Partidos
Luiz Carlos Azedo: Rio, 40 graus
Agora, a Operação Calicute investiga a conexão entre o escândalo da Petrobras e a política do Rio de Janeiro
Com dois ex-governadores na cadeia, Anthony Garotinho (PR) e Sérgio Cabral Filho (PMDB), em menos de 48 horas, e um governador que ninguém sabe como terminará seu mandato, Luiz Fernando Pezão (PMDB), seja em decorrência da Operação Lava-Jato (ele também é investigado, mas tem foro privilegiado), seja em razão do colapso financeiro, o Rio de Janeiro chegou ao fundo do poço. É o fim melancólico de um projeto concebido para ser a sede do capitalismo de Estado no Brasil, no auge do sonho de Brasil potência do governo Geisel. E da tentativa de revivê-lo, durante os governos Lula e Dilma, para se contrapor e neutralizar o peso econômico e político de São Paulo.
Sim, porque esse foi o objetivo da fusão da antiga Guanabara, o centro nervoso da política nacional, após a inauguração de Brasília, com o antigo Estado do Rio de Janeiro, cuja política gravitava de Niterói a Campos, enquanto a economia girava no eixo Duque de Caxias-Volta Redonda. De um lado, o mandachuva era o governador Chagas Freitas, do MDB, aliado do regime disfarçado de oposição; do outro lado da baía, Raimundo Padilha, da Arena, remanescente do Integralismo. A decisão foi autocrática, com a nomeação de um interventor para comandar a fusão, o brigadeiro Faria Lima, mas o desenho da estrutura do novo estado foi traçado por uma Constituinte eleita em 1974.
A memória política dos dois estados cultuava dois governadores: o udenista Carlos Lacerda (1914-1977), na capital, que fora cassado mas ainda estava vivo, e o petebista Roberto da Silveira (1923-1961), no antigo Estado do Rio, que morrera num desastre de helicóptero. O projeto de transformação do novo estado numa potência econômica, a partir do setor produtivo estatal, era ancorado nas sedes das principais empresas estatais: a Petrobras e a Vale do Rio Doce, bem como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco Nacional de Habitação (BNH), na capital, além da Refinaria Duque de Caxias, a Fábrica Nacional de Motores, a Companhia Brasileira de Álcalis e a Companhia Siderúrgica Nacional, no interior.
O primeiro sinal de que isso daria errado foi até prosaico. A larga Avenida Norte-Sul, dos Arcos da Lapa à Rua da Carioca, fora projetada para fazer a ligação rápida entre as sedes das estatais, tanto na Avenida Chile como na Presidente Vargas, e a Avenida Perimetral. Nada que não pudesse ser feito, se o tradicional Bar Luiz não estivesse no caminho. Artistas e intelectuais boêmios do Rio de Janeiro resolveram fazer uma campanha para salvar o Bar Luiz e tombar a Rua da Carioca. A nova avenida morreu ali.
Como Plano Nacional de Desenvolvimento de Geisel, a fusão também foi um tremendo desastre na política. Vitorioso em 1974, o MDB também fez bigode, cabelo e barba nas eleições de 1978, o que levou Faria Lima a uma composição com os políticos mais adesistas e fisiológicos dos dois estados. Resultado: na Constituinte, as antigas estruturas dos estados foram superpostas e ampliadas: a administração da antiga Guanabara foi servir à Prefeitura do Rio; a do antigo estado do Rio, ampliada para atender as necessidades do novo estado. O novo estado já nasceu inchado: de um lado, pelos apadrinhados de Chagas; de outro, por apaniguados de Padilha; e, finalmente, pela turma que chegou com Faria Lima. Todos efetivados pela Constituinte. Depois, vieram os governos de Leonel Brizola (PDT), em 1982, e de Moreira Franco (PMDB), em 1986, aos quais se seguiu a Constituinte de 1988. Mais uma leva de funcionários foi efetivada.
Calicute
Seguiram-se o segundo governo de Brizola, que renunciou ao mandato, e os governos Nilo Batista, Marcelo Alencar, Anthony Garotinho, Benedita da Silva e Rosinha Garotinho, um nascendo praticamente dentro do outro, até a eleição de Sérgio Cabral, em 2006. Seu governo foi dos mais exitosos, por causa da economia do petróleo e da política de segurança pública. Carioca da gema, Cabral parecia redimir seus conterrâneos da frustração com a fusão, até que entrou no oba-oba do petróleo da camada pré-sal e aceitou a mudança do regime de concessão para o de partilha. Também embarcou nos delírios de Eike Batista e apostou as fichas no novo Maracanã da Copa do Mundo e nas obras das Olimpíadas. Além disso, não se contentou com o apoio da velha elite carioca – resolveu fazer parte dela.
A mudança do regime de concessão para regime de partilha seria mais do que suficiente para uma ruptura entre Cabral e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como fora a ruptura de Moreira Franco com José Sarney por causa do polo petroquímico, cuja planta foi transferida do Rio para Camaçari (BA). Por que não houve a ruptura? Ora, porque essa aliança – que possibilitou a reeleição de Lula e Cabral e, depois, a eleição e reeleição de Dilma Rousseff e Pezão – estava muito bem azeitada pelas empreiteiras, e contou com apoio maciço da massa de servidores federais e estaduais e funcionários das estatais que hoje pagam essa conta. Agora, a Operação Calicute, desfechada ontem pelos juízes federais Marcelo Bretas, do Rio, e Sérgio Moro, de Curitiba, investiga a conexão entre o escândalo da Petrobras e a política do Rio de Janeiro.
https://youtu.be/AhuJ3dUVQvc
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br
Luiz Carlos Azedo: O grande operador
O discurso em defesa da Petrobras serviu para a montagem do esquema de propina e financiamento de campanhas eleitorais
O juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, aceitou ontem a denúncia feita pelo Ministério Público Federal contra o ex-ministro Antônio Palocci e outras 14 pessoas, por crimes de corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia é um “case” de como funcionava o esquema de propina da Petrobras e da escala de desvio de recursos públicos para financiamento do PT e enriquecimento dos envolvidos. Foram pagos, segundo o MPF, R$ 252,5 milhões em propinas em 21 contratos de afretamento de sondas para exploração do pré-sal, por meio da Sete Brasil. A propina foi fixada em 0,9% sobre o valor total dos contratos: R$ 28 bilhões. Seis sondas foram negociadas com o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, da Odebrecht.
Tal operação não seria possível se a Lei de Licitações não tivesse sido escanteada pelo “regime especial” criado para a contratação de obras e serviços pela Petrobras, a pretexto de dar agilidade à empresa nos seus investimentos e operações comerciais. Também não seria possível se não houvesse uma lei para favorecer a formação de empresas nacionais de tecnologia, estabelecendo a obrigatoriedade de componentes nacionais. E não ocorreria se o governo não tivesse financiado, a juros camaradas, a criação de estaleiros para salvar a indústria naval. Muito menos se não houvesse uma lei que obrigasse a Petrobras a ter 30% de participação na exploração do petróleo da camada pré-sal.
Ou seja, o discurso em defesa da Petrobras e da tecnologia nacional, de salvação da indústria naval e de estímulo aos “campeões nacionais” serviu para a montagem do grande esquema de desvio de recursos públicos e financiamento de campanhas eleitorais que quebrou a Petrobras e levou de roldão a economia do país. Naturalmente, pagando um pedágio altíssimo para seus operadores: “Conforme planilha apreendida durante a operação, identificou-se que entre 2008 e o final de 2013 foram pagos mais de R$ 128 milhões ao PT e seus agentes, incluindo Palocci. Remanesceu, ainda, em outubro de 2013, um saldo de propina de R$ 70 milhões, valores estes que eram destinados também ao ex-ministro para que ele os gerisse no interesse do Partido dos Trabalhadores”, afirma a denúncia.
A lista dos envolvidos não tem pé de chinelo: Antonio Palocci, Branislav Kontic, Marcelo Odebrecht, Fernando Migliaccio da Silva, Hilberto Mascarenhas Alves da Silva Filho, Luiz Eduardo da Rocha, Olivio Rodrigues Junior, Marcelo Rodrigues, Rogério Santos de Araújo, Monica Moura, João Santana, João Vaccari Neto, João Ferraz, Eduardo Musa e Renato Duque. Na época em que o escândalo da Sete Brasil estourou, a presidente Dilma Rousseff moveu mundos e fundos para tentar salvar a empresa, mas o rombo era grande demais.
Campanha eleitoral
Foi de um contrato da Sete Brasil que saíram as nove transferências feitas por Zwi Skornick, de US$ 500 mil cada uma, para contas mantidas no exterior em nome da offshore Shellbill, descobertas pela Lava-Jato, que levaram à prisão do casal de marqueteiros de Lula e Dilma: “Tanto João quanto Mônica tinham pleno conhecimento de que tais recursos haviam sido auferidos pelo Partido dos Trabalhadores em decorrência de crimes praticados contra a Petrobras”, diz a denúncia. “A utilização de tão refinada técnica de lavagem de dinheiro revelou claramente a consciência de ambas as partes de que os US$ 4,5 milhões eram produto de crime anterior e que, exatamente por isso, não poderiam ser repassados à campanha eleitoral da forma legalmente estabelecida.”
A casa começou a cair quando Pedro Barusco, ex-presidente da Sete Brasil, em delação premiada, entregou à Lava-Jato US$ 96 milhões que estavam escondidos em contas secretas ligadas a offshores. Foi um espanto na Petrobras, onde o montante passou a ser considerado pelos técnicos e executivos da empresa uma unidade de valor na hora de discutir projetos e orçamentos: “um barusco, dois baruscos…” Na verdade, o dinheiro não era só dele, era uma espécie de caixa 2 do esquema cujo principal operador seria Palocci.
O ex-ministro da Fazenda entrou na alça de mira dos investigadores da Lava-Jato quando o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, que acaba de se livrar da tornozeleira eletrônica, disse que, em 2010, o doleiro Alberto Yousseff lhe pediu R$ 2 milhões da cota de propinas do PP para a campanha presidencial da ex-presidente Dilma Rousseff. O pedido teria sido feito por encomenda de Palocci.
Fonte:
http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-grande-operador/
Luiz Carlos Azedo: PSDB e PMDB levam a melhor
Um aspecto importante foram as dificuldades dos prefeitos candidatos à reeleição, como Luciano Rezende(PPS), em razão da crise econômica
O segundo turno das eleições municipais confirmou uma tendência de fortalecimento da base do governo nas eleições. Isoladamente, o PSDB foi o grande vitorioso do segundo turno, com a reeleição dos prefeitos Arthur Virgílio Neto, em Manaus (AM); Zenaldo Coutinho, em Belém (PA); Rui Palmeira, em Maceió (AL); e a eleição dos tucanos Marchezan Júnior, em Porto Alegre (RS), e Dr. Hildon, em Porto Velho (RO). Ainda nas capitais, o PMDB venceu em Goiânia (GO), com Iris Rezende; Florianópolis(SC), com Gean Loureiro; e Cuiabá (MT), com Emanoel Pinheiro.
Os dois partidos se enfrentaram em Porto Alegre, Cuiabá e Maceió, mas foi chumbo trocado. Nas demais capitais, houve pulverização partidária: Rafael Grega (PMN) venceu em Curitiba (PR); Alexandre Kalil (PHS) em Belo Horizonte (MG); Luciano Rezende (PPS) em Vitória; Marquinhos Trad (PSD) em Campo Grande; Edvaldo Nogueira (PCdoB) em Aracaju (SE); Geraldo Julio (PSB) em Recife (PE); Roberto Cláudio (PDT) em Fortaleza (CE); Edvaldo Holanda Júnior (PDT) em São Luiz (MA); e Clécio Veras (Rede) em Macapá (AP).
Nesse cenário, destaca-se a derrota de João Leite (PSDB) em Belo Horizonte, que enfraquece a posição do presidente do PSDB, Aécio Neves, embora o desempenho tucano nas capitais tenha sido tão espetacular no segundo turno quanto no primeiro. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, colheu vitórias importantes no ABC, com Paulo Serra em Santo André, contra Carlos Grana (PT); Orlando Morando em São Bernardo do Campo, contra Alex Manente (PPS); e em Ribeirão Preto, com Duarte Nogueira, que derrotou Ricardo Silva (PDT). Ou seja, o resultado acirrará a disputa interna pela candidatura do PSDB à sucessão de Michel Temer em 2018.
O PMDB foi a segunda força nas capitais e demais grandes cidades, mas nenhum nome desponta como alternativa para 2018. A derrota dupla de Eduardo Paes, que apoiou Marcelo Freixo (PSol) no segundo turno, tirou-o definitivamente do jogo; a eleição de Iris Rezende em Goiânia não resolve o problema da legenda. A única alternativa seria a reeleição de Temer, o que hoje é uma tese que implodiria a base do governo.
Outra variável importante são as vitórias do PDT em Fortaleza e São Luiz, que fortalecem a candidatura de Ciro Gomes e apontam para uma possível aliança da legenda com o PCdoB, que venceu em Aracaju. São cabeças de ponte para uma candidatura com apoio no Norte e Nordeste, que pode ser uma alternativa para o PT, caso se inviabilize a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que amarga a sua maior derrota eleitoral. Pela primeira vez, o PT não elegeu prefeito na região do ABC, seu reduto histórico. Lula ficou tão deprimido que sequer compareceu às urnas em São Bernardo, mesmo podendo votar nulo. PSDB e PPS disputaram o segundo turno na cidade.
Um balanço da eleição nos 57 municípios onde houve o segundo turno confirma a pulverização partidária: PSDB (14), PMDB (9), PPS (5), PSB (4), PDT (3), PR (3), PV (3), DEM (2), PRB (2), PSD (2), PTB (2), Rede (2), PCdoB (1), PHS (1), PMN (1), PTN (1), SD (1). Esse resultado está na contramão da reforma política que está sendo discutida no Congresso, que pretende restringir o número de partidos. O PMDB se aliou ao PT para controlar a comissão especial da reforma política na Câmara, que é presidida por Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) e tem como relator o deputado Vicente Cândido (PT). Esse resultado deve aumentar a dificuldade para aprovação da reforma.
Ajuste fiscal
Um aspecto importante foram as dificuldades dos prefeitos candidatos à reeleição, como Luciano Rezende (PPS), em razão da crise econômica. Ficaram pelo caminho, por exemplo, no primeiro turno, Fernando Haddad (PT), em São Paulo, e Gustavo Fruet (PDT), em Curitiba. Todos que chegaram ao segundo turno, nas capitais, mesmo com dificuldades, conseguiram se reeleger. O impacto dessas dificuldades no debate eleitoral resultou na apresentação de propostas mais realistas. Na verdade, a crise financeira dos municípios se agravou e vai se complicar ainda mais com a aprovação do teto dos gastos públicos.
As cidades com mais de 200 mil eleitores são as que têm mais dinamismo econômico, num universo de 5.568 municípios, cuja maioria vive dos repasses federais. O Índice Firjan de Gestão Fiscal (IFGF), calculado com base em dados de 2015 de 4.688 prefeituras, mostra que 87,4% delas estavam em situação entre difícil e crítica. Só 12,1% se encontravam em boas condições, sendo 0,5% cidades que apresentam uma situação fiscal robusta. Se os eleitos começarem a gestão fazendo o dever de casa, darão uma grande contribuição ao ajuste fiscal. Mesmo assim, as prefeituras sempre investiram mais e melhor na qualidade de vida das cidades do que os estados e a União.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br
Luiz Carlos Azedo: Cunha e a Lei de Dostoiévski
O ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi preso preventivamente ontem, por ordem do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, a pedido do Ministério Público Federal, que temia a sua fuga para o exterior por ter passaporte italiano. Sua prisão teve grande repercussão no Congresso, embora fosse esperada desde a sua cassação.
Os procuradores usaram os mesmos argumentos utilizados junto ao ministro-relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki, para afastá-lo do comando da Casa, o que foi decidido ‘excepcionalmente’ pelo Supremo. Agora, afirmaram que o político “ainda mantém influência sobre seus correligionários, tendo participado de indicações de cargos políticos do governo Temer”.
Segundo eles, Cunha “não poupou esforços para embaraçar as investigações” e seu poder “não diminuiu após ter deixado a Câmara”. Há um certo exagero na afirmação, mas não há dúvida de que Cunha continua tendo certa influência, embora menor do que aquela que tinha antes. Pesou também na decisão de Moro a acusação feita pelos procuradores de que Cunha teria indicado aliados para cargos estratégicos no governo. Na petição encaminhada ao juiz federal de Curitiba (PR) Sérgio Moro, citaram, como exemplo, a nomeação de Maurício Quintela para o Ministério dos Transportes. Segundo a denúncia, o parlamentar ainda tentou indicar um apadrinhado para cargo estratégico na Receita Federal.
Moro, porém, negou a apreensão dos carros de luxo de Cunha e de seus familiares – Porsche Cayenne(2013), Porsche Cayenne (2006/2006), Land Rover Freelander (2007/2008), Hyundai Tucson (2008/2009), Volkswagen Tiguan (2010/2011), Volkswagen Passat Variant (2003/2004), Ford Edge (2013) e Ford Fusion (2013) –, mas bloqueou a transferência dos veículos. Também negou nova busca e apreensão na casa do ex-presidente da Câmara, porque essa operação já havia sido feita por ordem do STF. Moro não viu necessidade de nova busca.
A prisão provocou uma espécie de barata-voa na Câmara, onde os aliados de Cunha já se articulam para fazer o sucessor de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na Presidência da Casa. Na eleição passada, foram derrotados porque o parlamentar carioca se articulou com a antiga oposição e com o PT. Além disso, os ex-aliados que votaram pela cassação de Cunha temem que o parlamentar, uma vez preso por tempo indeterminado, acabe recorrendo à delação premiada, como fez o ex-líder do governo Dilma no Senado, Delcídio do Amaral (ex-PT-MS).
Cunha destacou-se no parlamento como hábil negociador de projetos de natureza econômica e financeira, fazendo a interlocução entre grandes empresas, parlamentares e o próprio governo para aprová-los. Sua prisão se deu em razão da Operação Lava-Jato, mas seu envolvimento no caso é apenas a ponta de um iceberg. O mandato de quem recebeu dinheiro de Cunha para campanha pode subir no telhado.
Apesar da tensão no Palácio do Planalto, o presidente Michel Temer está blindado constitucionalmente: não pode ser investigado por fatos anteriores ao mandato, mesmo que Cunha faça alguma acusação contra ele. Mas a prisão do ex-presidente da Câmara serve também de aviso para o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), cujo afastamento do cargo e prisão já foram pedidos três vezes pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Todos foram negados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por falta de razões juridicamente robustas. Renan não cometeu os mesmos erros de Cunha, não aceitou um confronto aberto com o MPF. Articula nos bastidores do Congresso uma lei contra o abuso de autoridade e uma anistia para quem praticou “caixa dois eleitoral”. Porém, responde a meia-dúzia de processos no STF e deve deixar o comando do Senado em fevereiro, para assumir a liderança do PMDB. O novo cargo é poderoso, mas não na relação entre os poderes. Renan virou uma espécie de bola da vez entre os políticos investigados pela Lava-Jato.
Sabe o que fez
Durante o fim de semana, militantes petistas espalharam nas redes sociais o boato de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria preso por Moro e chegaram a fazer uma vigília na porta do prédio onde o petista mora, em São Bernado do Campo. A prisão de Cunha funcionou como uma espécie de anticlímax para a mobilização, esvaziando o discurso de que o foco do magistrado era o PT. Lula chegou a escrever um artigo denunciando as investigações como perseguição política, com o objetivo de inviabilizar sua candidatura presidencial. Também deflagrou uma campanha internacional.
Pesquisa CNT/MDA divulgada ontem pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) mostra Lula com 11,4% de intenções de voto na resposta espontânea e, na forma induzida, de 24,8% a 27,6 %. Nas simulações de segundo turno, porém, perderia para Aécio Neves (PSDB-MG (37,1% a 33,8%) e para Marina Silva (35,8% a 33,2%). Mas venceria do presidente Michel Temer (37,3% a 28,5%). O discurso no qual Lula se vitimiza na Lava-Jato, porém, não cola. É aí que entra a lei de Fiódor Dostoiévski, autor de Crime e Castigo, o clássico russo da Literatura Universal. Lula se comporta como um Raskólnikov ao ter tanta certeza de que será preso antes mesmo de ser julgado.
Fonte: correiobraziliense.com.br
Luiz Carlos Azedo: Entre a cruz e a espada
O Rio de Janeiro marcha para um cenário de muita confusão política, em meio à recessão e ã crise fiscal
O segundo turno das eleições no Rio de Janeiro merece uma reflexão mais profunda sobre seus significados na política nacional. O embate entre o senador Marcelo Crivella (PRB) e o deputado estadual Marcelo Freixo (PSol) sinaliza uma disputa na qual os grandes protagonistas da política nacional — PMDB, PSDB e PT — estão fora do jogo. Entram em cena, de um lado, o dogmatismo de natureza religiosa, representado pelo pastor da Igreja Universal do Reino de Deus; de outro, o dogmatismo ideológico de esquerda, representado pelo PSol.
Depois da derrota acachapante do PT em todo o território nacional, a do prefeito Eduardo Paes (PMDB) — cujo candidato à sucessão, deputado Pedro Paulo (PMDB), ficou de fora do segundo turno, mesmo com o sucesso das Olimpíadas — antecipa um cenário que pode se repetir na política nacional em 2018. Um eventual colapso do governo Temer levaria de roldão não somente o PMDB, mas também o PSDB. Esse risco não decorre apenas da situação da economia, mas em razão do desgaste que ambos os partidos podem sofrer com a Operação Lava-Jato, vide o desastre eleitoral petista.
Em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) promoveu uma ruptura com as lideranças políticas tradicionais, inclusive do seu próprio partido, com a candidatura bem-sucedida do empresário João Doria. No Rio de Janeiro, o que se observa é a aparente exaustão do PMDB, partido que deu as cartas na política do estado desde 2006. Ocorre que seus adversários tradicionais, o PT, o DEM, o PSDB e o PDT, também têm lideranças desgastadas ou incipientes. Sem alternativas ao centro, o eleitorado foi polarizado por duas candidaturas dogmáticas, uma de direita e outra de esquerda; os candidatos de centro-esquerda, centro e centro-direita acabaram descartados pelos eleitores.
Evangélicos
A presença de lideranças evangélicas na política não é nova e chegou ao protagonismo no Congresso após a eleição do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) à Presidência da Câmara, da qual foi afastado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), sendo, posteriormente, cassado pelos próprios colegas, em razão de seu envolvimento no escândalo da Petrobras. As características do senador Crivella, porém, são diferentes, do ponto de vista das condutas pessoal e política. Crivella não se tornou evangélico para ocupar espaço numa fatia do eleitorado. É representante orgânico de uma poderosa facção religiosa. Sua candidatura ultrapassa os limites da busca de simples representação parlamentar para representar um ambicioso projeto de poder político.
Sem preconceitos, essa projeção de Crivella é decorrência da presença das igrejas evangélicas e pentecostais nas comunidades pobres de todo o país, em particular no Rio de Janeiro, onde exercem um papel crescente na organização da vida comunitária e preservação dos costumes e da estrutura familiar tradicionais. Não é pouca coisa, diante do cenário de violência e degradação social que predomina nessas comunidades, a maioria desassistida pelo Estado e controlada por milícias e traficantes. Crivella, porém, não tem o perfil do fanático religioso, embora seja o mais orgânico dos representantes de sua igreja. Para se eleger, fará um discurso laico e buscará alianças ao centro.
Socialistas
Freixo representa os setores radicalizados da classe média carioca, principalmente dos servidores públicos e funcionários de empresas estatais. Seu partido, o PSol, é formado por lideranças de esquerda que romperam com o Partido dos Trabalhadores depois do escândalo do mensalão, com um discurso socialista radical impregnado de dogmatismo marxista. Sua projeção política não decorre só do ardor dos militantes de sua campanha, mas da forte atuação parlamentar em defesa dos direitos humanos, das minorias e contra a violência urbana.
Os votos tradicionais da esquerda carioca, pautada pelo velho nacionalismo e por uma visão estatizante, concentrados do Grajaú ao Leblon, porém, não são suficientes para Freixo vencer o pleito. É necessário que ele amplie alianças em direção ao centro, aproveitando o fato de que o PMDB, o PSDB e o DEM foram batidos no primeiro turno. Essa foi a oportunidade que faltou aos candidatos de esquerda que maior projeção conquistaram em pleitos anteriores, Denise Frossard (PPS) e Fernando Gabeira (PV). Ocorre que os militantes do PSol não aceitam essa inflexão política, confundindo o que seria o “aggiornamento” da candidatura com o “transformismo” petista que tanto criticam.
O Rio de Janeiro marcha para um cenário de muita confusão política. Imaginem uma cidade cujo hino é uma marchinha de carnaval governada por um prefeito guardião da família e dos seus costumes, diante de uma oposição aguerrida, que reunirá movimentos sociais, intelectuais e artistas, ou um prefeito radical, contra os principais meios de comunicação e a favor da estatização dos serviços públicos, em meio à recessão e uma crise fiscal sem precedentes no estado. Ou seja, o Rio está entre a cruz e a espada.
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br
Nas entrelinhas: Atrás do Fora, Temer!
Temer era o vice escolhido pela presidente deposta, é seu sucessor constitucional e não foi eleito pela oposição ao governo Dilma
Grosso modo, há dois tipos de articuladores do movimento Fora, Temer! Os espertos e os ingênuos. Os espertos são aqueles que utilizam essa palavra de ordem como biombo para ganhar tempo e reagrupar suas forças, depois de apeados do poder pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. Os ingênuos são os que acreditam sinceramente na narrativa do golpe e veem o afastamento definitivo da ex-presidente Dilma Rousseff como uma ameaça à democracia. Do ponto de vista prático, porém, ambos convergem na mesma direção: desestabilizar o governo de transição. Temer era o vice escolhido pela presidente deposta, é seu sucessor constitucional e foi eleito pelos espertos e pelos ingênuos. Não foi eleito pela oposição aos governos petistas.
Antes que espertos e ingênuos vejam essa introdução como uma provocação, vamos examinar os possíveis desdobramentos da proposta pelas vias institucionais: suponhamos que o objetivo fosse realmente a volta de Dilma Rousseff ao poder. Isso só seria possível se o Supremo Tribunal Federal (STF) anulasse todo o rito cumprido pelo Congresso para afastar a petista, o que seria um absurdo, pois foi estabelecido pelo plenário da Corte. A única fricção foi o fatiamento do impeachment em duas votações, uma decisão monocrática do presidente do STF, Ricardo Lewandowski, que comandou o julgamento pelo Senado. O máximo que poderia ocorrer seria o STF anular a votação. Alguém imagina Dilma de volta ao comando do país, depois de seu discurso pós-cassação do mandato? Ou seja, teríamos mais uma rodada de barganhas, mas Dilma seria afastada definitivamente na nova votação. É que ninguém a quer de volta, nem o PT.
Descartada essa hipótese, como diria o Barão de Itararé, a outra poderia ser pior. Vamos supor que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) resolva julgar o processo de impeachment impetrado pelo PSDB contra Dilma e Temer. A jurisprudência da Corte sinaliza que a cassação do mandato de Dilma extingue o processo. Mas há controvérsias. Em caso de julgamento e cassação de toda a chapa, haveria de novo duas possibilidades: uma seria a convocação de eleições diretas, se o julgamento ocorrer ainda esse ano, o que é improvável a essa altura do campeonato, por causa das eleições municipais; a outra, a realização de eleições indiretas, na Câmara, que seria uma roleta russa, na qual o primeiro a morrer seria o PT.
Os espertos estão falando em convocação de eleições gerais, os ingênuos acreditam. Nesse caso, estaríamos diante de uma situação de flagrante inconstitucionalidade, pois os mandatos dos senadores e deputados não podem ser cassados, a não ser individualmente, pelo próprio Legislativo, nos casos previstos em Lei. É cláusula pétrea da Constituição, nem o Congresso pode modificá-la. Mesmo em caso de hipotética renúncia coletiva, os suplentes assumiriam os cargos vagos de direito. A única maneira de convocar eleições gerais seria através de uma ruptura institucional, com a tomada do poder pela força. Quem tem bala pra isso? Ora, os militares, que estão quietos no seu canto e que não querem se meter nessa roubada.
Então, o que é o Fora, Temer!? Uma tática evasiva. A palavra de ordem que serve para os petistas apeados do poder unir as forças adversárias do novo governo e tentar mobilizar o povo contra o presidente Temer, em razão da recessão e de sua baixa popularidade. Também é uma maneira de fugir à responsabilidade pelas crises ética. política e econômica nas quais o país foi lançado após 13 anos de governos petistas. Não reconhecer o próprio fracasso evita a discussão sobre o esgotamento de um projeto político que misturava nacional-desenvolvimentismo, populismo e patrimonialismo. Ou seja, trata-se de um biombo atrás do qual os espertos se escondem e comandam os ingênuos.
No poder, o PT foi capturado pelo corporativismo, pelo fisiologismo e pelo patrimonialismo, as três pragas seculares da administração pública brasileira. O seu maior erro, porém, foi confundir as próprias forças com as do governo, que agora lhe fugiu das mãos. Se cada esperto dissesse o que fazia antes do afastamento de Dilma Rousseff, teríamos um microcosmo dos interesses contrariados ou frustrados pelo impeachment, que não são pequenos, porque o PT operou com muita desenvoltura o aparelho de Estado para tecer alianças, fazer negócios, acomodar corporações; cooptar artistas, intelectuais, sindicalistas e ativistas sociais.
Por: Luiz Carlos Azedo, jornalista, colunista do Correio Braziliense
Fonte: Correio Braziliense