dados

Segundo a Fundação Oswaldo Cruz,

Nova alta de casos de covid-19 exige atenção para cuidados e proteção

Mariana Lemos*, Brasil de Fato

Mesmo que o Brasil esteja vivenciando os menores números de contaminações e mortes por coronavírus desde o início da pandemia, cientistas apontam que uma nova onda, causada sobretudo por nova subvariante do vírus, pode estar chegando ao Brasil. Com isso é importante estar atento à saúde e ao calendário vacinal, assim como retomar os cuidados de proteção contra a Covid-19. 

Em diversos estados brasileiros já se está percebendo o aumento do número de casos registrados. Segundo levantamento realizado pelo Instituto Todos pela Saúde (ITpS), no mês passado os testes com resultado positivo saltaram de 3% para 17%. 

Segundo os dados divulgados pelo Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), a média móvel de casos registrados por dia nos últimos sete dias está em 6.181. Entretanto, somente nas últimas 24 horas foram registrados 12.017 casos confirmados. Fora isso, 40 mortes por covid foram registradas nesta última quinta (10) . 

Prevenção

Por isso, é muito importante que a população retome os cuidados e evite a transmissão do vírus, precauções que nos últimos anos viraram rotina e que todo mundo já sabe. 

Além do uso de máscaras de proteção, sobretudo em lugares fechados como no transporte público e em salas de aula, é importante realizar a higiene das mãos com água e sabão ou álcool 70%. Vale também, se possível, evitar aglomerações e, no caso de apresentar sintomas, realizar o isolamento social. A etiqueta respiratória também é válida, ou seja, ao tossir ou espirrar, utilize um lenço de papel para que as gotículas não sejam espalhadas pelo ar. 

E mesmo com todos estes cuidados é importante estar com a vacinação em dia, evitando assim, o contágio pelo vírus. Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), "a vacinação contra a Covid-19 provou ser altamente efetiva na proteção contra casos graves e morte. No entanto, a efetividade da vacinação com as duas doses iniciais diminuiu com a chegada de novas variantes, justificando a aplicação das doses de reforço". 

Portanto procure o posto de saúde mais próximo de você e atualize o seu esquema vacinal, conforme o calendário de vacinação previsto para a sua faixa etária no seu município. Vale lembrar que, salvo raras exceções, toda a população desde os seis meses de idade, pode ser vacinada. 

Edição: Rodrigo Durão Coelho

Texto publicado originalmente no Brasil de Fato.


Foto: Andrii Kobryn/Shutterstock

Revista online | Pobreza sem fronteiras

Marcelo S. Tognozzi*, especial para a revista Política Democrática online (46ª edição: agosto/2022)

A geração destes anos 20 do século 21 é uma geração de sobreviventes. Como há 100 anos, também encarara uma pandemia e uma guerra com potencial de se tornar conflito generalizado, não apenas do ponto de vista político e econômico, como já acontece, mas das armas. As crianças são cotidianamente expostas a todo o tipo de sofrimento num mundo cada vez mais conectado. Infâncias dilapidadas são compartilhadas pelas redes sociais pelos meninos e pelas meninas que um dia, daqui a 20, 30 anos, serão nossos políticos e governantes.

A guerra na Ucrânia mata ao menos duas crianças por dia, dizem os números oficiais da ONU. Aqueles meninos e meninas sobreviventes são expostos a todo tipo de risco, desde tráfico de pessoas a novas e antigas formas de exploração, violação e humilhação. Aqui no Brasil, a pandemia tirou de milhões de pequenos cidadãos pobres o direito ao ensino e à merenda escolar. Os meninos e meninas das famílias da classe média também ficaram sem aulas presenciais, mas puderam aprender pela internet e ir em frente.

A guerra no Leste Europeu cobra sua cota diária de vidas de crianças com bombas e tiros, mas também dizima pela fome outras dezenas, centenas, milhares na África, na América do Sul, no Caribe e na Ásia. O conflito fez subir os preços da comida, do gás de cozinha, dos combustíveis, e o empobrecimento é generalizado. Qualquer um que ande pelas ruas do Rio e de São Paulo, de Porto Alegre ou Belo Horizonte, Recife ou Salvador irá cruzar com famílias inteiras vivendo amontoadas, transformando caixotes de papelão em lares.

Confira, abaixo, galeria de imagens:

Perdi meu emprego | Foto: editada/Shutterstock
Inflação no preço dos alimentos | Foto: PERO studio/Shutterstock
Distanciamento de pobres e ricos | Foto: MichaelJayBerlin/Shutterstock
Globalização | Imagem: Dilok Klaisataporn/Shutterstock
Investimento | Imagem: LookerStudio/Shutterstock
Pobreza | Foto: yamasan0708/Shutterstock
Refugiados da Guerra da Ucrânia | Foto: Shutterstock
Serviço de uber eats | Foto: nrqemi/Shutterstock
Consequências da Guerra na Ucrânia | Imagem: Miha Creative/Shutterstock
Perdi meu emprego
Inflação no preço dos alimentos
Distanciamento de pobres e ricos
Globalização
Investimento | Imagem: LookerStudio/Shutterstock
Pobreza
Refugiados da Guerra da Ucrânia
Serviço de uber eats
Consequências da Guerra na Ucrânia
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Inflação no preço dos alimentos
Distanciamento de pobres e ricos
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No México, 54,3% das crianças estão em situação de pobreza extrema, sem as condições mínimas de sobrevivência. Na Argentina, a situação não é diferente: 60% das crianças. A África dispensa apresentações, a exemplo da Índia, Síria e Afeganistão.

Infância pobre é o padrão. Olho para as crianças da minha família e agradeço a Deus e ao Universo pela sorte que elas têm de poder comer todos os dias, frequentar escola, usar roupas limpas, sapatos, gozar de lazer, viver num lar onde há respeito e amor.

As crianças vivem na pobreza globalizada, mas acessam a internet, ainda que de vez em quando, e, com o que ainda resta de inocência e sonho, mergulham no mundo das redes sociais, das pessoas bonitas, do consumo e da fartura. A riqueza mora ao lado ou no celular, dependendo da cidade, do bairro ou da rua. Como será a sociedade que estas crianças construirão depois de adultas? A globalização, tida e havida como geradora de riqueza e bem-estar, acabou trazendo mais pobreza e mais sofrimento.

Entre os três estados mais importantes do Brasil, o Rio é o que registra a maior taxa de desemprego. Em maio deste ano, tinha 15% de desempregados ou 1.323.000 trabalhadores sem trabalho. São Paulo registrou 10,8%, e Minas, 9,3%. Os dados são do IBGE. Provavelmente, existam muito mais desempregados, porque a pandemia ceifou a renda de milhões de cariocas agora dependentes da informalidade e que se tornaram camelôs, ambulantes nos sinais de trânsito, famílias amontoadas nas calçadas do Centro, da Zona Sul, em qualquer lugar da cidade.

A vida começou a piorar para os cariocas quando a Petrobras viveu o terremoto das investigações da Lava Jato. Em 2019, o Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) informava que a crise vivida pela Petrobras desde 2015 custou o emprego de 2,5 milhões de brasileiros, o “equivalente a 19% do desemprego” (daquele ano de 2019). O Rio, maior produtor de petróleo, sofreu mais.

Uma psicóloga com mais de 30 anos de clínica, de uma hora para outra, viu seu consultório em Copacabana se encher de pacientes sofrendo de depressão. Eram os demitidos pelas empresas fornecedoras da Petrobras. Aquela classe média chegava ao divã dilacerada. Não perdera apenas o emprego, mas o status, o estilo de vida. Estava sendo obrigada a se mudar de bairro, a tirar os filhos da escola, a recomeçar. Muitos daqueles profissionais superqualificados se refugiaram no Uber, outros mudaram de profissão, alguns conseguiram ir para o exterior. Mas todos, sem exceção, entraram para a estatística do Ineep, na qual estavam incluídos cálculos indicando que 60% dos investimentos realizados no Brasil neste ano de 2022 viriam da Petrobras, o que não aconteceu.

O Rio e a Petrobras tiveram um longo caso de amor que começou nos anos 1950 com a campanha do Petróleo é Nosso e que culminou com a criação da empresa em 1953. Depois de investigada pela Lava Jato, posta de joelhos no exterior pagando multas, algumas secretas, a Petrobras deu uma guinada de 180 graus. Passou a ser a queridinha de grandes fundos de investimentos internacionais como os trilionários The Venture Group e Blackstone. Trocou de amor.

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Hoje, a Petrobras exporta empregos ao invés de se preocupar em repor aqueles tragados pela crise instaurada a partir de 2015. Parece absurdo, mas não é. A empresa tem encomendado plataformas para empresas estrangeiras, deixando de lado as brasileiras onde atuavam os trabalhadores superqualificados, mandados para o divã e, depois, para o Uber. Sem contar os menos qualificados, sem divã ou Uber. Atualmente, das 14 empresas qualificadas para participar de licitações de construção de plataformas, apenas uma, a Queiroz Galvão Naval, é brasileira. As demais são estrangeiras ou controladas por capital estrangeiro.

A exportação de empregos virou algo banal. A empresa Keppel Shipyard apresentou proposta de US$ 2,98 bilhões na licitação das plataformas P-80 e P-82, valor 26% acima do preço estimado pela Petrobras. A Sembcorp Marine Rig & Floaters, segunda colocada, cotou o serviço em US$ 3,6 bilhões. Ambas são empresas de Cingapura, do outro lado do planeta.

É muito esquisito que poucas empresas estrangeiras ditem o preço nas licitações da Petrobras, oferecendo orçamentos acima do estimado. Isso não aconteceu nem nos tempos da Lava Jato, quando o Ministério Público processou empresas acusadas de integrar um cartel. O próprio MP constatou que as empresas do cartel cotavam suas propostas pelo preço máximo estimado pela estatal nas licitações. Imagine se elas tivessem cobrado acima, como estão fazendo as multinacionais de Cingapura.

E por que a Petrobras exporta empregos para Cingapura quando o Rio de Janeiro, onde está sua sede, tem um dos maiores índices de desemprego do Brasil? Nesta era pós Lava Jato, a direção da petroleira decidiu implementar critérios técnicos e financeiros considerados absurdos para a classificação de fornecedores, inviabilizando a participação das brasileiras e também de muitas estrangeiras, que, mesmo estando pré-qualificadas para participar das licitações, se recusam a oferecer lances, diante do excesso de exigências da estatal, as quais vão muito além do praticado no mercado internacional.

 Nesse cenário, as companhias brasileiras, que pagaram multas e fizeram acordos de leniência, continuam sendo punidas, mesmo depois de acertarem as contas com a Justiça. Perderam o direito de competir, mesmo tendo capacidade técnica, pessoal qualificado e potencial para gerar os empregos de que tanto necessitam os brasileiros. 

Uma empresa e seu quadro de funcionários não podem ser confundidos com executivos processados e condenados por crimes. Na Alemanha, a Siemens e a Volkswagen tiveram problemas com a Justiça, mas lá ninguém confundiu pessoa física com pessoa jurídica. A falta de concorrência nas licitações da Petrobras, tão questionada pelas investigações da Lava Jato, ficou ainda maior nos dias de hoje, com três ou quatro empresas estrangeiras participando das licitações e determinando os preços dos projetos bem acima do estimado pela estatal.

É uma injustiça o Rio de Janeiro ser eternamente punido pela Petrobras, que mantém seus estaleiros à míngua, enquanto dá empregos em Cingapura ou na Coréia da Samsung, Hyundai e Daewoo. Esta política mostra o quanto a empresa se desconectou dos brasileiros, ao mesmo tempo que vai na contramão da conjuntura atual. Depois da pandemia e da guerra na Ucrânia, as empresas estratégicas querem proximidade com seus fornecedores, preocupadas em diminuir riscos políticos, geográficos e econômicos.

Um investimento de quase US$ 3 bilhões (cerca de R$ 16 bilhões) numa plataforma representaria uma injeção de dinheiro na economia fluminense capaz de gerar pelo menos uns 10 mil empregos diretos e dezenas de milhares de indiretos. Agora, imagine se multiplicarmos isso por 10, 20 plataformas. Isso mudaria a cara do Rio de Janeiro, refletindo em todo o Brasil. O Rio hoje é uma cidade com alto índice de violência e centenas de milhares de crianças condenadas a serem cidadãs de segunda classe, como acontece nos países nossos vizinhos ou na África.

Num texto brilhante, publicado em março deste ano, meu amigo Jamil Chade, pai de 2 garotos, descreve, com clareza e emoção à flor da pele, a história de meninos e meninas vítimas de todo tipo de violência. Jamil nos leva aos cárceres do Estado Islâmico, à Servia, a um campo de refugiados no Quênia e à cidade de Bagamoyo, na Tanzânia, onde conheceu duas meninas, de no máximo 10 anos de idade, que brincavam no pátio de um hospital. Conversou com elas e mostrou um cartão de visitas com seu nome, porque as garotas não entendiam direito quem era aquele homem branco com um bloquinho na mão e uma câmera fotográfica pendurada no pescoço.

Passou um tempo, e o Correio fez uma conexão Genebra-Bagamoyo. Dentro de um envelope surrado, Jamil encontrou um pedido desesperado de ajuda de uma das meninas. Suplicava que a levasse dali e prometia amor para sempre. Jamil chorou o choro dos impotentes, o mesmo que eu chorei quando li seu texto. Aquela criança faria qualquer coisa – qualquer coisa! – para escapar daquela escuridão miserável: “preciso sair daqui”.

As guerras, a inflação, a falta de educação e de cidadania são irmãs da miséria e da fome. Elas hoje brincam de mãos dadas pelos campos de refugiados da África, nas cidades destruídas da Ucrânia, nas noites de terror do Afeganistão, nas calçadas superpovoadas de Nova Dehli, do Rio, de São Paulo, nas palafitas de Manaus e Belém ou nas ruas de terra batida das periferias de Recife e Salvador.

Estas irmãs, agora, também andam pelas ruas de Paris, Madrid, Londres ou Roma. Em plena pandemia, um amigo diplomata ligou para contar que, em Genebra, os pobres estavam pedindo esmola nos sinais. Nos Estados Unidos, a pobreza também chegou forte. No fim do ano passado, uma pesquisa mostrou que cerca de 30% dos americanos não conseguiam bancar despesas básicas, 12% dos chefes de família amargavam dificuldade para comprar comida e 28% dos negros e 20% dos latinos não pagavam aluguel em dia. A pobreza virou vizinha, habita as calçadas do Champs Élysées, da Gran Via ou uma esquina da 5ª Avenida. Daí o desespero da Comissão Europeia e do governo Biden com a inflação estourando nos 2 dígitos.

Temos uma geração de sobreviventes que, cedo ou tarde, irá se confrontar com outros desta mesma geração tocados pela sorte de estudar, comer, receber amor e respeito. O abismo entre a classe média e os pobres ficou tão grande, tão profundo, a ponto de transformar num privilégio coisas básicas como comer, tomar banho, vestir e estudar. A bomba-relógio armada a partir do pós-guerra dividiu o mundo entre ricos e pobres. Agora, faz tique-taque nas grandes cidades do mundo desenvolvido. A miséria deixou de ser invisível, remota, para se tornar presente, cotidiana, ousada e incômoda.

Antigamente - ou seja, há uma década, no máximo -, uma pessoa saía do Brasil, da África ou da Ásia para ser pobre ou remediado nos Estados Unidos ou na Europa, porque a vida era mais digna, as crianças comiam e estudavam. A brutal concentração de renda patrocinada pelo setor financeiro, tão criticada pelo filósofo Stéphane Hessel, gerou a globalização da pobreza. E ao escrever sobre ela, há mais de 20 anos, o professor Milton Santos foi profético: “A globalização mata a noção de solidariedade, devolve o homem à condição primitiva do cada um por si e, como se voltássemos a ser animais da selva, reduz as noções de moralidade pública e particular a um quase nada”.

Sobre o autor

*Marcelo S. Tognozzi é jornalista e consultor independente. Fez MBA em gerenciamento de campanhas políticas na Graduate School Of Political Management - The George Washington University e pós-graduação em Inteligência Econômica na Universidad de Comillas, em Madri.

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de agosto/2022 (46ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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El País: Brasil chega a 200.000 mortes na pandemia com SUS sob pressão

País enfrenta um cenário difícil com doença mais uniforme entre as regiões enquanto a estratégia de vacinação segue imersa em dúvidas. Atrasos em testes e na atualização de prontuários turvam análise

Beatriz Jucá e Jorge Galindo, El País

O Brasil supera a dura marca de 200.000 mortes pela covid-19 em sua contagem oficial com um cenário nebuloso pela frente. O país está prestes a entrar na sazonalidade que favorece a circulação de vírus respiratórios e espera um repique pelas aglomerações das festas de fim de ano enquanto se vê imerso em uma série de obstáculos para iniciar a vacinação e ainda não tem uma política efetiva para frear os contágios mesmo com a iminência de uma variante do coronavírus mais transmissível. É neste cenário que o país conta, nesta quinta-feira, 200.498 mortes por coronavírus durante a pandemia e 7,96 milhões de casos ―mais de 87.000 deles registrados nas últimas 24 horas, um pico. Se no início da crise sanitária algumas regiões emanavam maior preocupação no país continental, a situação agora é grave nas mais diversas regiões. Nos últimos meses, o Brasil viu o vírus se espalhar pelo seu território de forma mais uniforme e agravar, por exemplo, a situação em regiões ao sul, que inicialmente tinham mais fôlego pela baixa concentração de casos e agora sofrem com seus sistemas de saúde abarrotados.

Depois de atingir os primeiros 100.000 mortos oficiais pela covid-19, em agosto, o Brasil não registrou picos agudos de mortes por covid-19 como nos primeiros meses da crise. A estratégia brasileira focou basicamente em uma gestão de leitos por prefeitos e governadores, que decidiam ampliar ou reduzir as medidas restritivas frequentemente conforme os dados locais. Em geral, só iniciativas pontuais de restrição circulação foram novamente impostas de agosto para cá, algumas delas só com a intervenção da Justiça, como em Manaus. Medidas para rastrear casos e de fato tentar frear os contágios não foram implementadas como uma política pública robusta. As mortes por covid-19 foram distribuídas em um espaço maior de tempo, mas o Brasil nunca chegou a conseguir controlar de fato a pandemia. Foram mais de 200.000 mortes registradas oficialmente desde março, data do primeiro óbito. Cerca de metade delas a cada cinco meses de pandemia no país.

Mas a perda humana de uma das maiores crises sanitárias pode ser ainda maior. O excesso de mortes já havia ultrapassado 200.000 em relação à média de anos anteriores em meados de novembro, segundo dados do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass). Além disso, o sistema do Governo Federal que registra hospitalizações e mortes por covid-19, o Sivep-Gripe, indicava nesta quarta-feira, dia 6, as cifras de 187.800 óbitos confirmados e outras 80.000 mortes por síndrome respiratória aguda grave (uma complicação da covid-19 e de outras síndromes gripais) não especificadas, nas quais podem estar incluídos casos de coronavírus não registrados por exame por motivos que vão de problemas da coleta à dificuldades de detecção pelo teste laboratorial. A Vital Strategies —uma organização global composta por especialistas e pesquisadores com atuação junto a Governos— já alertou sobre a possibilidade de casos omissos sob a justificativa de que a OMS determina que casos em que os pacientes apresentaram três ou mais sintomas clínicos de covid-19 deveriam ser diagnosticados como suspeitos. O Ministério da Saúde tem dito que os casos são revisados e só depois incluídos no sistema de monitoramento.

Soma-se a isso a demora nas notificações e o represamento de dados que pesquisadores brasileiros têm ressaltado neste momento, quando a demanda por internação hospitalar de infectados pelo coronavírus voltou a crescer em diversos Estados. Isso porque, com a base de atendimento lotada, as fichas demoram a ser preenchidas e notificadas no sistema federal, atrasando a cadeia de dados. O cenário ainda é influenciado pelo represamento durante os feriados de fim de ano, quando tanto laboratórios quanto hospitais atuaram com equipes reduzidas, em regime de plantão.

Pandemia interiorizada

Se antes havia uma ampla concentração nas populosas capitais e cidades metropolitanas, o interior do país já está marcado pelo avanço do vírus e enfrenta a pandemia com sistemas de saúde mais frágeis. O mais recente boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, com dados até o dia 26 de dezembro, mostra que 56% das novas mortes por covid-19 na referida semana já se concentravam em cidades do interior. Esta interiorização da mortalidade é observada desde setembro, quando a concentração de mortes começou a se equiparar entre estes dois perfis.

Em vários Estados, gestores trabalham para tentar ampliar leitos de UTI, mas agora enfrentam maiores desafios para contratar profissionais da saúde, exaustos pelo trabalho na linha de frente ao longo de meses. O Amazonas ―Estado onde já se ventilou a teoria de ter chegado a uma imunidade de rebanho sem vacina e a um preço alto de mortes― vive uma nova onda preocupante. O próprio ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, já afirmou que o Amazonas está caminhando para as proporções do ano passado. E o governador Wilson Lima tem dito que trabalha contra o tempo para abrir mais leitos hospitalares, transformando espaços administrativos em hospitais em salas com leitos clínicos e as de leitos clínicos em terapia intensiva. Lá, a Justiça determinou maiores restrições após o Governo relaxar medida sob pressão de comerciantes e empresários.

Em um contexto em que os vizinhos da América Latina já reagem à alta de casos de covid-19 com novas restrições, o Brasil segue inerte. E parece repetir a mesma posição errática do começo da pandemia. A guerra política entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador João Dória na corrida por uma vacina geraram um clima tenso no país, embora, nos últimos dias, há uma pequena sinalização de trégua, com a decisão do Ministério da Saúde de comprar a vacina paulista desenvolvida com os chineses, a Coronavac. O Governo Federal enfrenta pressão da sociedade, de governadores e até da Justiça para antecipar uma estratégia nacional de imunização depois de atrasos nas negociações tanto de vacinas quanto de insumos. O Governo de São Paulo está na iminência de pedir a autorização para uso emergencial à Anvisa da Coronavac e promete começar a vacinar grupos prioritários no dia 25 de dezembro. Enquanto isso, o Governo Bolsonaro corre contra o tempo para tentar iniciar a vacinação antes. Prometeu começar cinco dias antes de São Paulo, no dia 20 de janeiro. Os cronogramas sobre o quantitativo de vacinas que devem estar disponibilizadas nos postos nos próximos meses ainda não estão definidos.

“A gente lamenta, mas a vida continua”

Já o presidente Jair Bolsonaro segue com declarações que põem em xeque a segurança de vacinas em um momento em que a confiança na ciência é fundamental para garantir uma campanha de vacinação ampla. Especialistas têm sido categóricos ao dizer que a estratégia de imunização é coletiva e que, para chegar à almejada proteção, é preciso que a maioria da população receba os imunizantes. Mesmo que a vacinação comece nas últimas semanas de janeiro, os meses seguintes deverão ser de muito trabalho para garantir esta cobertura vacinal. Mesmo os que receberem a vacina deverão seguir os cuidados como distanciamento e uso de máscara, já que há um tempo até o corpo desenvolver uma resposta imune e a maioria das vacinas necessita de duas doses para uma proteção admissível.

Numa mudança de tom, o Ministério da Saúde emitiu nota de pesar pelas vítimas da pandemia. Assinada pela pasta, o informe expressa solidariedade aos familiares que perderam seus entes queridos e diz fazê-lo em nome do presidente. Pazuello também falou pela primeira vez em “guerra” total contra a doença, que deve estar acima “das ideologias”. “O Ministério da Saúde está trabalhando incansavelmente, acompanhando pesquisas científicas e reforçando diálogos entre o Brasil e outros países para garantir vacinas seguras e eficazes à população”, prometeu o ministério. Já Bolsonaro, em uma transmissão ao vivo nas redes sociais, voltou a questionar os dados sobre mortes, falando que pessoas morreram “com” covid-19, como se fosse possível separar as causas. “A gente lamenta hoje, estamos batendo 200 mil mortes. Muitas dessas mortes com covid, outras de covid, não temos uma linha de corte no tocante a isso aí. Mas a vida continua...”

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