Renan Calheiros

El País: Davi Alcolumbre, o aspirante do baixo clero que desbancou o MDB no Senado

Renúncia de Renan Calheiros facilita caminho e candidato do ministro da Casa Civil é novo presidente do Senado. Apesar da tensão, Governo Bolsonaro anota vitória na estreia do Legislativo

Errou quem achou já ter visto de tudo em uma sessão do Senado brasileiro na sexta-feira. No sábado a confusão e a tensão foram ainda maiores na longa jornada para escolher o senador que vai comandar a Casa e o Congresso pelos próximos dois anos. Depois de recorrer ao Supremo Tribunal Federal e garantir que o voto da eleição interna fosse sigiloso, Renan Calheiros (MDB-AL), um dos mais experientes operadores políticos da redemocratização, um atingido pela Operação Lava Jato que sobreviveu nas urnas, capitulou. O senador alagoano decidiu renunciar de sua candidatura para presidir o Senado - seria a quinta vez dele no cargo - no meio do processo eleitoral e acabou facilitando e jogando a vitória no colo do até então inexpressivo senador Davi Alcolumbre (DEM-AP). Sem Renan, a votação acabou assim: 42 votos para Alcolumbre, 13 votos para Espiridião Amin (PP-SC), 8 para Álvaro Coronel (PSD-BA), 6 para José Reguffe (Sem partido – DF) e 3 para Fernando Collor (PROS-AL).

Com o resultado deste sábado, o MDB perde todos os nacos de poder que tinha nacionalmente, assim como a hegemonia no Senado – desde 1985 em apenas três ocasiões o Senado não foi presidido por um emedebista. E o DEM ganha um protagonismo inédito ao presidir as duas casas do Congresso Nacional simultaneamente, mesmo sem ter a maior bancada em nenhuma delas. Na Câmara, na sexta-feira, o eleito foi presidente em primeiro turno foi Rodrigo Maia (DEM-RJ). No caso de Maia, ele teve o apoio explícito do PSL do presidente da República, Jair Bolsonaro. Enquanto que no caso de Alcolumbre, o Governo foi mais discreto –só quem agiu com maior dedicação com o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS).

O novo presidente foi ungido em uma conturbada eleição em quatro atos. O primeiro foi na sexta, quando a sessão, presidida por Alcolumbre, aprovou instaurar voto aberto provocando um impasse que obrigaria o adiamento da eleição. O segundo foi o judicial, quando o presidente do STF, Antonio Dias Toffoli, decidiu, já às 3h45 deste sábado, que o voto aberto estava proibido para a escolha do comando do Senado e que a sessão deveria ser presidida por José Maranhão (MDB-PB), um renanzista. O terceiro foi o da organização de uma tropa de choque contra Renan, com três dos nove pleiteantes à presidência (Simone Tebet, Álvaro Dias e Major Olímpio) renunciando a suas candidaturas em favor de Alcolumbre. E o quarto, a fraude eleitoral ocorrida na primeira votação em cédula de papel – na hora em que se abriu a urna havia 82 cédulas, mas há 81 senadores. Ocorreu, então, uma segunda votação. Foi nessa que Renan decidiu renunciar e facilitou o caminho para o representante do DEM.

“Este processo não é democrático. Tudo o que havia na primeira votação poderia ter acontecido na segunda. O que não podia era o PSDB, na segunda, abrir o voto”, disse Renan ao abandonar o plenário. Pelas suas contas, ele teria quatro votos entre os tucanos que acabaram virando para Alcolumbre, a partir do momento em que o PSDB orientou os seus parlamentares a votarem no adversário.

Outra razão para o cacique emedebista abdicar da candidatura foi porque o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), também acabou abrindo o seu voto, algo que não fez na primeira votação. Em seu Twitter, Flavio justificou, primeiro, que queria “evitar especulações com intuito de prejudicar o Governo”. Foi massacrado por boa parte de seus seguidores e acabou abrindo o voto no segundo pleito, num dos lances mais explícitos da lógica imediata de cobrança de políticos via redes sociais. Pivô da primeira crise do Governo, por estar sendo investigado pelo Ministério Público do Rio no chamado caso Queiroz, o senador dos Bolsonaro parece não ter querido ampliar a lista de problemas com apoiadores.

Um irritado Renan não escondeu a frustração diante da situação. Disse que Alcolumbre e seus apoiadores estavam atropelando o regimento e a Constituição. E acabou fazendo uma comparação com a história bíblica entre Davi e o gigante Golias “Eu retiro a postulação porque entendo que o Davi não é o Davi, é o Golias. Davi sou eu. Ele é o Golias, atropela o Congresso. O próximo passo é o Supremo Tribunal Federal sem o cabo e sem o sargento", declarou Renan, alfinetou o emedebisma, citando a inglória frase de desdém do deputado Eduardo Bolsonaro sobre a mais importante corte do país.

Pouco quisto entre militares
A mágoa de Renan deixa no ar a pergunta sobre que tipo de resistência ele estará disposto a impor ao Governo Bolsonaro após ser obrigado a capitular. Mas esse não é o único problema de Alcolumbre. Apesar de ser o candidato do chefe da Casa Civil, o senador pelo Amapá não era o favorito do braço militar da gestão Bolsonaro, nem de parte dos técnicos do Governo. O motivo é que ele responde a dois processos no STF por caixa dois e falsificação de documentos na eleição de 2014, quando se elegeu senador.

Aos 41 anos, o novo presidente do Senado está na política desde o ano 2000. Foi vereador em Macapá até 2002. Entre 2003 e 2014, foi deputado federal, sempre no baixo clero, com pouquíssima projeção nacional. “Esse é o maior desafio da minha vida”, disse ele após o resultado da eleição ser anunciado. Ele foi derrotado nas duas eleições para o Executivo que disputou, em 2012, quando tentou ser prefeito de Macapá, e em 2018, quando perdeu o Governo do Amapá.

No Congresso Nacional, ficou marcado, principalmente, por retirar assinaturas de duas CPIs. Em 2005, desistiu de apoiar a CPI dos Correios, que investigava o mensalão petista e em outra que investigaria os contratos do time Corinthians com a empresa MSI. Pesou a favor de Alcolumbre a juventude, a pouca ligação com antigos caciques políticos e um movimento nas redes sociais contrário à candidatura de Renan Calheiros. Entre seus apoiadores, apenas Tasso Jereissatti (PSDB-CE) é da velha guarda. Os demais ou são neófitos ou nunca tiveram posição de comando no Congresso. Entre eles estavam três que desistiram de suas candidaturas na última hora: Simone Tebet (MDB-MS), Major Olímpio (PSL-SP) e Álvaro Dias (PODE-PR). Agora, o desafio de Alcolumbre será se descolar o quanto possível do ministro Onyx, o articulador político de Bolsonaro, para ganhar trânsito mais amplo na Casa e sanar sequelas da turbulenta sessão. Seja como for, somados os resultados de Câmara e Senado, o Governo de neófitos no Executivo passou sem maiores sobressaltos pelo primeiro para valer no Legislativo.


Leandro Colon: Aceno de Renan é sinal de perigo

Elogio de senador a Flávio Bolsonaro é mensagem de proteção a um governo enfraquecido

O presidente Jair Bolsonaro desembarca em terras suíças nesta segunda-feira (21) para o Fórum Econômico Mundial, em Davos, deixando por aqui uma crise com potencial para causar sérios danos em um governo que ainda engatinha.

Uma consequência do caso Queiroz é a dificuldade que Bolsonaro terá para faturar politicamente as eleições às presidências da Câmara e do Senado, no dia 1º de fevereiro.

Salvo imprevistos, tudo caminha, respectivamente, para as vitórias de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Renan Calheiros (MDB-AL) em cada Casa.

O PSL de Bolsonaro abraçou a candidatura de Maia ao perceber que, mesmo com a maior bancada eleita, não teria condições de levar adiante um candidato competitivo.

O provável sucesso de Maia não será uma vitória de Bolsonaro. O atual presidente da Câmara não é um candidato do governo. Pode até, por circunstâncias da eleição na Câmara, ter se aproximado do Planalto, mas deve manter a relação política ambígua adotada no período de Temer.

O maior perigo para Bolsonaro está no Senado. Na última sexta-feira (18), em entrevista à Folha, Renan Calheiros fez um aceno ao defender o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente.

“Temos com relação a ele (Flávio) as melhores expectativas, de que é um moço que quer trabalhar, que quer fazer um bom mandato, que tem posições e defende-as”, disse.

Horas depois da declaração, o Jornal Nacional revelou os 48 depósitos na conta de Flávio que somam R$ 96 mil, todos no valor de R$ 2.000 e feitos sucessivamente em curiosos intervalos de poucos minutos.

Flávio chega ao Senado nas cordas, sem força para ser porta-voz do pai. Perdeu a capacidade de articulação para influenciar na eleição à presidência da Casa. O gesto que recebeu de Renan é um recado de proteção antecipada contra eventuais tentativas de cassação de mandato.

Em troca, o emedebista quer ter o Planalto ajoelhado aos seus pés para garantir a reforma da Previdência. O pior cenário para qualquer governo.


Eliane Cantanhêde: Renan e Deltan

Já pensou Dallagnol na PGR e Calheiros na presidência do Senado? Vai pegar fogo

Adversários ácidos e públicos, o senador Renan Calheiros e o procurador Deltan Dallagnol podem ter um encontro marcado para setembro deste ano, quando Renan espera estar de volta à presidência do Senado e Deltan estará concorrendo a procurador-geral da República. Inimigos, disputam o apoio, mesmo que velado, do presidente Jair Bolsonaro.

Renan é um dos campeões de investigações entre os que têm foro privilegiado no Supremo e Deltan é uma das estrelas – certamente a mais estridente – da Lava Jato. Logo, os dois são como gato e rato. Enquanto um é senador e o outro é procurador, vá lá. Quando, e se, virarem presidente do Senado e procurador-geral, vai ter barulho.

Renan acaba de chamar Deltan de “ser possuído”, mas ele também reúne uma coleção de adversários e ambos seriam facilmente apontados como “seres possuídos”. Apesar disso, o governo Bolsonaro – a “nova era” – dá sinais de apoio a Deltan na PGR e pode ficar entre Renan e Fernando Collor no Senado. Seis por meia dúzia.

Depois de dizer que não se meteria na disputa pelas presidências do Congresso, Bolsonaro já apoiou, via PSL, a reeleição de Rodrigo Maia na Câmara (anda até trocando bilhetinhos com ele em solenidades públicas) e agora pode jogar a toalha no Senado.

Renan é do MDB, esteve na linha de frente dos governos Fernando Henrique, Lula e Dilma, fez dobradinha com o PT em Alagoas em 2018 e tem “problemas” na Justiça. Mas, como parlamentar, é competente, praticamente fechou o cerco a seu favor, e o PSL está aprendendo pragmatismo rapidamente.

Do outro lado, Dallagnol é porta-voz da Lava Jato e conquistou notoriedade com o PowerPoint de 2016 em que apontou Lula como “maestro da orquestra criminosa” e relevou as provas como “pedaços da realidade que geram convicção”. Ministros do STF, juristas e, claro, petistas, ficaram de cabelo em pé.

O mandato de dois anos de Raquel Dodge só vence em setembro, mas desde já a “República de Curitiba” faz campanha por Dallagnol. Dodge denunciou Lula, Aécio e o próprio Temer, que a nomeou. Seu “pecado” foi denunciar também Bolsonaro, por um discurso sobre quilombolas que ela considerou racista.

Para os “curitibanos”, “é preciso uma chacoalhada na PGR”, não há lei exigindo lista tríplice para o cargo e o procurador da Lava Jato seria o homem certo, no lugar certo, na hora certa. Aliás, como todos os paranaenses ou os que fizeram carreira no Estado e estão em alta: Sérgio Moro, Maurício Valeixo, Gebran Neto, Edson Fachin, Felix Fischer, Roberto Leonel, Igor Romário de Paula, Erika Marena e Fabiano Bordignon. É o que eles próprios chamam de “alinhamento dos astros”. Uma sorte e um gol de Bolsonaro.

Prudência. Lá se foram três semanas e o governo não para de produzir manchetes surpreendentes e as piores envolvem o filho do presidente, Flávio Bolsonaro. Primeiro, ele pediu para suspender investigações sobre seu gabinete na Alerj, sem ser o investigado. Depois viu-se por quê: as dezenas de depósitos em dinheiro na sua conta.

Não satisfeito em transferir o Serviço Florestal para a Agricultura, o governo nomeou para o cargo um ruralista antiflorestas derrotado nas eleições. Raposa tomando conta do galinheiro.

Após tantos elogios de Jair e Eduardo Bolsonaro a Murilo Resende Ferreira, por que ele não resistiu mais que 24 horas na coordenação do Enem? E a guerra contra ONGs? E a discussão sobre a China? E o relatório do Human Rights Watch?

Como fecho de ouro da semana, o vice Mourão verbaliza na revista Época o que todos se perguntam: “Terá Ernesto (Araújo) condições de tocar (...) a política externa do Brasil?”. Atenção, bolsonaristas de internet: Mourão não é petista, comunista nem esquerdopata. Aliás, o alerta é dele: “Está faltando prudência”.


Correio Braziliense: "O legado é o MDB continuar grande", diz Renan

Eleitor de Lula, o senador diz que as candidaturas de Meirelles e Temer são ruins para o partido, que precisa se recuperar nas urnas

Por Alessandra Azevedo e Denise Rothenburg, do Correio Braziliense

Conhecido nos últimos tempos mais pelos embates que protagoniza do que por consensos, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) se prepara para mais uma batalha dentro do partido que representa há praticamente quatro décadas, salvo o curto período em que apostou no PRN, de Fernando Collor, no início da década de 1990. Depois de ter feito, em várias oportunidades, duras críticas à atuação do presidente Michel Temer, ele não poupa palavras para dizer que o MDB não tem nenhum candidato viável para disputar a Presidência da República em 2018.

Os dois nomes discutidos hoje, de Temer e do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, numa campanha, defenderiam “o legado do governo, não do partido”, sustenta, em entrevista ao Correio. “Meirelles é a versão piorada do Michel”, diz. Renan não apenas descarta a possibilidade de apoiar algum deles, como defende que o MDB; em vez de investir recursos em uma candidatura própria, precisa “sobreviver à hecatombe que o governo Michel Temer provocou no partido”.

Enquanto busca um projeto alternativo para apresentar na convenção do MDB, em julho, o senador elogia Joaquim Barbosa (PSB), desacredita o futuro de pré-candidaturas, como a do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alerta quanto ao potencial de votos de Jair Bolsonaro (PSL-RJ) e comenta sobre alguns dos nomes que fazem parte do quadro fragmentado que espera para a eleição de 2018. Mas reforça que o apoio dele é ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tentará visitar na prisão nos próximos dias “para conversar sobre a conjuntura atual”.

O senador acredita que, embora Lula ainda esteja preso, conseguirá se candidatar em agosto. Mas sem plano B. Outra opção, como o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, seria “trocar o lulismo pelo petismo” — na visão do senador, má ideia. Renan fala também sobre o fim do foro privilegiado e a Operação Lava-Jato, e critica a atuação de alguns investigadores, que classifica como “abuso de autoridade”. Confira os principais trechos da entrevista:

O senhor começou a preparar um projeto alternativo à candidatura do presidente Michel Temer ou do Henrique Meirelles para a convenção de julho. Por quê?
Na verdade, não é uma preparação, é uma compreensão que se generaliza no partido. O MDB é um partido plural, com muitas correntes, e precisa sobreviver à hecatombe que o governo Michel Temer provocou no partido. Acabamos de perder 15 deputados federais e sete senadores. O MDB não tem vantagem com a candidatura do Michel.

O presidente diz que seria uma forma de defender o governo, de tentar resgatar um legado, como ele se refere às melhorias na economia, por exemplo.
Se existe legado do governo Michel Temer, certamente não é do MDB.

Como assim?
O MDB sempre foi o partido das massas, dos trabalhadores, da defesa do interesse nacional, da estabilidade democrática e econômica, dos avanços sociais. O maior legado que precisa sair dessa eleição é o MDB continuar grande. Nós temos excelentes governadores, bons candidatos a deputados. Uma aliança meramente para defesa do legado do Michel significaria a derrota dessas pessoas.

Por que você tem tanta convicção disso?
Porque o Michel faz um governo estreito, com opção pelo mercado. Flexibilizou direitos trabalhistas em plena recessão, ampliou desemprego, não retomou os investimentos públicos nem privados. O país vai ter deficit até 2025.

Mas já seria difícil. Seria pior se tivesse ficado a Dilma?
Na verdade, a crise se agravou. Ainda no mês passado, tivemos um aumento do desemprego, com aumento da informalidade. O que, aliás, aconteceu em todo país que, na crise, flexibilizou direitos, modernizou legislação ou, de uma forma ou de outra, incentivou o custo da produção. O Brasil vive muitas dificuldades porque, além da crise econômica, nós temos uma crise política sem fim, com dificuldades cada vez maiores na separação dos poderes. Isso tudo torna esta eleição de 2018 uma eleição única, com a política desgastada e com um número de candidatos que remonta à eleição de 1989.

O senhor falou que ia defender um projeto alternativo. Qual é esse projeto?
O projeto alternativo significa que é diferente da candidatura do Michel ou do Meirelles, porque elas não acrescentam nada ao MDB. São candidaturas preocupadas em defender uma prática que não está sendo aceita na sociedade.

E não tem nenhum outro nome no MDB?
O sonho do MDB é ter um candidato a presidente competitivo, que agregue nos estados, que some. Essa candidatura é imbatível numa convenção. É o que sempre quisemos, o problema é que não temos. A candidatura do Michel é a defesa do legado do governo, não do partido.

E como será a defesa do legado do partido?
O MDB hoje está vivendo papel contrário ao que desempenhou no passado. Por isso, precisa mudar. Não é a ponte para o futuro, é a ponte para a sobrevivência. Esse sentimento de necessidade de preservar o MDB não se conjuga com a candidatura do Michel e do Meirelles, não é compatível. Daí a necessidade de um cenário alternativo, que precisa ser articulado. Precisamos construir uma convergência em torno da repetição do que aconteceu em 2006, quando o MDB aprovou não ter candidatos, contra a candidatura própria do Anthony Garotinho. Ou pode caminhar para aprovar alianças. Nesse caso, indicando ou não o vice-presidente.

Ou seja, o senhor acha que não é momento de o MDB ter candidatura própria?
No passado, os oráculos da política brasileira vaticinaram o fim do MDB, e não se apagou a luz do partido, porque nós ganhamos aquela convenção, respeitando as prioridades regionais. Ou seja, as prioridades políticas programáticas eleitorais. E isso favoreceu a eleição de grandes bancadas, e o MDB, de novo, foi um dos partidos que mais tiveram votos na eleição. Mesmo não tendo candidatos nos grandes centros aos governos estaduais, teve uma votação muito grande, próxima do primeiro colocado.

O cenário atual é outro?
Hoje, esse cenário é completamente diferente. Não temos mais o número de governadores que tínhamos, pelas circunstâncias eleitorais. Alguns deixaram seus cargos para ser candidatos. Tivemos rebaixamento na Câmara e no Senado. A compreensão da necessidade de casar os interesses regionais do MDB com candidatura nacional e com aliança vai dificultar a homologação dos nomes do Michel ou do Meirelles pela fragilidade eleitoral que eles hoje significam. E, se contarmos com a presença do Michel nos palanques, muita gente vai pagar com a derrota o preço dessa incompreensão. Eu acho até que o Henrique Meirelles melhorou. Não pelos resultados que obteve na economia, mas pela grande jogada de marketing que ele fez ao posar com a cadela. Ouvi isso de muitos publicitários. Sem dúvida que ele ficou mais humano.

O senhor acha que todos os pré-candidatos vão ficar ou vai afunilar?
Acredito que todos ficarão, inclusive o Lula. E esse quadro eleitoral deverá ficar congelado até decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com efeito suspensivo para o STF (Supremo Tribunal Federal).

Só quando o Supremo der um veredito sobre a candidatura do Lula iremos destravar o quadro?
A complexidade tornou mais fácil prender o Lula não votando as ADCs do que impedir a candidatura dele com a legislação eleitoral. A própria Lei da Ficha Limpa garante aos condenados em segunda instância o direito de pedir o registro. E, pedido o registro, tem que ser tratado em igualdade de condições com os outros candidatos.

Ou seja, ele ainda pode recorrer ao Supremo depois. Então, o senhor acha que teremos candidatura de Lula?
Eu acho. Não enxergo no TSE, que é uma Corte respeitável, um procedimento igual ao do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região. Que, não há dúvidas, colocou a condenação do Lula no calendário eleitoral para obrigar a sua prisão.

Como o senhor vê o Joaquim Barbosa, que surge como opção dentro do PSB?
Sempre achei Joaquim Barbosa um grande nome. Aliás, não é surpresa seu desempenho nas pesquisas. Todas as pesquisas que incluíram seu nome apontavam esses resultados.

O senhor poderia apoiá-lo?
Se o Joaquim acertar na política, ele pode entrar no jogo com mais facilidade do que o Ciro Gomes, do que a Marina Silva ou do que o próprio Geraldo Alckmin. Mas precisa acertar na política. É um nome respeitável, mas eu voto no Lula. Eu apoiaria o Lula. Eu confio na hipótese, sobretudo pelos avanços da última semana no STF, de a sua candidatura sobreviver até a eleição. Não vejo alternativa para ele senão insistir no direito que tem de ser candidato, apesar da condenação sem provas por um típico juízo de exceção.

E entre os que tentam se firmar no centro, o senhor acredita que Rodrigo Maia ainda pode ser candidato?
Não, não acredito. A candidatura do Rodrigo tem a mesma consistência da candidatura do Michel ou do Meirelles. Mas seria bom para a democracia a participação de candidatos com pensamentos políticos econômicos diferentes. Isso que, sem dúvida, diferenciará um debate. Mas o jogo, entendo que continuará congelado até a última semana de setembro. Porque, pelas pesquisas, uma quantidade enorme de eleitores diz que não vai votar em ninguém, vai anular o voto, não vai comparecer às eleições.

E como o senhor vê o Jair Bolsonaro?
Penso radicalmente diferente dele, mas não subestimo a candidatura.
Aliás, no mundo todo, esse fenômeno de direitização, de discurso contra política, tem crescido. E muitas vezes ganha, porque são subestimados.

Agora tem a questão do financiamento, não é? Como vai ser a questão do dinheiro?
Esse é o problema do MDB e de muitos partidos. Tentamos estabelecer regras para dar isonomia do financiamento para que não houvesse prejuízos para correntes nos partidos. Mas o presidente Michel Temer vetou. O que deixa aos partidos a definição para o financiamento, esse é outro problema que precisa ser conjugado. Porque a candidatura do Meirelles, ou do Temer, significará mais dificuldade de financiamento para o MDB.

Mas o Henrique Meirelles disse que financia a campanha dele…
Sem dúvida é outro fator que humanizará mais a candidatura. Mas o Meirelles é a versão piorada do Michel. O Michel ainda tem política, o Meirelles não tem popularidade nem política.

O ministro Carlos Marun disse,na semana passada, que o senhor faltou à reunião, mas não falta à inauguração. Como o senhor vê a crítica?
Na minha terra, costuma-se dizer que ninguém está livre de coice de burro e de pedrada de doido. Mas só rebato críticas de quem conheço. Marun? Quem é Marun? Não conheço, portanto, nem vou responder.

Se o PT trocar o Lula pelo Haddad, consegue repetir a votação no Nordeste?
Seria trocar o lulismo pelo petismo. Em português claro, não seria uma boa troca. Recomenda-se que o Lula esgote todos os meios para sua candidatura.

Mas até lá dá tempo de fazer a transferência de votos?
Com esse jogo que está aí, qualquer um que se apresentar como substituto do Lula, eles destruirão. Com aquela narrativa que eu falei: alguém, para sair da cadeia, conta um fato que não precisa provar. Hoje, me lembrei do Estado Novo, quando Graciliano Ramos foi preso por ser comunista quando nem comunista era. O que se reproduz agora na democracia com a condenação do Lula por um tríplex onde ele nunca morou e que nunca comprou, por ter reformado uma cobertura que, agora se sabe também, nunca reformou. Inacreditável. Mas é um sintoma dos tempos em que vivemos, que não são únicos no Brasil, tivemos outros.

O senhor acredita que outras pessoas que estão sob investigação vão acabar tendo o mesmo destino que o Lula?
Quando defendemos a lei do abuso de autoridade, o Moro (o juiz Sérgio Moro) veio aqui para defender a aprovação da lei, desde que ressalvasse a hermenêutica. O que significa não obrigar o juiz a julgar de acordo com a lei, com provas, mas de acordo com a convicção. Mas não basta dizer que tem, tem que mostrar para condenar. Se não, acontece o que aconteceu com Lula. Condena, mas as pessoas não se convencem. Nesse cenário, é evidente que qualquer um pode ser tratado na mesma condição que o Lula.

Na quarta-feira, o Supremo vai analisar o foro privilegiado. Como está essa questão no Congresso?
Essa intervenção no Rio de Janeiro, entre outros males, imobiliza o Congresso. Retira do Legislativo o protagonismo que ele deve exercer. Aprovamos em dois turnos no Senado, e eu me dediquei a isso, o fim do foro para os 58 mil, como qualquer democracia civilizada. Não basta acabar com o foro para 600 pessoas e garanti-lo para outros. Eu sempre defendi investigação. Toda vez que me investigam, eu defendo que é uma oportunidade para que eu possa esclarecer fatos, fazer a prova negativa. Mas todos têm que ser investigados. Todos, sem exceção. Por exemplo, por que é que não se investiga o (ex-procurador-geral da República, Rodrigo) Janot depois do que aconteceu na delação da JBS?

O senhor acha que ele tinha que ser investigado?
Tinha que ser investigado. E tem que ser investigado na primeira instância, como qualquer outro.

Quanto tempo mais será que vai ter de Lava-Jato?
A Lava-Jato precisa continuar. Ela vai deixar muitos resultados. Mas ela não pode prender para delatar, ou então prende para continuar prisão provisória com a condenação em primeira instância, que foi o que aconteceu com o (Antonio) Palocci, deixando a delação como a única alternativa. Eu sempre defendi a Lava-Jato, sempre considerei que ela deixaria avanços civilizatórios. Mas isso não significa dizer que, por isso, pode exagerar, abusar da autoridade, passar de seus limites com vazamentos que não foram apurados, muitos deles mentirosos, com delações seletivas dirigidas. Eu nunca me esqueço de uma nota que dizia que, para todos os 77 delatores da Lava-Jato, foi feita a pergunta “nos ajude, o que você sabe sobre o Renan Calheiros?”. Isso não pode acontecer. Juízes de primeira instância, por meio da convocação de suas entidades, invadirem o STF até que ele receba uma denúncia contra o senador Renan Calheiros, que foi o que aconteceu em dezembro do outro ano. Isso não pode acontecer, porque isso desequilibra a democracia. Atemoriza as pessoas.

O senhor ficou atemorizado com aquilo?
Todo ser humano tem medo. Eu também tenho medo. Esse enfrentamento que eu fiz em alguns momentos não é heroísmo, é que ou faz isso, ou vai prevalecer a compreensão que eles querem que prevaleça, que é a generalização da corrupção na política, com a participação de todos. É um jogo bruto que acaba nivelando culpados com inocentes. E criando um cenário de substituição da política. No Paraguai, agora tivemos abstenção de 44%. Eles querem que, nesta eleição, tenhamos cenário igual no Brasil.

E acha que vamos ter esse cenário?
Acho que vamos. Por isso que falei lá atrás, o quadro ficaria congelado porque uma parcela significativa, 30% da população, diz que não vota em ninguém, 35% ou 36% votam no Lula. Aumentou depois da prisão, em Maceió. Para que o Ciro cresça um ponto, ele tem que derrubar um ponto do Alckmin, da Marina, do Álvaro, do Collor...

Como o senhor vê essa questão de a ministra Cármen Lúcia dizer que seria depenar o Supremo rediscutir a prisão em segunda instância?
Tenho o maior respeito pela ministra, consideração, mas acho que houve um equívoco no encaminhamento dessa questão, e o preço está sendo cobrado agora. Quanto mais cedo ela votasse a ADC, mais segurança jurídica se tinha, menos dúvida havia.

O senhor algum dia imaginou que o Supremo fosse ter mais protagonismo que o Legislativo?
Este cenário não é novo, quando alguém tenta afastar presidente de Congresso com uma liminar. Quando isso acontece, já dá para oferecer uma dimensão do papel que cada um exerce.

A população parece que está aprovando o novo Supremo e o juiz Sérgio Moro, o contrário do que ocorre com a classe política. Como vai ser chegar em outubro para pedir voto para o eleitor diante de uma população tão mal-humorada?
Esse fenômeno não é só brasileiro. Aqui temos especificidades, mas é preciso robustecer a ocupação de espaços, na comunicação, o equilíbrio desse debate, para que cresça a percepção de que nada se resolve sem a política. Mesmo a política com essa importância tem que responder por seus erros eventuais, por isso, a necessidade de investigações. Mas não apenas para as políticas, mas para os tribunais, por exemplo. Todos os setores.

O senhor usa muito o Twitter. A campanha vai ser mais em rede social, então?
Cada vez mais vamos ver campanhas com mais participação de redes sociais. Esta daí terá uma participação forte, porque você vai ter uma diminuição do horário eleitoral, o que valerá mais, na prática, serão as iniciações e a rede social terá um papel grande a cumprir, para o bem e para o mal.


Luiz Carlos Azedo: Primeira fissura

Renan tem poder para emparedar as reformas que forem aprovadas na Câmara. A simples alteração pelo Senado faz o processo dar um largo passo atrás

 

 

Surgem as primeiras grandes fissuras na base do governo Temer, a principal delas no Senado, encabeçada pelo líder da bancada do PMDB, Renan Calheiros (AL), que assumiu uma clara dissidência em relação à orientação do governo. Renan é um sobrevivente de todos os governos, desde o de Fernando Collor, que o revelou para a política nacional. É um ás da baldeação: carregou o caixão de Dilma Rousseff até a porta do cemitério. Considerado um dos melhores estrategistas do Senado, ao lado de Jader Barbalho (PMDB-PA), que atua na surdina, seu desembarque do governo é iminente e perigoso.

Na manhã de ontem, Renan criticou mais uma vez a condução dada ao país pelo presidente Temer, o qual acusou de não ouvir ninguém, o que não é verdade. O presidente da República ouve pelo menos três integrantes da equipe de governo, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da secretaria de Governo, Moreira Franco, além de Rodrigo Maia, presidente da Câmara, e Romero Jucá, presidente do PMDB e líder do governo, que disputa influência no Senado com o líder da bancada.

Renan fez ontem uma comparação de Temer com a ex-presidente Dilma: “E a impressão de agora, com o presidente Michel, é que com essa política econômica, com esse aumento de imposto, com essa renegação da folha, com tudo isso, parece que, diferentemente da Dilma, que não sabia o que fazer, o Michel não tem o que fazer. E isso é pior para o Brasil”, disparou. E voltou a atacar a reforma da Previdência: “Uma reforma da banca, querendo arrecadar R$ 780 bilhões em 10 anos. Tem que fazer uma reforma da Previdência ideal”.

Ao atacar a política econômica deu uma pista do verdadeiro alvo: “O governo está errando ao querer resolver a crise econômica, colocar a inflação na meta com mais recessão. Isso é um horror. Isso vai levar o país, em um curtíssimo espaço de tempo, infelizmente, a uma crise maior”. O problema de Renan é a negociação da dívida dos estados, em apreciação na Câmara, que está sendo conduzida pelo ministro da Fazenda. Quer flexibilizar o acordo com os estados para favorecer o governo de Renan Calheiros Filho (PMDB), em Alagoas, candidato à reeleição junto com o pai.

Outro ator importante no jogo parece se manter ao largo da disputa, o presidente do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), que tem boas relações com Temer, mas jamais seria eleito para o posto que ocupa sem o apoio de Renan. Eunício costuma virar uma esfinge nessas horas e esperar o vento firmar para escolher o rumo a seguir. Somente assume uma posição mais agressiva quando se sente ameaçado. Todos estão citados nas delações premiadas da Operação Lava-Jato, o que aumenta o estresse entre eles.

Temer já passou por muitas disputas com Renan, que inclusive tentou removê-lo da presidência do PMDB. É dispensável dizer quem foi que até agora riu por último. Quando parecia na iminência de ser derrotado dentro da legenda, Temer fez um acordo com os deputados do PT, foi eleito presidente da Câmara e, depois, vice-presidente da República na chapa de Dilma Rousseff, em 2010. Hoje, é o presidente da República, depois de romper com Dilma Rousseff e atrair o apoio de Renan.

A recidiva dessa velha disputa, porém, pode desestabilizar o governo. Renan tem poder para emparedar as reformas que forem aprovadas na Câmara. A simples alteração pelo Senado do que foi aprovado pelos deputados faz o processo dar um largo passo atrás. Além disso, caso Renan consiga manter a bancada de senadores do PMDB coesa, dificilmente isso não dividirá a bancada de deputados. Não é à toa que o Palácio do Planalto preferiu não alimentar a polêmica. A opção foi correr com a votação do acordo das dívidas dos estados na Câmara.

A renegociação
Esse assunto vem se arrastando desde o ano passado, quando os deputados retiraram as contrapartidas do projeto original do Ministério da Fazenda, sob forte pressão dos governadores. Temer enviou um novo texto para socorrer os estados em situação mais dramática, principalmente Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul. Há duas semanas, uma batalha surda se desenvolve entre a equipe econômica e base do governo na Câmara para votar o projeto.

Para renegociar as dívidas, a Fazenda quer que o acordo autorize a privatização de empresas dos setores financeiro, de energia e de saneamento para quitar dívidas, como já aconteceu com a Cedae, no Rio de Janeiro; que eleve a alíquota de contribuição previdenciária dos servidores estaduais; e que reduza incentivos ou benefícios tributários. Tudo enguiça na hora em que o acordo proíbe estados de conceder vantagem, aumento, reajuste ou adequação de salários a servidores; criar cargos ou funções que impliquem aumento de despesa; alterar a estrutura de carreira que gere aumento de gastos; realizar concurso público, ressalvadas hipóteses de reposição de cargos vagos; criar ou aumentar auxílios, vantagens, bônus, abonos ou benefícios de qualquer natureza. São matérias indigestas para candidatos ao Senado e governadores candidatos à reeleição.

 


Planalto e base avaliam desacelerar projeto

Matéria sobre abuso de autoridade poderá sair da pauta de votação do Senado amanhã em razão da pressão pública

BRASÍLIA - Após manifestações País afora, que tiveram como foco a atuação dos parlamentares para inibir investigações da Operação Lava Jato e ações de juízes e promotores, o Palácio do Planalto e líderes partidários do Senado avaliam que o projeto de lei de abuso de autoridade deverá ser desacelerado. A matéria poderá sair da pauta de votação do plenário do Senado amanhã.

Esse calendário de apreciação do projeto havia sido anunciado há três semanas pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), principal alvo dos protestos de ontem. Segundo líderes da base e interlocutores do Planalto, a tendência é que a pressão pública retire a proposta de lei de abuso de autoridade da lista de prioridades de votação.

Oficialmente, o discurso do governo é não se envolver em assuntos do Legislativo, embora haja uma expectativa de que o projeto não avance e chegue à mesa do presidente Michel Temer para decidir se veta ou sanciona as medidas. O Executivo defende foco total na agenda do Senado para a votação do segundo turno da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Teto de Gastos, que deve ser apreciada em segundo turno dia 13.

O Planalto considera que as manifestações não vão prejudicar as reformas. Avalia também que Renan – mesmo sendo alvo dos protestos – está comprometido com a agenda de recuperação econômica. Temer foi preservado das críticas da rua, mas o Planalto, conforme reportagem do Estado de ontem, receia ser tragado pela onda de protestos.

No fim da tarde, o Planalto divulgou nota em que defende que os “Poderes da República estejam sempre atentos às reivindicações da população brasileira”. “A força e a vitalidade de nossa democracia foram demonstradas mais uma vez, neste domingo, nas manifestações ocorridas em diversas cidades do País”, declarou a Secretaria Especial de Comunicação do Planalto.

O líder do governo no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), disse que é pessoalmente contra a votação do projeto. “A atualização de uma matéria de 1950 não pode ser prioridade agora”, afirmou.

O líder do DEM na Casa, senador Ronaldo Caiado (GO), disse que vai apresentar um requerimento de retirada de pauta da matéria. “Não podemos ter uma pauta provocativa nem podemos fazer uma queda de braço com a população”, afirmou, avaliando que é preciso preservar a governabilidade de Temer.

Outra liderança da base disse não acreditar na votação do projeto nesta terça-feira. Uma das ideias em discussão seria remeter o projeto para a Comissão de Constituição e Justiça do Senado a fim de discuti-lo com integrantes do Judiciário e do Ministério Público.


Fonte: http://gilvanmelo.blogspot.com.br/2016/12/planalto-e-base-avaliam-desacelerar.html


Fernando Gabeira: Enquanto o Brasil chorava

No Brasil os bandidos é que determinam como e o que pode ser feito contra eles

Na madrugada, como costumam sempre fazer, os deputados votaram um texto destinado a golpear a Lava Jato e intimidar os procuradores e juízes. Dessa vez uma madrugada de luto pela queda do avião da Chapecoense, desastre que impactou o mundo.

Temer prometeu vetar a anistia para o caixa 2 e outros crimes. Mas não mencionou o tema da represália à Justiça, uma das grandes aspirações de Renan Calheiros.

O Brasil está diante de uma afronta espetacular: deputados investigados por corrupção determinam os limites dos próprios investigadores. Denunciar sua manobra não significa conciliar com abuso de autoridade, mas apenas enfatizar que legislaram em causa própria. No Brasil são os bandidos que determinam como e o que pode ser feito contra eles.

O que existe mesmo, como ação central, é uma tentativa de neutralizar a Operação Lava Jato, sobretudo às vésperas da divulgação dos depoimentos da Odebrecht. O caminho foi interferir nas “10 Medidas Contra a Corrupção”.

Interferir na proposta, na verdade, é um atributo do Congresso. Assim como não deve simplesmente carimbar medidas do governo, o Congresso não pode apenas carimbar medidas que se originam na sociedade.

Não há nenhum problema em cortar exageros, em adequar ao texto constitucional, etc. A crise começa quando decidem confrontar a Lava Jato e outras investigações. Em primeiro lugar, com manobras sobre uma anistia impossível; em segundo lugar, aprovando uma lei de controle de autoridade que não pertencia à proposta original.

Aliás, esse tema pertence a Renan Calheiros, com 12 investigações no Supremo Tribunal Federal. A Câmara dos Deputados antecipou-se a ele porque, com o êxito da Lava Jato, a contraofensiva parlamentar tornou-se a principal tarefa para bloquear as mudanças.

Não dá. Assim como não deu para o governo transformar-se num grupinho de amigos do Geddel e pressionar para que o prédio La Vue fosse construído com 30 andares.

Renan Calheiros segue sendo a maior ameaça. É curioso como um homem investigado 12 vezes coloca como sua tarefa principal controlar a Justiça. Com a votação da Câmara ele recebeu um alento. Renan e os deputados caminham para impedir que o Brasil se proteja dos assaltantes que o levaram à ruína.

Renan tem influência. Há os que pensam, como ele, que é preciso torpedear a Lava Jato e há os que não ousavam combatê-lo, mas agora começam a perceber que foi longe demais. E o derrotaram no plenário do Senado, impedindo a urgência na lei da intimidação.

Renan desenvolve o mesmo estilo de Eduardo Cunha, o cinismo, e usa o cargo para se proteger da polícia. Enfim, Renan delira, como Cunha delirava. A melhor saída é eles que se encontrem em Curitiba. Na ânsia de sobreviver, não hesitam em agravar a situação do País, já em crise profunda.

A votação escondida num momento de luto, tudo isso é muito esclarecedor sobre a gravidade do desafio que lançaram. O sonho dourado dos políticos corruptos ainda em liberdade não é apenas deter as investigações. Eles querem reproduzir o momento anterior, em que assaltavam os cofres das estatais, vendiam artigos, emendas, frases, às vezes até um adjetivo.

Romero Jucá é um craque nessa arte. Ele conseguiu passar uma lei que permite a repatriação do dinheiro de parentes de políticos. E não se expôs. Jogou apenas com a incompetência da oposição.

Os membros da apodrecida cúpula do PMDB precisam ser julgados. Enquanto estiverem no poder, estarão tramando uma volta ao passado, porque é esse o território em que enriqueceram. Eles sabem que nada é tão fácil como antes, caso contrário Sérgio Cabral estaria em Paris aquecendo o bumbum em privadas polonesas.

O problema no Brasil é julgar para gente com foro especial. O Supremo é um órgão atravancado por milhares de processos.

Uma razão a mais para julgar os políticos investigados com urgência é que estão legislando em causa própria. Depois de tantas investigações, tanta gente na rua, é incrível que o Brasil continue sendo dirigido pelo mesmo grupo que o assaltou.

É inegável que houve avanços, muito dinheiro foi restituído. Dirigentes do PT estão na cadeia, assim como alguns do principais empreiteiros do País. Entretanto, quem conseguiu escapar até agora organiza a resistência, prepara-se para o combate e só descansará quando puder de novo roubar em paz.

Esta semana me lembrei do Glauber Rocha. Num de seus diálogos mais geniais, um personagem dizia: “Já não sei mais quem é o adversário”. Se a sociedade e a Justiça tiverem dúvidas sobre quem é, podem pagar caro por essa hesitação.

O movimento inspirado por Calheiros e iniciado com êxito na Câmara é, no fundo, uma provocação irresponsável. O Congresso, recentemente, já foi invadido por gente indignada com a corrupção. Toda a luta pelo impeachment foi conduzida de uma forma pacífica. Todavia se torna mais difícil evitar a radicalização, uma vez que deputados e senadores já mal podiam andar pelas ruas antes mesmo de golpearem a Lava Jato.

Será preciso muita habilidade e paciência para julgá-los e prendê-los. Se isso não for feito logo, o Brasil merecerá o nome que Ivan Lessa lhe dava nos seus textos bem-humorados: Bananão. Não nos deixam outro caminho senão lutar com todas as forças, como se tivéssemos sido invadidos por alienígenas de terno e gravata.

Depois de nove anos, o primeiro inquérito em que Renan Calheiros é acusado finalmente entrou na pauta do Supremo para ser julgado. O silêncio dos ministros ao longo de todos esses anos contribuiu para que ele se sentisse impune. Se escolheram esta semana para absolvê-lo, então aí terão, ainda que involuntariamente, se tornado numa força auxiliar do crime político. Se condenado na primeira ação, Renan começará a arrumar as malas para Curitiba. Lá nasceram os demais inquéritos e lá já estão outros que deliram com riqueza e poder. Como Eduardo Cunha.


Fonte: http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,enquanto-o-brasil-chorava,10000092006