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Frente, transição, futuro governo e a política: Lula segura as rédeas

Paulo Fábio Dantas Neto*, Esquerda democrática

Durante essas semanas seguintes às eleições, quem realmente gosta de democracia e entende a importância da política na vida pública está matando saudades. Desfruta imagens e falas que vão além do alívio – algo já em si importante – e trazem esperança de que possamos voltar a ter no Brasil espaço para argumentos, diálogos e embates políticos civilizados em lugar de dogmas, berros e violência. Fantasmas que apavoravam a sociedade, ou se dissiparam (caso do perigo de golpe) ou migram para as margens das estradas e do noticiário político, caso das manifestações de inconformismo politicamente ativo em relação ao resultado eleitoral. Nuvens descarregam e o descarrego torna o ar menos abafado.

Há quem chame isso de volta à normalidade. Apesar da sensação real de que matamos saudades, tenho dúvidas sobre se de fato estamos diante de algum tipo de retorno. Tendo mais a compreender esse momento como saída de um beco enlameado, pantanoso e como entrada numa avenida desconhecida. À medida em que, ao caminhar por ela, o país finque os pés no chão, poderá avaliar a qualidade do piso, sua textura em cada trecho, percebendo a firmeza e o alcance de cada passo. Enquanto vencedores podem arriscar saltos para desfrutar bônus da vitória, a realidade aconselha, a quem ganhou e a quem perdeu as eleições, pisar devagarinho, pois a nova avenida não é reta nem está toda pavimentada. Para os componentes do que se autodesignou “frente ampla”, os desafios são manter em dia os músculos e articulações dos pés e prestar atenção a curvas sinuosas, túneis e elevados, que modulam a velocidade.

Na pista da política institucional, o piso é amigável. Atitude cooperativa predomina para além dos necessários acordos e negociações, próprios do jogo político. Há no ambiente uma consciência coletiva da elite política de que lhe foi dada nova oportunidade de agir como tal. O instinto sobrevivente, após quatro anos de incerteza radical, sugere aos atores políticos que a parte atual do jogo pode ser jogada de modo a beneficiar, inicialmente, a todos os que se dispuserem ao jogo dentro das regras, inclusive se forem da turma do capitão. Remete-se ao futuro as disputas decisivas. Se a futuro breve ou distante não se sabe (a política dirá), mas ao menos tem-se um prazo fixado pela democracia, isto é, no próximo encontro com as urnas tudo será reexaminado. Por ora, não convém a ninguém antecipar, para não travar a acumulação de capital político acessível a todos, enquanto dure a cooperação. Nessa, portanto, nada há de altruísmo. É interesse que, ao que parece, começa a ser mais bem compreendido. Desse modo, a visita do presidente eleito às cúpulas dos outros dois poderes da República apenas selou uma atitude antecedente de compromisso. Com os ministros do STF e com os presidentes do Senado e da Câmara Lula não precisou oferecer mais do que uma disposição de laissez-faire. Menos judicialização da política e abstenção em relação às disputas internas ao Legislativo bastam para assegurar bom tráfego.

Quadro distinto há no túnel onde circula um eleitorado cindido quase ao meio, parte dele interditando a pista sem pavimento pela qual a frente ampla pede passagem. Suas motivações não são desejo de golpe, mas um imenso ceticismo em relação ao presidente eleito e ao seu ainda futuro governo. Ceticismo também em relação ao processo eleitoral findo, modo de repudiar o sistema político ao qual Bolsonaro, contra leis da lógica, ainda conseguiu aparecer como contraponto, depois de ter patrocinado, em favor da sua tentativa de reeleição, uma radical mobilização de recursos públicos por dentro desse sistema. Conforme pesquisa do Instituto Atlas (trago aqui informação da jornalista Raquel Landim, da CNN, ao entrevistar o responsável pelo instituto), entre os dias 4 e 8 de novembro 43% dos eleitores entrevistados disseram que Bolsonaro foi injustiçado na eleição e 38% que Lula não teve mais votos que Bolsonaro. Mesmo mantendo a devida distância desses números exatos, inclusive por não conhecer bem a metodologia empregada, creio ser impossível não prestar atenção na ordem de grandeza. Ela dá ideia sobre o tamanho do caminho a percorrer pelo campo democrático (não só pelo governo, como lembrou ontem a jornalista Maria Cristina Fernandes em sua coluna no jornal Valor Econômico) entre a vitória eleitoral da frente ampla, a montagem e atuação do novo governo e a fixação de um padrão de competição confiável entre ele e uma oposição democrática. Nenhuma das três condições é dispensável para afastar do nosso horizonte, ao menos a médio prazo, o protagonismo político de uma extrema-direita subversiva e agonística. Das três, por enquanto alcançou-se a primeira, a 30 de outubro. As duas outras (governo de frente ampla e oposição democrática) ainda são temas mais para prospecção.

Mas o presidente eleito é uma personalidade política marcante e incontrolavelmente ostensiva. Por mais que tenha seus segredos imperscrutáveis e faça deles uso, como qualquer político, sua persona pública não abre mão de fazer revelações inesperadas, elas também armas para exercer protagonismo. A sua presença nos palcos procura por vezes neutralizar a obra da paciente dialética articulatória dos bastidores, caso essa obra ameace, de algum modo, a sua condição de vértice. E no cumprimento das ordens do instinto de sua pessoa termina fornecendo material a análises que, sem ele, seriam precoces.

Foi exatamente o que ele fez nessa última semana, ao final de dois dias de alta exposição. Na quarta-feira cumpriu, como se governante já fosse, o importante ritual da separação harmônica dos poderes, colhendo os merecidos frutos do contraste gritante com o seu antecessor que ainda vaga pelo palácio. Nesse dia Lula guardou para si seus sentimentos, desejos e planos, respeitando a primazia das instituições sobre as pessoas. Depois fez do dia seguinte uma quinta-feira com ares de um pastiche da Lavagem do Bonfim. Sem confrontar o ritual sagrado cumprido na véspera, assumiu o apetite profano de políticos outsiders em romaria e se esbaldou em desabafos ao povo, inclusive com direito a lágrimas. Ao seu lado, fiéis escudeiros e/ou parceiros de primeiro turno e aliados chegados já no segundo. Esses últimos e parte dos primeiros foram levados de roldão ao encontro da patuscada, no embalo da retórica populista, como se fossem turistas desavisados, perplexos e receosos, mas também encantados com o sincretismo da festa. Na Bahia o rumo é uma basílica e a festa é em honra de um redentor. Mas no caso em tela, o que são a motivação e o rumo é discussão mundana, que vai longe e desautoriza a analogia.

O eleitor médio adora tudo isso, daí a popularidade de Lula. A militância retira dessa performance o combustível do seu fervor. Já a dinâmica institucionalmente plural e laica da política democrática sofre com isso, daí a dificuldade de Lula adquirir, nesse âmbito, uma confiabilidade sustentável, o que o obriga a permanente exercício de seduções a granel. Por mais que sua retórica populista assopre, depois de morder, seus pares no mundo da elite política sabem que não estão livres de, na próxima esquina, receberem do hipnotizador de massas a pecha de picareta ou golpista. Acordos políticos com Lula tendem a ser intensos, para mostrar que envolvem cérebro e coração. E efêmeros, a não ser que os aliados, mesmo céticos, metabolizem seus interesses em forma de devoção e profissão de fé no líder.

Fiz uma interpretação sumária, que não resistiria ao teste do que foi a performance um tanto frustrante de um líder populista meio fora de forma, que Lula exibiu na mais recente campanha. Para quem esperava dele o arrebatamento das massas num resgate de sua trajetória, é pedagógico resignar-se ao fato de que deve sua eleição à formação de uma frente ampla de última hora, formada por forças políticas, lideranças, pessoas e grupos movidos pelo medo da reeleição do seu oponente. Esse choque de realidade não impede, contudo, que se leve em conta outro fato incontestável, o de que ninguém, na política brasileira atual, senão ele, poderia reunir condições necessárias - embora não suficientes, como mencionei acima - para enfrentar e derrotar um incumbente que, por sua vez. reunia três condições que faziam dele o espectro de uma tempestade perfeita: mística antissistêmica, arsenal (legal e ilegal) de recursos materiais derivados da ocupação do cargo e disposição pessoal de não se deter diante de escrúpulos de qualquer natureza. Esse segundo fato, de ter sido a única alternativa ao caos, sinaliza um futuro ao protagonismo de Lula. Um futuro de consolidador da vitória do sistema contra a subversão.

Esse é o preço que, em tese, Lula deve pagar por ter obtido o apoio eleitoral de uma minoria política e social decisiva, que lhe rendeu os votos que faltavam. Votos que sozinho com seus apoiadores primeiros ele não pôde obter, ao contrário do que previa sua tática original de frente de esquerda acenando ao centro. A dialética articulatória, fundada no entendimento e em concessões mútuas, com ânimo de conciliação, é a única gramática disponível a Lula, antes que ele tenha em mãos, efetivamente, os cordéis do poder governamental. Pode ser que a mantenha, por meses ou até o fim do mandato, em atenção aos condicionantes objetivos de sua apertada eleição. Pode ser que não. Até aqui há pistas de uma coisa, de outra e também de combinação ignorada entre a gramática da articulação e a de cooptação fisiológica.

A frente ampla, por ter sido improvisada e não fruto de uma convergência programática dentro de uma estratégia política, implica, agora, em processos complexos de realinhamento ainda muito opacos. Enquanto dinâmica de partidos e lideranças que pretendem influir sobre o futuro governo, o rumo ou a falta de rumo dessa frente ainda é um quebra-cabeças de resolução ignorada. Certamente será tema em pauta na sequência dos artigos semanais. Hoje só arrisco, para concluir, uma hipótese, a partir do que transparece a mim sobre desígnios, provavelmente provisórios, do ator principal. A transparência relativa desses desígnios provém, como já dito, do fato de Lula, embora sendo mestre na dissimulação, ser, também, perito em oratória incontinente. Nunca esquecendo que ambas são recursos conscientes do ator, é possível interpretar, a partir do que não pode ser dissimulado, o que tem sido a sua tática.

Para resumir, penso que se trata para ele, agora, de segurar as rédeas da política em suas mãos, como vértice indisputado. É possível que consiga. Votos, mesmo sem goleada, revigoram o animal político. Mas a fila da política anda e pode fugir ao seu controle, na eventualidade de um condicionamento da formação do governo pela transição coordenada por Geraldo Alckmin. As coisas, no meio político e empresarial, também na sociedade civil e na imprensa, começavam a parecer andar “bem demais”. Era tal o clima de busca de consenso que, de repente, se poderia chegar a ele sem a intervenção decisiva do protagonista. As virtudes do método dialético da articulação poderiam fazer com que ele, o método, relativizasse as diferenças substantivas sobre, por exemplo, política econômica, dando lugar a um script irrecusável pelo presidente. Até porque a percepção da gravidade da crise social e o profissionalismo da articulação política sobre economia jamais permitiriam à coordenação da transição o luxo de nublar a máxima prioridade presidencial para suas promessas explícitas de campanha, quase todas remetidas ao social. Em todas as arenas visitadas pela comissão respirava-se ar de conciliação entre responsabilidade social e responsabilidade fiscal. A adversativa “ou” caminhava para o armário. Mas eis que, numa quinta apoteótica, a mão visível do ator principal instala um contencioso em cima de uma não questão. Volta-se à reta final do primeiro turno e o que estava irresolvido, mas andando, parece voltar à estaca zero.

Vozes petistas menos moderadas, viajando na maionese, exultaram quando souberam que Henrique Meireles teria dito que Lula dilmou. Será? As seguidas indicações de pessoas do governo Dilma para diversos núcleos temáticos da comissão de transição; o aval, ainda que contido, da presidente do PT à carta institucionalmente aloprada de Guido Mantega ao BID para reverter uma indicação do atual governo como se já houvesse um novo; as especulações em torno do nome de Fernando Haddad para o ministério da Fazenda, tudo isso e outras narrativas mais pareciam encontrar guarida e sentido nas palavras aguerridas do presidente eleito num discurso dito histórico, por essas correias de transmissão.

Por outro lado, reações políticas em contrário assumiram variadas formas. No plano partidário poucos exemplos. Profissionais da política em geral seguram-se numa hora dessas, quando há muito em jogo. Mas é digna de nota a clareza quanto ao mérito da discussão usada por Gilbert Kassab para, em entrevista à CNN, condenar polidamente a fala. E de curiosidade a ausência do MDB à primeira reunião dos partidos da base ampliada da transição, que o partido integra a convite direto da presidente do PT. Entre os chamados “economistas liberais” (profissionais ou intelectuais públicos que a turma das correias de transmissão ironiza como vozes do “mercado”, o inimigo secular, evocado pela fala de Lula) as reações variaram entre a crítica assertiva, sem meias palavras, de Elena Landau – a assessora do programa econômico de Simone Tebet – e a ironia moderada de Arminio Fraga simulando responder com paciência às indagações retóricas da fala de Lula. Por fim, no próprio PT houve leituras bombeiras de que “não foi bem assim” e palavras moderadoras consistentes, como a do senador Welington Dias.

Essas manifestações de incômodo parecem longe de um caminho sem volta em relação ao governo Lula, mas refletem, em comum, a consciência sobre a falta de futuro da dicotomia falaciosa entre responsabilidade fiscal e responsabilidade social no atual contexto de revisão conceitual desse tema em todo o mundo pós-pandemia e de convergência política democrática no Brasil. E expressam, de um ponto de vista racional, variados graus de apreensão quanto às palavras do presidente eleito, de quem esperam atitudes de um dirigente do sistema democrático e da política sólida das instituições.

Penso que os temores de um lado e as celebrações do outro não se sustentam ainda em suficientes fatos. O mais que provável é que Lula volte do Egito carregado de acordos e promessas internacionais, antidistônicos para resolver a distonia que provocou. O discurso deverá ser ambíguo, como sempre. Aos críticos que quiser afagar dirá “não disse que não havia motivos para preocupação?” Aos que quiser manter à distância dirá que são provincianos, enquanto ele, Lula, está antenado com a ordem mundial.

Lidar bem com a ambiguidade do mundo real e saber cultivá-la é, sem dúvida, uma virtude política. Pode ser praticada tanto na direção de construir consensos sempre parciais e nunca absolutos, fazendo da política um artesanato de várias mãos, construindo um centro diretor vertical a partir de circuitos horizontais; ou pode ser praticada na direção de ativar conflitos até o limiar da divisão, fazendo da ambiguidade do líder o único ponto de equilíbrio possível e consagrando a política como atividade dependente de estímulos que podem e até devem vir de baixo, desde que sejam triados pelo vértice. Essa última é a via da ambiguidade virtuosa de Lula e um mandamento que talvez deva ser observado por todos os brasileiros que ajudaram a elegê-lo é lembrar que não se pode eleger Lula e querer que ele seja outro. É assim e assim será. Qualquer projeto democrático que o inclua não deve incluir a hipótese de que um dia ele desça do palanque. Jamais descerá. Se descesse seria menos marcante que um chuchu.

Se alguém, como esse colunista, se inquietar ou contrariar com isso, deve observar, durante os próximos quatro anos, um segundo mandamento das urnas, que é imaginar como estaríamos se o eleito tivesse sido o outro. O espirito de quem é democrata sincero ficará mais apaziguado. Mas ao mesmo tempo deve ficar atento a outro ponto da fala do presidente eleito naquela memorável quinta-feira: ele não só exumou o inimigo “mercado”, como o inimigo Bolsonaro, esse de carne e osso, repetindo, em palanque tardio, a pauta de uma campanha que deve dar por encerrada se quiser, de fato, agregar o país. Por mais apaziguados que estejamos com a ambiguidade de Lula, é insólito ouvir o eleito despolarizador do país tirar o capitão do atual ostracismo para convidá-lo a se preparar melhor para a “próxima”. Bolsonaro pode virar, a médio prazo, assunto do Poder Judiciário e pé de página na política institucional. Sua irrelevância sistêmica é indispensável para desobstruir o túnel de insatisfeitos, onde ele atua e tem peso. Para pavimentar o túnel e integrar os transeuntes à política da nova avenida Brasil, pelo novo governo e pela nova oposição. E deixar Bolsonaro entregue aos juízes e a André Janones.

* Paulo Fábio Dantas Neto é cientista político e professor da UFBa.

Texto publicado originalmente no Facebook da Esquerda Democrática.


Foto: reprodução | Arthur Menescal / Especial Metrópoles

Governador bolsonarista: Lula não é de direita ou esquerda, é do povo

Tácio Lorran | Metrópoles

Enviado especial à Sharm El-Sheikh – Governadores da Amazônia que declararam apoio à reeleição de Jair Bolsonaro (PL) indicaram estar dispostos a trabalhar junto ao novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para reduzir o desmatamento ilegal na região. Eles ponderam, contudo, que políticas do agronegócio não podem ser deixadas de lado.

governador do Acre, Gladson Cameli (PP), afirmou que Lula não é presidente de esquerda ou de direita, mas, sim, do povo brasileiro.

“A eleição acabou. Desci do palanque e estou pronto para ajudar no que for necessário. Temos as políticas ambientais e as políticas do agronegócio”, afirmou Cameli, nesta segunda-feira (14/11), durante a 27º edição da Conferência das Partes das Nações Unidas (COP27), realizada em Sharm el-Sheikh, no Egito.

Por sua vez, o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (União), pontuou que quando alguém se elege para um cargo público, a Constituição e a legalidade passam a ser a grande baliza.

“A eleição terminou. Quando eu ganhei a eleição, 15 prefeitos me apoiaram. Nesta reeleição, eu tive apoio de 140 prefeitos. Espero que daqui a um tempo o presidente Lula possa ter o apoio de todos – vai ser um sinal de que ele vai governar para todos e não somente para aqueles que o elegeram”, acrescentou Mendes.

Ambos os governadores declaram apoio a Bolsonaro nas últimas eleições.

O consórcio interestadual da Amazônia Legal tem um hub próprio na COP27. Nesta quarta-feira (16/11) o espaço terá a presença do Lula, que receberá uma carta dos governadores da região. O documento está em fase de finalização.

“Essa carta vai trazer, em linhas gerais, uma proposta de uma visão que possa representar esse novo momento que o Brasil vai viver, mas, acima de tudo, que possa garantir o respeito à Amazônia e a todos nós que vivemos naquela parte do país. Preservar nós queremos, mas queremos também que o povo da Amazônia possa tero direito de continuar crescento e se desenvolvendo”, disse o governador do Mato Grosso.

*O repórter viajou a convite do Instituto Clima e Sociedade (ICS)

Matéria publicada originalmente no Metrópoles


O QG lulista contra as fake news

Folha UOL*

Ao assumir a assessoria jurídica da campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, este ano, o advogado Cristiano Zanin, que também defendeu Lula nos processos da Lava Jato, tinha uma preocupação: como enfrentar e brecar os ataques das redes digitais do presidente Jair Bolsonaro contra o candidato petista. A experiência de 2018 deixara clara a eficiência das redes bolsonaristas. Zanin, portanto, não tinha dúvida de que as redes seriam uma grande ameaça a Lula, pois era claro que os adversários usariam perfis espalhados por várias plataformas para propagar notícias falsas, criar terror entre os eleitores e, principalmente, reforçar o fato de o ex-presidente ter sido condenado e preso, embora o advogado tivesse conseguido reverter todas as 26 condenações.

Zanin estava convicto de que somente o trabalho jurídico não daria conta de vencer o ataque digital. Para enfrentar a guerra em condições de igualdade era preciso mais: montar um contra-ataque mais eficiente do que a ação do adversário.

Discretamente, como é do seu feitio, o advogado foi buscar para essa tarefa aquele que não apenas tinha um grande conhecimento em estratégia de redes sociais mas, ainda por cima, conhecia o modus operandi do adversário, por ter trabalhado com ele na eleição anterior. Tratava-se de Marcos Carvalho, estrategista em marketing digital e presidente da agência AM4, responsável pela bem-sucedida campanha digital de Bolsonaro em 2018. Logo após a eleição, contudo, Carvalho foi defenestrado pelo então presidente que ajudara a eleger em razão do ciúme que Carlos Bolsonaro, o Zero Dois, tinha do profissional.

Carvalho entrou para a campanha de Lula logo no começo de agosto. Após conversas com Zanin, os dois decidiram montar uma sala de monitoramento de redes sociais. Zanin e Carvalho passaram a trabalhar em permanente parceria. O advogado sabia que, para poder agir, entrando com ações rápidas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra os ataques digitais das redes bolsonaristas, teria que estar muito bem amparado por informações que comprovassem a disseminação de conteúdos falsos – algo que já vinha ocorrendo antes mesmo do início da campanha.

O quartel-general petista contra fake news foi instalado numa sala no terceiro andar de um prédio na Rua Padre João Manuel, nos Jardins, em São Paulo, onde, coincidentemente, funcionam tanto o escritório do advogado quanto o do marqueteiro. Na sala havia apenas uma grande mesa retangular ao centro e cinquenta monitores cobrindo uma parede inteira. Por meio deles, dez analistas da empresa de Carvalho acompanhavam, minuto a minuto, o que era disseminado em páginas e perfis de seguidores do presidente na internet. “Essa tela fazia o raio X das redes para entender o que estava acontecendo”, contou Zanin, por telefone, no dia 28 de outubro, enquanto seguia de carro para o estúdio da Globo, no Rio de Janeiro, onde se daria o último debate entre Bolsonaro e Lula.

Zanin acabara de chegar de Brasília para acompanhar o debate, após passar a madrugada e a manhã daquele dia entrando com os últimos recursos no TSE para barrar nova leva de postagens de notícias falsas contra Lula. E contou, entusiasmado, como se deu o trabalho para enfrentar o exército digital do adversário.

 “Montamos uma sala de altíssima tecnologia com expertise de quem tinha passado pela eleição de 2018”, disse. “Toda essa experiência se somou a outros profissionais que também nos deram suporte relevante.” E detalhou: “Foi um conjunto de advogados e experts na área de estratégia digital que nos permitiu ter a compreensão de como funcionava esse sistema e contra-atacá-lo na sua essência, notadamente na produção de material falso.”

Monitorando o que estava bombando nas redes adversárias, os advogados entravam com pedido de liminar junto ao TSE e com ações junto às plataformas denunciando a disseminação de fake news. Com base nas liminares concedidas pelo TSE, a equipe jurídica conseguia a desmonetização nas plataformas, como Twitter, YouTube, TikTok e Instagram – ou seja, cortavam os recursos financeiros –, das páginas que distribuíam conteúdo falso. “Ao se desmonetizar esses canais, cortou-se na raiz boa parte da produção de fake news”, disse Zanin. “Elas não deixaram de existir, mas foi uma providência muito importante que teve um impacto significativo nesse ecossistema de desinformação.” 

Proibidos de receber remuneração pela reprodução de material falso, para serem difundidos por vários perfis, os produtores desse tipo de conteúdo viram seu financiamento secar, principalmente no YouTube. Financeiramente, já não compensava seguir adiante com as fake news.

Os escritórios de Cristiano Zanin e de Eugênio Aragão entraram com uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral contra propagadores de informações falsas. A decisão do TSE puniu perfis como os de Carlos, Eduardo e Flávio Bolsonaro, filhos do presidente; Kim Paim, youtuber bolsonarista; Nikolas Ferreira, vereador por Belo Horizonte e deputado federal eleito; Alexandre Ramagem, diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e candidato a deputado federal; o influenciador Leandro Ruschel; o youtuber Bernardo Küster; o jornal Gazeta do Povo; Filipe Martins, assessor internacional do presidente; Terra Brasil Notícias; o perfil @Patriotas; as deputadas Carla Zambelli e Bia Kicis. De acordo com a ação, esses perfis acumulavam milhões de seguidores apenas no Twitter, sem considerar as demais plataformas. O monitoramento mostrou que só em julho esses perfis publicaram 434 tuítes associando o PT ao PCC e à morte de Celso Daniel. Em agosto foram 103; em setembro 101, caindo para 34 em outubro graças às ações dos analistas e advogados da campanha de Lula.

O quartel-general petista antifake news foi instalado em São Paulo. Dez analistas acompanhavam, minuto a minuto, o que era disseminado em páginas e perfis de seguidores de Lula na internet

De acordo com Zanin, a narrativa de associar Lula ao crime não nasceu organicamente, mas fez parte da estratégia final da campanha de Bolsonaro. Entre o dia do debate e a véspera do primeiro turno, segundo apurou o site de checagem Aos Fatos, Bolsonaro atribuiu a Lula a pecha de criminoso em ao menos 34 ocasiões. Antes dos conteúdos serem retirados, a desinformação já havia chegado a 1,7 milhão de pessoas apenas no YouTube da Jovem Pan e alcançado 38 grupos de WhatsApp e Telegram monitorados.

Zanin explicou que o trabalho conjunto do seu escritório – que trabalhou na defesa de Lula desde o início da Lava Jato – e o de Aragão, que já tinha tido experiência com o enfrentamento de fake news nas eleições de 2018, ajudou muito no contra-ataque deste ano. “Essa visão multidisciplinar que usamos na defesa de Lula na Lava Jato foi levada para essa equipe conjunta”, disse. “Um dos aspectos que sempre nos intrigou foi como fazer um combate às fake news, que foi um problema em 2018 e que seria também nestas eleições.” O TSE, disse ele, já tinha sinalizado que essa era uma grande preocupação para a campanha de 2022.

O que mudou em relação a 2018 foi que os advogados perceberam que, além da parte jurídica, precisariam de suporte da parte digital, o que não ocorreu na eleição passada. Era necessário que tivessem com eles uma expertise em redes sociais. “Conversando com o Marcos Carvalho, surgiu esse trabalho comum”, disse Zanin. “Ele nos subsidiou com muitos dados das redes que foram importantes para ganharmos essa guerra.” A equipe de Carvalho, segundo Zanin, acompanhava com precisão não só o que circulava de notícias falsas e desinformação. Mas permitiu traçar um caminho de como essas fake news estavam se reproduzindo e quais os perfis que estavam sendo relevantes na produção e disseminação da desinformação. “A gente tinha ali movimento permanente, desde o início da campanha. Era um trabalho multidisciplinar para se acompanhar o caminho de circulação das fake news e, dessa forma, nortear uma atuação estratégica para combatê-las.”

Explicou que esse norteamento era importante porque não adiantava levar ao tribunal qualquer assunto e qualquer perfil. Precisava estar tudo muito comprovado. “Na reta final, o resultado desse trabalho com o Marcos e outros profissionais nos permitiu mapear a cadeia organizada de perfis que produzem e disseminam fake news montando, assim, o ecossistema de desinformação que serviu para a ação de investigação eleitoral.” Com esse mapa da desinformação, o TSE mandou desmonetizar vários sites que atuavam na produção de conteúdo falso.

O dia a dia da caça às fake news era tenso. Os escritórios recebiam as informações dos analistas e entravam imediatamente com representação no tribunal para derrubar o material falso. Descobriram que vários perfis tinham os mesmos atores envolvidos, e isso chamava a atenção. Perceberam, assim, que não era algo casual e circunstancial. Era, na verdade, um modelo de operação, produção e divulgação de notícias falsas, que resultou na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) movida pelos escritórios de advocacia contra a campanha de Bolsonaro. De acordo com Zanin, a campanha de Lula ganhou dezenas de ações que derrubaram um número infindável de links e perfis do presidente, de seus filhos e apoiadores. Levantou-se um conjunto de teses bolsonaristas que foram declaradas falsas pelo TSE, tais como ligações com o crime organizado, aborto, banheiro unissex. Todas elas eram replicadas da mesma forma por uma rede de apoio a Bolsonaro.

Essa estratégia por parte da campanha petista falhou em 2018 porque havia dificuldade de se fazer uma cadeia probatória. Havia uma certa limitação tecnológica para se compreender o modelo e atacá-lo com uma ação mais potente, que é essa AIJE. “A somatória de análises jurídicas junto com análise de estratégia digital ajudou na compreensão plena e na elaboração dessa ação que culminou na desmonetização dos perfis e das páginas.”

Zanin diz que é fundamental a modernização da advocacia. “Para ter ações na justiça com resultados é preciso uma cadeia probatória robusta. Se na parte digital não houver experts que deem um suporte para advocacia é muito difícil fazer frente e descobrir os ilícitos no mundo digital.” Para ele, cada vez mais a advocacia precisará ter uma visão multidisciplinar, contemplando vários ramos de direito, além de buscar suporte tecnológico.

O advogado está seguro de que o trabalho de rastrear o ecossistema das fake news, que teve a colaboração da pesquisadora Fernanda Sarkis, foi fundamental para desarmar Bolsonaro. Disse que houve uma reação grande da campanha adversária em razão da vitória que a campanha de Lula obteve nesse universo digital e que serviu para derrubar muito material espalhado pela rede que sustentava essas teses bolsonaristas baseadas na desinformação. “Eu não tenho dúvida de que as ações abalaram bastante a estrutura dessa rede de notícias falsas que sustentaram a campanha bolsonarista em 2018.”

O marqueteiro e estrategista digital Marcos Carvalho não esconde seu entusiasmo com o resultado da campanha. Não apenas por ter desmontado, em parte, a estrutura bolsonarista nas redes. Mas também por entender que, com isso, fez justiça de alguma forma ao amigo Gustavo Bebianno – personagem chave da campanha de Bolsonaro em 2018 que, após “ter dado o sangue” para eleger o capitão, foi escorraçado pelo presidente menos de dois meses após a eleição. Carvalho não esconde sua decepção: “Bolsonaro não é líder de nada. Para mim, ele é um mistério. Eu até entendo que uma pessoa com pouca instrução e baixa escolaridade virasse massa de manobra dele nas redes. Mas ver médicos, advogados, liderados por esse sujeito, isso é incompreensível para mim.”

Carvalho estava exultante também com o fato de ter trabalhado em duas campanhas vitoriosas seguidas: a de Bolsonaro em 2018, e a de Lula agora. Diz que a eleição de 2022 foi ganha no detalhe e cita alguns exemplos. “Os adversários não conseguiram emplacar nada muito forte nas redes porque nós conseguimos desarmar antes. A história da perseguição às igrejas foi forte. Mas não se sabe se em função das redes ou das igrejas evangélicas, que trabalharam dentro dos templos”, disse. “Eles não tiveram grande êxito porque desarmamos muitas bombas.”

Outro exemplo citado por ele foi a prisão de Roberto Jefferson, ponto de desgaste para Bolsonaro. Para tirar a notícia do foco, a campanha bolsonarista tentou criar um fato novo, o das rádios que não veiculam a propaganda eleitoral gratuita bolsonarista, mas cuja tese não se sustentou.

Outra iniciativa das redes bolsonaristas – que foi percebida e imediatamente comunicada a Zanin – foi a visita de Lula ao Complexo do Alemão, conjunto de favelas na Zona Norte carioca. Logo as telas da sala de “situação”, como ele se refere à sala de monitoramento de rede, captaram a mentira que vinha sendo espalhada nas redes: a de que Lula tinha tido apoio de traficantes para organizar o evento. Os advogados imediatamente entraram com ação no TSE. “Nós monitorávamos todo o tempo o que estava sendo mais difundido. Identificávamos a falsidade do material e avisávamos o Cristiano, que logo tomava uma medida judicial. Era assim que funcionávamos. Operamos de forma conjunta e muito ágil”, conta.

Outro caso captado pelo sistema de monitoramento foi o dos padres expulsos da Nicarágua – notícia utilizada pelas redes bolsonaristas para dizer que Lula faria o mesmo no Brasil. “Eles queriam induzir o eleitor ao erro. Percebemos o impulsionamento nas redes e nos perfis bolsonaristas, e os advogados trataram de desmontar judicialmente.” Junto a isso, as plataformas eram notificadas pela Justiça e orientadas a desmonetizar essas redes. Assim, elas perdiam a força na produção de conteúdo falso. Um momento tenso na sala de monitoramento foi a entrevista de Lula no Jornal Nacional chamando parte do agronegócio de fascista. “Os bolsonaristas se aproveitaram demais dessa fala. Foi muito ruim para a campanha petista”.

As cinquenta telas da sala de situação, de acordo com Carvalho, monitoravam várias personalidades políticas por estado e por região – tanto aliados e eleitores de Lula como os do campo adversário. Os influenciadores de direita, políticos e youtubers bolsonaristas eram permanentemente analisados. Na sala havia cinco sistemas diferentes combinados e, com essas plataformas, os analistas catalogavam os influenciadores e verificavam o peso e a influência social de cada um para saber quais precisavam ser mais acompanhados. Também monitoravam os vários influenciadores que estavam abaixo desses, mas que ajudavam a difundir a informação mais rapidamente.

Através dos monitores, eles também classificavam os assuntos mais difundidos nas redes bolsonaristas dentro de alguns campos temáticos e regionais, como os influenciadores de educação, economia, meio ambiente, religião. A internet não tem fronteiras, mas tem um tipo de impacto diferente se o influenciador está no Centro-Oeste, no Sul, no Nordeste. “A direita faz isso muito bem. Ela sabe como utilizar o assunto que interessa mais a cada região”, explicou. Além disso, asseverou, toda vez que havia alguém da família Bolsonaro republicando algo que o influenciador falava, a proporção da mensagem e seu alcance cresciam exponencialmente, além de ratificar a informação. Assim, era fundamental agir imediatamente para bloquear a disseminação do conteúdo.

Carvalho contou que a campanha deste ano foi muito mais desafiadora que a de 2018, quando ele atuou ao lado de Bolsonaro. “Diferente de 2018, não havia TikTok nem Kwai. O Kwai, inclusive, tem um perfil de consumo curioso: 70% do público dessas plataformas está no Nordeste.” Com isso, a campanha bolsonarista tentou, através delas, furar a bolha petista na região. “Talvez o trabalho mais importante foi criar um muro de contenção para evitar que furassem nossa bolha.” Mas o trabalho foi árduo. De acordo com Carvalho, o Auxílio Brasil ajudou muito a furar bolha petista no Nordeste porque havia muito conteúdo circulando por essas duas plataformas. O Kwai, explicou o marqueteiro, é semelhante ao TikTok, só que com um público mais popular. Por isso, o poder de penetração dessa plataforma na bolha petista era muito forte.

Através do Kwai, os bolsonaristas traziam para a realidade dessa população, basicamente preocupada com economia popular, temas como a ameaça de o Brasil virar uma Venezuela, comunismo, fechamento de igrejas e o clássico tema ideologia de gênero de Bolsonaro. “Eles passaram a circular essas informações falsas numa rede popular com penetração enorme nas classes menos favorecidas”, informou.

De acordo com Carvalho, a ação do Judiciário em conjunto com o trabalho dos especialistas em rede e mais a desmonetização dos sites que produzem conteúdo falso foram um importante antídoto contra a difusão das fake news. “A internet não é um mundo sem lei, um mundo do anonimato, embora as pessoas acreditem nisso”, afirmou. “O erro das campanhas em 2018 foi achar que só poderiam combater a desinformação na própria rede. Mas não é assim. Somos regidos pela Constituição do mesmo jeito que todos os outros serviços.” O pulo do gato do Cristiano Zanin, afirma Carvalho, foi juntar inteligência, monitoramento de rede e ação jurídica veloz. “Foi com esse tripé que ele derrotou o exército digital de Bolsonaro.”

Texto publicado originalmente na Folha UOL.


Sandro Caron, em imagem sem data; policial é cotado para a direção-geral da Polícia Federal no novo governo Lula | Foto: Divulgação/Governo do Ceará

Aliados de Lula tentam emplacar lava-jatista na direção-geral da PF; nome gera polêmica

Andréia Sadi, Julia Duailibi e Octavio Guedes,*g1

A atuação de aliados do presidente eleito Lula (PT) a favor do delegado Sandro Caron para dirigir a Polícia Federal levantou discussão interna e polêmica no grupo de transição. Isso porque Caron foi responsável pela Diretoria de Inteligência Policial (DIP) da Polícia Federal durante a Lava Jato, operação que levou à prisão Lula em 2018.

Caron atuou junto com o então diretor-geral da PF, Leandro Daiello, durante as fases de maior repercussão da operação, quando o ex-juiz Sergio Moro gozava de prestígio inclusive perante a corporação – depois foi considerado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) parcial no julgamento de Lula e teve mensagens com procuradores da operação divulgadas pela Lava Jato.

Nos últimos dias, no entanto, segundo o blog apurou, Caron passou a ser citado como um dos nomes cotados para a vaga. Outro nome cotado é o de Andrei Passos, que foi chefe de segurança da campanha de Lula.

Dentro da PF, delegados ouvidos pelo blog confirmam que passou a circular como cotado o nome de Caron, que tem a simpatia do ex-governador do Ceará Camilo Santana (PT) – de quem foi secretário de Segurança Pública e Defesa Social –, que é próximo de Lula e cotado para um ministério. Advogados próximos a Daiello também trabalham por ele.

Na transição, no entanto, o nome é visto com resistência uma vez que seria pouco provável que Caron não soubesse dos métodos da operação que sempre foram questionados pela defesa de Lula e pelo PT em geral.

Caron já foi superintendente da PF no Ceará e no Rio Grande do Sul.

Texto publicado originalmente no portal do g1.


Protesto em Embu das Artes, na Grande São Paulo. Foro: reprodução DW Brasil | Andre Penner/AP/picture alliance

Tranquilidade após vitória de Lula é traiçoeira

Philipp Lichterbeck -ColunaCartas do Rio | DW Brasil

Joe Biden disse a seguinte frase: "A democracia não pode sobreviver quando um dos lados acredita que há apenas dois resultados para uma eleição: ou eles vencem ou foram enganados." Ele falava sobre os Estados Unidos, mas poderia facilmente estar se referindo ao Brasil.

A boa notícia é que até agora a democracia brasileira sobreviveu à ameaça bolsonarista. As instituições do país estão funcionando. Os militares não estão interessados em aventuras. Grande parte da elite política tem mais interesse na estabilidade e na continuidade do que em tumultos e ruptura. O que também tem a ver com o fato de que muitos políticos esperam receber cargos e vantagens em um novo governo. É o velho "toma lá dá cá", que deveria acabar, mas que continuará fazendo parte da realidade enquanto não houver uma reforma do sistema político.

Até mesmo Jair Bolsonaro parece ter se resignado amargamente à derrota. Isso depois de, aparentemente, esperar em vão durante dois dias por uma revolta popular (armada?) e relatos de fraude eleitoral que ele poderia ter explorado. Foi impressionante a rapidez com que ele foi abandonado por aliados como Tarcísio de Freitas, Romeu Zema e Arthur Lira, que rapidamente perceberam que esta batalha estava perdida.

Discute-se orçamento em vez de "mamadeiras de piroca"

A maior parte da mídia noticiou os bloqueios em rodovias e protestos em frente a quarteis do Exército corretamente como "antidemocráticos". Apenas a Jovem Pan, com suas aspirações de virar a "Fox News do Brasil", afirmou que "o povo" rejeita Lula e agora estava levando "sua vontade" para as ruas. Como se o povo não tivesse acabado de expressar sua vontade nas urnas.

Agora, certa normalidade política retorna ao Brasil. Um sinal claro disso é a discussão sobre o orçamento para 2023, e não sobre "mamadeiras de piroca", "golden showers" ou "uma cara de homossexual terrível". Nesse processo torna-se claro quem realmente roubou do Estado brasileiro. Para garantir seu poder, Bolsonaro deixou um rombo de R$ 400 bilhões no orçamento e desmoralizou instituições construídas ao longo de muitos anos.

Os setores da educação, saúde e proteção ambiental estão em pior estado do que há quatro anos. O patriotismo de Bolsonaro, assim como a sua afirmação de fé cristã, nunca foram substanciais, mas meramente retóricos. A verdadeira bandeira de Bolsonaro não é a brasileira, mas a de seu clã.

Exemplo do trumpismo

Muitos brasileiros estão aliviados com o fim do pesadelo dos constantes tumultos, insultos e escândalos. Mas essa tranquilidade é uma ilusão.

Está de volta uma rotina que os bolsonaristas não querem de modo algum. Eles se veem como um movimento revolucionário e disruptivo contra um establishment de esquerda, que domina as instituições, o Judiciário, a mídia e as universidades. A Jovem Pan, portanto, está certa sobre uma coisa: este movimento fanático nunca aceitará Lula, e sim afirmará para sempre que Lula é o maior ladrão da história e que não deveria ter recebido permissão para concorrer novamente à Presidência.

Tão inteligente e eloquente quanto pouco escrupuloso e perigoso, uma figura como o deputado federal eleito Nikolas Ferreira já anunciou que seu principal objetivo será causar problemas e atrapalhar. O novo governo deve ser obstruído da forma mais brutal possível.

O modelo  vem dos EUA, onde o trumpismo sequestrou o Partido Republicano e o transformou em um instrumento de fanatismo religioso, separatismo e irracionalidade. O trumpismo não é patriótico, como alega, mas uma ameaça à democracia e à unidade dos Estados Unidos, que correm o risco de se desintegrar se Trump continuar a ter sucesso.

A narrativa da fraude eleitoral já circula no Brasil: Bolsonaro se tornou vítima de uma conspiração que ninguém pode provar, mas da qual os bolsonaristas estão firmemente convencidos. A narrativa de ser vítima é central para todos os movimentos de extrema direita ao redor do mundo. Por quê? Porque se você é vítima, você tem o direito e até mesmo a obrigação de se defender.

Pode-se notar a profunda frustração por meio das postagens repletas de ódio contra moradores de favelas, nordestinos, negros e outros eleitores de Lula. Como se tivesse ocorrido uma grande injustiça que precisa ser revertida.

Lula pode pedir unidade, paz e reconciliação o quanto ele quiser. Ele e sua coalizão podem tentar voltar à política normal. Mas com estes extremistas não haverá unidade, paz, reconciliação e política normal.

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Philipp Lichterbeck queria abrir um novo capítulo em sua vida quando se mudou de Berlim para o Rio, em 2012. Desde então, colabora com reportagens sobre o Brasil e demais países da América Latina para jornais da Alemanha,Suíça e Áustria Ele viaja frequentemente entre Alemanha, Brasil e outros países do continente americano. Siga-o no Twitter em @Lichterbeck_Rio.

O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

Matéria reproduzida do portal DW Brasil


Foto: Elaine Menke/Câmara dos Deputados

Alta infidelidade

Wilson Lima*, UOL

Apesar de o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, ter dito ontem que a sigla será oposição ao governo Lula, integrantes da Câmara já admitem que pelo menos 50 parlamentares dos principais partidos que compõem a base bolsonarista na Casa vão votar de acordo com os interesses de Lula a partir de janeiro do ano que vem.

Nos cálculos de quatro lideranças partidárias ouvidas por este site, pelo menos 30 deputados do PL serão infiéis ao futuro presidente de honra da sigla – Jair Bolsonaro; no caso do PP, a defecção será de pelo menos 18 congressistas, conforme cálculos de lideranças partidárias. Esse movimento, ainda incipiente, foi antecipado na semana passada por O Antagonista.

Graças ao bolsonarismo, o PL elegeu 99 deputados federais que vão assumir seus respectivos mandatos em fevereiro do ano que vem. Destes, 40 são considerados extremamente fiéis ao presidente da República e os restantes (29) são tidos como “nem-nem” – nem Lula, nem Bolsonaro.

Na avaliação de parlamentares, essas defecções não tendem a gerar processos por infidelidade partidária. O Antagonista apurou que Valdemar Costa Neto deve adotar uma postura mais maleável em relação a esses congressistas.

Contando com esses números, o PT acredita que Lula pode iniciar seu mandato com uma base parlamentar mínima de 264 parlamentares, contando, além dos infiéis de PP e PL, com as futuras bancadas de MDB, PSD e dos partidos que já compõe a base petista: PDT, PSB, PV, PCdoB, Solidariedade e PROS.

Esse número de votos seria suficiente para, por exemplo, aprovar projetos de lei e livrar Lula de eventuais processos de impeachment.

Agora, o PT também busca apoio da União Brasil. Assim, caso os petistas consigam costurar acordos com os 59 deputados da sigla, o governo Lula poderia ter o apoio de até 323 parlamentares – o suficiente até para fazer mudanças de caráter constitucional.

Texto publicado originalmente no UOL.


Presidente Nacional do Cidadania23, Roberto Freire

Nota oficial: Cidadania defende transição democrática e condena movimentos golpistas

Cidadania23*

Reunida nesta terça-feira (8), a Executiva Nacional do Cidadania manifestou total apoio ao processo de transição democrática entre os governos Bolsonaro e Lula, coordenado pelo vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin.

E condenou, de forma veemente, a tentativa de partidários do atual presidente, com apoio oficial e velado de pessoas próximas a ele, de solapar a legitimidade das urnas em protestos de caráter claramente golpista.

A esse movimento que fala abertamente em rompimento democrático, se somam outras manifestações de cunho racista, xenofóbico e segregacionista, com gestos e comportamentos já vistos em outros tempos sombrios da história e que devem ser prontamente repudiados pela sociedade brasileira.

Sufocadas essas bolhas nazifascistas, o Cidadania espera que surja do processo de transição entre as gestões um governo que represente a diversidade de visões de mundo observada na frente ampla que deu a vitória a Luiz Inácio Lula da Silva e suplantou o fascismo bolsonarista pelo voto livre e universal.

Que as cenas deploráveis a que o Brasil assiste sejam apenas o último suspiro do golpismo de extrema-direita no Brasil, o que depende do êxito do novo governo em endereçar corretamente os problemas que afligem a população, como fome, desemprego, estagnação econômica e destruição do meio ambiente.

O Cidadania seguirá apoiando, como sempre, os projetos e as reformas de interesse do país.

Roberto Freire
Presidente Nacional do Cidadania

Texto publicado originalmente no portal Cidadania23.


Ilustração: Mila Benassi para o Intercept Brasil

Lula precisa fazer o Brasil recuperar o controle sobre o armamento de civis

The Intercept Brasil*

Acabou, mas não chegou ao fim. Após quatro anos da nefasta gestão de Jair Bolsonaro, somos um país com um povo mais radicalizado, à vontade para ser preconceituoso, xingar desafetos e resolver qualquer bate boca no tiro.

Os CACs –  sigla para caçadores, atiradores esportivos e colecionadores – já têm em mãos mais de 1 milhão de armas, mas o Exército falha em sua missão de fiscalizá-las e não sabe exatamente quais são e onde estão. O resultado? CACs estão vendendo e alugando armamento para o PCC, o Comando Vermelhomilicianos e assaltantes de banco. Depois dos decretos de Bolsonaro, criminosos passaram a ter acesso a armas mais modernas, mais potentes e mais baratas.

As armas são o elefante na sala da vez. Muito pouco se falou sobre elas durante a campanha presidencial e há grande expectativa sobre o que vai acontecer. Aliados de Bolsonaro que são CACs ou simpatizantes da política do libera geral já postam nas redes sobre o medo infundado de perder suas armas e seus clubes de tiro. O maior expoente das medidas de afrouxamento do Estatuto do Desarmamento, o presidente do ProArmas Marcos Pollon, eleito deputado federal pelo Mato Grosso do Sul, nem assumiu e já postou sobre o impeachment de Lula. No mesmo vídeo, ressaltou versículos bíblicos, prometendo “não se dobrar”.

É fato que não há clima e aprovação política para um Estatuto do Desarmamento 2. Mas também é fato que não houve ou há, até o momento, movimentações no sentido de desarmar a população. Não podemos, contudo, deixar para depois o problemas da violência armada, o da falta de pulso do Exército nessa fiscalização e o da facilidade com que criminosos estão comprando armas legais, muitas delas mais potentes do que as das polícias.

E não é por falta de propostas para mudar esse cenário que ele se perpetua. Existem leis, decretos e mecanismos referentes a armamentos e munições que nunca saíram do papel e devem ser acionados o quanto antes para mitigar o estrago da gestão armamentista de Jair Bolsonaro.

A medida mais básica é integrar o Sistema Nacional de Armas – o SINARM, operado pela Polícia Federal, que reúne informações sobre concessões feitas à civis – e o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas – o SIGMA, que abrange informações de armas de policiais, militares e CACs, gerido pelo Exército. Estipulada há quase 20 anos pela lei 10.826, ela não se concretizou, mesmo após o Ministério Público Federal ajuizar uma ação civil pública em 2008 para obrigar o Exército a cumprir a legislação.

Órgãos importantes para a construção de estratégias de enfrentamento ao tráfico de armas e munições e para a investigação de crimes são prejudicados pela inação das Forças Armadas há muitos anos. Elas nunca cumpriram as leis e decretos sobre o tema e, em 2011, fingiram resolver a falta de integração ao distribuir 60 senhas de acesso ao SIGMA. E só.

O Exército e o Ministério da Justiça e Segurança Pública não avançaram na integração dos sistemas que facilitariam o rastreamento de armas e munições, como o Sistema Nacional de Informação de Segurança Pública, o sistema do Ministério da Justiça que agrega dados de segurança pública e pode ser acessado por policiais estaduais, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal.

O atual sistema – que, absurdamente, é de propriedade da empresa Companhia Brasileira de Cartuchos, a CBC – não permite, por exemplo, a geração de relatórios para subsidiar ações de inteligência e fiscalização, prejudicando a investigação de roubos, desvios e extravios. Uma empresa privada gerindo informações de segurança nacional nos deixa, mais uma vez, vulneráveis do ponto de vista social, econômico e político.

Cabe ao novo presidente eleito cobrar o cumprimento de leis, decretos e normas assinados há tempos para mudar este quadro – ou amanhã não será outro dia.

Texto publicado originalmente no The Intercept Brasil.


Agência de rating S&P prevê continuidade econômica com Lula

DW Brasil

Em nota a seus investidores, a agência de notação financeira Standard & Poor's Global Ratings estima que o presidente eleito do Brasil,Luiz Inácio Lula da Silva, não deverá reverter as principais reformas econômicas que levaram a um aumento do investimento privado nos últimos anos.

"A maior parte das revisões regulamentares e o enquadramento para as concessões não foram emendas constitucionais, mas revertê-las por completo implicaria uma maioria simples no Congresso, de que o Partidos dos Trabalhadores (PT) não dispõe", apontaram os analistas da agência de rating  numa nota sobre o que esperar do próximo governo brasileiro divulgada neste domingo (06/10).

"Devido a sua fraquíssima capacidade para investir, acreditamos que o governo de Lula não terá incentivos para reverter completamente as mudanças promovidas pelo governo de Bolsonaro, que levaram a níveis mais elevados de investimentos do setor privado nos últimos anos."

Medidas anti-inflacionárias comprometem financiamento

Na nota enviada aos investidores, a que a agência de notícias Lusa teve acesso, a S&P salienta que não espera uma aceleração significativa no crescimento da economia brasileira, frisando, pelo contrário, que o desempenho econômico é uma principais fraquezas do ponto de vista da análise da qualidade do crédito.

Recuperação econômica com fome e inflação?

"Apesar de as âncoras institucionais serem relativamente estáveis, da estrutura econômica diversificada e de um forte setor externo, a tendência de crescimento do Brasil está estimada em 1,8% entre 2022 e 2024", diz a S&P, que reviu a previsão de crescimento do Brasil para este ano, de 0,8% para 2,5%.

"Os esforços das autoridades monetárias para conter a inflação vão resultar em condições mais adversas para o financiamento doméstico e global, o que abrandará o crescimento para 0,6% em 2023."

PIB cresce, mas abaixo da média mundial

Os analistas estimam ainda que, com novas políticas macroeconômicas e condições de financiamento mais favoráveis, o PIB pode acelerar para um crescimento de 2% em 2024 e 2025. Apesar de ser positivo face à expansão média de 0,4% entre 2012 e 2021, o índice está ainda bem abaixo da média dos mercados emergentes no nível mundial.

Em contraste, logo após ser eleito, o petista esboçou metas econômicas ambiciosas para o país, por exemplo em relação ao acordo de livre-comércio Mercosul-União Europeia.

"Queremos um comércio internacional mais justo [...] Não nos interessam acordos comerciais que condenem nosso país ao eterno papel de exportador de commodities e matéria-prima"; em vez disso, o Brasil precisa ser reindustrializado, frisou Lula em seu discurso de vitória.

Em sua coluna para a DW, às vésperas do segundo turno, o jornalista econômico Alexander Busch também se mostrava otimista: "Se o atual ambiente político explosivo voltar a se acalmar depois das eleições, o governo que assumir em 1º de janeiro terá uma boa situação econômica na largada. Só precisará saber aproveitá-la."

Luiz Inácio Lula da Silva ganhou as eleições presidenciais por uma margem estreita, recebendo 50,9% dos votos, contra 49,1% para Jair Bolsonaro, que procurava um novo mandato de quatro anos. Ele assumirá novamente a Presidência do Brasil em 1º de janeiro de 2023, após dois mandatos entre 2003 e 2010.

av (Lusa,DW)

Matéria publicada originalmente no portal DW Brasil


Equipe de Lula se reuniu com Marcelo Castro nesta quinta-feira (3) | Foto: Assessoria Jean Paul Prates (PT-RN)

Relator do orçamento e Alckmin propõem "PEC da Transição" para garantir verbas da gestão Lula

Cristiane Sampaio*, Brasil de Fato

O Congresso Nacional poderá analisar e votar até o final do ano uma proposta de emenda constitucional que já vem sendo apelidada de "PEC da Transição". O objetivo é que esse texto dê conta de verbas adicionais que precisarão ser previstas no Orçamento de 2023 para financiar programas e ações do primeiro ano da gestão Lula (PT).

O anúncio sobre a proposição da medida veio após uma reunião ocorrida entre o relator do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI), o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), e uma comitiva de senadores e deputados ligados ao PT. O grupo se reuniu nesta quinta-feira (3), no Senado, no que foi a primeira agenda oficial da equipe de transição.

O Congresso Nacional discute atualmente a Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para o ano que vem. Enviado pelo governo Bolsonaro, o texto prevê um salário mínimo de R$ 1.302 a partir de janeiro, taxa básica de juros de 12,5% e inflação de 4,6% em 2023.

Os números, no entanto, só serão fechados quando o Legislativo aprovar finalmente o texto da PLOA, o que deve ocorrer em 16 de dezembro, segundo divulgado pelo presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), deputado Celso Sabino (União-PA). Enquanto isso não ocorre, a equipe destacada por Lula para liderar a transição se movimenta junto a parlamentares para costurar saídas que evitem um rombo no primeiro ano de gestão.

A ideia da PEC foi proposta pelo grupo como forma de solucionar o impasse relacionado à discrepância entre o orçamento previsto pela gestão Bolsonaro para o ano que vem e as promessas de campanha do presidente recém-eleito. A equipe ficou de detalhar os números na próxima semana, mas a situação preocupa o grupo desde já.

"É, seguramente, o orçamento mais restritivo, o que traz mais furo da nossa história, [em] que nós temos ano a ano diminuído os investimentos. Um órgão importante como o DNIT [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes] este ano só tem R$ 6,7 bilhões. Isso é insuficiente até para a manutenção da nossa malha. Nós já tivemos, em governos passados, uma média de investimentos no DNIT em torno de R$ 15 bilhões", comparou Marcelo Castro.

Ele ressaltou que o DNIT já chegou a ter orçamento anual de R$ 20 bilhões. "Apesar de estarmos com quase dez anos depois e com inflação durante todo esse período, estamos diminuindo em valores nominais", lamentou o senador.

Combo

A equipe de Lula tem, no centro da mesa de negociação, a preocupação de garantir o custeio de programas como o Bolsa Família, além de várias outras medidas de caráter social prometidas pelo petista ao longo da campanha. Castro destacou que há um conjunto de desafios pela frente em meio às tratativas sobre o Orçamento de 2023.

"Não tem recurso pro Bolsa Família, pro [programa] Farmácia Popular, pra saúde indígena, pra merenda escolar, então, são muitas as deficiências do orçamento, mas nós temos que trabalhar dentro da realidade. O orçamento em cima do qual estamos trabalhando foi apresentado legitimamente pelo atual governo e, legitimamente, o governo eleito está fazendo gestões para emendá-lo pra que ele possa se adequar à maneira de governar do novo governante eleito legitimamente pelo povo brasileiro", afirmou.

Segundo Castro, a ideia é que a proposta de aprovação da "PEC da Transição" seja apresentada agora às outras lideranças políticas que têm relação com o tema. O grupo pró-Lula entende que é preciso abrir exceções fora dos limites do Teto de Gastos para despesas consideradas "inadiáveis".

"É como o Bolsa Família no valor de R$ 600, que é um compromisso público assumido pelo presidente Lula. E seria inconcebível que 21,6 milhões de famílias recebessem a partir de janeiro apenas R$ 400", disse Castro.

Agenda

O roteiro das tratativas viverá novos capítulos a partir de segunda-feira (7), quando a equipe de transição se reúne diretamente com Lula. Depois, na terça (8), o grupo tem um novo encontro com o senador Marcelo Castro. Também ocorrerão agendas com os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), bem como com o presidente da CMO, deputado Celso Sabino.

De acordo com Alckmin, uma das preocupações do novo governo é evitar que haja paralisação de serviços no país. "Isso não está adequado no orçamento enviado para o Congresso Nacional, então, há necessidade de se ter uma suplementação pra garantir os serviços, as obras e, ao mesmo tempo, por exemplo, o Bolsa Família de R$ 600 reais".

Ainda segundo a equipe, o objetivo é que a PEC tramite em regime de urgência, já que precisaria ser aprovada em dois turnos pela Câmara dos Deputados e pelo Senado até dezembro para valer em 2023. "Tudo tem que ser muito rápido porque tem ainda uma série de procedimentos, então, a rapidez e a agilidade são muito importantes", reforçou Alckmin.

O senador recém-eleito Wellington Dias (PT-PI) disse que uma equipe técnica vai se debruçar sobre o texto da PEC até a próxima semana. "Eu diria que o grande desafio é o tempo. Nós teremos que já na terça-feira ter as condições da redação dessa emenda constitucional, ter a definição dos valores e também a posição do presidente Lula a partir da apresentação a ser feita."

Estrutura

A equipe de transição terá 50 nomes e ainda será formalmente constituída junto ao Diário Oficial da União (DOU) a partir de segunda-feira (7), mesma data em que os trabalhos mais operacionais do grupo terão início no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília (DF), local que já sediou outros gabinetes de transição de governo.

Texto publicado originalmente em Brasil de Fato.


FOTO: ALEXANDRE SCHNEIDER/GETTY IMAGES

Fim de sigilo de 100 anos? As decisões de Lula que poderão afetar Bolsonaro após posse

Mariana Schreiber*, BBC News Brasil

"Eu vou ganhar as eleições, e quando chegar dia primeiro de janeiro, eu vou pegar seu sigilo e vou botar o povo brasileiro para saber por que você esconde tanta coisa. Afinal de contas, se é bom, não precisa esconder", prometeu o petista, no debate do segundo turno da TV Bandeirantes.

Além do fim desses sigilos, outras decisões do próximo governo também poderão afetar a família Bolsonaro, como a troca de comando da Polícia Federal e a escolha do novo Procurador-Geral da República em setembro do próximo ano. O presidente enfrenta acusações de ter interferido nessas instituições para evitar investigações contra si e seus filhos.

Entenda melhor a seguir as decisões que Lula tomará e como elas podem impactar o futuro ex-presidente.

Sigilo de cem anos

A imposição de sigilo de um século ocorreu em situações que ganharam destaque durante o governo Bolsonaro, como nesses quatro casos:

- O cartão de vacinação de Bolsonaro foi colocado em sigilo, em meio à pandemia de covid-19 e no contexto de que o presidente questionava eficácia e segurança dos imunizantes;

- O governo determinou sigilo de cem anos sobre informações dos crachás de acesso ao Palácio do Planalto emitidos em nome dos filhos Carlos Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro;

- A Receita Federal impôs sigilo de cem anos no processo que descreve a ação do órgão para tentar confirmar uma tese da defesa do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, sobre a origem do caso das "rachadinhas";

- O Exército impôs sigilo de cem anos no processo que apurou a ida do general da ativa e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello a um ato no Rio de Janeiro com o presidente Jair Bolsonaro e apoiadores do governo.

As decisões de manter o tema em sigilo são feitas em resposta a pedidos apresentados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), geralmente sob alegação de que documentos continham informações pessoais.

Também há caso em que o governo tentou manter a informação secreta e depois mudou de ideia — como os dados sobre visitas ao Palácio do Planalto de pastores suspeitos de favorecer a liberação de verbas do Ministério da Educação para prefeitos aliados.

O sigilo de no máximo cem anos, decretado em resposta a pedidos de informação do governo, está previsto na lei que acabou com o sigilo eterno de documentos oficiais — a Lei de Acesso à Informação. Ela foi sancionada em 2011 pela então presidente Dilma Rousseff — e foi assinada junto com a lei que criou a Comissão da Verdade.

No artigo 31, a lei prevê que informações pessoais relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem tenham acesso restrito pelo prazo de até cem anos.

Também está lá um trecho que busca conter o uso dessa medida: o texto diz que a restrição de acesso de "informação relativa à vida privada, honra e imagem de pessoa não poderá ser invocada com o intuito de prejudicar processo de apuração de irregularidades em que o titular das informações estiver envolvido, bem como em ações voltadas para a recuperação de fatos históricos de maior relevância".

Em meio à pandemia de covid-19, Bolsonaro questionou a eficácia e segurança das vacinas — e seu cartão de vacinação foi colocado em sigilo

Para o advogado Bruno Morassutti, fundador da agência especializada em transparência Fiquem Sabendo, pessoas que ocupam importantes cargos públicos, como a Presidência da República, não devem ter o mesmo nível de proteção de sua privacidade que cidadãos comuns.

Dessa forma, ele avalia que o governo Lula poderá, sim, revisar com facilidade os sigilos decretados pela gestão Bolsonaro.

"O presidente poderia, diante de alguns casos concretos, determinar a abertura das informações, já que ele é o chefe do Poder Executivo e tem competência jurídica para fazer isso. Ou, eventualmente, ele pode orientar o ministro da Transparência e os membros da Comissão Mista de Reavaliação de Informações a revisar essas decisões de acordo com critérios que ele estabelecesse", afirma.

A Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) é um órgão colegiado composto por nove ministérios: Casa Civil; Justiça e Segurança Pública; Relações Exteriores; Defesa; Economia; Mulher, Família e Direitos Humanos; Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; Advocacia-Geral da União e Controladoria-Geral da União.

Além dessas ações, Morassutti também diz que o governo pode alterar o decreto que regulamenta a LAI ou enviar uma proposta de alteração da lei ao Congresso para que seja adotada uma nova redação que impeça um uso inadequado do sigilo.

"A lei, interpretada da forma correta, não permitiria esse tipo de sigilo. Acontece que ela foi interpretada de uma forma que a torna muito restrita. É uma visão que não interpreta a lei junto com o restante da legislação e com o que a Constituição diz sobre acesso à informação pública", ressalta.

Na sua avaliação, o potencial de impacto do fim desses sigilos vai depender do que for revelado.

No caso das visitas dos filhos do presidente ao Palácio do Planalto, por exemplo, o advogado acredita que há um interesse em saber se houve alguma atuação em encontros com ministros que poderia ser enquadrada como advocacia administrativa, que consiste no crime de patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública.

Os inquéritos contra Bolsonaro

Bolsonaro enfrenta acusações de interferir na Polícia Federal, órgão que tem inquéritos abertos contra o presidente e seus filhos. Uma dessas investigações apura acusações de interferência levantadas pelo ex-ministro Sergio Moro em 2020, quando pediu demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Assim que assumir o cargo, em primeiro de janeiro de 2023, o petista poderá nomear um novo diretor-geral para a Polícia Federal. O novo chefe da instituição, por sua vez, deve escolher novos nomes para postos chaves, como as superintendências regionais.

Para o professor de direito penal da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Davi Tangerino, a gestão petista não vai promover uma "perseguição" à família Bolsonaro, tentando direcionar a atuação da PF contra o antigo clã presidencial, mas deve dar autonomia para que a polícia toque as investigações que julgar pertinentes.

Tangerino lembra que os governos do PT garantiram independência a órgãos de investigação, algo que até expoentes da operação Lava Jato já reconheceram, como o próprio Moro.

"É certo que o governo na época tinha inúmeros defeitos, aqueles crimes gigantescos de corrupção que aconteceram naquela época, mas foi fundamental a manutenção da Polícia Federal para que fosse feito o bom trabalho, seja de bom grado ou por pressão da sociedade, mas isso (a autonomia) foi mantido", disse o ex-juiz da Lava Jato, ao deixar o governo Bolsonaro.

Atualmente, há quatro inquéritos autorizados pelo STF em que o presidente é investigado pela Polícia Federal por suspeitas de diferentes crimes:

- Sobre divulgação de notícias falsas sobre a vacina contra covid-19 (INQ 4888);

- Sobre vazamento de dados sigilosos sobre ataque ao TSE (INQ 4878);

- Inquérito das fake news, sobre ataques e notícias falsas contra ministros do STF (INQ 4781);

- Sobre interferência na Polícia Federal (INQ 4831).

Bolsonaro sem foro

Bolsonaro também enfrenta as acusações de crimes feitas pela CPI da Covid, que estão em apuração pela Procuradoria Geral da República (PGR).

No entanto, a partir do momento em que deixar a Presidência da República, Bolsonaro perde o foro privilegiado e passa a responder por suspeitas na Justiça Comum.

A Polícia Federal poderá continuar as investigações sem autorização do Supremo. As apurações que estão sendo feitas pela Procuradoria Geral da República passarão para a competência de instâncias inferiores do Ministério Público. Os processos no TSE passam para o TRE da região onde houve a suspeita.

Se o Ministério Público decidir fazer uma denúncia contra Bolsonaro, ele será julgado por um juiz de primeira instância.

Uma exceção a essa regra, porém, pode ocorrer no caso do inquérito das fake news, já que nesse caso pessoas sem foro privilegiado estão sendo investigadas no STF, suspeitas de ataques contra a própria Corte e o Estado Democrático de Direito.

Enquanto Bolsonaro perderá o foro privilegiado, seus filhos Eduardo Bolsonaro (deputado federal) e Flávio Bolsonaro (senador) continuam tendo foro especial no STF em casos de supostos crimes relacionados ao seus mandatos. Eduardo Bolsonaro é alvo também do inquérito das fake news.

Dessa forma, ambos podem ser afetados por uma provável mudança no comando da PGR, que hoje é chefiada por Augusto Aras, visto como um aliado do presidente. Seu mandato acaba em setembro.

Quando Lula foi presidente entre 2003 e 2010, sempre escolheu como Procurador-Geral da República o primeiro de uma lista tríplice elaborada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). O petista inaugurou essa tradição, vista como determinante para garantir a independência do Ministério Público Federal.

Dilma Rousseff manteve o procedimento, enquanto Michel Temer nomeou a segunda pessoa da lista tríplice. Já Aras foi nomeado por Bolsonaro sem ter sido selecionado para a lista da categoria.

Lula não se comprometeu na campanha a respeitar novamente a lista, mas Davi Tangerino acredita que ele pode resgatar a tradição, já que a escolha de Aras acabou gerando um desgaste grande para o Ministério Público Federal.

"Foi Lula quem começou (a nomear o PGR pela lista tríplice). Por que mudar agora, justamente para substituir um Procurador-Geral sobre quem sempre pesou a acusação de ser muito dócil com quem o indicou? Eu acho que é um ônus que o Lula não precisa", avalia o professor da FGV.

Flávio Bolsonaro, por sua vez, é alvo de investigação por um suposto esquema de rachadinha (desvio de recursos) em seu antigo gabinete de deputado estadual no Rio de Janeiro. Essa investigação, porém, tramita na Justiça do Rio.

Texto publicado originalmente em BBC News Brasil.


Foto: reprodução/Shutterstock

O que eleitores mais querem saber sobre Lula e Bolsonaro 48 horas antes da votação

BBC News

Mas nem sempre essas dúvidas são facilmente sanadas — especialistas alertam para a torrente de notícias falsas espalhadas por diferentes plataformas.

Por isso, a 48 horas do pleito, a BBC News Brasil elencou as principais dúvidas dos eleitores sobre os dois candidatos à presidência — Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — e buscou as respostas.

Os dados foram colhidos a partir das buscas realizadas no Google nos últimos sete dias.

A maior parte das pesquisas mais recentes sobre Jair Bolsonaro e Lula gira em torno do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB). Aliado do atual presidente, ele foi o delator do escândalo do "mensalão", um esquema de compra de apoio político ocorrido durante o primeiro mandato presidencial do petista.

Roberto Jefferson
Legenda da foto,Roberto Jefferson teve prisão domiciliar revogada por ter descumprido medidas impostas pelo Supremo

Quem é Roberto Jefferson

Presidente de honra do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), o ex-deputado Roberto Jefferson é aliado do presidente Jair Bolsonaro. Ele estava em sua casa no interior do Estado do Rio de Janeiro e teve sua prisão domiciliar revogada nesta semana pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Alexandre de Moraes, por violar os termos de seu benefício.

Jefferson resistiu inicialmente à prisão, disparando contra policiais da PF (Polícia Federal) e atirando granadas contra eles. Dois agentes ficaram feridos.

Ele foi preso em flagrante. Nesta quinta-feira (27/10), Moraes converteu a prisão em flagrante de Jefferson em preventiva (por tempo indeterminado).

Bolsonaro tentou desvencilhar sua imagem da de Jefferson, chamou-o de "bandido", apesar de criticar sua prisão que, segundo ele, carece de "inquérito" e "atuação do MP (Ministério Público)". Disse também que não havia fotos dos dois juntos, o que não é verdade.

"Não tem uma foto dele comigo, nada", disse.

Mas imagens dos dois juntos estão registradas e foram divulgadas pelo PTB.

Jefferson foi o delator do chamado "mensalão", um esquema de compra de apoio político ocorrido no primeiro mandato de Lula como presidente — parlamentares recebiam dinheiro em troca de votarem a favor dos projetos do governo. Seu partido, o PTB, fazia parte da base aliada.

O que Bolsonaro fez na carreira política?

Bolsonaro entrou para a política em 1989 ao se eleger vereador pela cidade do Rio de Janeiro. Desde então, foi deputado federal por sete mandatos (28 anos), até ser eleito presidente da República em 2018 com cerca de 58 milhões de votos (55,13% do eleitorado).

Durante sua carreira política, apresentou cerca de 170 projetos de lei, mas apenas dois foram aprovados — um que estende o benefício de isenção do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) para produtos de informática e outro que autoriza o uso da chamada a fosfoetanolamina sintética, a "pílula do câncer", cuja eficácia não foi comprovada; o STF acabou barrando o uso do medicamento.

O jogador Neymar
Legenda da foto,'Acho que ele está com medo de que, se eu ganhar as eleições, eu vá saber o que o Bolsonaro perdoou da dívida do Imposto de Renda dele. Acho que é isso que ele está com medo de mim', disse Lula sobre Neymar

O que Lula falou de Neymar?

O jogador de futebol Neymar apoia abertamente Bolsonaro. Em entrevista ao podcast Flow, em 18 de outubro, Lula comentou o apoio do craque a seu rival, afirmando que Neymar deve estar "com medo" de que um suposto perdão do chefe do Executivo à sua dívida com a Receita Federal seja descoberto.

"Não fico p..., Neymar tem o direito de escolher quem ele quiser para ser presidente", disse Lula. "Acho que ele está com medo de que, se eu ganhar as eleições, eu vá saber o que o Bolsonaro perdoou da dívida do Imposto de Renda dele. Acho que é isso que ele está com medo de mim", acrescentou.

O petista disse considerar "óbvio" que tenha havido um acordo entre Bolsonaro e o pai do jogador, o empresário Neymar da Silva Santos.

"Obviamente o Bolsonaro fez um acordo com o pai dele. E ele agora está com problema com o imposto de renda na Espanha. Mas isso não é um problema do presidente, é da Receita Federal, e não meu", afirmou.

Por meio de um comunicado, a NR Sports, empresa da família de Neymar Jr. que gerencia a carreira do jogador, classificou afirmação como "falaciosa" e "leviana". Também disse que Lula deverá provar o que disse "no palco adequado".

"A NR Sports, seus Diretores e a família do Sr. Neymar da Silva Santos, repudiam a afirmação falaciosa que um dos candidatos à Presidência da República fez de forma leviana, ao acusá-los de práticas de condutas ilícitas supostamente praticadas em conjunto com o atual presidente Jair Messias Bolsonaro", escreveu a empresa no seu perfil no Instagram.

"Para encerrar definitivamente o assunto comunicamos que a informação é falsa. Os responsáveis deverão provar o contrário no palco adequado." "Em um momento importante que o país está vivendo não se espera de um candidato à presidência da república falas como essa, que ultrapassam os limites do razoável da liberdade de expressão", concluiu.

O que Bolsonaro fala sobre aposentadoria?

Em seu plano de governo, Bolsonaro diz pretender "aprimorar o sistema previdenciário, garantindo sustentabilidade financeira e justiça social".

Em vídeo divulgado por sua campanha, ele disse recentemente que o salário mínimo do Brasil irá aumentar acima da inflação para 2023, além de prever aumento real para aposentados, pensionistas e servidores públicos.

"Consertamos a economia do Brasil, estamos arrecadando muito, a partir do ano que vem, a nossa garantia é dar a todos os aposentados e pensionistas um reajuste acima da inflação, a mesma coisa no tocante aos servidores públicos. O valor do salário mínimo também será acima da inflação", afirmou.

Sobre aposentadoria, Bolsonaro foi alvo de fake news. Um vídeo que circula nas redes sociais foi editado para fazer crer que ele cortaria salários de servidores, pensões e aposentadorias em 25% e que essa seria uma proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Já outro vídeo, manipulado para distorcer sua fala, faz crer que Bolsonaro confiscaria a aposentadoria dos brasileiros e nomearia seu aliado, o ex-presidente Fernando Collor de Mello, como ministro da Previdência.

Por que Bolsonaro se aposentou?

Jair Bolsonaro é aposentado pelo Exército Brasileiro.

Ele iniciou sua carreira no Exército em 1973 e entrou para a reserva remunerada em 1989.

Isso aconteceu porque, em 1988, ele foi eleito vereador na cidade do Rio de Janeiro, e assumiu o mandato em 1989.

Segundo o Estatuto dos Militares, o integrante das Forças Armadas, se for eleito para cargo político, será transferido automaticamente para a reserva remunerada.

Essa reserva é diferente da aposentadoria, porque o militar ainda pode ser convocado para as atividades, se for necessário.

Mas, mesmo que queira seguir na ativa, o militar é obrigado ir para a reserva, de modo a evitar a influência de interesses político-partidários.

Em 2015, quando completou 60 anos, Bolsonaro atingiu a idade limite de permanência na reserva remunerada do Exército, passando, portanto, a ser capitão "reformado".

É falso que Bolsonaro receba R$ 68 mil de aposentadoria, como parece mostrar um suposto extrato de pagamento compartilhado nas redes sociais. Segundo o Portal da Transparência, ele recebeu, em agosto deste ano, R$ 11.945,49 brutos por sua atuação como militar.

Também é falso que ele tenha sido aposentado ou expulso do Exército com laudo de "insanidade mental", como alegam algumas publicações nas redes sociais.

Por que Lula não foi ao debate?

Lula não compareceu aos debates do 2º turno que aconteceram no SBT (21 de outubro) e na Record (23 de outubro).

A campanha do petista optou por enfrentamentos contra Bolsonaro apenas na Band (16 de outubro) e na Globo (28 de outubro).

No primeiro turno, Lula já havia optado por não ir ao debate no SBT; já a Record não organizou encontro com os candidatos. Na ocasião, o petista alegou "incompatibilidade de agendas".

Lula já falava que não deveria comparecer a todos os debates, mesmo antes do início da corrida presidencial. Sua campanha argumenta que tais eventos demandam muito tempo de preparação.

Já Bolsonaro disse que o rival "brochou" por não ir ao debate no SBT e o chamou de "fujão" por não ter marcado presença no encontro realizado pela Record.

André Mendonça e Jair Bolsonaro
Legenda da foto,Mendonça ocupou lugar de Marco Aurélio Mello

Quem Bolsonaro indicou para o STF?

Bolsonaro indicou dois ministros para o STF (Supremo Tribunal Federal), instância máxima do Poder Judiciário: André Mendonça e Kassio Nunes Marques.

André Mendonça foi o mais recentemente indicado pelo presidente, em 2021, e ocupou a vaga que era de Marco Aurélio Mello.

Ex-advogado-geral da União (AGU) e pastor presbiteriano, foi descrito por Bolsonaro como "terrivelmente evangélico".

Já Kassio Nunes Marques foi indicado pelo presidente em 2020 e ocupou a vaga que era de Celso de Mello.

Nunes Marques era desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª região.

Piauiense de Teresina, atuou como advogado por 15 anos. Ele é o único nordestino entre os 11 ministros.

Quando Lula nasceu? Quando virou presidente? Quando saiu do poder?

Lula nasceu em Caetés, no interior do Estado de Pernambuco, em 27 de outubro de 1945. Ele tem 77 anos, 10 a mais do que Bolsonaro.

Ele foi empossado como presidente em 1º de janeiro de 2003. Governou o Brasil por dois mandatos e saiu do poder em 1º de janeiro de 2011, quando passou a faixa presidencial à sua sucessora, a ex-presidente Dilma Rousseff, que havia sido ministra da Casa Civil e de Minas e Energia de seu governo.

Jair Bolsonaro leva facada durante campanha de 2018
Legenda da foto,Bolsonaro estava sendo carregado por apoiadores quando levou uma facada na barriga em 2018

Quando Bolsonaro levou a facada?

Bolsonaro foi vítima de um ataque durante um ato de campanha em Juiz de Foras (MG) em 2018.

Ele recebeu uma facada e precisou passar por cirurgia.

O autor do ataque foi identificado como Adélio Bispo de Oliveira. Ele segue preso em uma penitenciária federal em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.

Segundo um laudo pericial, Bispo "permanece com diagnóstico clínico de transtorno delirante persistente" e teria "alucinações de cunho religioso, persecutório e político que se manifestam frequentemente".

Um delegado que cuidou do caso concluiu por duas vezes que ele agiu sozinho e que não houve mandante no atentado contra Bolsonaro.

Em junho de 2020, com base nas conclusões da segunda investigação da Polícia Federal sobre o episódio, o Ministério Público Federal (MPF) em Minas Gerais se manifestou pelo arquivamento do inquérito policial que apurava o possível envolvimento de terceiros no crime.

Apesar disso, Bolsonaro e aliados no governo alegam que o atentado foi orquestrado.

- Este texto foi originalmente publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63426576