Cristovam Buarque

Cristovam Buarque: Aliança para salvar Brasília

Muitas vezes, a política promove alianças eleitoreiras e em outras, patrióticas. Não é fácil reunir em um mesmo projeto políticos com divergências anteriores. Quando isso ocorre, em geral, estão sacrificando princípios, programas e ideias em função de interesses puramente eleitorais.

Em ocasiões distintas, políticos adversários deixam de lado as divergências para se unirem em defesa de interesses maiores do país ou da cidade. São alianças para salvar a comunidade da crise que atravessa.

O Brasil viu isso quando Prestes, depois de anos preso e sabendo que sua esposa fora enviada para a morte na Alemanha, se uniu a Getúlio Vargas para trazer de volta a democracia; ou quando Mandela se uniu a De Klerk para acabar com o apartheid na África do Sul. São alianças salvadoras. Brasília está precisando de uma dessas.

Governos anteriores do Distrito Federal deixaram uma imagem negativa na política e um desastre fiscal nas finanças. O último governo, além de péssima imagem moral, deixou as contas públicas absolutamente falidas, diante dos compromissos assumidos, irresponsavelmente, para obter votos e se reeleger.

O Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha é o símbolo perfeito desse desastre. Uma obra sem sintonia com as necessidades da população, foco de corrupção de dirigentes, tanto nas prioridades, quanto no comportamento. Gastos de quase R$ 2 bilhões no estádio, no lugar de escolas, saneamento e saúde. Apropriou-se de parte disso sob a forma de propina, segundo a Polícia Federal.

Lamentavelmente, o estádio é uma entre dezenas de outras medidas imorais que destruíram o bom funcionamento da nossa cidade e a credibilidade de nossos políticos. O governador atual assumiu uma cidade com compromissos que não tem como cumprir, sejam aqueles determinados por seu antecessor, sejam alguns que ele prometeu na campanha eleitoral de 2014.

O resultado é que seu governo se arrasta há dois anos e meio no pântano das dificuldades fiscais — todos recursos são para pagar salários e outros poucos custeios. Apesar de receber mais de R$ 13 bilhões do Fundo Constitucional, que o resto do Brasil, inclusive estados pobres, nos transferem anualmente, agora não temos como pagar os salários de nossos servidores em dia.

Quando o governador assumiu, em 2015, deveria ter chamado todas as lideranças políticas, inclusive, os seus opositores, para tentar encontrar um caminho, com apoio de todos, e enfrentar as dificuldades. No lugar disso, preferiu se isolar com um pequeno grupo de auxiliares, que se consideram em condições de resolver todos os problemas. Fracassaram.

Brasília precisa superar sua dupla tragédia: fiscal e moral. Equilibrar suas contas, usar seus recursos para servir à cidade e ao seu povo e recuperar a credibilidade de seus dirigentes. Isso não será tarefa de nenhum líder carismático, de nenhum partido. Exige uma aliança de todos que tenham sentido de responsabilidade e respeito aos interesses públicos.

A aliança para salvar Brasília não deve abrir mão de convicções e não pode ter preconceitos: deve unir todos os políticos, independentemente de suas posições no passado, desde que respeitem princípios como:

— Não estarem sob suspeitas de corrupção;

— Terem responsabilidade no uso dos recursos públicos, não apenas pela ética no comportamento, mas também na responsabilidade do respeito pelas contas do erário;

— Entender que a gestão pública eficiente é um dos maiores compromissos necessários para servir bem à população;

— Não aparelhar e usar a máquina governamental para beneficiar seus partidos;

— Respeitar o mérito dos escolhidos para cargos e comprometer-se com a austeridade que elimine as chamadas mordomias e vantagens pessoais;

— Em nenhum momento cair na demagogia de prometer mais do que poderá fazer. Não se submeter às reivindicações de grupos corporativos, seja de empresários, seja de igrejas, seja de sindicatos de servidores;

— Definir um programa claro para corrigir os graves problemas na saúde, no emprego, na educação, na mobilidade, na segurança, no crescimento da economia e, obviamente, no equilíbrio fiscal.

Em termos políticos, os últimos que governaram Brasília contribuíram para que a população tivesse uma visão negativa do Distrito Federal. É preciso que nossas lideranças tenham grandeza e se unam pela cidade em uma aliança patriótica.

 


Cristovam Buarque: O pior déficit

O Congresso Nacional se prepara para saltar da responsável aprovação do teto nos gastos públicos para a irresponsável aprovação do desvio de R$ 3,6 bilhões, com o objetivo de financiar as campanhas eleitorais no próximo ano. Um dia, preocupado, o povo assiste ao presidente da República dizer que o Brasil sofre a falência dos serviços públicos por falta de dinheiro; no outro, perplexo, assiste que haverá dinheiro para financiar campanha milionária: R$ 2 milhões por eleito — deputados federais e estaduais, governadores, presidente; R$ 30 pagos por eleitor. Ao assistir a estes dois fatos — falta de dinheiro para os serviços e dinheiro sobrando para as eleições —, o povo desacredita ainda mais de seus governantes, sobretudo depois do reconhecimento de um déficit de R$ 159 bilhões em 2017.

A oposição também fica desacreditada ao tratar o povo como se ele não soubesse que este déficit foi provocado sobretudo pela irresponsabilidade de seu período no governo. Chega a ser cínica a afirmação de que este custo das eleições é pequeno, quando sabemos que seria suficiente para enfrentar as dificuldades da nossa ciência e tecnologia, por exemplo. Também é cinismo dizer que a democracia exige estes gastos, sem levar em conta que nossas eleições estão entre as mais caras do mundo; ou ainda ao dizerem que o recurso sairá das emendas de parlamentares, quando este dinheiro é pago pelo contribuinte, e as emendas dirigidas para atender necessidades da população.

Graças ao teto dos gastos, o povo sabe que o dinheiro é curto e será tomado dele para financiar as campanhas, caracterizando uma corrupção nas prioridades. É uma vergonha dizer que este gasto é necessário para fortalecer a democracia: não há democracia sem políticos com credibilidade e não há credibilidade em um Parlamento cujos membros um dia aprovam um necessário teto de gastos, e no outro continuam fazendo uma das mais caras eleições do mundo, sem dar exemplos próprios de austeridade. O Congresso devia determinar medidas que reduzam o custo das campanhas e que elas sejam financiadas pelos filiados e simpatizantes dos partidos e dos candidatos.

Além dos elevados gastos de campanha, o governo precisa dar exemplos: acabando com remunerações acima do já elevado teto salarial que equivale a 35 vezes o salário mínimo do trabalhador; precisa determinar que nenhum de seus dirigentes acumule salários, como aposentadorias; acabar com mordomias e subsídios pessoais. São gestos que têm pouco impacto fiscal, mas um imenso impacto moral. O Brasil não supera sua crise se seus dirigentes não derem o exemplo. E os políticos estão na contramão ao apresentar uma proposta de reforma política que, além de piorar o maldito sistema atual, desvia recursos públicos para campanha eleitoral. Pior que o déficit fiscal é o déficit moral. E esta reforma eleitoral está ampliando essa escassez e comprometendo nossa democracia, no lugar de fortalecê-la. (O Globo – 19/08/2017)


Cristovam Buarque: As causas do desastre

Basta olhar ao redor para perceber o desastre social, econômico, institucional que os líderes deste país, no governo e na oposição, estão deixando como herança maldita para o presente e o futuro. Por ação, omissão ou incompetência, todos somos responsáveis, mas a culpa maior recai sobretudo nos governos liderados pela coalizão PTMDB entre 2003 e 2016. O PTMDB desprezou a gestão pública e entregou os órgãos estatais, Petrobras, fundos de pensão, agências reguladoras e outros, nas mãos de pessoas despreparadas, sem respeito ao mérito e à competência. Até mesmo na escolha do vice-presidente da República, houve desprezo aos interesses maiores do país. Para manter a coalizão, tudo se justificava, inclusive o loteamento do patrimônio estatal.

Ao aliar-se ao PMDB, o PT perdeu também o vigor transformador que caracterizava seu discurso; distanciou-se das promessas reformistas e caiu no assistencialismo com fins eleitoreiros. No lugar de iniciar as transformações na educação para, um dia, os filhos dos pobres estudarem em escolas com a mesma qualidade das dos filhos dos ricos, preferiu vender a ilusão de que o aumento de vagas nas universidades resolveria o triste estado das escolas públicas.

Sem bandeiras transformadoras, aprisionado ao eleitoralismo, caiu na banalização e na institucionalização da corrupção.Deixou-se levar pelo comportamento dos políticos no uso de propinas, como também na definição de prioridades ao construir estádios em vez de melhorar as escolas. As manobras visando ao poder pelo poder, sem bandeiras para o futuro, levou o PTMDB à promiscuidade entre os dois partidos e destes com os empresários. Assumiram que, na política, todos são iguais na falta de propósitos transformadores e na voracidade da corrupção, desmoralizando a política e afastando os jovens da militância.

A corrupção e a falta de gestão teriam sido evitadas se não fosse a surdez às críticas e o culto à personalidade de seus líderes. Não se perguntou por que militantes com solidez ideológica, eticamente respeitados, saíram do partido; nem ouviram os alertas vindos de aliados. Dividiu o mundo político entre nós e eles, colocando do lado “nós” velhos coronéis corruptos e do lado “eles” pessoas sérias, apenas porque os primeiros batiam palmas e os outros criticavam. Políticos com forte tradição de direita viravam esquerda se batessem palmas; esquerdistas críticos eram tidos como de direita, se não aplaudissem.

Esse comportamento levou ao sectarismo, transformando os partidos em seitas, intolerantes com os críticos. Direções e militantes passaram a desconfiar das bases democráticas, da coerência dos partidos, da seriedade dos meios de comunicação, da neutralidade dos juízes. O sectarismo impediu de ver as transformações que ocorrem no mundo, deixando a militância para trás na história. O partido se firmou como defensor de interesses conservadores das corporações e do presente, relegando os interesses nacionais e o longo prazo. Confundiu sindicato com povo, presente com futuro. Não foi capaz de perceber as amarras que impedem o país de avançar.

Para manter-se reacionário sem perder o discurso progressista de antes, optou por falsas narrativas, preferiu marqueteiros a filósofos. Sem substância ideológica, porque os filósofos se transformaram em seguidores, perderam o compromisso com a verdade, passaram a acreditar nas próprias mentiras: “o pré-sal salvaria o Brasil,” o Bolsa Família emanciparia os pobres, “os que divergissem seriam traidores”. Caiu na armadilha dos que acreditam nos dogmas que criou. Tanto que certamente se negará a debater esse artigo, uma vez que só os aliados merecem ser lidos.

A luta do PT foi um dos maiores saltos de toda a história política do Brasil. Seus desvios nos últimos anos foram uma traição à pátria, ao provocar desperdício da esperança e do potencial para realizá-la. O enfraquecimento do PT, pela desconfiança da população, pelo afastamento de muitos de seus militantes e pela prisão mental em que estão os que ainda lhe são fiéis, sem espírito crítico, talvez seja o maior dos erros de suas direções nos últimos anos, além do desastre provocado no rumo do país e do povo ao progresso.

 


Cristovam Buarque: O tamanho da insanidade

Os professores, servidores e alunos das universidades precisam se mobilizar contra esta insanidade que vai retirar recursos de áreas prioritárias agravando ainda mais a tragédia fiscal pela qual passam nossas universidades

O Congresso brasileiro se prepara, mais uma vez, para dar um tapa na cara dos seus eleitores, aprovando gastos de R$ 3,6 bilhões para financiar as eleições de seus futuros membros.

Isso acontece no mesmo momento em que as universidades federais estão ameaçadas de fechar por falta de dinheiro para os gastos mais primários.

Nossos institutos de ciência e tecnologia estão parando suas pesquisas.

Se a proposta for aprovada no Congresso e o governo não vetar, o presidente Temer e o ministro Henrique Meireles passarão a ideia de que estão mentindo quando dizem que não há recursos para financiar nosso sistema universitário, que a previdência é deficitária, que é preciso demitir servidores.

Estão mentindo ou dirigem um governo insano.

Todos falam que, no lugar de novos impostos, o governo deveria reduzir gastos. No lugar disso, eles aumentam despesas para financiar campanhas eleitorais, tomando R$ 3,6 bilhões dos eleitores (R$ 60,00 por eleitor) que não foram consultados – inclusive daqueles 50 milhões que as pesquisas indicam que não vão votar ou votarão em branco.

Isto é uma insanidade coberta por uma mentira.

Isto poderia ser evitado cortando o custo da campanha.

Triste é que a comunidade acadêmica não parece mobilizada para impedir esta insanidade.

É hora de um movimento nacional contra parlamentares e contra o presidente Temer, para que não cometam esta insanidade, fazendo campanha mais barata e financiada pelos simpatizantes dos partidos e dos candidatos, não por cidadãos que sofrem a degradação dos serviços públicos e que são obrigados a financiar políticos que recusam.

Os professores, servidores e alunos das universidades precisam se mobilizar contra esta insanidade que vai retirar recursos de áreas prioritárias agravando ainda mais a tragédia fiscal pela qual passam nossas universidades.

 

 


Cristovam Buarque: A ocupação necessária

O Rio e o Brasil estão comemorando mais uma vez a entrada de nossos soldados na luta contra a violência que tomou conta desta bela cidade. Diante da guerra civil em andamento, não há como ficar contra a decisão do governo federal, mas é preciso estar alerta aos seus riscos e limitações.

Com as Forças Armadas (FFAA) nas ruas, a população carioca pode ter um fôlego de paz, mas sob o risco de envolver nossos soldados em mortes: a deles e a de bandidos nas ruas. As consequências destas mortes poderão ser muito graves para o necessário casamento entre os brasileiros e suas FFAA.

Ao escolhermos o caminho do enfrentamento entre nossos soldados e a guerrilha do crime, adotamos o risco de soldados matarem brasileiros, inclusive com prováveis efeitos colaterais: eufemismo para dizer vítimas inocentes de balas perdidas atiradas por armas de um lado ou de outro. Somente neste ano de 2017, 92 policiais militares e mais de 500 civis, inclusive crianças, foram mortos na guerra entre bandidos e policiais. São estatísticas assustadoras: ainda mais grave se envolver nossos soldados.

Igualmente grave são os limites desta opção. O Exército não pode ficar para sempre nas ruas do Rio, nem de outras cidades. No dia seguinte à saída dos militares, mesmo não sendo vista como derrota, os bandidos voltarão com espírito de vencedores. Sem falar no risco de sucesso da guerrilha do crime, se não diretamente no enfrentamento com nossos soldados, indiretamente pela disseminação da bandidagem em outras cidades.

A solução provisória será um agravante. Ainda que tenham sucesso momentâneo, os soldados não construirão a paz permanente, que só viria se o governo federal ocupasse o Rio com professores bem preparados, dedicados, bem remunerados, em escolas bonitas e bem equipadas, todas com horário integral.

Há anos, muitos dizem que se o Brasil não ocupar suas cidades com professores, teria de ocupá-las com soldados. Darcy Ribeiro dizia que, se não fizermos escolas, teremos que fazer cadeias. Ou ocupamos com professores ou não adianta ocupá-las com soldados.

Mas continuamos preferindo os soldados aos professores, a segurança provisória à paz permanente. Comemoramos a federalização da segurança, mas nos recusamos a federalizar a educação. Se todas as crianças do Rio tivessem escolas equivalentes aos Colégios Federais, Pedro II ou Militares, em uma geração teríamos um ambiente de paz, evitando a necessidade da precária e arriscada opção militar.

Talvez isto nunca vá acontecer, por causa da miopia em relação ao futuro que nos faz preferir soldados nas ruas, muros nos condomínios, carros blindados, a uma paz duradoura que vem da educação. Em grande parte, porque temos três ideias arraigadas: a educação não resolve o problema; não podemos esperar por ela; e, sobretudo, a ideia de que no Brasil não há como oferecer escola com a mesma qualidade para os filhos de ricos e filhos de pobres. Esta mentalidade é a principal origem da violência que agora tentamos barrar com soldados.

 

 


Contra o ódio e a intolerância

Cada vez mais isolada e sem um discurso minimamente capaz de explicar o inexplicável ou justificar o monumental fracasso de um projeto de poder que se revelou nocivo ao país e gerou tamanha corrupção, desmantelo e a maior crise econômica de nossa história republicana, parte da esquerda brasileira resolveu apelar ao ódio e à intolerância para atacar e desqualificar seus críticos, contaminando o ambiente político e colocando em xeque a própria convivência democrática.

Recentemente, o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), um dos homens públicos mais respeitados e bem preparados do país, foi vítima de um grupo de fascistoides durante o lançamento de um livro de sua autoria na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde também se realizava a reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Com xingamentos e tentativas de intimidação, essa pequena horda de militantes revelou a verdadeira face de uma esquerda populista, atrasada e essencialmente reacionária que perdeu o rumo, o discurso e a dignidade.

Curiosamente, mas não por acaso, são os mesmos setores que, há alguns dias, manifestaram novamente o seu apoio incondicional à ditadura comandada por Nicolás Maduro na Venezuela, um regime amplamente rejeitado pela comunidade internacional e por todos aqueles que prezam pela democracia e pela liberdade. Os que tentavam constranger o senador Cristovam na UFMG preferem fechar os olhos para uma tirania que reprime manifestações democráticas com violência (o que levou a mais de uma centena de mortes até o momento), censura a imprensa independente, viola as liberdades individuais, persegue e prende opositores políticos, controla o Poder Judiciário, entre outras atrocidades próprias de um governo autoritário.

Pessoalmente, jamais imaginei que tivesse de criticar forças de esquerda não por seus erros políticos, mas pelo nível de degradação moral em que parte delas se meteu. Mas é exatamente disso que se trata. É evidente que muitos foram os equívocos cometidos pela esquerda historicamente – e nós, do PPS, herdeiros do Partido Comunista Brasileiro (PCB), nos incluímos nesse processo de autocrítica –, mas desta vez é necessário apontar e condenar, com veemência, o desmantelo moral que tomou conta de uma parcela significativa da esquerda na América Latina, em especial o chamado bolivarianismo. Lamentavelmente, para onde quer que se olhe entre os países latino-americanos, essa esquerda se enxovalhou da forma mais espúria com a corrupção, praticando um verdadeiro assalto aos cofres públicos. Os 13 anos de governos lulopetistas no Brasil, infelizmente, são um exemplo ilustrativo de tamanho descalabro.

Além da corrupção em si, o que já seria gravíssimo, os regimes que predominaram em diversos países do continente na última década foram marcados por um viés populista que atende aos setores historicamente espoliados, mas de forma superficial e imediatista – por meio de um assistencialismo barato que não oferece um futuro digno nem é capaz de mudar a realidade. Há uma série de estudos acadêmicos e livros publicados na área de ciência política que tratam justamente do fim do populismo na América Latina, em especial o chavismo, na Venezuela, e o lulismo, no Brasil. Guardadas algumas diferenças, os dois modelos se assemelham muito no essencial: não propuseram nenhuma mudança substancial na qualidade de vida dos cidadãos por meio da educação ou de um efetivo projeto de desenvolvimento. A aposta quase exclusiva foi no incentivo ao consumismo desbragado e nos programas assistencialistas.

Os ameaçadores gritos de guerra e as palavras de ordem dirigidas a um homem honrado como Cristovam Buarque são reflexo justamente dessa visão de mundo populista, autoritária, antidemocrática e intolerante, que demoniza aqueles que pensam de forma diferente e não tolera o contraditório no debate público. Ao investirem no ódio, os setores mais atrasados e reacionários da esquerda ficam ainda mais isolados da opinião pública e da sociedade em geral e são responsáveis, de certa forma, pelo fortalecimento de um segmento também populista, mas de uma direita reacionária e de corte claramente fascista, que acaba por fazer o contraponto no outro extremo do espectro político.

Não construiremos um novo país com agressividade ou violência, e muito menos com o populismo mais rasteiro. Devemos fomentar o debate, a convivência pacífica entre contrários, a diversidade. As agressões contra o senador Cristovam são o retrato de um tempo que ficou para trás, uma espécie de grito desesperado daqueles que perderam o seu naco de poder. A população brasileira está cansada de tanto ódio, de tanta raiva, de tanta divisão e do discurso surrado do “nós contra eles”. Contra o ódio e a intolerância, respondemos sem medo, com serenidade e democracia.

Fonte: http://www.diariodopoder.com.br/artigo.php?i=56279853968


Cristovam Buarque: Portadores do novo

 

Ser moderno é servir aos interesses do público. A política brasileira sofre de apego ao passado. Até mesmo as forças progressistas deixaram de ser portadoras do novo. Mas nunca foi tão urgente imaginar o futuro desejado e como construí-lo.

O novo está mais no dinamismo decorrente da coesão social, do que na disputa de interesses de grupos, corporações e classes: empresários precisam entender que há um interesse nacional comum a todos brasileiros; os trabalhadores precisam perceber que a luta sindical não deve sacrificar a estabilidade nacional, nem o bem-estar do conjunto do povo. Ser moderno é servir aos interesses do público, seja com instrumentos estatais, privados ou em parceria.

O novo exige que a economia seja eficiente, que a moeda seja estável e que o seu excedente seja usado para cuidar dos serviços públicos com qualidade e respeito aos usuários. O novo está na educação de qualidade capaz de construir uma sociedade do conhecimento, da ciência, da tecnologia, da inovação, da cultura.

O novo não é mais a proposta da igualdade plena na renda, que, além de demagógica, é autoritária, ineficiente e não respeita o mérito, o empenho e as opções pessoais. O novo está na tolerância com uma desigualdade na renda e no consumo dentro de limites decentes, entre um piso social que elimine a exclusão e um teto ecológico que proteja o equilíbrio ambiental. Entre estes limites, é preciso a escada social da educação que permita a ascensão das pessoas, conforme o talento e o desejo de cada um.

O novo não está mais na ideia de uma economia controlada sob o argumento de ser justa, mas no entendimento de que o seu papel é ser eficiente sob regras éticas nas relações trabalhistas, no equilíbrio ecológico e na interdição de produzir bens nocivos. O novo está na definição ética do uso dos resultados da economia eficiente para construir a justiça, com liberdade e sustentabilidade, especialmente garantindo que os filhos dos brasileiros mais pobres terão escolas com a mesma qualidade dos filhos dos mais ricos.

O novo não está na riqueza definida pelo PIB, a renda e o consumo, mas na evolução civilizatória, por exemplo; não está no número de carros produzidos, mas na eficiência como funciona o transporte público. O novo não está na velocidade como se destroem florestas e sujam-se os rios, mas na definição de regras que permitam oferecer sustentabilidade ecológica e monetária. O novo não está na segurança de mais prisões para bandidos, mas na paz entre os cidadãos.

O novo não está mais no excesso de gastos e de consumo, mas na austeridade que permita sustentabilidade e bem-estar. A política nova não está apenas na democracia do voto, mas também no comportamento ético dos políticos, em eleições com baixo custo, espírito público sem corporativismo, e na apresentação de propostas para o futuro nos atuais tempos de mutação, mesmo que isso implique em suicídio eleitoral, porque em tempos de mutação, os portadores do novo correm o risco de solidão. Mesmo assim, é preciso dizer: o novo está na educação.

* Cristovam Buarque é senador (PPS-DF)

 


FAP: Nota de repúdio à agressão sofrida pelo Senador Cristovam Buarque

Nesta terça-feira, 18 de julho, o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), presidente do Conselho Deliberativo da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), foi objeto da agressão verbal, covarde e autoritária de um pequeno grupo de manifestantes, partidários do governo passado e opositores das reformas em processo de aprovação no Congresso Nacional.

Nós, diretores e conselheiros da Fundação, manifestamos de público, em primeiro lugar, nosso veemente repúdio à essa violência. A Democracia se constrói no debate, na contraposição de argumentos e até mesmo no silêncio, quando os argumentos falecem. Não se constrói na agressão, na camuflagem com insultos de vazio argumentativo. Esse é o caminho da intolerância, dos "iluminados" que não precisam de diálogo nem de democracia, uma vez que as ditas verdades da politica já se encontram para eles reveladas. Sabemos que esse caminho tem apenas um ponto de chegada: o autoritarismo.

Manifestamos também nossa solidariedade irrestrita ao senador Cristovam Buarque. Sabemos que acontecimentos desse tipo não o farão esmorecer, mas redobrarão seu empenho na luta por um Brasil politicamente mais democrático e socialmente mais justo.

Diretores e Conselheiros da Fundação Astrojildo Pereira (FAP)


partido

PPS repudia agressões contra Cristovam Buarque na UFMG

O presidente do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP), repudiou em nota pública (veja abaixo), nesta quarta-feira (19/7) as agressões sofridas pelo senador Cristovam Buarque (PPS-DF), no lançamento de seu livro na reunião da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) realizada na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

No documento de desgravo, Freire afirma que o lulopetismo mostrou, mais uma vez, a sua “verdadeira face de intolerância e desrespeito a convivência democrática”. Ele destacou que o ato foi agravado por ter sido cometido dentro de uma universidade federal, espaço que, necessariamente, deve ser aberto às discussões e ao debate.

Freire ressaltou ainda que dirigentes petistas estão cada vez mais isolados diante da corrupção praticada nos 13 anos que estiveram à frente do governo federal e que, por esse motivo, tentam impor uma “visão única do processo político brasileiro”.

Veja abaixo a íntegra do documento.

“Nota de desagravo: A intolerância como norma

Mais uma vez o lulopetismo mostra sua verdadeira face. Agora, no recinto da UFMG, uma das mais respeitadas universidades do país, em um evento de lançamento de um livro do senador Cristovam Buarque (PPS-DF), na reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC.

Um diminuto grupo de militantes sectários tentou constranger o senador Cristovam Buarque, um dos mais importantes educadores do país, ex-reitor da UnB e ex-ministro da Educação. Tal postura deu-se única e exclusivamente por uma concepção de política marcada pela intolerância e o total desrespeito a convivência democrática.

Um sinal tanto mais perigoso para nossa democracia, por se dar no recinto de uma Universidade, que por razão de ser, é necessariamente aberta às discussões e ao debate, sempre em função da busca da Verdade e do esclarecimento. Mesmo que tenha sido um ato de uma minoria, teve a chancela de uma minoria de professores e funcionários, o que mostra claramente o nível de deturpação do que venha a ser uma militância política.

Acossados pela operação Lava Jato, com vários de seus dirigentes condenados inclusive o ex-presidente Lula da Silva, cada vez mais isolados e sem “discurso” que possa confrontar um legado de corrupção, um déficit fiscal da ordem de R$ 180 bilhões e 14 milhões de desempregados, o que restou ao lulopetismo a intolerância como norma, tentando impor sua visão única do processo político brasileiro.

Quanto mais intolerantes, mais revelam o paradoxo político do lulopetismo do fascismo de esquerda.

Roberto Freire
Presidente Nacional do PPS”


Alberto Aggio: A democracia corre risco no país

Os acontecimentos de ontem (18/07) na UFMG que envolveram o Senador Cristovam Buarque (PPS-DF) são muito preocupantes. Servem de alerta a todos os democratas do país e do mundo para uma escalada regressiva que ameaça nossa convivência democrática.

Hostilizado por militantes de uma esquerda ancilosada, com brados de “golpista” e “traidor”, o Senador Cristovam Buarque, que visitava a Reunião Anual da SBPC para divulgar um livro, foi impedido, à força, de fazer a divulgação de suas ideias. Esses militantes que combatem ideias com violência política foram assim educados por essa esquerda antidemocrática. Eles pensam a política a partir da relação amigo/inimigo e foram, pouco a pouco, transformando uma das mais importantes universidades do país numa madrassa similar àquelas comandadas pelo Exército Islâmico que infelicita o Oriente Médio. O acontecimento mancha a Reunião Anual da SBPC com a marca da intolerância.

Muitas vezes confunde-se, propositalmente, intransigência – coisa a que o petismo não é acostumado, a não ser retoricamente – com intolerância – sem dúvida, uma especialidade sua. A intransigência é a defesa de princípios, estratégias e ações concretas, voltadas para uma perspectiva republicana e universalista; ela não refuga ao debate democrático e valoriza o pluralismo de ideias. A intolerância é uma postura exclusivista que visa estabelecer um dono da verdade, recusa o debate, quer eliminar o outro, impedi-lo de falar, quer evitar a discussão e impor a acusação. A intolerância é a grande marca do PT que, hoje em baixa, quer atribuir o ódio e intolerância ao outro, especialmente aos democratas, esquecendo-se de tudo o que fez e, infelizmente ainda hoje, faz contra a democracia brasileira.

A intolerância petista e filopetista explodiu mais uma vez na bela capital mineira, logo nela, terra de espírito tolerante e que prega a convivência política entre diferentes, elementos positivos da nossa tradição da qual Minas Gerais é reconhecidamente o nosso epicentro.

Na “manifestação” de ódio ao Senador Cristovam não há nenhum saldo positivo a mencionar. O objetivo imediato do PT e de seus aliados continua a ser o estabelecimento de uma fronteira intransponível entre os interlocutores da cena política brasileira. A narrativa do impeachment como golpe ocupa o lugar central nessa formulação, impedindo qualquer terreno para o diálogo. Para isso ela conta com intelectuais – não por acaso da UFMG – que revelam claramente o objetivo mais estratégico dessas manifestações de intolerância, qual seja, minar a confiança do povo brasileiro nas instituições e, principalmente, na eleição como lugar central da construção da nossa democracia.

O sentido estratégico mais nefasto dessas manifestações é claro: tal como os militares no início da década de 1980, o PT quer impedir a realização das próximas eleições. Esse é o sentido estratégico: cancelar as eleições de 2018. E a senha desse movimento será dada pela suposta (ou “esperada”) ausência de Lula na cédula eleitoral da urna eletrônica. Nada mais explícito do que o título de uma matéria jornalística com o cientista político da UFMG, Juarez Guimarães, no Portal “Faca Afiada” – que dispensa apresentações: “Lula não será candidato, nem haverá eleições em 2018”!

O pano de fundo dessa formulação tresloucada é de que o impeachment instalou o Estado de Exceção no Brasil, suprimiu a normalidade democrática e cancelou as condições objetivas do pluralismo. Todos os que apoiaram o impeachment são, nessa leitura, mais do que golpistas, são autoritários. E o PT, apeado do poder, seria, supostamente, o lato democrático da sociedade, com Lula à frente, perseguido, sua principal vítima.

De maneira irresponsável, o PT visa aprofundar a divisão do país e leva-lo para a beira do abismo. O que aconteceu com o Senador Cristovam Buarque é apenas um pequeno sinal de que a democracia no Brasil corre um sério risco. Os traços da violência política típica do fascismo começam a atravessar o umbral do Estado Democrático que construímos. É preciso, democraticamente, resistir a essa investida!

* Alberto Aggio é historiador e professor titular da Unesp


Cristovam Buarque: Porque sou favorável à reforma trabalhista

Senador do PPS explica motivos do apoio às mudanças na legislação trabalhista

Nosso País não tem obstáculos naturais ao seu progresso, como outros países: dividido em etnias, línguas, seitas; com o território desértico ou submetido a intempéries periódicas; tampouco somos uma destas minúsculas ilhas perdidas no oceano, distantes do resto do mundo. Apesar disto, não temos conseguido acompanhar o progresso dos países ricos, com elevado nível civilizatório, porque sempre nos recusamos a fazer as reformas que toda sociedade necessita para ajustar-se às transformações que ocorrem no mundo: fugimos do progresso como uma nação conservadora, presa ao passado. Criamos nossos próprios obstáculos que nos amarram. A principal causa disto tem sido a dominação das estruturas sociais pelas elites.

A falta de sentimento nacional e de compaixão de nossa elite nos fez manter o obstáculo do latifúndio e da escravidão, amarrando nosso progresso, enquanto os outros países entravam na revolução industrial, promovendo o trabalho livre, a educação das massas e o incentivo à criatividade tecnológica.

Foi preciso esperar o final do século XIX para abolirmos a escravidão, mesmo sem completar a educação: mantivemos nossas amarras por falta de oferta de educação pública e da necessária reforma agrária. Mantivemos amarrados o potencial do conhecimento e da terra distribuída. Quando a proposta da Lei Áurea chegou ao Parlamento, por meio de um governo conservador, o grande abolicionista Joaquim Nabuco apoiou essa reforma libertadora, manifestando sua posição de que ainda faltava muito para liberar as forças criativas do Brasil.

Ao longo do século XX demos saltos na produção, sem quebrar os obstáculos e as amarras, sem fazermos as reformas necessárias para liberar nosso potencial. Quando o governo Goulart tentou levar adiante as reformas, a elite reacionária derrubou sua presidência e implantou uma longa ditadura. O regime militar investiu em infraestrutura, criou leis de incentivo, ofereceu créditos, conseguiu fazer o Brasil crescer, mas não eliminou qualquer dos obstáculos que nos amarravam.

A democracia, apesar de 30 anos de governos socialdemocratas, não fez as reformas necessárias – nenhuma delas. Organizou as finanças públicas para logo depois arruiná-las; montou uma rede de proteção social, um sistema único de saúde, mas não derrubou os obstáculos, manteve o país amarrado. Foram governos de um partido intitulado social democrata e outro dos trabalhadores, ambos reacionários, que impediram a participação de nossa economia no mundo global.

Mas continuamos um país sem produtividade elevada, com reduzidíssima capacidade para a inovação, com um número estável ou crescente de cidadãos analfabetos, incapazes até de ler a palavra progresso escrita na bandeira, uma sociedade com a pobreza persistente que não reduz a concentração da renda, sem educação, imersa na violência e na corrupção. Esses são os obstáculos que nos amarram e nos condenam ao fracasso como país.

O mundo está inovando produtos industriais todos os dias e nós continuamos com uma economia baseada na mesma velha produção primária; mudaram as máquinas e as técnicas, mas continuam os mesmos produtos. Enquanto isso, nosso debate político continua preso a velhos temas e com as forças reacionárias contra a derrubada dos obstáculos, por interesses ou por preguiça.

O mundo está criando e usando automóveis sem motoristas e nós discutindo se aceitamos o uso de aplicativos para o sistema de taxi; muitos países já adotam sistemas flexíveis que permitem aos trabalhadores definirem os regimes de trabalho que melhor lhes convém, inclusive adotando o trabalho em casa, e nós querendo regular cada minuto de vida do trabalhador, até mesmo quanto tempo ele deve usar para almoçar. O Brasil precisa derrubar as amarras que impedem seu ingresso no mundo moderno.

As atuais propostas de reforma serão capazes de adaptar as relações trabalhistas minimamente e permitir com isto desamarrar o funcionamento da economia e assim merecem nosso apoio, mesmo sabendo que, devido ao rápido avanço tecnológico, não resistirão aos próximos 10 anos e precisarão de novas adaptações.

Quanto à presente proposta de reforma trabalhista:

a) Sou favorável à prevalência do negociado sobre o legislado porque, na dinâmica atual, se não quisermos amarrar a economia, as legislações devem ser modificadas a cada instante; o mundo dinâmico na velocidade atual exige flexibilização das regras trabalhistas na velocidade que permita ficar em sintonia com o progresso técnico.

A alternativa a isto seria impedir o progresso técnico, na linha das velhas lutas do século XIX, de quebrar máquinas para impedir o progresso. Mas isso exigiria o isolamento do Brasil em relação ao mundo. Sem a flexibilização, o Brasil continuará perdendo investimentos para outros países.

Outra opção seria uma revolução que imponha regras internacionais ao capital, mas nada indica a possibilidade política desta mudança no prazo de algumas décadas, e nem se vê alternativa para colocar no lugar do atual sistema global, mesmo sabendo-o perverso.

b) Os atuais direitos fundamentais como 44 horas de trabalho por semana e 30 dias de férias por ano, entre outros, serão mantidos, mas agora dando ao trabalhador o direito de ter liberdade para ajustar sua relação com a empresa e com suas outras atividades.

O trabalhador, em acordo com o empregador, poderá definir a estrutura das férias e mesmo o número de horas de trabalho a cada dia, aumentando até o limite de 12 horas em um dia e usando um banco de horas para reduzir a jornada em outros dias, como diversas categorias já fazem depois de conquistarem este direito que a reforma agora oferece a todos.

c) Sou favorável e considero uma conquista a possibilidade de o trabalhador sair meia hora mais cedo do trabalho, graças a opção de reduzir meia hora no seu horário de almoço, hoje engessado em uma hora. Sou favorável porque, com esta redução de meia hora no almoço por opção, acredito que milhões de jovens poderão sair mais cedo do trabalho, eliminando a tragédia de chegar atrasado na escola ou mesmo ficar impossibilitado de frequentar cursos universitários noturnos por causa da jornada de trabalho regulamentada por leis que não lhes dão liberdade. Também sou favorável porque acredito no discernimento dos trabalhadores de só fazerem esta opção se for de seu interesse, sem necessidade do protecionismo defendido por aqueles que veem nossos trabalhadores como incapazes de defenderem seus direitos, como antes se dizia dos escravos.

d) Sou favorável ao que se está chamando de trabalho intermitente porque ele será a base para a contratação de trabalhadores desempregados e subempregados por empresas que não precisam do trabalhador em caráter permanente. Daqui para frente, querendo ou não, o trabalho deste tipo será cada vez mais generalizado.

Sou favorável a esta modernização porque ela vai beneficiar a juventude, que poderá desempenhar diversas funções, como estar um período em uma empresa e outro como trabalhador em empresa diferente ou como empreendedor de seu próprio auto-emprego, como digitador, programador, garçom, etc, ou em serviços de Uber. A reforma não amarra o trabalhador à empresa e ainda exige da empresa convocá-lo com no mínimo três dias de antecedência.

Mais uma vez é uma reforma criticada pelos que defendem o status-quo do trabalho permanente e presencial, quando o mundo já está nos tempos do trabalho à distância, o chamado trabalho-desde-casa.

e) Sou favorável à reforma porque ela vai permitir o uso de terceirização, que já é uma realidade espalhada, mas agora será protegida passando a ter os mesmos direitos dos efetivos, como atendimento ambulatorial, alimentação, segurança, transporte, capacitação e qualidade de equipamentos. Além disto, a reforma garante um período mínimo de 18 meses durante o qual o trabalhador permanente não poderá ser recontratado como terceirizado, evitando-se assim o uso dos recursos de precarização que a partir de agora deixa de ser vantajoso para as empresas, uma vez que os terceirizados também terão proteção.

f) Voto pelo fim da contribuição obrigatória aos sindicatos (como também defendo acabar com a contribuição do Estado ao Fundo Partidário), porque esta contribuição terminou servindo para criar impérios sindicais com dinheiro assegurado independente do serviço que presta. Resta ao cidadão o discernimento para escolher o sindicato e o partido com o qual quer colaborar. Acredito que isto vai melhorar o serviço de cada sindicato e sua relação com o trabalhador, sem peleguismo. Concordo, entretanto, que esta mudança exija um período de transição, para evitar a falência brusca das máquinas sindicais, e por isso apresentei emenda com redução gradual deste imposto em três anos.

g) Voto porque a reforma mantém a possibilidade de o trabalhador reclamar seus direitos na Justiça do Trabalho, ao mesmo tempo que incentiva, o que é uma medida positiva desburocratizadora, as negociações diretas na linha do direito moderno, como os diversos tipos de juizados de pequenas causas. Sei que isto quebra o monopólio de verdadeiros cartéis-do-direito-formal, mas apesar de suas reações, considero ser mais um passo na direção de desamarrar o Brasil de seus latifúndios.

h) Sou favorável porque a reforma não toca em nenhum direito garantido pela Constituição e nem acaba com o concurso e não desmonta a estabilidade e o Estado. É hora de acabar com a mentira e o populismo eleitoreiro querendo ganhar votos enganando a população.

Votarei a favor da reforma porque ela é para o Brasil, não importa qual seja o presidente da República do momento e porque não vejo como sua aprovação vai beneficiar a continuação do governo Temer que caminha para terminar, completando-se assim o impeachment, iniciado em 2016.

Voto contando com o veto de vários artigos que vieram no projeto da Câmara dos Deputados, cuja rejeição neste momento forçaria a volta do projeto à Câmara, o que provocaria adiamento ou mesmo a interrupção da reforma. E o Brasil tem pressa de se desamarrar.

VETOS

Nesse sentido, o Presidente da República enviou ao Senado Federal, na pessoa de seu Líder, carta assumindo o compromisso de vetar questões apontadas pelo relator da reforma, senador Ricardo Ferraço e, concomitantemente a editar medida provisória contendo as modificações que forem negociadas entre os parlamentares, seu relator e o Líder do governo no Senado. Entre os pontos que foram relacionados pelo Líder do governo para ajustes estão:

a. Criação de quarentena de 18 meses para eventual migração, dentro da empresa, de trabalho permanente para intermitente. Ainda sobre essa forma de contratação, elimina-se a multa de 50% do trabalhador no caso de falta.

b. A jornada de 12/36 horas só será possível por acordo coletivo.

c. Será obrigatória a participação sindical nas negociações coletivas.

d. Será restabelecida a vedação do trabalho de gestantes em local insalubre e o enquadramento da insalubridade será feito por acordo coletivo.

e. Será retirado o texto que fala sobre dano extrapatrimonial, cujo conteúdo vinculava o ressarcimento ao salário do empregado.

f. Não poderá haver nenhuma cláusula de exclusividade para o trabalho autônomo.

g. Será adotada a redução gradual da contribuição sindical, ao invés de sua eliminação abrupta.

EMENDAS

Voto achando que a reforma poderia ter sido melhor e por isso eu apresentei sete emendas:

a. Criação de licença capacitação de cinco dias úteis para o empregado, por ano trabalhado, não podendo acumular mais de três anos. Essa licença deverá ser utilizada para reciclagem profissional, curso de aperfeiçoamento, ou aprendizado de novo ofício. A intenção é criar uma cultura de aperfeiçoamento profissional, valorizando a formação do empregado e sua contribuição à empresa, gerando efeitos positivos para todo o Brasil, ao criar instrumentos de qualificação da mão de obra.

b. Ao retirar o termo “entre outros” do texto do artigo sobre negociação coletiva, criamos uma restrição do uso desta aos itens citados no projeto de reforma. Nossa ideia é soltar as amarras da economia dando alguma previsibilidade sobre o tópico a ser negociado, reduzindo o grau de incertezas.

c. Nossa terceira emenda restringe e dá previsibilidade ao trabalho intermitente. Garantimos ao trabalhador que a recusa da oferta não caracteriza falta ou motivo para sanção contratual. Além disso, propomos a vedação da convocação de mais de um período no mesmo dia – que poderia resultar na disponibilização não remunerada do trabalhador nos intervalos, criamos a figura da hora extra quando o trabalhador tiver que ficar em horário subsequente ao da convocação e propomos a criação de quarentena para a contratação de trabalhador por tempo indeterminado como intermitente, por período de dezoito meses.

d. Embora sejamos favoráveis ao fim do imposto sindical, permitimos um período de três anos para sua eliminação gradual (60%, 40% e 20% nos anos que seguem a aprovação da reforma). Com isso, queremos dar aos sindicatos tempo para se adaptar e conquistar associados entre os membros da categoria que representam.

e. Emenda proibindo a terceirização do trabalho docente em sala de aula quando os assuntos tratados na aula são do núcleo essencial de cada curso. Com isso pretendemos valorizar os profissionais envolvidos no núcleo essencial de cada curso e garantir a qualidade do ensino nessas disciplinas.

f. Emenda vedando terceirização de atividades estatais finalísticas relativas a cargos ou empregos públicos. Embora acreditemos que a contratação de trabalho terceirizado possa oxigenar algumas atividades do setor público, nossa intenção aqui é preservar a prevalência da contratação por concurso nas atividades fins do setor público.

g. Emenda que cria a possibilidade de aproveitamento de trabalhador em outras áreas da empresa, permitindo a contratação por multifunção ou multiqualificação. Isto possibilitará maior mobilidade do trabalhador dentro da empresa, permitindo, tanto aos trabalhadores como aos empregadores, aproveitamento da relação trabalhista em caso de modificação de tecnologia.

Estas emendas, recusadas pelo relator em nome da agilidade que considero necessária, já foram transformadas em projetos de lei que vou apresentar – até porque esta e todas as outras reformas são um processo. Acabou o tempo da ilusão da permanência que seduz aos conservadores e que Marx havia desfeito, quando 150 anos atrás, muito antes de imaginar-se as atuais transformações ele disse:

“Tudo que é sólido se desmancha no ar”.

 


Cristovam Buarque: Onde erramos

Preferimos defender direitos dos servidores de estatais à qualidade dos serviços públicos

O jornalista Paulo Guedes escreveu nesta página, em 19-6-2017: “os partidos social-democratas que nos dirigem há mais de três décadas devem explicar nossa degeneração política e o medíocre desempenho econômico”. Eu acrescento: “a persistência da pobreza e da desigualdade, a desagregação social, a violência generalizada, o desencanto dos jovens com a política e a tolerância com a corrupção”.

Uma explicação: não nos sintonizamos com o “espírito do tempo”, perdemos o vigor transformador. Enquanto a realidade se transformava, continuamos com as ideias do passado. Não entendemos que hoje a divisão entre presente e futuro é mais importante que entre capitalistas e trabalhadores; nem que estes se dividiram entre modernos, com bons padrões de consumo, e tradicionais pobres e excluídos, com um “mediterrâneo invisível” separando-os. Tampouco aceitamos que os sindicatos representam o setor moderno. Preferimos defender direitos dos servidores estatais à qualidade dos serviços públicos; ignoramos que estatal não é sinônimo de público, sob falso conceito de igualdade, abandonamos o reconhecimento ao mérito de alguns profissionais.

Optando pela disputa entre corporações, de capitalistas ou de trabalhadores, governamos sem buscar coesão social e rumo histórico. Substituímos propostas de um mundo melhor para as futuras gerações, por promessas de maior consumo no presente; criamos consumidores, não cidadãos. Caímos no oportunismo eleitoral ao prometer que todos atravessariam o “mediterrâneo invisível” apenas com “bolsas” e “cotas” para pobres e isenções fiscais para empresários. Não percebemos que o esgotamento dos recursos fiscais e naturais exige austeridade nos gastos e eficiência na gestão. Aceitamos a irresponsabilidade populista sem ver os riscos de induzir soluções inflacionárias e autoritárias no futuro.

Não entendemos que a justiça social vem da aplicação correta e responsável dos resultados de economia eficiente; que no mundo global não há mais futuro para economias movidas por nacionalismos isolados; nem reconhecemos que o capital do século XXI está no conhecimento para inovar e usar as novas máquinas inteligentes. Faltou a compreensão de que a eficiência e a justiça não virão da ocupação do Estado para subordinar as economias sob controle dos partidos, mas da educação para todos, filhos de pobres e de ricos em escolas com a mesma qualidade. Não acreditamos que a igualdade educacional com qualidade teria sido nossa nova bandeira.

No lugar de gigante deitado em berço esplêndido, deixamos um Brasil amarrado em laços corporativos e antiquados. Nossos intelectuais ficaram acomodados em ideias antigas, filiações partidárias, fascínio por líderes. Substituímos ideias por slogans, filósofos por marqueteiros. Caímos em narrativas falsas e passamos a acreditar nas próprias mentiras. Prisioneiros de siglas partidárias sem ética e programas, trocamos princípios por preconceitos. Sem rumo, caímos no eleitoralismo populista e na corrupção, que mora ao seu lado. E ainda não fizemos uma autocritica, nem pedimos desculpas à história e ao povo.

* Cristovam Buarque é senador (PPS-DF)

Fonte: https://oglobo.globo.com/opiniao/onde-erramos-21566743