremental os pilares do novo sistema econômico baseado nos princípios liberais. A ideia é trabalhar com o conceito de "equilíbrio geral", no qual os processos vão sendo construídos de forma a um ajudar na sustentação do outro.
Em outras palavras, a reforma da Previdência se combina com um processo de privatização que se complementa com as reformas administrativa e tributária, que reduz o peso do Estado sobre as empresas e as famílias. E essas etapas vão se alimentando de um crescimento mais firme da economia.

Os governos tentaram de tudo após a democratização para colocar o Brasil nos trilhos do crescimento econômico sustentável. Avançou em um período, mas regrediu em outro. Buscou-se todos os tipos de atalho com intervenções exacerbadas. A carga tributária subiu a patamares asfixiantes - de 26,7% do PIB em 1995 para mais de 32% do PIB atualmente - para dar conta do acelerado crescimento do gasto público. Não foi suficiente e, então, recorreu-se ao aumento do endividamento para financiar as despesas, deixando a dívida chegar a níveis perigosos.

Resta tentar um caminho ainda não explorado: cortar a despesa pública para que ela seja financiada por uma carga tributária compatível com o resto do mundo, reduzir o tamanho do Estado e abrir a economia.

A equipe econômica do presidente eleito avalia que "pela primeira vez na história o país terá o governo com uma agenda claramente liberal". Até então, medidas de cunho liberal foram adotadas de forma pontual, mais por necessidade do que por convicção. Uma dúvida é se e por quanto tempo Bolsonaro comungará das mesmas ideias de Paulo Guedes.


Alexandre Schwartsman: A 'farsa' do desemprego

Economia não é para aspirantes; antes de falar do assunto, não custa passar no posto Ipiranga

Na semana passada, o presidente eleito se manifestou sobre as estatísticas de desemprego no país afirmando: “Vou querer que a metodologia para dar o número de desempregados seja alterada no Brasil, porque isso daí é uma farsa. Quem, por exemplo, recebe Bolsa Família é tido como empregado. Quem não procura emprego há mais de um ano é tido como empregado. Quem recebe seguro-desemprego é tido como empregado”.

Segundo o IBGE, a população brasileira em setembro deste ano era de aproximadamente 209 milhões de pessoas. Nem todos, porém, estão aptos a trabalhar. O IBGE define a População em Idade Ativa, PIA, como aqueles com mais de 14 anos, em torno de 170 milhões de pessoas.

Obviamente, apenas parte dos maiores de 14 anos está no mercado de trabalho. Alguns, por exemplo, estudam (ainda bem!), outros já se aposentaram, e há quem decida não tomar parte no mercado por uma série de motivos, alguns dos quais trataremos à frente.

Os que participam, seja trabalhando, seja buscando emprego, são definidos como “força de trabalho”, ou PEA (População Economicamente Ativa), e montavam a 105 milhões de pessoas em setembro.

Desses, 92,6 milhões estavam ocupados, e 12,5 milhões, desempregados. Assim a taxa de desemprego atingiu 11,9% (12,5÷105).

Essa é a definição internacional da taxa de desemprego, adotada por todos os países com boas estatísticas na área. No caso, se a pessoa recebe o Bolsa Família (sem estar empregada) ou o seguro-desemprego, ela obviamente não conta como empregada.

Caso esteja procurando trabalho, contará como desempregada (e participante da PEA); caso contrário, não aparecerá nessa estatística de desemprego.

Ocorre que a taxa de desemprego descrita acima não esgota o conjunto de estatísticas sobre o mercado de trabalho. O IBGE também discrimina entre os ocupados aqueles que trabalham menos do que desejam e calcula a taxa de desempregados (12,5 milhões) e subocupados (6,9 milhões) com relação à PEA: 18,4% (19,4÷105).

Há, por outro lado, entre as pessoas que estão fora da PEA, as que gostariam de trabalhar, mas não estão buscando emprego, a chamada “força de trabalho potencial”, 8 milhões de pessoas.

A estatística mais ampla do IBGE a respeito (a taxa de subutilização da força de trabalho) junta os desempregados, os subocupados e a força de trabalho potencial, um conjunto de pouco mais de 27 milhões de pessoas como proporção da “PEA ampliada”, isto é, os 105 milhões da PEA mais os 8 milhões da força de trabalho potencial (123 milhões), revelando uma taxa de subutilização na casa de 24%.

A coexistência de várias medidas de desemprego não é uma jabuticaba.

Nos EUA, por exemplo, o Bureau of Labor Statistics publica a cada mês nada menos do que seis alternativas: a taxa denominada U3, calculada de forma similar à nossa, é a mais disseminada, 3,7% no mês passado; a taxa mais ampla, U6, se encontrava em 7,4%, o dobro da oficial, por incorporar também os que gostariam de trabalhar mais e os participantes da força de trabalho potencial.

Economia, apesar das aparências em contrário, não é para aspirantes. Como regra, antes de falar do assunto, não custa nada dar uma passada no posto Ipiranga.


Samuel Pessôa: Mercadores de ilusão

Oxalá Paulo Guedes, economista muito respeitado, não entre nessa categoria

Tudo o que um político deseja é que um técnico com credenciais acadêmicas tenha diagnóstico simples para problemas complexos.

Paulo Guedes, com a ênfase na privatização e, possivelmente, na redução das reservas internacionais como políticas para reduzir o endividamento público, pode se prestar a esse papel. O de mercador de ilusão.

Os políticos, felizes da vida, empurram os problemas para a próxima legislatura e para as próximas gerações. O país não sai do lugar.

Privatização e redução do nível de reservas podem ser políticas auxiliares importantes para reduzir o endividamento público e o custo da dívida, mas somente após haver caminho definido que solucione o problema fiscal.

É esse caminho que recuperará a confiança e o valor do patrimônio público.

Nos últimos anos, os economistas de “esquerda” têm sido pródigos em vender ilusões aos políticos. Um caso recorrente é a tese do “moto perpétuo” na política fiscal: a elevação do déficit público para financiar o aumento do investimento público gera impacto tão elevado sobre o crescimento e, portanto, sobre a arrecadação de impostos que, no fim do processo, a dívida pública como proporção do PIB cai.

No momento, o verdadeiro ornitorrinco representado pela coligação entre a extrema direita e a esquerda na Itália se prepara para testar essa tese.

Olivier Blanchard, ex-economista-chefe do FMI e pesquisador do Peterson Institute for International Economics, apontou, em recente post com colegas, que o impacto negativo sobre o crescimento da Itália da elevação dos juros de mercado, em consequência da maior percepção de risco pela piora fiscal, mais do que compensa possível efeito expansionista dos gastos sobre o crescimento.

Tese comum entre os economistas de “esquerda” é que impostos sobre ricos podem resolver o problema fiscal. A técnica é superestimar em muito —em até dez vezes mais— os ganhos de arrecadação com alguma modalidade de imposto sobre os ricos.

Os profissionais que fazem conta corretamente e, portanto, não inflam os números são tachados de “contrários aos pobres”.

No dia 3, Pochmann e Feldmann afirmaram que eu não gosto “do sentido de nossas (deles) propostas”, no caso um imposto de 50% sobre o lucro dos bancos que arrecadaria R$ 55 bilhões, pois o lucro do setor neste ano será de R$ 110 bilhões.

Tratei da importância de elevar a tributação sobre os mais ricos em minha coluna de novembro de 2015 na revista Conjuntura Econômica, bem como neste espaço em 8 de abril.

Novamente os mercadores de ilusão erraram as contas. O lucro dos bancos líquido de impostos foi em 2018 algo próximo de R$ 80 bilhões.

Os bancos já foram tributados em 45%. Descontando o abatimento do JCP, a alíquota foi de 36%, ou seja, para um lucro bruto (sem descontar os impostos) de R$ 125 bilhões, a arrecadação foi de R$ 45 bilhões.

Se a alíquota fosse de 50%, em vez de 45%, e se não houvesse a isenção do JCP, a arrecadação seria de R$ 63 bilhões, R$ 18 bilhões a mais, e não os R$ 55 bilhões propalado pelos mercadores de ilusão.

Essencialmente os mercadores de ilusão inflaram a receita de 2018, esqueceram que os lucros já são tributados em 45% e desconsideraram a importante isenção dada pelo juro sobre o capital próprio (JCP).

Oxalá Paulo Guedes, economista muito respeitado, formado em Chicago e com exitosa atuação no setor privado, não entre para a categoria dos mercadores de ilusão.

*Samuel Pessôa é pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP.


João Domingos: Reforma da Previdência exige mais que torcida

A se julgar pelo que dizem parlamentares que conseguem medir as tendências do Congresso, no momento a reforma não passa

A aprovação neste ano da reforma da Previdência, ou de um remendo qualquer, como a idade mínima para se aposentar, seria o maior presente para Jair Bolsonaro depois dos 57.797.847 votos obtidos por ele no segundo turno da eleição. Começaria seu governo sem se preocupar com a idade mínima para a aposentadoria, a parte que sofre maior resistência por parte do Congresso e a que mais causa preocupação ao equilíbrio das contas públicas. Mais à frente poderia cuidar de outros detalhes menos polêmicos.

A questão a ser observada, porém, é que nesse momento a reforma não passa, a se julgar pelo que dizem parlamentares que conseguem medir as tendências do Congresso, entre eles o vice-presidente da Câmara, Fábio Ramalho (MDB-MG). Para mudar essa tendência, Bolsonaro teria de exibir suas armas de negociador. Em primeiro lugar, unir forças com o presidente Michel Temer. Ao eleito, interessa aprovar o projeto, mesmo que aos pedaços; ao que sai, deixar no currículo a reforma da Previdência seria o melhor dos mundos.

Em segundo lugar, Bolsonaro teria de negociar com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o apoio à reeleição deste para mais um período de dois anos à frente da Casa. Sem esse acordo, Maia dificilmente fará um esforço maior pela reforma, pois dependerá dos votos do PT e de outros partidos de centro-esquerda numa eventual disputa pelo comando da Câmara com algum aliado do capitão. E esse campo político é contrário ao projeto.

É preciso considerar ainda que 243 deputados, ou 47,3% da Câmara, não se reelegeram. No Senado foi pior. Só oito se reelegeram na disputa que envolveu 54 cadeiras, com renovação de 85%. Como mobilizar esses parlamentares que estão se despedindo sem prometer alguma coisa para eles, nem que seja um carguinho no Estado para onde retornam?

Tanto Bolsonaro quanto Paulo Guedes, o futuro superministro da área econômica, têm dito que seria muito importante a aprovação da reforma da Previdência. Não poderiam dizer outra coisa. Eles sabem das dificuldades que tal empreitada carrega. Despejar otimismo sobre a possibilidade de aprovação da reforma tem efeitos benéficos para a economia. O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles fez isso o tempo todo. Não aprovou a reforma. Mas animou o mercado.


Bruno Boghossian: Pauta ruralista e evangélica será chave de Bolsonaro no Congresso

O próximo ministro da Fazenda não gostou de ver um deputado dando palpite em sua área. “É um político falando de economia”, reclamou Paulo Guedes ao desautorizar Onyx Lorenzoni, articulador do futuro governo.

Guedes terá que se acostumar. As medidas que propõe para colocar as contas do país em ordem dependerão de 513 Lorenzonis na Câmara e outros 81 no Senado.

A capacidade de formar maioria no Congresso para aprovar propostas impopulares como a reforma da Previdência será uma das principais provas para Jair Bolsonaro. Sob a promessa de romper a tradição de distribuir cargos aos partidos aliados, o presidente eleito usará sua popularidade como chave para uma lua de mel com o Legislativo.

A plataforma conservadora que teve êxito nas urnas deve ser uma das peças centrais desse jogo. Ainda em campanha, Bolsonaro sugeriu que aproveitaria a pauta de costumes para adoçar a boca dos parlamentares e convencê-los a engolir a pílula amarga do aperto fiscal.

“Se nós tipificarmos ações do MST como terrorismo, será que a bancada ruralista não vai estar conosco?”, perguntou o então candidato em uma palestra a empresários, em julho. “Se nós buscarmos resgatar os valores familiares, não vamos ter simpatia dos evangélicos?”

O apoio do governo aos interesses do agronegócio, das igrejas e da bancada da bala seria um torrão de açúcar barato. “Não estou falando em construir uma ponte até Fernando de Noronha”, disse Bolsonaro.

Formados por deputados e senadores de várias siglas, os grupos temáticos do Congresso são os canais que o presidente eleito quer usar para driblar os caciques partidários. Pode até funcionar, mas essa articulação fluida deve se tornar custosa.

Bancadas informais não têm mecanismos para disciplinar traidores ou negociar detalhes dos projetos em votação. Quando estiverem em pauta mudanças nas aposentadorias ou a criação de tributos, não haverá economista capaz de acomodar os palpites de centenas de políticos.


Ricardo Noblat: Bolsonaro preside e Guedes governa

De um único posto a uma rede de postos

Nem Delfim Netto em certo período da ditadura militar de 64, ou talvez somente foi ou aparentou ser mais poderoso do que será a partir de janeiro próximo o economista Paulo Guedes, que de uma só tacada acumulará os ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio do governo do presidente eleito Jair Bolsonaro.

A confirmar-se o que ontem foi anunciado, Bolsonaro presidirá o país – para isso se elegeu no último domingo com expressiva votação. Mas quem governará será Guedes, o Posto Ipiranga ungido por Bolsonaro, que de simples posto não terá nada. Guedes estará mais para uma rede de postos, a única do mercado, da qual dependerá tudo mais.

Será um tremendo desafio para um economista que nunca serviu a governos em cargos executivos, não tem experiência em lidar com políticos e nem mesmo é reconhecido como uma sumidade por seus pares. Eles reverenciam sua inteligência e seu reconhecido dom para a polêmica, e é só. Caberá a Guedes provar as demais qualidades que imagina ter.

Os ministérios da Fazenda e do Planejamento já foram um só no passado. Deixaram de ser quando o conhecimento avançou e a administração pública se tornou muito mais complexa. A fusão dos dois é considerada um retrocesso por economistas de grosso calibre. Juntá-los com Indústria e Comércio, uma temeridade. Mas vamos que vamos. Bolsonaro tem muitas fichas para gastar.

Se a experiência, afinal, for malsucedida como se teme, ou se o temperamental Guedes acabar se desentendo no futuro com parte dos demais ministros, Bolsonaro sempre poderá dizer que tentou o que lhe parecia o melhor para o Brasil, que não tem e jamais terá a obrigação de entender de tudo, engatando em seguida uma meia volta, volver.

Moro, o Pelé de Bolsonaro
Jogada brilhante
O juiz Sérgio Moro já deu todas as indicações possíveis de que aceitará o convite do presidente Jair Bolsonaro para ser ministro da Justiça e daqui a dois anos ou menos ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) na vaga a ser aberta com a aposentadoria compulsória do ministro Celso de Mello.

Se o convite para ministro da Justiça não trouxesse embutido o acerto para que dali ele saltasse para o STF, até que Moro o recusaria. Mas esse não é o caso. Um lugar na mais alta corte de justiça do país é o sonho de qualquer juiz. Moro acha que sua obra como juiz federal está completa. E sua mulher também concorda.

Quem o suceder no comando do braço original da Lava Jato no Paraná estará obrigado a ser tão rigoroso quanto ele tem sido. E Moro considera que seu trabalho ali está praticamente concluído. Pouco se lhe dá que o PT possa aproveitar sua entrada no governo Bolsonaro para tentar desacreditá-lo. Ele se acha blindado.

Um amigo de Moro, que ainda duvida que ele aceite o convite, lembrou ontem à noite que Fernando Henrique Cardoso, no seu primeiro governo, teve Pelé como ministro dos Esportes. Moro seria o Pelé do governo Bolsonaro. Só que Pelé não desfalcou a Seleção para ser ministro, ele já aposentara as chuteiras.

Moro desfalcará o combate à corrupção como seu líder inconteste. Enfraquecerá a operação da qual se tornou um símbolo. Porá em dúvida sua imagem de juiz isento de paixões políticas. E dará forte munição para que desafetos tentem desqualificar suas decisões. Um prato cheio a ser devorado por um PT faminto.

Quanto a Bolsonaro, será aplaudido pelos seus devotos e também por aqueles que sempre quiseram ver Moro removido de onde está. Uma jogada brilhante de um político que muitos ainda subestimam.


Angela Bittencourt: Espera-se que Paulo Guedes "governe" na medida certa

Câmbio é "calcanhar de Aquiles" dos estrangeiros

A lua de mel do mercado com o novo presidente eleito neste domingo vai durar até a cerimônia de posse? Esta pergunta foi feita, na semana passada, repetidamente à Coluna, que devolveu a questão, recebeu várias respostas e considerou esta a mais instigante: "Vai durar até que o ministro da Fazenda descubra que o tempo da economia é um e o tempo da Política é outro. O tempo da economia é o da urgência; o tempo da política é o da negociação. Há um excesso de otimismo com Paulo Guedes exatamente porque o economista ainda não se apropriou adequadamente da figura de ministro que exercerá a partir de segunda-feira", afirma o interlocutor.

Para um profissional do mercado financeiro, Paulo Guedes pode cometer um equívoco - ou meter os pés pelas mãos - se decidir se apressar para fazer anúncios assim que formalizada a vitória de Jair Bolsonaro. "O que se espera é que ele volte a falar. Que não se tranque em copas. Que sinalize que a equipe que já está na Fazenda e no Tesouro e no BC permaneça ou diga que seguem conversando e isso vale também para Bolsonaro. Vale até um 'tamo junto' de Bolsonaro, referindo-se às equipes ou parte delas que já estão no governo", diz a fonte.

Outra clara indicação observada pela Coluna é quanto à formalidade esperada para as reformas. Questionados sobre a independência do Banco Central (BC), os profissionais do mercado financeiro são positivos quanto ao assunto, acreditam que o governo fruto dessa eleição preocupa-se com legitimidade das instituições e perseguirá a independência do BC. E, também por esse motivo, consideram indispensável a aprovação de um projeto de lei que discrimine todas as condições a serem cumpridas pela instituição para que ela tenha o selo de "independente".

Nesse sentido, o momento é considerado perfeito pelo fato de Ilan Goldfajn, presidente do BC, estar chegando ao final do segundo mandato, podendo ser reeleito por mais dois e quebrando mandatos por períodos coincidentes aos dos poderes Legislativo e Executivo. O que também vale para a diretoria da instituição. Um dos entrevistados da Coluna acredita que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fará das tripas coração para que Ilan tenha esse legado no currículo. E ele também, inclusive, porque, das 513 cadeiras da Câmara, 251 foram renovadas nessas eleições. E Maia, que era considerado um deputado forte na Casa, agora é considerado forte no Centrão.

Embora Jair Bolsonaro não seja Geraldo Alckmin, o candidato de fato cobiçado pelo mercado desde o minuto inicial da campanha eleitoral para presidente da República, a corrida acabou e o resultado agradou. Afinal, Bolsonaro não é PT e está ainda mais à direita.

Quadro posto já na sexta. "Há ou não um rali armado para a segunda?", questiono. "Resposta de US$ 10 milhões", devolve o analista.

"Uns dizem que sim, outros dizem que não. Mas hoje começa a doer carregar dólares em carteira. É alta a propensão a 'stopar'. A vender para conter o risco de assumir novas perdas", explica o analista de um grande banco. Ele lembra que o dólar ficou um bom tempo ao redor de R$ 3,70 e chegou a R$ 4,20, com o PT avançando nas pesquisas. Até aqui, só lucro. Mas a queda foi rápida e, abaixo de R$ 3,70, é perda. Já estamos a R$ 3,65.

Esse profissional alerta que a grande maioria dos investidores estrangeiros deixou o Brasil até duas a três semanas antes do 1º turno das eleições. O resultado do 1º turno, com vantagem para Bolsonaro, não atraiu essa modalidade de investidor para novas compras. "Neste caso, o D+1 não funcionou", diz.

O interlocutor da Coluna lembra que os estrangeiros continuam mantendo posição de compra em instrumentos derivativos de câmbio representados por contratos de dólar futuro e contratos de cupom cambial ou juro em dólar negociados na B3.

Essas compras começaram em março, quando o saldo era de US$ 11 bilhões. Em abril já estavam em US$ 23 bilhões; em maio, em, US$ 26 bilhões; em junho, US$ 34 bilhões; em julho, US$ 32 bilhões; agosto, US$ 39 bilhões; e, na última quinta-feira, em US$ 38,5 bilhões. Estas posições são utilizadas como garantia para transações com juros e ações no Brasil normalmente. Contudo, o analista entrevistado informa que boa parte desses dólares é hedge de aplicações feitas em outros países emergentes. E que alterações expressivas na taxa de câmbio no Brasil poderão desorientar grandes mercados.

Este profissional não descarta a possibilidade de a taxa de câmbio declinar a R$ 3,50, mas considera o futuro imprevisível, de fato, caso a reforma da Previdência não tome a direção prevista pelo mercado, o que pode ocorrer caso o governo não obtenha uma maioria solidária ou, ainda, caso o PT faça uma oposição ruidosa ao governo na Câmara dos Deputados, onde terá a maior bancada.

Um outro analista, também muito atento aos movimentos cambiais, tem uma avaliação diferente por contemplar um novo elemento: maior oferta de dólares ao Brasil pelo petróleo do pré-sal. Para este profissional, a vitória de Jair Bolsonaro vai recuperar a imagem do Brasil, o Investimento Direto no País (IDP) seguirá na ordem de US$ 70 bilhões ao ano, o superávit comercial ficará próximo a esse valor e o país ainda terá a receita adicional do pré-sal.

"Creio que teremos sim esse problema cambial. Uma apreciação do real que pode chegar a 20%. E, a se confirmar, será grave porque não há produtividade que compense essa variação de câmbio e não podemos imaginar que o mercado não vai fazer o que sabe, que é antecipar o movimento, o 'overshooting'", lamenta.

Uma preocupação que está no ar quando se pensa em dólar no Brasil é a intensa queda das Bolsas americanas. Em outubro, o Nasdaq tombou 10,93%, o que fez evaporar mais de US$ 1 trilhão de valor de mercado de seus componentes.

Mas Pedro Martins, estrategista de ações para o JPMorgan, em entrevista a José de Castro, do Valor, diz que é prematuro considerar que o mais longo "bull market" da história dos EUA chegou ao fim. E avalia que o nível "descontado" das ações emergentes em 2018 acaba deixando esses mercados mais atrativos neste momento.


El País: Plano econômico de Paulo Guedes, guru de Bolsonaro, depende de uma ‘bala de prata’ para funcionar

Propostas de privatizações e reformas "radicais" na Previdência e no sistema tributário demandam a arte de negociar com 30 partidos que estão representados no Congresso

O mercado demorou em começar a levar a sério a candidatura à presidência de Jair Bolsonaro (PSL). A carência de pessoas do campo econômico no seu entorno e a mistificação de sua figura, tanto pela carreira militar quanto no Congresso, onde revelava uma postura estatista e intervencionista, eram motivo de receio para os investidores. Tudo mudou com a chegada do economista Paulo Guedes à campanha, que rapidamente converteu-se no "Posto Ipiranga" de Bolsonaro. PhD pela Universidade de Chicago – berço dos Chicago Boys, economistas que na segunda metade do século XX influenciaram as reformas liberais de países como Chile, EUA e Reino Unido –, Guedes tornou-se o selo de qualidade de Bolsonaro com uma agenda liberal que defende privatizações e reformas tributárias e da Previdência “radicais”. No dia em que foi anunciado como Ministro da Fazenda em um eventual governo do PSL (em 27 de novembro de 2017), a Bolsa de Valores, que havia começado o pregão em queda, subiu.

Apesar de as propostas econômicas serem lidas como “uma boa carta de intenções” e gerarem entusiasmo entre os jovens operadores das mesas de negociação, os atores mais experientes do mercado financeiro se mostram mais céticos e levantam dúvidas sobre a viabilidade de tais promessas.  A leitura geral é que o plano econômico de Guedes para o governo de Bolsonaro depende de uma “bala de prata” para dar certo. Ele propõe a reestruturação da área econômica, com dois organismos principais, o Ministério de Economia e o Banco Central, formal e politicamente independentes. Quanto à Reforma da Previdência, cuja necessidade é um consenso entre os analistas de mercado, o plano prevê a mudança do sistema atual de repartição (pagamento dos aposentados é feito pelos trabalhadores ativos)  pelo modelo de contas individuais de capitalização (cada trabalhador contribuirá durante a vida para sustentar seu benefício previdenciário). E aqui surgem as primeiras críticas. “Essa proposta de reforma radical da Previdência é suspeita, porque eles falam de capitalização, mas não deixam claro como seria feita essa transição. O Guedes diz que pagaria o custo com as privatizações, mas o processo de privatização é longo, então isso não está claro”, avalia Silvio Cascione, analista para o Brasil da consultoria de risco Eurasia.

Cascione acrescenta que também há desconfiança sobre o “amplo programa de privatizações” que aparece no plano de governo de Bolsonaro, mas sem especificar quantas ou quais das 147 empresas da União seriam vendidas. O objetivo seria utilizar todos os recursos obtidos com as privatizações para pagar a dívida pública. “Muita gente gosta da ambição do Guedes, quando ele fala nas privatizações radicais, mas também há investidores que acham que esse discurso vai desinflar com o tempo”, comenta o analista.

Para Amaury Fonseca Júnior, sócio fundador da Vision Brazil Investments, gestora de recursos focada em investidores institucionais, para resolver a questão da dívida pública, qualquer Governo deve priorizar a reforma tributária. O plano esboçado por Guedes prevê a simplificação e unificação de tributos federais e a descentralização e municipalização de impostos. O economista chegou a afirmar, conforme revelado pela Folha de S. Paulo, que pretendia recriar um imposto nos moldes da CPMF, que incide sobre movimentação financeira, além de criar uma alíquota única do Imposto de Renda de 20% para pessoas físicas e jurídicas – e aplicar a mesma taxa na tributação da distribuição de lucros e dividendos. Por outro lado, ele estudava eliminar a contribuição patronal para a Previdência, que incide sobre a folha de salário – que tem a mesma alíquota, de 20%. “Para chegar nesses 20%, as contas públicas precisariam estar muito bem equilibradas. Essa coisa da CPMF não agradou o mercado”, comenta Júnior.

Bolsonaro e seus aliados, que sempre defenderam que em um eventual governo do candidato os impostos seriam reduzidos, apressaram-se em tentar explicar as declarações de Guedes, que chegou a rebaixar a cifra para os 15%, mas o estrago já estava feito. “O país tem um problema clássico de déficit fiscal. As cifras de 20% ou mesmo 15% são totalmente impraticáveis”, afirma Ricardo Sennes, economista e diretor da consultoria Prospectiva. Para Sennes, esse é “só o primeiro exemplo de inconsistência” na campanha. “Ele foi fazendo cálculos e viu que em vez de diminuir, tinha era que aumentar impostos, porque a conta não fechava. Parece fazer declarações sem ver números básicos de economia”, critica ele, que vê no “guru econômico” do candidato alguém “tão neófito quanto Bolsonaro”.

Em entrevista ao Jornal Nacional, Jair Bolsonaro voltou a tratar do tema: "A proposta do nosso economista Paulo Guedes é que quem ganhe até 5 mínimos não descontará Imposto de Renda. E acima disso, uma tabela de 20% para todos. Não pretendemos recriar a CPMF, eu fui um dos que votou contra a CPMF no passado",  afirmou. A reportagem entrou em contato com Paulo Guedes para responder aos comentários dos analistas, mas não obteve resposta.

Trajetória

Guedes, de 68 anos, de fato, tem uma breve experiência na carreira política. Ele assessorou o então candidato à presidência Guilherme Afif Domingos, em 1989, sendo um crítico dos projetos econômicos do período, principalmente do Plano Real. Tendo feito fortuna no ramo financeiro do Rio de Janeiro, o economista foi um dos fundadores do Ibmec, criado como instituto de pesquisa voltado para o mercado financeiro, do think thank Instituto Millennium e do Banco Pactual. Também investiu na Abril Educação com Roberto e Giancarlo Civita, donos da Editora Abril, até criar, em 2006, a BR Investimentos (comprada depois) pela Bozano Investimentos. Hoje, concilia seu tempo entre a assessoria de Bolsonaro e a empresa. Guedes acredita que o deputado, que construiu sua carreira como estatista, está “aprendendo” a ser um liberal-democrata, mesmo elogiando a ditadura militar, conforme contou em entrevista a EL PAÍS realizada em agosto.

O “Posto Ipiranga” de Bolsonaro se apresenta como um intelectual que não foi devidamente reconhecido por seus colegas. “Nos anos 80, participei de todos os debates econômicos do Brasil a favor do tripé macroeconômico e da reforma da Previdência. E de fazer no Brasil as reformas que foram feitas no Chile: banco central independente, câmbio flutuante, equilíbrio fiscal e o regime de capitalização da previdência”, contou durante a entrevista para este jornal, lamentando que, em vez disso, se realizassem as “tolices” do Plano Cruzado e do Plano Collor.

Sua estadia no Chile, como professor universitário durante o regime do ditador Augusto Pinochet, é justamente um dos pontos mais controversos de sua trajetória. “Eu não me sinto nem um pouco culpado ou responsável por ser um bom economista. É a mesma coisa que você ser dono do Starbucks e aí entra um ditador e toma um café lá na sua loja. Eu era um professor. O Brasil tinha reserva de mercado na universidade. Minha produção acadêmica era muito superior ao que se praticava nas universidades aqui. Mas, por ser de Chicago, eu fui convidado pra dar aula na FGV, no IMPA e na PUC em tempo parcial. Não podia ser tempo integral porque eu não pertencia a nenhuma tribo ideológica. Não é que fui pro Chile, pra ditadura... Eu recebi um convite de tempo integral na Universidade do Chile e fiquei seis meses”, justificou-se.

Guedes afirma que tinha “um sonho acadêmico”, mas alguns dos seus pares desmentem a afirmação. Edmar Bacha, um dos responsáveis pelo Plano Real e contemporâneo de Guedes na PUC, afirmou à revista Piauí que o colega “nunca nem sequer tentou o tempo integral. Até porque, para isso, precisaria publicar artigos, escrever textos para discussão, e ele não demonstrou disposição”. Já Elena Landau, diretora do BNDES durante o governo de FHC, classifica o ex-professor como “megalomaníaco”. “Ele tem as mesmas ideias de vender ativos para solucionar a dívida pública desde 1990 e já era criticado naquela época”, disse ela ao EL PAÍS.

Governabilidade

Mesmo entre os que veem com bons olhos as propostas econômicas de Guedes, admitem que sua implementação está sujeita a um cenário político amigável. E, caso chegue ao Planalto, Bolsonaro, , terá de coordenar um Congresso com 30 partidos. Muito embora tenha eleito 52 deputados pelo PSL, e tenha o apoio declarado da bancada dos ruralistas e evangélicos, na prática será necessário alinhar muitos interesses que afetam diretamente a população que não deve assistir a tudo impassível. “A política é a arte do possível. Muitas das ideias são esboçadas de maneira genérica e é preciso ver se, na prática, seria de fato possível aprová-las. É o caso da reforma tributária, que envolve diferentes interesses no pacto federativo”, explica Ricardo Schweitzer, sócio-fundador e analista de ações na Nord Research. “Privatização, reforma da Previdência... são temas difíceis em qualquer governo de coalizão. Acredito que Bolsonaro consiga aprovar parte dessas propostas, mas vai ser um processo muito arrastado”, concorda Silvio Cascione, da Eurasia. Após ter apoio dos deputados para a reforma trabalhista e o teto de gastos, a reforma da Previdência ficou travada no Governo Temer.

Monica de Bolle, diretora do Programa de Estudos Latino-Americanos e Mercados Emergentes da Universidade Johns Hopkins, em Washington, é mais categórica: "Há uma “síndrome de ingenuidade aguda” do mercado em relação a Guedes e Bolsonaro. O presidencialismo de coalizão não permite conduzir reformas tão radicais. Temer era um operador de chão do Congresso e não conseguiu. Presidencialismo e Estado mínimo são incompatíveis". A especialista considera que o entusiasmo de parte do mercado financeiro pela candidatura do ex-militar "só se explica pelo medo de que o PT ganhe" as eleições.

Ricardo Sennes, da Prospectiva, explica que a agenda de privatizações agrada o mercado financeiro de curto prazo, mas não aos investidores internacionais, que "realmente injetam dinheiro no país". Ele pondera que o enxugamento de políticas de fomento e isenção fiscal feriria o interesse de vários setores. "Se você desmonta a Caixa Econômica Federal, a construção civil e setores de infraestrutura perdem crédito. Pode-se dizer o mesmo da relação entre o agronegócio e o Banco do Brasil, que faz até perdão de dívida quando as safras não vão bem. Essas propostas seriam, então, o desmonte da política de financiamento agrícola", diz.

Sobre a possibilidade de conseguir apoio político para essa agenda, Sennes diz que fazer um plano de governo em dois meses é "muito complicado". "Há uma leitura de que governabilidade se consegue depois de eleito, mas essa postura me parece mais um wishful thinking [um excesso de otimismo] do mercado do que uma avaliação de fato do panorama atual", conclui.


El País: “Bolsonaro representa a classe média, agredida e abandonada pela esquerda”, diz Paulo Guedes

Economista e principal assessor do candidato ultraconservador defende que "a expansão dos gastos públicos nos últimos 30 anos corrompeu a democracia e estagnou economia"

O economista Paulo Roberto Nunes Guedes (Rio de Janeiro, 1949) é o principal conselheiro do candidato Jair Bolsonaro (PSL), que já admitiu em diversas ocasiões não entender de economia e recorrer sempre que precisa a seu "Posto Ipiranga" — uma referência a um comercial da TV no qual o posto é a resolução para tudo. Trata-se de uma parceria que até pouco tempo atrás parecia improvável, já que Bolsonaro, nostálgico da ditadura militar, sempre adotou posições estatizantes e intervencionistas na economia. Já Guedes é PhD pela Universidade de Chicago, berço dos Chicago Boys, economistas que na segunda metade do século XX influenciaram as reformas liberais de países como Chile, EUA e Reino Unido. Ele concedeu na última terça-feira uma entrevista ao EL PAÍS no escritório da Bozano Investimentos, da qual é sócio, localizado no nobre bairro do Leblon, na zona sul do Rio.

Vestindo um paletó xadrez que lhe confere ainda mais um ar de (neo)liberal inglês de meados dos anos 80, Guedes chega falante na sala de reunião onde ocorreria a conversa. Começa protestando sobre um artigo de opinião publicado pelo EL PAÍS em julho deste ano repercutindo uma entrevista que havia dado ao jornal Valor Econômico. Nela, ao ser questionado sobre a possibilidade de se afastar de Bolsonaro caso este representasse uma ameaça para a democracia, disse não acreditar que ele fosse capaz de dar esse passo. “Posso estar errado”, concluía. “Eu estava justamente dizendo que existe quase 0% de chance de ele ser um risco, mas o texto do EL PAÍS dizia que eu admitia a possibilidade de que ele fosse uma ameaça a democracia”, esclarece.

Professor universitário e um dos fundadores do IBMEC, do think tank Instituto Millenium e do Banco Pactual, o economista se apresenta em diversas ocasiões como um visionário incompreendido pelos seus pares. Por exemplo, diz que quando o Brasil aplicava “planos bolivarianos” nos anos 80 para conter a inflação, ele já defendia uma solução que passasse por uma meta fiscal, meta de inflação e câmbio flutuante —o chamado tripé macroeconômico aplicado a partir do segundo Governo FHC. Também mostra seu lado apostador quando conta que, até meados do ano passado, auxiliava o apresentador Luciano Huck em suas ambições políticas. “Ele foi uma descoberta. Eu falei para ele: 'Um tsunami vai invadir sua vida. Você vai ser arrastado para a política'. Foi uma previsão, eu deduzi. Não estava procurando alguém, apenas o ajudei. Ele era um outsider, jovem, sem história política, e me parecia um candidato imbatível, mas ele acabou desistindo”. Só então, a partir do final do ano, depois que escreveu um artigo no jornal O Globo prevendo um embate entre Bolsonaro e “o mais legítimo herdeiro das correntes políticas de esquerda no Brasil, Ciro Gomes”, foi apresentado ao deputado. Vendeu-lhe então planos, ideias e objetivos econômicos —tudo o que sua candidatura até então não possuía— como quem oferece casa, comida e roupa lavada.

O provável ministro da Fazenda de Bolsonaro lembra: “Escrevi que essa eleição me lembrava muito a de 1989, quando o establishment perdeu a decência. Quando uma classe política deixa a inflação ir para 5.000%, ela não faz um sucessor. Naquela época surgiram à esquerda e à direita duas opções: Lula, um operário de um partido pequeno, e Collor, um jovem outsider também de um partido pequeno”, explica. “Acho que hoje o establishment também perdeu a decência, não por causa da hiperinflação, mas por causa da corrupção que pegou todo o espectro político brasileiro”. Para ele, Bolsonaro representa “uma classe média esquecida e abandonada, agredida em seus princípios e valores, e que quer ordem”. Suas respostas sobre o fenômeno Bolsonaro tornam-se longas divagações filosóficas e históricas, da Revolução Francesa até nossos últimos 30 anos de democracia. Diante das tentativas deste jornalista de voltar ao tema da pergunta, repete várias vezes: “Calma, nós vamos chegar lá”.

Pergunta. Bolsonaro está há 27 anos no Congresso, a maior parte desse tempo pelo Partido Progressista (PP), um dos mais atingidos pela Lava Jato. Sua família entrou na política e reportagens mostram que enriqueceu nesse período. Ele não é mais um membro do establishment?
Resposta. Você ficar todo esse tempo no Congresso sem um escândalo de apropriação de recursos... Não sei se ele pode ser chamado de um membro do establishment ou de um sobrevivente num mar de lama. Cristovam Buarque é um social-democrata de esquerda que não está envolvido em nenhum escândalo também, merece respeito. Não é porque é de direita ou de esquerda. Tem pessoas muito sérias lá em cima e que são igualmente respeitáveis.

"Uma democracia exige alternância de poder. E no Brasil essa alternância não ocorre há 30 anos. PT e PSDB sempre foram parecidos"

P. Como a social-democracia se esgotou se nem chegamos ainda a ter saneamento básico, saúde e educação universais e de qualidade?
R. Não é o fim dela. Mas uma democracia exige alternância de poder. E no Brasil essa alternância não ocorre há 30 anos. PT e PSDB sempre foram parecidos, e eu escrevo isso há 30 anos. Na política brasileira, depois de 20 anos de um regime militar associado politicamente à direita, houve uma reação a isso que foi de esquerda. Ela foi absoluta, hegemônica, e é natural e compreensível que assim tenha sido. O que você pode perguntar é por que foram tão incompetentes e depois de 30 anos não chegaram a resolver o problema da educação, saúde... O Brasil tem uma dívida de quatro trilhões de reais e paga 400 bilhões por ano em juros. Isso corresponde ao Plano Marshall do pós-guerra. O Brasil reconstrói uma Europa por ano só em juros, sem amortização da dívida. Essa foi a areia movediça que engoliu as melhores intenções. E de onde vem isso tudo? Não é a social-democracia por si, é a incapacidade de resposta aos desafios que surgiram. É fútil, tola, a discussão sobre se o Estado é grande no Brasil. Se você olhar do ponto de vista de necessidade do financiamento do setor público, é enorme e disfuncional. Ele consome 45% do PIB, somando impostos mais o déficit. Mas ele gasta mais com ele mesmo e com o passado inepto dele, ou seja, os juros da dívida, os privilégios previdenciários do setor público e com a máquina pública. Gasta 6% do PIB em educação e 5% em saúde, mais que alguns países desenvolvidos, e não é o suficiente. E não conseguimos cumprir uma função básica do Estado que vem antes, que é a preservação de vidas e propriedades. Então o Brasil está dando um grito desesperado.

P. Como chegamos a esse quadro?
R. No regime militar você centralizou o poder e os recursos e desidratou a classe política. Isso é dirigismo econômico. E o projeto qual foi? Desenvolver a infraestrutura brasileira. Foi um modelo de desenvolvimento baseado em um planejamento central que sempre funciona por certo tempo, mas depois se esgota. É o mesmo desafio que está esperando a China. Esse dirigismo já causou vários episódios históricos de descarrilamento, de crise política e econômica. Eu lembro da Revolução Francesa, da crise da social-democracia alemã, do fim da União Soviética... Em um modelo dirigista, esquerda e direita estão muito próximos. Não quero saber quem é um ou outro, para um liberal são totalitaristas, a tragédia é a mesma. As modernas democracias liberais saíram dessa zona totalitária: temos democratas e republicanos nos EUA, conservadores e trabalhistas no Reino Unido, democratas-cristãos e sociais-democratas na Alemanha, Bachelet e Piñera no Chile. Os dois lados aceitam o mercado e aceitam a função do Governo de atenuar as desigualdades.

P. Acredita que o Brasil está mais próximo desse modelo ou do modelo totalitarista anterior, respaldado por Bolsonaro em diversas ocasiões?
R. O Brasil, ainda que só um lado tenha prevalecido nos últimos 30 anos, é uma democracia emergente virtuosa, uma sociedade aberta, de Karl Popper, em construção. A gente já está muito longe do totalitarismo. E a Lava Jato está nos remetendo para esse campo da liberal-democracia. Saímos do regime militar com uma eleição indireta. Tivemos então uma eleição direta, e aí fizemos o impeachment de Collor. Não foi por causa da roubalheira, mas acabou sendo uma declaração de independência do poder Legislativo. Na hora que ficou independente, o Executivo comprou o Legislativo. E agora houve o despertar, a declaração de independência, do Judiciário. Primeiro com Joaquim Barbosa no Mensalão, e agora com o Sérgio Moro. O Brasil está muito mais forte como democracia, está tendo um processo de aperfeiçoamento institucional. Não sei se o presidente vai ser Ciro, Bolsonaro ou Alckmin... Não estou preocupado. Confio no processo democrático brasileiro. Nosso grande desafio agora é transformar o Estado dirigista moldado pelo regime militar num Estado social que tanto a social-democracia como a liberal-democracia aprovariam. Mas no Brasil, a expansão ininterrupta dos gastos públicos nos últimos 30 anos corrompeu a nossa democracia e estagnou nossa economia. O país está preso. É uma armadilha de baixo crescimento e corrupção sistêmica. Nós já sabemos que foi culpa do dirigismo econômico. “Ah, mas as pessoas não foram corretas, não foram utópicas”. Bom, esse foi o discurso do Fernando Henrique, do Lula... Acabou isso. Não dá agora para o PSOL chegar e falar que faltou ética. Não foi por falta de ética.

P. Mas esse é precisamente o argumento do Bolsonaro.
R. Mas a força dele não foi essa. Não foi por isso que ele subiu. A mídia não está entendendo que há um pedido pela função básica do Governo, que é garantir ordem. Bolsonaro está representando uma classe média esquecida e abandonada, agredida em seus princípios e valores, e que quer ordem. A esquerda se perdeu no andar de cima com a corrupção, com todos setores da economia cartelizados, e um assistencialismo lá embaixo para as classes mais pobres. E abandonou os valores e princípios de uma classe média emergente, B e C. Não é razoável viver num lugar onde tudo está relativizado. Você tem coragem de colocar um relógio e andar na praia? Isso significa que você não tem direito a uma propriedade, a um bom relógio. E agora vamos para a coisa pública: está certo tirar um bilhão da Petrobras? As pessoas também estão dizendo que não querem essa roubalheira. Enquanto isso, a social-democracia está preocupada com outras coisas, como a legalização da maconha. Fernando Henrique tem falado mais sobre isso do que sobre segurança.

P. Ainda assim, as pesquisas indicam que Lula é está muito à frente nas pesquisas, com 37% dos votos, segundo o IBOPE. Muitos especialistas acreditam que teremos mais um duelo entre PT e PSDB no segundo turno.
R. Isso daí não me impressiona e não são os números em que eu acredito. Não é o que estou vendo. Isso para mim é a bolha. Rio, São Paulo e Brasília, onde a elite conversa e se acerta, troca de candidato, prende e solta. Mas tem o Brasil profundo. A minha convicção é que Lula tem 25%, ele não passa disso. E o Bolsonaro tem outros 25%. É o que eu acredito. O resto para mim é fumaça. Se dizem que o Lula tem 30%, eu digo que quero ver. Só acredito nisso se a votação for com urna que não seja eletrônica.

P. Acredita que a urna eletrônica é fraudada?
R. Digo que com a urna eletrônica quero ver os 37%. Com o voto impresso Lula não passa de 25%. Essa é minha opinião. É um direito meu [achar isso]. É uma convicção minha.

P. Você mencionou a questão da regulamentação das drogas, que é também um tema sobre segurança. Seus defensores argumentam que justamente a atual política de confronto nos levou ao quadro de insegurança pública. E para o liberalismo, para a defesa das liberdades individuais, esse debate também deveria ser importante, não?
R. Sim, mas a preservação da vida é mais importante do que a legalização da maconha. São 60.000 pessoas por ano morrendo, não dá. Qual é a melhor forma de lidar com isso? Um liberal pode dizer que é legalizar tudo. Um conservador pode dizer “de jeito nenhum”, que isso pode destruir as famílias. Existe uma disputa de princípios e valores, e aparentemente os conservadores estão levando vantagem.

P. Bolsonaro fala em garantir segurança jurídica para a polícia, algo interpretado como uma licença para matar. Mas foram justamente os liberais clássicos que colocaram limites no uso da força do Estado, de modo a não atropelar liberdades e garantias individuais.
R. Sim, mas se o sujeito estiver com um fuzil na mão, fica difícil dizer que aquele cara é só um suspeito. Não é suspeito. E não é proibido usar arma? Aliás, houve um plebiscito no Brasil e a população votou por ter armas. E aí Bolsonaro chega e fala "acho que todo mundo quer ter arma". E sabe por que estão votando nele? Porque votaram para ter arma e não estão deixando ter arma.

P. Mas o brasileiro pode adquirir armas, ainda que existam regras bastantes rígidas. Não pode andar armado, mas pode ter em casa para se defender.
R. As pessoas votaram para ter arma. Aí regulam, não pode isso, não pode aquilo... Mas a maioria da população está dizendo que quer, como você vai dizer que não?

P. Como você se posiciona pessoalmente no debate sobre costumes?
R. Intelectualmente, um liberal é bastante liberal. Se você é íntegro intelectualmente, você delega ao Governo muito poucos poderes. Agora, existem conservadores que acham que a esquerda faz isso ideologicamente, para desestabilizar os valores deles e minar a família, as crenças religiosas...

P. Acredita que no Brasil há conservadores que se dizem liberais e não são?
R. Dentro do centro estão conservadores oportunistas e conservadores realmente conservadores. Os oportunistas querem preservar os privilégios, e os de verdade acreditam nos princípios, querem uma estabilidade política, etc. A esquerda comprou os conservadores oportunistas. É o MDB do Sarney. O que Bolsonaro está propondo é uma a aliança política de centro-direita em torno de um programa liberal na economia e conservador de costume. Ele quer alguém com princípio, sem o toma-lá-dá-cá. Quer pessoas que estejam indignadas com a educação com viés socialista e com a ruptura dos costumes. Porque uma coisa é o homossexual respeitar o heterossexual e vice-versa. O que não pode é um debochar do outro, do tipo "ah, esse cara está casando com uma menininha, é um conservador, um burguês". Tem que ter respeito. E outra coisa é a propaganda. Você não deve na escola tentar converter alguém para um estilo de vida. A escola não pode discriminar ou reprimir o homossexual, mas também não pode tentar levar a qualquer tipo de comportamento. Cada um deve ser livre e respeitado, sem ser persuadido a ir em uma direção ou outra.

P. Você acredita que isso, de fato, ocorra?
R. Não é que eu acredito, eu vejo. Eu sei que há. Eu sou liberal, mas não sou cego. Posso até estar a favor de determinando tema, mas não a ponto de ver o que estou vendo, como um sujeito entregar o manual do Marighella dentro de uma universidade ou botar um menino de 5 ou 6 anos para cantar a internacional socialista. Isso é lavagem cerebral. Eu ria disso, achava engraçado, pitoresco. Mas estando fora da bolha, você começa a receber esse tipo de material. Tem coisas que não são razoáveis. Mas não quero mais falar disso, meu assunto é economia.

"Se quisermos educação e saúde, temos que acabar com privilégios"

Guedes se mostra mais sucinto ao falar sobre os temas econômicos. É cauteloso e não detalha nenhum dos planos. Seu projeto ainda está em construção. Defende, por exemplo, um sistema previdenciário de capitalização individual —isto é, que cada pessoa ganhe de aposentadoria aquilo que economizou— ao invés do atual, de repartição. No entanto, reconhece sua dificuldade em implantá-lo e não diz como faria essa transição, considerada bastante custosa por economistas, uma vez que o Governo deixaria de arrecadar e não teria como pagar as pensões dos atuais aposentados. Também encampa o discurso do candidato contra políticas públicas para proteger minorias e corrigir injustiças históricas, como as cotas para negros nas universidades públicas. Defende que o critério para conceder ajudas deve ser sempre o econômico e social, mas não racial ou por gênero. Ao mesmo tempo, diz acreditar "na sociedade aberta que não discrimina, aceita a diferença de opinião e acha que a humanidade avança exatamente por causa da diversidade".

Também fala em lições aprendidas. "Não adianta negar as capacidades das economia de mercados e atacar os economistas que sabem economia do ponto de vista ideológico. Isso é obscurantismo. Já paguei a minha vida toda por essa discriminação, por estar num país onde todo mundo era de esquerda”, explica. E reivindica a legitimidade da candidatura de Bolsonaro. “Dilma foi uma guerrilheira, então ela pode ser presidente, e o Bolsonaro, por ter sido capitão, não pode? Isso é a negação da democracia”.

P. O mundo liberal vem demonstrando bastante desconfiança com Bolsonaro, dentro e fora do Brasil. O Estado de S. Paulo e a The Economist lançaram editoriais duríssimos questionando sua capacidade para ser presidente. Diplomatas estrangeiros disseram recentemente ao EL PAÍS que ele pode espantar investimentos e se isolar. Por que o mundo liberal anda tão desconfiado?
R. Qual é o presidente que entendia de economia? O Sarney fez as maiores atrocidades, fez planos bolivarianos. O FHC é um sociólogo que não tinha a menor noção do que era o Plano Real. Lula entendia alguma coisa de economia? Ou só assinou uma carta aos brasileiros e seguiu a política anterior? Dilma, que era economista, fez uma tragédia. Qual é a novidade de Bolsonaro não conhecer economia?

P. Mas por que o mundo liberal, do qual você faz parte, questiona tanto ele?
R. Acredito na dinâmica de uma sociedade aberta. Não acho que Bolsonaro é um salvador da pátria e nem que vou resolver tudo para ele. É uma aliança política de centro-direita depois de 30 anos de social-democracia. Portanto, acredito que é uma deselegância, um descrédito que estão lançando contra a democracia brasileira, que eu tenho vivido e que sou testemunha de que tem funcionado. Eu só posso lamentar. Lamento que um processo virtuoso no Brasil esteja sendo questionado.

P. Mas economia depende de confiança, como repetem vocês economistas. E está havendo uma desconfiança dentro e fora do país.
R. Com a informação que eu tenho, com o que eu tenho observado... Eu vi uma ameaça à democracia chamada Lula ser inteiramente absorvida e ter feito um primeiro Governo bom e o segundo razoável. Então todo o receio que existia contra o que seria um radical de esquerda não aconteceu.

P. Mas quando Bolsonaro propõe aumentar o número de ministros do STF, isso não gera uma insegurança jurídica que afeta também a economia?
R. Ele já revisou sua opinião, para você ver o que é uma sociedade aberta. Ele foi alertado pela Janaína Paschoal, que disse "você vai ser mal interpretado, vão achar que você está querendo interferir no parecer do Supremo". Ele mudou de ideia no dia seguinte. Eu o convenci a respeito de Banco Central independente, que ele era contra. Nós conversamos e em 24 horas ele falou "sou a favor de Banco Central independente".

P. O que te leva acreditar que Bolsonaro se tornou um liberal? Foi ele quem disse que FHC deveria ser fuzilado, na época da privatização da Vale.
R. Eu nunca disse que ele é liberal. Mas da mesma forma que Fernando Henrique era um sociólogo de esquerda e 20 anos depois ficou mais liberal, da mesma forma que os economistas social-democratas eram contra política monetária e privatizações... Da mesma forma que esse povo aprendeu, por que eu vou supor que o Bolsonaro não aprende? Por que ele não pode ser presidente? A Dilma foi uma guerrilheira, então ela pode ser presidente, e o Bolsonaro, por ter sido capitão, não pode? Isso é a negação da democracia.

P. É você quem vai ensiná-lo?
R. Não, é a sociedade quem está ensinando. Nós todos estamos aprendendo. Ele tinha votado primeiro contra a privatização das distribuidoras da Eletrobras, mas seu último voto foi a favor. Ele tinha votado contra o cadastro positivo, mas ele me deu uma explicação muito boa: não havia garantia de sigilo. No dia em que deram essa garantia, ele apoiou. Outro dia ele disse que se não resolverem a crise da gasolina, iria privatizar inclusive a Petrobras. Mas está claro para mim que o mais importante para ele são os princípios e valores. É inadmissível para ele uma elite política que rouba.

P. Bolsonaro vai enfrentar esse mesmo Congresso, que tende a não se renovar. Também terá que comprá-lo para não cair, da mesma forma que os governos anteriores?
R. A classe política vai se reinventar agora. Ela chegou à exaustão do modelo antigo. Os mesmos personagens vão trabalhar diferente. Essa eleição já está sendo temática. Ninguém está perguntado de que partido você é, mas sim qual é a sua posição sobre segurança, aborto, educação... Vai acabar o tomá-lá-dá-cá. O apoio agora será temático, baseado na reidratação da classe política.

P. Um ponto que chama atenção no programa de Bolsonaro é que se fala em aumentar o Bolsa Família e chegar a uma renda mínima. Como seria isso?
R. Isso é uma coisa complexa. O pai desse conceito de renda básica é o [economista] Milton Friedman. O Bolsa Família é uma versão disso. Evidente que isso está no nosso mapa. Essa renda mínima foi desenhada de modo a deixar o mercado funcionar, com salários livres e sem esse negócio de Justiça trabalhista... Caso alguma categoria profissional, por qualquer motivo, não tem aquele salário, aquela renda básica que a gente considera justa então recebe uma ajuda. Com instrumentos como o chamado imposto de renda negativo.

P. Qual modelo de Previdência você defende?
R. Nós preferimos o modelo de capitalização, mas reconhecemos a dificuldade [de implantá-lo]. Com uma renda básica, um mínimo estaria garantido. Mas essa é uma conversa longa. Nosso sistema de Previdência é uma bomba relógio: tem o problema da idade mínima; é uma fábrica de privilégios que promove desigualdade de renda; destrói os recursos, porque o jovem paga e o velho consome, e não bota o país para crescer; como não leva para o futuro, tem uma péssima alocação de capital e não democratiza a riqueza; a forma de financiamento é brutal, selvagem, porque os encargos trabalhistas destroem dois empregos para cada um que cria... É um desastre, é um avião que está caindo. Querer manter esse sistema aí é um massacre.

P. Bolsonaro foi militar, ele vai combater os privilégios dessa classe?
R. Olha, é evidente que ele vem sendo representante deste segmento por muito tempo, então ele tem uma visão que vem dele. Mas ao mesmo tempo ele tem um desafio novo, que é o da presidência da República. Dito isso, há funções clássicas de Governo. Garçom do Senado não é. E militar é. E ele não faz greve, etc. Existe alguma diferença. Mas outro dia, até mesmo o general Mourão [vice na chapa de Bolsonaro] disse em uma palestra que precisamos combater privilégios.

P. O que acha do teto de gastos? Vai propor sua revogação?
R. O teto de gastos faz total sentido. É a última barreira do total colapso das finanças públicas. Foi por não decifrar essa limitação de gastos que a classe política foi devorada. É triste ver a redemocratização devorando seus próprios filhos, botando Lula e todo mundo na cadeia. Eu sou a favor do império da lei, mas é trágico. Se quiserem tirar o teto, tirem. Mas em cinco ou dez anos vai todo mundo preso de novo. Essa é a minha tese. O excesso de gastos públicos corrompeu a democracia e estagnou a economia.

P. Como garantir então os investimentos necessários em saúde e educação?
R. A ideia é manter o teto, mas tentar diminuir os gastos de baixa qualidade, que são os juros da dívida, os privilégios do sistema previdenciário e descentralizar os recursos para Estados e municípios, para que possam justamente investir nessas áreas sociais que são legítimas. Precisa também de uma gestão melhor. O que gastamos em saúde e educação é comparável ao que se gasta em países desenvolvidos, então evidentemente há um problema de gestão. Por exemplo, o foco de educação tem que ser ensino básico. O período mais importante da criança vai de zero aos 3 anos. É creche. Mas o Governo brasileiro faz o contrario, gasta 60% em ensino superior. E o segredo de uma educação bem sucedida é professor e gestão, além de uma variável nova, que é a inclusão digital.

Isso tudo significa que se quisermos fazer educação e saúde, a gente tem que acabar com os privilégios. Se a gente quiser fazer saneamento e segurança, temos que privatizar algumas empresas. O Estado máquina tem que começar a virar o Estado vontade, do povo. Não adianta ficar com uma estrutura enorme, centralizada. Nosso programa é isso: mais Brasil, menos Brasília. Descentralizar poderes e recursos e atribuições. A sociedade saudável, liberal-democrata, ela é construída de baixo pra cima. O dinheiro fica lá embaixo. A União vem para poderes muito limitados e muito bem definidos, como o Exército. Mas o Brasil já nasceu capitania hereditária.

"Se quisermos educação e saúde, a gente tem que acabar com os privilégios. Se quisermos saneamento e segurança, temos que privatizar algumas empresas. Nosso programa é mais Brasil, menos Brasília"

P. Defende a cobrança de mensalidade na graduação para universidade pública?
R. Para quem tem recursos, certamente. O raciocínio do liberal é dar acesso aos que não podem. Se o cara tem recursos, ele tem que pagar. Não interessa se é pública ou privada. Quem não tem recursos precisa ter acesso as duas. Na pública ele não paga; na privada ele ganha um voucher.

P. Hoje vemos grupos de mulheres, movimentos LGBTI e negro pedindo políticas públicas voltadas para esses grupos que lhes garantam igualdade de oportunidade, pregada pelo liberalismo. O que você acha disso?
R. Você não pode discriminar alguém por ser negro. Mas isso de que o branco não pode entrar porque ele tem mérito, mas não tem vaga por causa da cota... Então você está descriminado o branco, dizendo que ele não pode entrar. Do ponto de vista liberal, a linha divisória é o acesso econômico. Se o sujeito vai entrar para a universidade pública, não quero saber se ele é preto, branco, gay, homem ou mulher. Quero saber do mérito. Ah, 'mas ele é preto e não tem dinheiro'. Então dá o dinheiro para ele. O negro objetivamente está prejudicado por causa da escravidão? Está. Está sem acesso a escola. Mas a condição social é o critério, não é a cor. "Ah, mas ele não consegue passar na prova para entrar por mérito". Então faltou um voucher numa etapa anterior, pra ele escolher uma boa escola e conseguir um bom treinamento para entrar na universidade. Se ele foi prejudicado porque a mãe não dava leite quando ele tinha dois anos, então temos que dar voucher para que as crianças estejam na creche bem alimentadas. Se não você cai na armadilha da discriminação. Do mesmo jeito que você não quer discriminar o negro e o homossexual, você não pode descriminar o branco e o heterossexual. Acredito na sociedade aberta que não discrimina, aceita a diferença de opinião, acha que a humanidade avança exatamente por causa da diversidade.

P. Como pretende fazer para baixar os juros?
R. Primeiro você tem que zerar o déficit fiscal. Essa história de combater a inflação durante 20 anos com os gastos públicos crescendo é o que produziu essa trajetória de juros muito altos. E isso produziu o endividamento de bola de neve. Então você primeiro tem que desmontar o déficit fiscal. E também reduzir o grau de concentração bancária. Uma coisa é você agir sobre o fluxo, reduzindo o déficit para derrubar os juros. Outra coisa é agir sobre o estoque da dívida. Então temos que acelerar a privatização para reduzir esse estoque. E tem um terceiro fator: a desestatização do mercado de crédito. Tem dinheiro barato para os amigos do rei, para a Odebrecht e JBS, mas caro para a população.

P. Concorda com o termo "bolsa banqueiro", empregado pelos demais candidatos?
R. Tenho uma outra expressão. O Brasil é o paraíso dos rentistas e o inferno dos empreendedores. Temos que inverter isso aí. O Brasil precisa ir em direção a uma economia de mercado. Tem que acabar com a disfuncionalidade do governo. Ele é uma gigantesca agencia de privilégios para grandes empresas no BNDES, privilégios pra funcionários na Previdência...

P. Você tem ido a Brasília conversar sobre um eventual Governo Bolsonaro?
R. Estou conversando com os ministros da área econômica. Essas conversas iniciais servem para lançar essa visão de que não existe um salvador da pátria ou um economista que vai resolver tudo. Estou vendendo o peixe da aliança de centro-direita em torno de um programa liberal democrata na economia. É que os Chicago Boys fizeram lá no Chile. Conversei com ministro do Planejamento, da Fazenda, presidentes do Banco Central e do BNDES... Estou mapeando o território, examinando os números e simulando.