Revista Política Democrática || Ivan Alves Filho: Johann Sebastian Bach

Johann Sebastian Bach é, para muitos, o maior nome da música em todos os tempos. Mestre do contraponto, o músico alemão fez nosso planeta soar de outra maneira.
Foto: Divulgação
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Johann Sebastian Bach é, para muitos, o maior nome da música em todos os tempos. Mestre do contraponto, o músico alemão fez nosso planeta soar de outra maneira

A pequena cidade de Eisenach teve um papel singular no desenvolvimento da civilização ocidental moderna. Nas suas cercanias, mais exatamente no Castelo de Wartburg, Martinho Lutero traduziu a Bíblia Sagrada para a língua alemã, tornando praticamente irreversível a Reforma protestante. E os partidários de Marx e Engels fundaram ali, em 1869, o Partido Social Democrata da Alemanha. Mais: na acanhada cidadezinha cercada de encantadoras florestas, nasceu Johann Sebastian Bach, para muitos, o maior nome da música em todos os tempos. Ninguém ou nada vem ao mundo em Eisenach impunemente, pelo visto.

Bach, um fervoroso protestante, era originário de uma família de músicos. Religião e arte faziam parte do seu corpo, como sangue e ossos. A darmos crédito a um depoimento, ao tocar órgão, Bach “corria sobre os pedais como se seus pés tivessem asas, fazendo o instrumento ressoar de tal maneira que quase se diria ouvir uma tempestade”.

Bach era um homem de luta. O Duque de Weimar chegou a mandar prendê-lo, porque o músico insistia em deixar a cidade em busca de melhores condições de trabalho. Obstinado, Bach não cedeu às pressões do Duque e ainda concebeu, na prisão, o Pequeno livro do órgão.

Toda vez que ouço algo de Johann Sebastian Bach, firmo a convicção de que sua música – de tão tensa, retorcida, obcecada até – não cabe completamente nos limites das notas musicais. Na verdade, Bach nos remete a um som que extrapola ou atropela tudo que conhecemos em matéria de escala ou métrica. Talvez resida aí a principal característica do estilo barroco, o qual ocupa todos os espaços possíveis da superfície musical. Ou o barroco não é um exagero, algo que transborda sempre?

Cantatas – e penso em Magnificat e na Cantata dos camponeses. Motetos – e me recordo de Jesus, minha alegria. Obras corais – e não tenho como deixar de lembrar da Paixão segundo São Mateus. Fugas – e não há como deixar de rememorar a impressionante A arte da fuga. Tocatas – e não se pode esquecer o comentário de Mendelsohn diante da Tocata e fuga em fá maior, “que soava como se fizesse a igreja desmoronar”. Além de missas, sonatas, variações, suítes e incontáveis prelúdios. Pois Johann Sebastian Bach abordou praticamente todos os gêneros musicais de seu tempo.

Contudo, acredito que o Bach concertista tenha sido o que deixou marcas mais profundas na história da música ocidental. Um exemplo apenas (ou melhor: seis…) corrobora o que digo: os monumentais Concertos de Brandemburgo. Os Concertos têm por base os instrumentos de sopro. Orquestrados, são muitas vezes tensos e conflitantes entre eles.

São seis concertos, eu lembrava mais acima – ou um verdadeiro festival de contrapontos e espantosa energia sonora. Ao mesmo tempo erudito e popular. Técnico e emotivo. Alegre e triste. Suave e enérgico. Cândido e explosivo. Alternando período longo e período curto. E – nunca é demais lembrar – contrapontísico ao extremo. Unificando tudo. Sonoridades italianas, alemãs, francesas, inglesas. Bach fazia uma música de uma época de contrastes, de Reforma e Contrarreforma, e, por isso, mesmo contraditória, rica. E bela, muito bela.

Bach combinava o recurso aos contrapontos no stilo antico com as formas orquestrais mais modernas de sua época, conforme salientou certa vez Helmut Rilling, maestro e organizador de suas obras completas. Contrapontos esses que lembram estranhamente o jazz e seu estilo sincopado. Talvez resida nessa relativa atemporalidade uma boa parte do fascínio que Bach exerce ainda hoje sobre nós.

 

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