Michel Temer

Roberto Freire: Para avançar nas reformas

Em mais um capítulo da tumultuada quadra política que o país enfrenta, os brasileiros acompanharam a votação na Câmara dos Deputados que sacramentou o arquivamento do pedido de licença para que o Supremo Tribunal Federal (STF) analisasse se havia ou não elementos suficientes que ensejassem a abertura do processo com base na denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer. Ao contrário do que apregoavam alguns analistas mais precipitados, o governo de transição demonstrou que ainda tem uma sólida base parlamentar de apoio no Congresso Nacional e, por isso, obteve uma vitória por ampla margem.

A bancada do PPS decidiu votar pela autorização da licença, seguindo um princípio histórico adotado pelo partido no sentido de que todas as denúncias de eventuais irregularidades devem ser rigorosamente apuradas, com total transparência. Mesmo assim, devemos reconhecer que, juridicamente, a peça apresentada pela PGR tinha fragilidades e uma série de inconsistências que certamente influíram no resultado final da votação. Além disso, parece consensual que houve certo açodamento do Ministério Púbico Federal ao apresentá-la sem ter reunido um cabedal probatório mais substancioso.

Com o resultado, a Câmara indica que o atual mandato será cumprido com Temer na Presidência da República. Se, em algum momento, havia a possibilidade de um outro presidente liderar a transição, hoje essa alternativa está, evidentemente, excluída. Diante de uma vitória tão acachapante, cabe ao governo a grandeza – e ela já transparece nas palavras do próprio presidente Temer – de buscar a reaglutinação da base de apoio na luta pelo impeachment em sua integralidade, sem excluir os deputados que, divergindo da posição do governo, votaram pelo pedido de licença já arquivado pela Câmara. A partir daí, na continuidade da transição, devem ser esses parlamentares os responsáveis pela retomada da votação das reformas.

O apoio à transição e às reformas tem de ser a palavra de ordem para chegarmos a 2018 em melhores condições e tendo superado os problemas decorrentes do perverso legado do lulopetismo. A principal tarefa do governo será rearticular todas essas forças políticas em prol de uma agenda reformista, positiva e necessária ao Brasil. No caso do PPS, é importante ressaltar que o partido segue com uma posição de independência, mas plenamente integrado na transição e na luta pela votação das reformas e pela recuperação econômica do país.

Apesar de algumas pesquisas de opinião apontarem uma grande rejeição ao presidente, a sociedade desta vez não se manifestou de forma significativa nem foi às ruas – ao contrário do que se viu no impeachment de Dilma Rousseff, que registrou as maiores mobilizações da história democrática do país. Trata-se, evidentemente, de uma clara demonstração de que a parcela amplamente majoritária dos brasileiros repudia a atual oposição, capitaneada pelo PT e também formada por alguns de seus satélites, como o PCdoB e o PSOL. O povo, definitivamente, não encampou a bandeira do “Fora, Temer” empunhada por aqueles que, abusando da desfaçatez, se dizem contra a corrupção, mas apoiaram Lula e Dilma; ou falam supostamente em favor da democracia e defendem a ditadura venezuelana chefiada por Nicolás Maduro.

A população brasileira demonstrou, afinal, que não se esquece do descalabro dos últimos 13 anos: corrupção desenfreada e escândalos em série como o mensalão e o petrolão, a destruição quase completa da Petrobras, a maior recessão econômica da história do Brasil, com mais de 14 milhões de desempregados, entre outras mazelas. Diferentemente do que pregam os áulicos do lulopetismo, que constroem uma narrativa falaciosa, enviesada e desconectada da realidade, os brasileiros não desejam a volta de Lula e do PT ao poder. As eleições municipais de 2016 já haviam sinalizado de forma categórica que o país quer olhar para frente, seguir adiante com um novo governo e avançar em uma agenda virtuosa que nos traga desenvolvimento e crescimento econômico.

O cumprimento dessa pauta benfazeja é o norte a orientar os parlamentares e partidos que têm a exata dimensão da importância de não desperdiçarmos a chance de tirar o país da crise. Já o reconduzimos de volta aos trilhos depois do desmantelo lulopetista. Agora é preciso acelerar e consolidar a retomada da economia.

 


Fernando Gabeira: Rio de Janeiro, Brasil

Estamos numa federação, e o país, nesse caso, precisa intervir. Quase todo dia somos obrigados a demonstrar em nossa vida digital que não somos um robô. Michel Temer, ao lado de Rodrigo Maia, anunciou um grande plano de segurança para o Rio. E até o meio da semana não tinha feito nada. Para milhões que não os conhecem pessoalmente agora precisam provar que não são robôs, que não passavam apenas de uma combinação de vozes gravadas e milhares de pixels. A situação tornou-se insustentável.

O próprio Maia, presidente da Câmara, reconheceu que o governo do Rio perdeu o controle. Temer e Maia estavam discutindo no princípio da semana quem ficaria com um grupo de deputados do PSB. Em suma, estavam absortos na luta pelo poder. Os tiroteios são diários, escolas são atacadas, crianças, alvejadas ou atropeladas no ventre da mãe, os policiais morrendo mais do que em qualquer época de nossa história recente.

Há outro problema: o crescimento do roubo de cargas. As estradas estão perigosas para quem chega ao Rio. O perigo assombra os motoristas de caminhão. As consequências já estão anunciadas: seguradoras não aceitam mais cobrir cargas que têm o Rio como destino, e as empresas podem parar de abastecer a cidade. Um colapso no abastecimento nos jogaria na Venezuela e seríamos forçados a emigrar para Roraima em busca de supermercados.

Se Temer não é um robô creio que já se fez uma pergunta elementar: por que um país que teve a capacidade de desmontar um gigantesco esquema de corrupção não consegue desarticular as quadrilhas de assaltantes que operam nas estradas do Rio?

Talvez não tenha percebido, como se percebe daqui, que o governo está no chão. Num spa de Penedo, mas de qualquer forma no chão. O ideal seria resolvermos nossos próprios problemas. Mas estamos numa federação, e o país, nesse caso, precisa intervir. A única saída que me parece trazer alguma possibilidade não só de evitar o pior como de recolocar o Rio nos trilhos é uma intervenção federal.

O universo político imerso na luta pela sobrevivência, diante da Lava Jato, não consegue incluir esse tema na agenda nacional. Pode haver até a necessidade de convencer outros estados da federação. Há custos que, na verdade, podem se transformar em investimentos.

Guardadas as proporções, a inclusão do lado oriental custou muito à Alemanha. Mas o país continua crescendo. Sinal de que os gastos, na verdade, foram investimentos. Acho o exemplo precário. No entanto, o raciocínio, em termos abstratos, é válido. Temer não é Helmut Kohl, as economias tinham dimensões e produtividades diferentes.

Em compensação o Rio daria, proporcionalmente, muito mais do que a Alemanha comunista. Retomar a segurança pública reanimaria sua grande fonte de renda, o turismo. E numa posição estratégica como porta de entrada do turismo internacional.

A produção do conhecimento, apesar dos embates que a crise lhe impôs, como declínio da pesquisa, fuga de cérebros, ainda é um recurso também estratégico para a economia nacional. No momento em que esses temas são secundários no universo político, a esperança é a de que as Forças Armadas também não deem as costas para ele, sob o argumento de que sua tarefa é defender o país de inimigos externos.

Mas o povo do Rio está desamparado. É preciso que os agressores vistam um uniforme estrangeiro para que se saia, provisoriamente, em sua defesa? Não se trata aqui apenas de fazer o papel da polícia, mas sim de evitar que ela seja dizimada. Vivemos uma situação grave a que os próprios estudiosos de guerra deveriam dar alguma atenção. O projeto das UPPs, que reuniu recursos do estado e de empresas, foi uma opção com resultados muito rápidos, portanto muito mais gratificantes de um ponto de vista político e eficazes para garantir Copa e Olimpíada. Ele ignorou as leis da guerra de guerrilha que se aplicam a uma realidade assimétrica independente de ideologias. Seria preciso o Exército chinês, com seus milhões de soldados, para instalar UPPs operantes em cerca de mil comunidades do Rio.

A lei da guerrilha acabou se impondo no comportamento do mundo do crime: quando o inimigo se concentra, você se dispersa; quando o inimigo se dispersa, você se concentra. A dispersão para comunidades sem UPPs, para a Baixada, para cidades médias foi uma realidade. Campos tornou-se a mais violenta do estado.

Agora, com a crise nacional, prisão de políticos do Rio que se mostraram assaltantes em escala monumental, vivemos o que o inesquecível Marinho Celestino chamava de a volta do retorno. Numericamente, nossas perdas se igualam ou superam as provocadas pelo terrorismo. Sem governantes aptos, a própria sociedade terá de demonstrar que não é um robô. Num outro país, os líderes políticos teriam visitado as mães atingidas, prestariam homenagem aos policiais mortos. Existe ainda, ao lado da alienação dos políticos, um caldo de cultura que estigmatiza a polícia e romantiza o crime.

Simpathy for the devil, como no título da canção.

* Fernando Gabeira é jornalista


Luiz Sérgio Henriques: As metáforas de Bobbio

Não são poucas as fantasias desfeitas e as ilusões perdidas que temos visto desfilar nos últimos tempos. Elas parecem passar mais depressa em períodos de crise vertiginosa e não poupam ninguém, mostrando os farrapos de bem e mal-intencionados, de “tribunos do povo” e adeptos de um liberalismo restrito. Difícil decifrar uma cena tomada pela centralidade dos órgãos de controle e pelos destroços de um sistema partidário que deveria vertebrar a institucionalidade democrática estabelecida há quase trinta anos.

Para usar uma metáfora de Bobbio, aliás originalmente de Wittgenstein, cada um de nós terá alguns bons motivos para se sentir como a mosca dentro de uma garrafa, a esperar talvez por uma intervenção externa que a livre da prisão. A intervenção externa em nosso caso, segundo os defensores extremados da inédita ação corretiva em curso, viria pura e tão somente de juízes, delegados e promotores, mesmo quando, ressalvado o papel globalmente positivo que desempenham, fazem como o Bacamarte machadiano, para quem toda a Itaguaí deveria ser encerrada na Casa Verde; ou para quem, atualizando a trama, a atividade política só poderia recomeçar depois de encontrada uma “solução final” para a corrupção.

Não é possível existir tal ator externo — foi o que Bobbio defendeu contra Wittgenstein e é o que já podemos ver com mais clareza, especialmente com a colaboração premiada do dono da JBS, no curso da qual, a par dos mecanismos jurídicos, se destacou a movimentação propriamente política do procurador-geral na seleção de alvos e prioridades. Pode-se e, de resto, deve-se muito bem admitir a impropriedade do diálogo registrado no Jaburu, indicador, no mínimo, de uma relação promíscua entre o líder político e o megaempresário. No entanto, corresponde a uma escolha mais problemática definir o papel do atual presidente da República como o de “número 1” na sequência de atropelos institucionais da última década e meia, alguns dos quais, como na Ação Penal 470, foram objeto a seu tempo de sanção do STF.

Se não há nenhum deus ex machina à nossa disposição, diante da atual miséria política nacional poderíamos talvez nos sentir como peixes apanhados numa rede – e é a segunda metáfora bobbiana a que recorremos para definir nosso estado de espírito. Estaríamos assim enredados num maniqueísmo indigente, a esbarrarmos uns nos outros com ódio, rancor e intolerância poucas vezes vistos e menos ainda previstos depois de trinta anos de vigência de amplas liberdades. Não soubemos nos autoeducar para a democracia ou então, à maneira de Weimar, vivemos numa democracia sem democratas, prisioneiros de culturas políticas que não se renovaram e, ao contrário, reiteraram alguns de seus piores vícios.

Tomemos, por exemplo, a cultura de esquerda, pelo menos a dominante. Após o longo ciclo autoritário, que expandiu e consolidou as relações capitalistas com sua mistura inseparável de arcaico e moderno, era de esperar que coubesse à esquerda – especificamente ao partido dos trabalhadores que surgiu ainda nos anos de transição – a função de esteio da política democrática: uma política de massas, culturalmente luminosa, capaz de promover os elementos modernos da nossa civilização e, aos poucos, cancelar os arcaísmos. Com frequência, no entanto, lemos seus documentos, observamos a ação de seus dirigentes e geralmente nos decepcionamos: a velha matriz de outros tempos — classe contra classe, proletariado contra burguesia — continua “produtiva”, mas produz menos a mudança e mais o alimento, no campo oposto, para uma direita igualmente primitiva e sectária.

Movimentamo-nos, então, como peixes aprisionados. Mas se trata de movimento rumo a uma saída catastrófica: levados para a margem, como lembra o filósofo, em vez da liberdade encontramos a morte. O que parecia saída era apenas a repetição do peso de chumbo da história: a “estadolatria”, o culto do chefe carismático, o sacrificium intellectum em suas mais variadas manifestações, a murchar o mundo da cultura ou a torná-lo tendencialmente irrelevante, à custa de adesões automáticas segundo o antigo roteiro dos “companheiros de viagem”, usados instrumentalmente e logo descartados.

O labirinto é a terceira das imagens bobbianas para figurar a condição humana e, nela, a dimensão política. Um labirinto sem saída, como convém a um pensador desconfiado de amanhãs radiosos e de uma humanidade utopicamente sem conflitos, ainda que insista, obstinada e racionalmente, em mudanças progressivas, “moleculares”, que possibilitem padrões de civilização mais altos ou, pelo menos, menos injustos. Mudanças estas que sempre foram, e presumivelmente serão, trabalho contínuo sobre madeira muito dura, baseado na disputa e na construção de consenso, na explicitação leal de divergências e na ampliação da tolerância entre os que divergem.

O labirinto é a política. Dentro dele temos de caminhar indefinidamente, contando tão só com nossas forças e nossa capacidade de invenção. Quedas e retrocessos nunca podem ser excluídos, mas temos a favor toda a caminhada anterior, isto é, o processo histórico, que, mesmo tragicamente acidentado, é um processo de criação de valores, entre os quais, como conquista difícil e sempre em risco, a democracia política.

Trinta anos de democracia não bastaram para civilizar as partes em conflito na cena brasileira. Mesmo na falta de alternativas radicais em confronto (e nem elas o justificariam), a divergência transbordou das redes “sociais”, infiltrou-se entre amigos, dividiu famílias. E criou impasses que não temos o direito de ignorar — afinal, o pecado mora ao lado, como nos mostra a desafortunada Venezuela de Chávez e Maduro. Segundo Bobbio, a arte de andar no labirinto — a arte da política — não é nada consolatória, mas, com o tempo, ensina a pressentir os caminhos bloqueados. Não é pouco.
* Luiz Sérgio Henriques é o editor de Gramsci e o Brasil

 


O Globo: A inadequada liberação de gastos por Temer

Apesar de o momento aconselhar prudência, dada a dificuldade de ser atingida a meta fiscal, Palácio permite despesas para garantir votos a favor do presidente

Corria o ano de 2013 quando a presidente Dilma Rousseff admitiu que, em eleição, se faz “o diabo” para vencer. No ano seguinte, ela praticaria o que disse, e terminaria impedida de continuar no Planalto, por crime de responsabilidade no campo fiscal.

Essa mesma ausência de limites no jogo da política tem sido vista em ações do governo Michel Temer, a fim de evitar que a Câmara conceda licença para o presidente ser processado no Supremo, conforme denúncia da Procuradoria-Geral da República, por corrupção passiva.

Se Dilma e equipe fizeram “o diabo” nas contas públicas, com artifícios nunca vistos, Temer e equipe usam velhos instrumentos de cooptação, usados, reconheça-se, também por petistas e tucanos, os polos opostos da política de hoje em dia. Nem por isso deixa de ser um recurso deplorável.

Reportagem do GLOBO, no domingo, revelou que, nas duas semanas anteriores à votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o Planalto liberou R$ 15,3 bilhões, entre programas e emendas parlamentares. No próprio domingo, o governo rebateu, alegando, em síntese, que são gastos legais, anteriormente previstos.

Pode ser, mas o dolo está na oportunidade da liberação. É cristalina a intenção do Planalto de conseguir, em troca, apoio de deputados. Na CCJ, deu certo. Agora, haverá o enfrentamento decisivo — nesta denúncia —, no plenário, dia 2 de agosto, uma quarta. Quanto custará?

O fluxo de dinheiro para atender a emendas de deputados foi de grande generosidade: nessas duas semanas anteriores à vitória de Temer na CCJ, liberou-se R$ 1,9 bilhão, praticamente o mesmo que tudo que se destinou a elas de janeiro ao início de junho, conforme levantamento feito pelo deputado Alessandro Molon (Rede-RJ). Meio ano em duas semanas.

Um aspecto diabólico dessa gastança, no sentido dado por Dilma, é que ela acontece enquanto a equipe econômica tenta encontrar formas de ser atingida a meta fiscal do ano, um déficit de R$ 139 bilhões. Como o ritmo de recuperação da economia é baixo, aquém do estimado, as receitas não aumentam. E as despesas continuam a subir, puxadas pela Previdência, cuja reforma espera a evolução da crise política.

Mesmo com todas essas dificuldades fiscais, o governo faz “o diabo” por meio de gastos fora de hora. E ainda analisa a possibilidade de aumentar impostos — um sacrilégio, neste momento de reação ainda tímida do setor produtivo.

E não se diga que não há margem para cortes em despesas de custeio. Como registra o economista Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, em artigo no GLOBO, persiste um número excessivo de ministérios, com quase 20 mil cargos especiais (DAS). Ao todo, há 99 mil servidores com essas gratificações.

Como costuma acontecer, a tendência é repassar-se o problema para o contribuinte, ainda obrigado a pagar a conta criada pelo fisiologismo do Planalto, em defesa de Temer.

Editorial O Globo

 


Maia diz que se vê como alternativa presidencial no longo prazo

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), reconheceu ontem, em entrevista ao programa do jornalista Roberto D'Ávila, na GloboNews, que pode alçar voos mais altos na político no longo prazo. Perguntado diversas vezes ao longo da conversa se não teria intenção de assumir a Presidência do Brasil, no lugar de Michel Temer, o deputado federal disse que seu papel atual é presidir a Câmara e que jamais faria algo para prejudicar Temer.

"O político, quando entra na política, sempre sonha com o máximo. Isso aí seria besteira não admitir. Mas neste momento, não", descartou o parlamentar. "A longo prazo, é óbvio, chegar onde eu cheguei já me coloca, daqui a duas ou três eleições, como uma alternativa", acrescentou.

Maia reafirmou que como parlamentar apoia o presidente Michel Temer, mas como presidente da Câmara dos Deputados vem mantendo posição de neutralidade em relação às denúncias feitas contra o mandatário.

"Uma coisa é o presidente da Câmara, outra é o deputado eleito pelo DEM que apoia o governo do presidente. Esse deputado vai ser sempre leal", afirmou Maia, acrescentando que manterá distância em relação ao governo, respeitando a Constituição Federal e o regimento interno da casa na tramitação das denúncia contra Temer.

A entrevista com o deputado federal foi gravada na tarde de ontem, no Rio de Janeiro.

Maia afirmou que o ideal para o Brasil seria que não tivesse havido o fatiamento das investigações contra o presidente Michel Temer, mas que respeita as decisões neste sentido tomadas por outros Poderes. Para o presidente da Câmara, o fatiamento enfraquece a posição de Temer em votações na Casa.

"O ideal para o Brasil é que tivéssemos apenas uma denúncia. Mas esse é um papel que cabe ao procurador-geral [da República] e ao ministro [do Supremo Tribunal Federal Luiz Edson] Fachin. O ministro Fachin já desmembrou o inquérito em dois. Então, ele mesmo viu motivos para separá-los", disse Maia, acrescentando que não tinha qualquer intenção de fazer críticas a outras instituições. "Não estou aqui para fazer críticas a outras instituições. Inclusive acho que no Brasil de hoje nós precisamos repactuar as relações entre os Poderes."

O presidente da Câmara criticou o que considera um excesso de declarações feitas por fontes não identificadas sobre assuntos do alto escalão do governo. "O Palácio [do Planalto] tem que falar menos", disse Maia, queixando-se das inúmeras "bocas" que falam pelo governo. Na avaliação dele, essa multiplicidade de fontes que falam sem se identificar acaba por atrapalhar o bom andamento da administração. "Pelo Palácio fala o presidente e seu porta-voz", acrescentou.

Rodrigo Maia reconheceu que as denúncias de corrupção contra Temer são graves. No entanto, minimizou o suposto uso de emendas parlamentares pelo presidente para garantir a rejeição na Câmara de Constituição e Justiça (CCJ) do relatório favorável à autorização para que o Supremo Tribunal Federal analise a denúncia contra ele. "Se cada emenda resolvesse o problema, Dilma ainda seria presidente do Brasil", argumentou. Com relação à troca de parlamentares na CCJ, para produzir um placar favorável a Temer, Maia afirmou que a instância definitiva será a votação da denúncia em plenário.

Maia afirmou que vem cobrando diariamente do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, a assinatura definitiva do acordo de recuperação fiscal entre a União e o Estado do Rio de Janeiro. "Nós perdemos completamente o controle da segurança pública no Rio", disse o deputado federal ao jornalista Roberto D'Ávila.

O presidente da Câmara frisou ainda que defende a implementação imediata do Plano de Segurança Nacional no Estado do Rio. Segundo o parlamentar, suas tentativas de acelerar a ajuda ao Rio de Janeiro mostram que, mesmo apoiando o presidente Michel Temer, ele e o governo federal divergem em alguns pontos.

Por Rodrigo Carro | Valor Econômico


Folha de S. Paulo: Lava-Jato na balança

Escolhida pelo presidente Michel Temer (PMDB) para substituir Rodrigo Janot no comando do Ministério Público Federal, Raquel Dodge passou sem problemas pela sabatina a que foi submetida no Senado na última quarta-feira (12).

Após mais de sete horas de questionamentos na Comissão de Constituição e Justiça, a futura primeira mulher a ocupar a Procuradoria-Geral da República terminou aprovada por unanimidade, fato inédito no colegiado. Em seguida, teve seu nome endossado por 74 senadores –há dois anos, Janot, cujo mandato se encerra em 17 de setembro, obteve 59 votos favoráveis.

Infelizmente para Dodge, o apoio extraordinário não equivale a um atestado de excelência pelos serviços prestados. Ao contrário, reflete a expectativa, compartilhada pela maioria dos congressistas, de que a Operação Lava Jato arrefeça sob nova direção.

Não é de hoje que Dodge se apresenta como contraponto ao atual procurador-geral. Quando Janot foi reconduzido ao cargo, em 2015, ela já aparecera na lista tríplice formada por iniciativa da categoria. Na disputa deste ano, deixou claras suas críticas em relação à falta de transparência nos acordos de delação premiada e suas divergências quanto à divulgação antecipada de investigações ainda em curso.

Ademais, seu nome tem sido vinculado nos bastidores a personagens do círculo próximo de Temer, como o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, e o ex-presidente José Sarney (PMDB).

Por outro lado, Dodge destacou-se no MPF pela atuação firme em casos de corrupção. Em 2009, participou da Caixa de Pandora, operação que revelou o chamado mensalão do DEM, e pediu a prisão de José Roberto Arruda, à época governador do Distrito Federal.

Seu currículo também inclui a ação que resultou na condenação de Hildebrando Pascoal, ex-deputado que matou um mecânico com uma motosserra no Acre, e o processo que levou à prisão José Carlos Gratz, ex-presidente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo.

Como tem sido usual nas sabatinas do Senado, Dodge não precisou anunciar posições definitivas em relação aos temas mais delicados.

Corrupção? "Manteremos esse trabalho de enfrentamento, aumentando se necessário as equipes que hoje já o vem desenvolvendo." Delação premiada? "Estamos debruçados para entender a instituição, seus limites e sua validade." Lei de abuso de autoridade? "No regime democrático, controles são necessários, inclusive sobre os órgãos de administração de Justiça."

São respostas genéricas, mas bastaram para sinalizar sua disposição a um diálogo que Janot se recusa a travar. Raquel Dodge faz bem em reconhecer que o MPF também comete erros. Corrigi-los é a melhor maneira de assegurar a repetição dos acertos.

A resposta mais importante, contudo, virá com a prática: a futura procuradora-geral terá independência para, nos termos da lei, prosseguir com as investigações que os políticos gostariam de ver abafadas?

Editorial Folha de São Paulo

 

 


Valor Econômico: Aos poucos, Temer perde o controle da base governista

 

As condições políticas para o presidente Michel Temer se manter no cargo estreitam-se a cada dia. Depois do primeiro pedido de inquérito feito pelo procurador Rodrigo Janot contra ele - e outros dois estão a caminho - a couraça de proteção do presidente no Congresso começou a rachar. Já não há tanta segurança de que Temer vá conseguir 172 deputados que votem contra a abertura de inquérito no Supremo Tribunal Federal. Mas ainda é mais provável que passe nesse teste.

Acuado, o grupo de Temer está perdendo rapidamente apoio de sua antes gigantesca base governista. As manobras com o objetivo de solidificar uma maioria e escapar do afastamento do cargo feitas por Temer resultam em mais insatisfações e desgastes. O PSDB as condensa até o paroxismo de não conseguir definir se permanece ou sai do governo. Os sucessivos avisos de que poderá desembarcar a qualquer momento não são exatamente proveitosos para as expectativas de Temer.

A troca em massa de deputados na Comissão de Constituição e Justiça, que votará pela admissibilidade do pedido de abertura de inquérito, mostrou que a desconfiança em torno da própria base de apoio se ampliou. A escolha de um deputado pemedebista independente, como Sérgio Zveiter (PMDB-RJ), para a relatoria do caso na CCJ, tornou-se um revés antecipado para Temer. O voto de Zveiter, de que há indícios sólidos de crime e materialidade no pedido da PGR e de que os casos narrados necessitam de investigações, complicou um jogo que deveria ser tranquilo para o governo.

A tentativa de liquidar o primeiro pedido rapidamente também não está dando muito certo. A CCJ permitirá manifestação de 172 parlamentares, o que deve levar a votação final em plenário a ultrapassar 17 de julho, data marcada para o recesso do Congresso. Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara e governista, disse que atuará como árbitro, seguindo o regimento da Casa, sem se dispor a executar truques de todo tipo, como seu antecessor, Eduardo Cunha.

Maia é o sucessor constitucional de Temer caso ele seja afastado para responder a processo no STF e tornou-se alvo da rede de intrigas que naturalmente se tece em torno de um presidente em queda. Em reunião com Temer, o presidente da Câmara falou o óbvio, mas que, na situação em que se encontra seu interlocutor, soou assim mesmo desagradável. Maia teria dito que Temer poderia ser vitorioso contra a primeira denúncia da PGR agora, mas que o apoio às próximas acusações se tornaria muito mais difícil e decrescente.

Maia não faz mais nada para beneficiar o governo por um cálculo óbvio. Como sucessor, não gastará todo seu cacife político para apoiar um presidente que perde aceleradamente as condições de governar. Se a Presidência lhe cair no colo, Maia provavelmente fará mais do mesmo - continuará a defender a equipe econômica, a política econômica que ela executa e procurará contar com a mesma base de apoio que foi de Dilma, depois de Temer e por fim, sua.

Um presidente em apuros perde o controle do processo. O presidente da CCJ é do PMDB, assim como o relator que pediu a admissibilidade do processo. Mesmo a aprovação da reforma trabalhista anteontem no Senado não veio acompanhada só de aplausos. Um acordo para impedir a modificação do projeto e sua volta à Câmara foi dado como inexistente para o presidente do Senado, Eunício Oliveira, também do PMDB, e por Maia, escolhido para liderar a Câmara com o apoio de Temer.

O antecessor de Maia, Eduardo Cunha, organizou o centrão: cativou com a perspectiva de poder um amontoado de partidos oportunistas, sem programa ou ideologia. A fraqueza de Temer resulta no início da debandada do baixo clero - primeiro aos poucos, como acontece agora, depois em massa. A chance de o Planalto reaglutiná-los é remota, embora possível. O fatiamento das denúncias promoverá a paralisia do governo por um longo tempo, sem qualquer garantia de que Temer continuará no poder. Nessas circunstâncias, procura-se o próximo detentor da caneta e os olhos encontram Maia.

O cerco das denúncias contra Temer e seu círculo palaciano, que será prolongado, torna-o não só incapaz de encaminhar as reformas, mas de governar plenamente. Maia tem, em tese, mais chances de fazê-lo e dar à transição o signo da normalidade até as eleições de 2018. Ainda assim, Maia foi mencionado em delações da Lava-Jato e pode ser alvejado, cedo ou tarde.


No Senado, Dodge defende lei de abuso de autoridade e admite rever provas

A CCJ do Senado realiza sabatina com a subprocuradora Raquel Dodge, indicada pelo presidente Michel Temer ao cargo de Procuradora Geral da República

REYNALDO TUROLLO JR.
TALITA FERNANDES
DE BRASÍLIA

No início da sabatina no Senado que analisa nesta quarta (12) sua indicação para comandar a PGR (Procuradoria-Geral da República), a subprocuradora-geral Raquel Dodge respondeu sobre temas espinhosos como delações, concessão de imunidade a delatores e supostos abusos da Lava Jato.

Ela se comprometeu com o combate à corrupção e defendeu, genericamente, a edição de uma lei que coíba abusos de autoridade. "A lei de abuso de autoridade vem no socorro da ideia de que, no regime democrático, freios e contrapesos são necessários, controles são necessários, inclusive sobre os órgãos de administração de Justiça", afirmou.

"Ninguém está imune a excessos, nenhuma instituição é imune a erros. E nessa perspectiva de que seja dada ampla autonomia para o exercício da função jurisdicional por juízes e membros do Ministério Público, mas contidos os excessos, é que vejo a importância de se aprovar uma lei que controle o abuso de autoridade", disse.

Um projeto de lei sobre o tema tramita no Senado e já foi duramente criticado pelo atual procurador-geral, Rodrigo Janot, cujo mandato termina em 17 de setembro. Para Janot, o projeto em curso visa intimidar membros do Ministério Público e do Judiciário.

Dodge, que faz oposição a Janot dentro da instituição, não comentou o projeto específico, mas sua fala pôde ser vista como um aceno aos parlamentares e uma abertura ao diálogo maior que a de Janot.

Questionada sobre um suposto "Estado policial", também afirmou que é comum que o Ministério Público revise as provas que ele próprio obteve caso detecte, no curso das ações penais, alguma ilegalidade.

"O grande compromisso do Ministério Público é agir sempre pautado na prova colhida de forma idônea e é preciso que zelemos sempre por esses princípios que são muito caros ao Estado democrático", disse.

"Devo dizer que não é incomum que um órgão do Ministério Público aponte a uma certa altura da ação penal que a prova é inidônea, que a prova é inválida. Esse é um dever que o Ministério Público tem, que é apresentar em juízo uma acusação sempre amparada na prova. Se há excessos, é o que deve ser sempre controlado, e o principal órgão de controle é o Judiciário."

COMBATE À CORRUPÇÃO
Ao responder às perguntas do senador Roberto Rocha (PSB-MA), relator de sua indicação na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), Dodge repetiu o principal mote de sua campanha para a PGR: "Ningúem acima da lei, e ninguém abaixo da lei", e comprometeu-se com o combate à corrupção.

"Manteremos esse trabalho de enfrentamento à corrupção aumentando, se necessário, as equipes que já o vêm desenvolvendo", disse. "Ao zelar pelo bom gasto do dinheiro público, o Ministério Público cumpre seu dever constitucional", afirmou.

Como vem dizendo publicamente, Dodge disse considerar a corrupção um mal em si que deve ser combatido para que os recursos sejam corretamente aplicados em saúde, educação, saneamento e outros serviços essenciais à população.

Dodge defendeu o instituto das delações premiadas para combater organizações criminosas. Questionada por Rocha sobre a concessão de imunidade penal a delatores, ela disse que há previsão legal. Porém, que é necessário que os criminosos reparem os prejuízos causados na esfera civil.

"Eu vejo a lei 12.850 [que regulamentou as delações, em 2013] como instrumento poderoso que facilita a investigação sobre organização criminosa. No entanto, o Congresso, na lei 12.850, impôs limites, vedações, seja no tocante àquilo que pode ser oferecido, seja no tocante à separação de jurisdição criminal e jurisdição civil", disse, referindo-se à necessidade de devolver o que foi desviado.

Tema polêmico, a imunidade penal foi concedida por Janot aos irmãos Batista, da JBS, em troca de informações que levaram a investigações sobre o presidente Michel Temer e o senador Aécio Neves (PSDB-MG), entre centenas de outros políticos citados. O acordo de delação é duramente criticado por vários políticos, incluindo o presidente.

Sobre o foro privilegiado para autoridades, Dodge disse que o assunto cabe ao Congresso e ao Supremo, e que ao Ministério Público só compete opinar.

"Encontra de minha parte muita simpatia a ideia de que todos os brasileiros sejam submetidos ao mesmo tipo de jurisdição. Compreendo que estamos caminhando dentro de um regime democrático para o amadurecimento das instituições e sempre verificando a pertinência de um instituto diante da realidade brasileira", disse.

A respeito de ter sido indicada por Temer apesar de ter ficado em segundo lugar na lista tríplice para o cargo, Dodge ponderou que a lista não é obrigatória e é uma "sugestão" dos membros da carreira ao presidente da República.

"Qualquer um dos três que figure na lista passou por rigoroso e severo critério dos procuradores da República", afirmou, e, por isso, tem legitimidade.

Acompanham a sabatina, na CCJ, os ex-procuradores-gerais da República Roberto Gurgel e Aristides Junqueira.

 


É normal que Rodrigo Maia sinta 'comichão' para assumir Presidência, diz FHC

Segundo FHC, presidente da Câmara é 'mais que humano, é político'; ex-presidente também disse, em entrevista à GloboNews, que Temer deve deixar posição defensiva e partir para o ataque se quiser contribuir para solução da crise política

João Paulo Nucci, O Estado de S.Paulo

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ser "muito difícil" que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não sinta um "comichão" com a possibilidade de assumir a presidência da República. "Suponho que seja uma pessoa correta, não vai fazer nada contra o presidente. Mas ele é humano. Mais que humano, é político", disse o tucano em entrevista ao programa Roberto D'Ávila, da GloboNews, nesta terça-feira, 11. "Na vida pública, por mais que as pessoas queiram ser leais, há interesses pessoais e políticos que se sobrelevam."

Para o líder tucano, o presidente Michel Temer deve deixar a posição defensiva e partir para o ataque se quiser contribuir para a solução da crise política. "O poder começa a erodir. Não importa se as denúncias são corretas ou erradas. Não adianta fazer uma guerra de trincheira, parado", disse na entrevista gravada na tarde desta terça-feira, 11, e exibida à noite.

FHC comparou a posição atual do peemedebista à fracassada Linha Maginot, criada pelos franceses para tentar se defender da invasão da Alemanha na Segunda Guerra Mundial. "Os alemães fizeram a guerra de movimento, a blitzkrieg (na Segunda Guerra Mundial)."

O ex-presidente usou a metáfora bélica para defender que a gestão Temer precisa demonstrar à população que ainda tem condições de governar ou de propor saídas para o impasse - nem que seja a abreviação do mandato ou a realização de uma reforma política. "O Temer ainda teria condições de abrir uma página nova no Brasil, (fazer) um gesto de grandeza." A atual postura do presidente, segundo o tucano, poderá até levá-lo a permanecer no cargo até o fim do mandato, mas com o poder esvaziado. "Pode ficar no governo, mas não governa mais. (Temer) está preocupado com o que a Câmara vai fazer. Amanhã, com o que a Justiça vai fazer."

Sobre a permanência do PSDB na gestão Temer - o partido comanda quatro ministérios -, FHC reiterou que ainda não há uma decisão formal sobre o assunto e que a reunião no Palácio dos Bandeirantes na noite desta segunda-feira, 10, que reuniu líderes do partido, não tinha como deliberar sobre o assunto. O tema será discutido oficialmente em uma reunião da Executiva do partido no mês que vem.

Do ponto de vista prático, no entanto, o ex-presidente diz que a relação entre Temer e o partido fica "muito difícil" a partir do momento em que os deputados tucanos votarem pela aceitação da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Temer. "Creio que maioria dos deputados (do PSDB) vai dizer sim, a opinião pública está muito comovida. Aberto o processo (contra Temer no Supremo Tribunal Federal), como fica o partido?"

O ex-presidente confirmou durante a entrevista que escreveu uma carta a Temer em junho, após a divulgação da gravação que o empresário Joesley Batista, da JBS, fez do diálogo que manteve com Temer. "Escrevi o que eu achava que era possível fazer dada a situação que está criada." FHC não obteve resposta de Temer. "Não era pra responder, era para ele refletir."

O líder tucano voltou a dizer que o melhor cenário para a saída da crise é a realização de eleições diretas. "Mas não sou qualquer apressado. Diretas já não pode, é copiar o passado. Precisa ter reforma política, avançar nas reformas."

A entrevista ao jornalista Roberto D'Ávila foi concedida no apartamento de FHC em São Paulo, pouco antes do ex-presidente embarcar para a Europa - viagem que o impediu de ir à Brasília, a pedido de Temer, para uma reunião. "Nunca me neguei e nunca me negaria (a dialogar). Pensei que iria à casa dele, em São Paulo. Mas pegar avião para Brasília é mais complicado."

FHC voltou a dizer que não tem mais pretensões de ocupar cargos públicos - seu nome é sempre lembrado para a eventualidade de uma eleição indireta à Presidência. "Não é que eu não queira, mas tenho 86 anos. (...) Ser presidente é um esforço extraordinário."

Mais do que questões políticas, o que mais o preocupa é o País, segundo Fernando Henrique. "Temos 14 mihões de desempregados, criminalidade enorme. Sessenta mil homicídios no ano. E tem desconforto político, é muito problema." Ainda assim, é preciso avançar no processo que está passando "a limpo o Brasil", disse o presidente. "Destampou a panela e as pessoas viram que tem coisa podre aí. Não vai acabar a Lava Jato, não deve acabar."

 

 


Roberto Freire: 'A base governista está mais aguerrida'

Amanda Almeida | O Globo

Michel Temer fica ou cai?
– O termômetro está muito mais difícil de ser aferido do que no processo do impeachment. Porque, naquele caso, havia um componente: povo na rua. Hoje, pode haver rejeição alta, mas não há manifestação. Além disso, a base governista está muito mais aguerrida.

A saída do presidente vai gerar instabilidade?
– Não. Se for vitorioso o afastamento, a transição continua. Até porque Rodrigo Maia é base do processo do impeachment e da transição, homem de confiança da base governista.

E qual a sua posição e a do PPS?
– A maioria da bancada é favorável à aceitação da denúncia. Respeitaremos todo e qualquer voto diferente. Não quero falar ainda minha posição. Qualquer que seja a decisão, o PPS continuará a apoiar a transição até 2018 nos termos da Constituição e a favor da reforma.

 


Estado de S. Paulo: Na prática, o PSDB deixou o governo, mas mantém cargos

Encontro de segunda-feira preparou terreno para que os quatro ministros do PSDB no governo deixem o governo Temer

Pedro Venceslau, O Estado de S.Paulo

O jantar oferecido na segunda-feira, 10, pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) na ala residencial do Palácio dos Bandeirantes ao primeiro escalão do PSDB teve dois objetivos: estabelecer um armísticio na sigla e preparar o terreno para que os quatro ministros tucanos deixem a administração Michel Temer.

O encontro ocorreu após o cancelamento de um encontro que o presidente teria domingo, 9, em São Paulo com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e os senadores Aécio Neves (MG), José Serra (SP) e Tasso Jereissati (CE).

Existem duas versões sobre o caso. Segundo interlocutores de Temer, ele avaliou que “não haveria mais clima” para a conversa devido às declarações dos senadores Tasso, presidente licenciado, e Cássio Cunha Lima (PB). O primeiro versou sobre o estado de “ingovernabilidade” do Brasil e o segundo teria dito em um encontro com investidores que “em 15 dias haverá um novo governo”.

Já FHC disse a assessores que a reunião foi uma sugestão do pessoas ligadas a Temer, mas que ele não poderia participar por problemas de agenda. O fato é que o Palácio do Planalto já foi informado pelos tucanos que a bancada decidirá sozinha sobre a admissibilidade da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR). Ou seja: na prática o partido deixou o governo, mas mantém os quatro ministérios na Esplanada dos Ministérios.

Depois de liberar o voto dos tucanos na votação contra Temer na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o líder da bancada do PSDB, Ricardo Tripoli (SP), reunirá o grupo nesta terça-feira, às 16h, para deliberar sobre a posição no plenário da Casa.

Com 46 deputados federais, a tendência é de que os parlamentares sejam liberados novamente para votar como quiserem. Defensor do desembarque, Tripoli disse na segunda-feira, 10, no jantar no Bandeirantes, que dos sete deputados da legenda na CCJ, Temer contará com apenas dois votos a seu favor.

 


Marco Antonio Villa: Adeus, Temer. E depois?

Impeachment deu a falsa ilusão de que tudo estaria resolvido com a mera substituição do titular do Planalto por Temer

Não há na nossa história republicana nenhum caso de um presidente que tenha tido uma agonia política tão longa como a de Michel Temer. No início da República, Deodoro da Fonseca, após ter fechado o Congresso Nacional, permaneceu mais uma quinzena no poder antes de ser obrigado a renunciar, após a rebelião da Marinha, entregando o governo a Floriano Peixoto. Mais de meio século depois, Getulio Vargas resistiu 19 dias até a tragédia do 24 de agosto de 1954. A crise de novembro de 1955 foi resolvida no próprio mês, mesmo tendo três presidentes em um curto espaço de tempo. Já em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros, em duas semanas, fundamentalmente, foi possível encontrar uma solução para o impasse sucessório. Três anos depois — e, neste caso, com a decisiva presença militar — em alguns dias foi construída uma nova situação política. Agora, mesmo tendo instituições um pouco mais sólidas do que nos momentos históricos citados, nada indica que seja possível encontrar, a curto prazo, um caminho que retire o país da mais profunda crise da nossa história.

Com a redemocratização, foi construído um estado democrático de direito que não conseguiu lançar os fundamentos de uma República democrática. Pelo contrário, a institucionalidade acabou — graças à sua complexidade e ausência de controle público — dando guarida segura àqueles que conspiraram sistematicamente contra os valores republicanos. O que deveria servir como um instrumento de defesa da cidadania acabou, ao longo de três décadas, sendo utilizado para garantir legalmente — por mais paradoxal que pareça — uma República apodrecida pela corrupção.

Os republicanos passaram por diversos momentos de desilusão política. A cada aparente ruptura, vinha — em seguida — a desilusão. E isso desde o 15 de novembro de 1889, passando por 1930, 1945, 1964, 1985 e, especialmente para a conjuntura que vivemos, 1988 e a sua “Constituição cidadã.” De Saldanha Marinho, lá no início do governo Deodoro, até a atual sociedade civil — participante, ativa, que transformou as redes sociais em instrumentos de combate político — todos dizem que não vivemos na República dos nossos sonhos.

A cada dia fica mais profundo o fosso que separa o cidadão comum da elite dirigente — elite dirigente, entenda-se, dos Três Poderes da República. O poder continua petrificado, de costas para a sociedade. Não quer saber de mudança. Quer manter, na essência, tudo como está. Basta recordar que estamos a cerca de um ano das eleições presidenciais e nada indica que haverá uma profunda alteração do que vivemos no processo eleitoral de 2014. Ou seja, teremos o habitual jogo sujo, com os mesmos partidos políticos, com os marqueteiros de sempre, os eternos candidatos e os ridículos debates. E no segundo turno, se houver, teremos dois candidatos representando frações eventualmente distintas do grande capital. E a cidadania? Ah, esta pouco importa — ou melhor, importa só como eleitor, naqueles segundos em frente à urna eletrônica.

Desta forma, a crise do governo Temer é muito mais profunda. Que o presidente não está à altura do momento histórico, disso não há dúvida. Poderia liderar o país até o processo eleitoral de 2018, mas se apequenou, seduzido pelas benesses financeiras do poder. Resta agora, desesperadamente, se manter à frente do governo, manobrando da forma mais vil. Contudo, nada indica que deva permanecer até 31 de dezembro de 2018.

Mas se o problema fosse somente Michel Temer, tudo poderia facilmente ser resolvido. A questão é mais complexa, é estrutural. Não estamos passando por uma crise política, o que não é pouco, como tantas outras na História do Brasil. Agora há uma crise sistêmica que atinge os Três Poderes. Temer, Lava-Jato, JBS, Dilma, Odebrecht, Lula, Aécio et caterva são faces conhecidas de um sistema que entrou em colapso.

O processo do impeachment deu a falsa ilusão de que tudo estaria resolvido com a mera substituição do titular do Palácio do Planalto. Ledo engano. Tanto que, no “novo governo”, grande parte da base parlamentar é a mesma da antiga situação e, inclusive, teve — e ainda tem — no Ministério Leonardo Picciani, que votou contra a autorização para a abertura do processo contra Dilma Rousseff.

Entre as principais forças políticas com representação no Congresso, há um relativo consenso de que tudo o que ocorreu nos últimos anos não passou de mero acidente de percurso. Algo inevitável, típico de uma jovem democracia. Insistem na falácia de que as instituições estão funcionando, mesmo em meio aos escândalos que transformaram o Brasil no país mais corrupto do mundo ocidental. É a velha conciliação, sempre presente na nossa história, principalmente nos momentos de tensão política.

Desta vez, dada a profundidade e magnitude temporal da crise, é provável que a conciliação fracasse. Isso só poderá ocorrer se a sociedade civil tiver uma ação ativa e propositiva. E aí mora um dos problemas. Fazer o quê? Como? Quais são as propostas? De que forma encaminhá-las? Como combinar a institucionalidade vigente com ideias de reorganização do aparelho de Estado? E de que forma construir o novo em meio a uma estrutura arcaica, que impede as mudanças?

Michel Temer deve logo abandonar o Palácio do Planalto. Mas a crise sistêmica vai permanecer. Ela é muito mais profunda do que a mera substituição do presidente. E se for seguido o velho figurino brasileiro — o que é mais provável — permaneceremos em meio à turbulência nos próximos anos, com reflexos diretos na economia e na sociedade.

* Marco Antonio Villa é historiador