o tempo

Marcus Pestana: O Papel de cada um

Ou “cada um no seu quadrado”. Ou “cada macaco no seu galho”

Montesquieu, em seu “O Espírito das Leis”, previu como elemento central para o funcionamento das sociedades democráticas a separação dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que deveriam ser independentes e harmônicos entre si. Essa dinâmica é fundamental para que o sistema de freios e contrapesos aja contra qualquer tentativa de exercício absoluto do Poder. A Constituição Brasileira adotou esta configuração. Mas do papel para a realidade, o que vemos hoje no país é que os conflitos institucionais entre os diversos poderes e instituições têm sido um perigoso elemento de instabilidade política. E a retomada do desenvolvimento depende visceralmente da estabilidade institucional.

Muitas vezes, o Judiciário interfere em relações contratuais estabelecidas e na órbita do Legislativo, quando ameaça legislar. O Congresso Nacional, por vezes, tenta engessar o Executivo e limitar as ações do Judiciário. O presidencialismo brasileiro sempre foi forte, e o Executivo era o grande protagonista comandando a agenda legislativa e exercendo fortes pressões sobre o Judiciário. A opção do atual governo de abandonar o “presidencialismo de coalizão” abriu a brecha para que o Legislativo crescesse em suas prerrogativas e desenvolvesse um inédito protagonismo. Tensões institucionais periféricas são naturais e parte do processo democrático, mas sempre dentro de determinados limites.

A temperatura subiu além do razoável, nas últimas semanas, com a convocação de uma manifestação contra o Congresso e o Supremo, com estímulos visíveis de importantes figuras do governo. E o conflito entre governo e Congresso se materializou na discussão sobre o orçamento impositivo.

A democracia moderna nasceu na Inglaterra para limitar o poder absoluto do Rei. Duas leis são centrais na institucionalização da democracia: a Constituição e o orçamento. A Constituição é a bússola maior. Ela é o porto seguro da democracia e a vacina contra qualquer aventura totalitária. Em relação ao orçamento, que ordena as despesas públicas a partir das receitas de impostos recolhidos junto à sociedade, cabe sim às casas parlamentares discutir e votar e ao Executivo executar.

No parlamentarismo, a formação de um governo pressupõe a formação de uma maioria parlamentar e a aprovação de um programa de governo, que encontra expressão nas peças orçamentárias a cada ano. Mesmo no presidencialismo americano, onde se inspirou o Brasil, o Congresso é que constrói a Lei orçamentária. Vejam a luta de Trump para construir seu tão sonhado muro na fronteira com o México. O Congresso americano não priorizou este investimento.

A polêmica instalada na última semana está muito mal discutida e obtendo grande repercussão na opinião pública e nas redes sociais, nem sempre com um enfoque correto e consistente. O orçamento por muito tempo no Brasil foi obra de ficção e o Executivo reinava absoluto. E a execução de emendas parlamentares era discricionária. Fui parlamentar de oposição e sei que tinha muito menos recursos de emendas executados do que os “amigos do Rei”. Era um mecanismo de chantagem e pressão sobre o Congresso, como admitiu o próprio presidente Bolsonaro em entrevista em 2016.

Voltarei ao tema na próxima semana!


Marcus Pestana: Carnaval e o politicamente (in)correto

Vivemos tempos nebulosos. No mundo inteiro, foi gestada uma cultura autoritária e preconceituosa, que ganhou expressão radical no UFC das redes sociais. A extrema direita americana e europeia destilam, à luz do dia e abertamente, suas concepções antidemocráticas e excludentes. São vítimas de preconceitos imigrantes, negros, mulheres, índios.

Aqui também em terras brasileiras, assistimos, nas últimas semanas, inacreditáveis manifestações de preconceito e intolerância, que devem receber nosso total repúdio.

É natural que a sociedade civil, os movimentos pelos direitos humanos e civis, as forças democráticas reagissem. Surgiu o que se acostumou chamar de “politicamente correto”. E aí, é preciso tomar muito cuidado para que a criança não seja jogada fora junto com a água suja do banho. Muitas vezes, o contraponto gera uma rigidez autoritária, que ao invés de atacar o problema de fundo, reforça preconceitos.

A saída para o enfrentamento de preconceitos e exclusões sociais não deve ser nenhum tipo de dirigismo estatal, legal ou cultural. A liberdade é sempre o melhor caminho. Apostar na elevação dos padrões educacional e cultural da sociedade, na vivência democrática, no diálogo e no pluralismo é o que deve nos inspirar. Bom senso, respeito, bom humor, tolerância devem ser os valores orientadores de uma cultura democrática.

O Carnaval é talvez a maior expressão cultural brasileira. Reverencia a alegria atávica e a irreverência de nosso povo. Materializa essa coisa um tanto macunaímica e antropofágica da civilização brasileira. Essa geleia geral, que no caldeirão da experiência histórica do país, metabolizou e sintetizou elementos culturais dos europeus, dos índios e dos negros. Isto é o que dá o caráter original e singular de nossa construção como povo e Nação. É verdade que ainda temos impregnados em nossa sociedade preconceitos que precisam ser combatidos. Mas a calibragem disso deve ser precisa, para que um autoritarismo não seja substituído por outro. Nada de dirigismo, democracia sempre, a liberdade no comando.

O Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Belo Horizonte publicou uma cartilha de orientação sobre o carnaval na linha do “politicamente correto”. Sugere que não sejam usadas fantasias de índios, de mulheres por homens, de ciganos, de enfermeiras sexys, que poderiam expressar preconceitos. E que as marchinhas de carnaval tomem cuidado para não exceder as fronteiras do “politicamente correto”. É evidente que o Conselho não emitiu, e nem teria poderes para isso, uma norma legal. Propôs uma reflexão.

Mas creio que o combate aos preconceitos não passa por sufocar a imaginação, a criatividade, a irreverência de nossos foliões. Há muito tempo, nas ruas e avenidas, o carnaval exerce uma bem humorada crítica social a fatos e contradições que vivemos em nosso cotidiano. Vamos “criminalizar” Haroldo Lobo, João Roberto Kelly, Braguinha ou Lamartine Babo? Vamos condenar manifestações como a Banda Mole de BH ou as Domésticas de Luxo da minha Juiz de Fora, que há décadas são sinônimos de alegria e confraternização?

A luta cultural e democrática é muito mais complexa. E uma sociedade nova, longe de preconceitos e intolerâncias, não nascerá certamente do mau humor ou de qualquer matriz única e dogmática de valores.


Marcus Pestana: Populismo e ação governamental

Populismo é uma categoria analítica imprecisa. Vai desde o uso corrente para caracterizar líderes políticos demagógicos, de discursos fáceis e vazios, repletos de promessas descoladas da realidade, para afagar a opinião pública e conquistar eleitores até a visão mais complexa que caracteriza a prática de líderes carismáticos, que prescindem das mediações institucionais, estabelecendo vínculos emocionais e de liderança forte, acionando diretamente a etérea noção de “povo”, esbarrando no autoritarismo, ao governar interpelando diretamente as massas. Hoje há o “populismo autoritário” ameaçando a democracia.

O termo populismo é tão impreciso que serviu, ao longo da história, para caracterizar personagens diversos como Trump, Vargas, Perón, Brizola, Berlusconi, o “Cinco Estrelas”, Órban, Hitler, Mussolini, Chávez, Putin, Lula e Bolsonaro.

Seja qual for a apropriação que se faça do conceito, o populismo é fácil de praticar nos palanques, mas negativo e corrosivo na prática governamental. E um vírus perigoso e tentador, que contamina as boas práticas governamentais e, muitas vezes, saí pela culatra.

Digo isto a propósito de dois fatos recentes. O primeiro foi o apelo de nosso Presidente para que os governadores, que ficaram expostos como vilões da história, reduzam o ICMS dos combustíveis. Ora, todos sabem da irracionalidade de nosso sistema tributário, daí a necessidade urgente da reforma. Mas os governos estaduais estão em graves dificuldades orçamentárias. O ICMS, na média, representa 70% da receita líquida total. Disso, cerca de 20% é sobre combustíveis, ou seja, 14% da receita líquida total. Como um estado como Minas Gerais, que sequestrou os recursos constitucionais dos municípios, se apropriou das parcelas do consignado dos servidores, atrasa salários e só está funcionando porque uma liminar assegura o não pagamento dos juros da dívida, vai de repente, numa penada, abrir mão de uma receita essencial?

Outra preocupação é a sustentabilidade dos aumentos anunciados pelo governo de Minas (13% em 2020,12% em 2021 e 12% em 2022) para os servidores das polícias, corpo de bombeiros e agentes penitenciários, comprometendo a adesão ao Programa de Ajuste Fiscal. De imediato, jogo uma vacina contra o clima de Atlético x Cruzeiro instalado no atual cenário político. Como secretário de planejamento, saúde e deputado, sempre construí grandes amizades e parcerias no setor. Tenho a noção exata da prioridade que é hoje a segurança pública. Mas, o tesouro estadual não está em condições de bancar aumentos reais muito acima da inflação projetada. Não adianta lotear a lua e na hora de honrar os compromissos não haver recursos disponíveis. As políticas públicas estão desmoronando, os investimentos em infraestrutura são pífios, o Brasil já compromete 80% de suas despesas primárias com salários e previdência. O orçamento expressa o conflito distributivo presente tanto na arrecadação como nas despesas. E os dois fatos narrados explicitam isso.

Minas Gerais tem uma situação pré-falimentar. É preciso tornar pública e transparente a gravidade da situação. Não adianta privatizar e antecipar receitas como a do nióbio para alimentar uma equação sem solução.

Todos os que têm espírito público têm que apoiar o ajuste fiscal estrutural de longo prazo. Fora isso, será o caos.


Marcus Pestana: Para além dos fundamentos econômicos

A grande angústia nacional continua sendo a baixo ritmo do crescimento econômico e suas repercussões no nível de emprego e renda da população. Ainda são mais de 12 milhões de desempregados, é grande o número de postos de trabalho informal e um terço dos trabalhadores recebe apenas um salário mínimo. As projeções para o crescimento em 2020 situam-se na faixa de 2,0 a 2,5%. O Brasil precisaria e pode crescer de forma sustentada a taxas superiores a 4% ao ano.

Sempre associamos crescimento econômico aos fundamentos econômicos. A situação no câmbio é confortável. Temos volumosas reservas, o câmbio flutuante garante o equilíbrio, com intervenções pontuais do Banco Central, o Balanço de Pagamentos tem o déficit em transações correntes compensado pela entrada de capitais externos e pelo resultado da balança comercial.

No plano da estabilidade da moeda e da taxa de juros há bons sinais. O Plano Real se mostrou resiliente diante dos múltiplos desafios desde 1994 e a inflação continua sobre controle. As taxas básicas de juros são as menores da história da SELIC, embora na ponta precisássemos dinamizar a competição para azeitar o crédito a custos compatíveis. Mas o mercado de capitais e as operações de captação de empresas brasileiras sinalizam uma mudança estrutural no financiamento do desenvolvimento.

O “Calcanhar de Aquiles” continua sendo no plano fiscal. Embora os déficits primário e nominal tenham tendência cadente, o cenário ainda é preocupante. Os governos subnacionais estão em situação crítica em grande parte por conta dos desafios previdenciários. E isso não se resolverá no curto prazo. Daí o investimento público se encontrar em nível recorde de compressão e não vir daí uma mola propulsora para a retomada, onerando o Custo Brasil pela precariedade da infraestrutura.

Mas há duas questões, às vezes negligenciadas, que impactam profundamente o nosso tristemente conhecido “voo de galinha”: o cenário internacional e o ambiente de negócios e institucional.

Vivemos num mundo globalizado e somos um país emergente, com um déficit histórico na qualidade da educação, na qualificação profissional e no desenvolvimento científico e tecnológico. A ocorrência da epidemia do Coronavírus já começa a ameaçar a retomada mais vigorosa da economia brasileira e também a guerra comercial EUA-China e seus desdobramentos acenam com riscos imponderáveis. O Brexit inglês é também um novo vetor negativo. Diante disso, o Brasil tem que rever seu posicionamento evitando alinhamentos desnecessários, gestos retóricos e ideológicos inúteis e retomar o protagonismo brasileiro na questão ambiental.

Também o ambiente de negócios, a estabilidade legal e regulatória, a desburocratização dos processos, o ambiente político, o fortalecimento de valores caros no mundo contemporâneo, como a defesa da democracia e da sustentabilidade ambiental, são decisivos para atração de novos investimentos. Liquidez no mundo há em abundância. A atividade capitalista pressupõe risco, mas não aventura. O ambiente brasileiro para o empreendedor, com todos os avanços recentes, é ainda hostil. Quem vai investir na privatização da Eletrobrás, por exemplo, ou em qualquer outra concessão ou PPP se não tiver certeza que a “regra do jogo” é pra valer e permanente?

O Brasil tem pressa e já se cansou de jogar oportunidades fora.


Marcus Pestana: Prevenção e catástrofes

De repente, não mais que de repente, a natureza explode e mostra sua força avassaladora. E as pessoas ficam indefesas, inseguras, impotentes, assustadas. Catástrofes sempre ocorreram na história da humanidade. É da vida, faz parte da aventura humana.

Os acontecimentos em Minas Gerais, nos últimos quinze dias, entristeceram a todos nós e nos convocam a uma inadiável reflexão e a uma mudança de atitude. Dezenas de vidas perdidas, milhares de desabrigados, rios transbordando, ruas e avenidas alagadas, pontes destruídas, casas e imóveis arrasados, carros empilhados. Um verdadeiro cenário de guerra.

O maior saldo tem necessariamente que ser o aprendizado coletivo. Os fenômenos naturais, até certo ponto, estão fora de nosso controle. O avanço tecnológico nos ajuda a antecipar acontecimentos, prevenir, criar defesas. Mas, às vezes, tudo parece inútil. O mundo parece cair sobre nossas cabeças. As perdas, principalmente de vidas, são irreparáveis. Mas o aprendizado é obrigatório.

Tudo começa na raiz. Nas mudanças climáticas fruto do desmatamento avassalador. No assoreamento dos rios, córregos e cursos d’água, frutos da ação humana. E prossegue na precária educação ambiental coletiva que temos no Brasil. As fotos do lixo represado por pontes encobertas no Rio Doce e outros deveriam ser objeto de reflexão em todas as escolas, associações de moradores e espaços comunitários. Cada vez que jogamos toda sorte de resíduos nos rios ou em simples “bocas de lobo”, estamos contribuindo para o agravamento do efeito catastrófico de eventos naturais.

Diante de tamanho desastre é hora de revalorizar os instrumentos de prevenção e planejamento da vida em comunidade. Sempre que as decisões sobre leis de uso e ocupação de solo, códigos de edificação, controle urbanístico, proteção ambiental, apontam para maior rigidez enfrentam as reações de interesses menores a obstaculizar o avanço. A verticalização urbana exacerbada esquece seus efeitos sobre as redes de saneamento e águas pluviais e sobre as estruturas de energia, gás, luz e telefonia.

A política habitacional tem um papel essencial. O poder público tem que saltar na frente do crescimento desordenado dos espaços coletivos. A oferta de moradias e lotes urbanizados, com infraestrutura adequada, induz preventivamente a ocupação de territórios mais seguros. Mas como atender esta demanda, principalmente das famílias muito pobres, na atual penúria fiscal e diante dos gargalos colossais da mobilidade urbana?

A crise fiscal tem tudo a ver com o agravamento de eventos como os de Minas. Ao gastarmos muito mais com a própria máquina estatal – previdência, salários, privilégios, pagamentos de juros, estamos reduzindo drasticamente a capacidade de investimento do poder público. São menos soluções contra enchentes, menos redes de captação de água pluvial, menos intervenções para desassoreamento de rios, ribeirões e córregos, menos ruas e estradas com infraestrutura adequada.

Fica um recado também para todos os governantes. Não vale a pena o tristemente famoso “asfalto eleitoral”. O asfalto, sem o devido tratamento à captação pluvial, acelera a velocidade das águas e é destruído rapidamente.

A natureza pertence a Deus. Mas a parceria entre o poder público e a sociedade pode melhorar e muito a prevenção de catástrofes como a ocorrida em Minas.


Marcus Pestana: Taxa de juros e política fiscal

A taxa de juros é um dos principais indicadores para a leitura da política econômica e a projeção do desempenho futuro da economia. A alta taxa básica de juros (SELIC) deprime o investimento público e privado, inibe o crescimento econômico, o crédito e a criação de empregos, aumenta a dívida e o gasto com o pagamento de juros, atraí capital especulativo em detrimento do produtivo, enfim, trava a economia.

A taxa de juros brasileira na ponta para as empresas, os consumidores e as pessoas, ainda é estratosférica, uma das mais altas do mundo. Mas isto só se reverterá com a mudança da situação oligopolista presente no mercado, concentrado em cinco grandes bancos, privados e públicos. Parece que finalmente os bancos virtuais, como os mineiros Inter e B2S, entre outros, e das fintechs, através de uma revolução tecnológica profunda, estabelecerão a verdadeira competição no mercado financeiro. No capitalismo, o principal elemento que favorece o consumidor e a sociedade como um todo é a concorrência.

Todos sabem que tenho pouquíssima identidade política e ideológica com o atual governo, mas apoio as linhas de atuação da política econômica liderada pelo Ministro Paulo Guedes e sua equipe. Cabe registrar que o ajuste e a retomada em curso só foram possíveis graças à estreita cooperação do Congresso Nacional, que aprovou, nos últimos anos, um elenco inédito de medidas saneadoras. E a SELIC pode atingir, de forma consistente e sustentável, o menor nível de sua história, ao ser rebaixada pelo COPOM ao presente patamar de 4,5%, podendo nos próximos anos cair ainda mais.

Quando estava presente nos debates da Câmara dos Deputados, sempre achei o nível de compreensão sobre a relação entre déficit fiscal, juros, expectativas e endividamento, extremamente baixo. Ao final do Governo Dilma, a dívida bruta apontava para o perigoso nível de 100% do PIB e o déficit nominal morava no nada confortável patamar de 9% do PIB.

Sempre me incomodou o posicionamento da esquerda em relação a estas questões. Sempre denunciavam os grandes gastos com juros e o agravamento do endividamento. Mas agiam em sentido contrário ao discurso. Uma mistura de desinformação, voluntarismo, ingenuidade, oportunismo e demagogia. Para a diminuição da dívida pública só há dois caminhos: intervir no estoque de dívida pagando parte dela com a venda de ativos ou no fluxo com a diminuição do déficit e da taxa de juros. Mas isto não é obra possível como exercício de voluntarismo, onde os fundamentos da economia são substituídos pela tão decantada e mal explicada “vontade política”.

Um exemplo disso é o exercício operado no Governo Dilma. De início a SELIC estava em 10,75%, chegou a 12,5%, num esforço voluntarista e insustentável caiu a 7,25% e acabou em 14,25%. Com o Governo Temer, que iniciou o ajuste e as correções necessárias, caiu para 6,5 e agora chega a 4,5%, de forma consistente e sustentável.

Com isso, segundo o VALOR ECONÔMICO, será possível uma economia de 417 milhões em quatro anos, ou seja, três orçamentos anuais da saúde, diminuindo o déficit nominal de 9% do PIB para 6% e estabilizando a trajetória da dívida bruta em 77% do PIB, permitindo a retomada inicial do crescimento.

Moral da história: mais vale uma boa política econômica do que uma retórica vazia, estridente, improdutiva e sem fundamento.


Marcus Pestana: Nem tudo é economia

Na última semana de 2019, escrevi aqui sobre a agenda de desafios econômicos e políticos. Mas nem tudo é economia, embora a economia seja determinante. Todas as decisões são políticas e o desenvolvimento humano exige um olhar holístico sobre todas as facetas da sua existência. Hoje, procurarei explorar um pouco os desafios, em outros campos, colocados para 2020.

Na política, embora seja de se prever a manutenção de um alto grau de tensão na relação entre os poderes da República e a permanência de um forte grau de polarização ideológica no plano nacional, é importante não esquecer que teremos eleições municipais.

A escolha de bons prefeitos nos 5.570 municípios brasileiros é fundamental para o desenvolvimento das políticas públicas. É a esfera mais próxima do cidadão, submetida a controle social mais intenso, responsável pela educação infantil e fundamental, pela gestão do SUS, pela infraestrutura urbana, pelo saneamento ambiental, pela mobilidade e as implantação efetiva das políticas sociais. Num país continental como o Brasil, os municípios deveriam ser o centro de gravidade. Embora as condições fiscais sejam extremamente heterogêneas - há municípios ricos e outros pobres - a eleição de bons prefeitos será fundamental para a virada que precisamos dar no país.

Na saúde, creio que meu amigo e ex-colega na CSSF da Câmara dos Deputados, o Ministro Luiz Henrique Mandetta, vem fazendo um bom trabalho. Promoveu uma importante mudança na atenção primária com o “Médicos pelo Brasil”, organizou uma boa equipe e ergueu uma boa agenda como bússola. Creio que a prioridade, em 2020, deveriam ser a discussão sobre novas formas de financiamento (DPVAT, copagamento, revisão das renúncias fiscais, redistribuição das vinculações, multas sobre os que dolosamente ocasionam eventos violentos, etc.), o debate com o Congresso Nacional, o Judiciário e o Ministério Público em torno da fixação de um padrão claro de integralidade a ser oferecido pelo SUS e a construção da infraestrutura informacional ligando todas as unidades de saúde do país onde poderão rodar inovações tecnológicas (telemedicina, cartão SUS, prontuário eletrônico, educação a distância, regulação de acesso, etc.).

Na educação, a receita é simples, menos ideologia e mais ações concretas para qualificar o ensino, principalmente o infantil e o fundamental, sem o que decretaremos a exclusão perpétua destas crianças na era da informação e do conhecimento. Melhorar o desempenho de nossos jovens e dar formação técnica no ensino médio é outra tarefa. Envolver e adotar formas criativas de integração das Universidades com os governos regionais e locais, empresas e sociedade no processo de desenvolvimento social e econômico é objetivo permanente.

O combate às desigualdades pessoais e regionais de renda é multisetorial, mas urgente. Não só possibilitar a inserção no mercado de trabalho, através de qualificação profissional, aos cadastrados no programa Bolsa Família, mas ter uma agenda para o Nordeste brasileiro e para as regiões pobres e colocar esta variável na mesa em reformas como a tributária.

Reter e formar cérebros criativos na ciência e tecnologia, recolocar no centro a sustentabilidade ambiental e respeitar e valorizar a diversidade cultural e artística, completam a agenda multisetorial.

Não é pouco trabalho. Vamos em frente!


Marcus Pestana: A agenda para 2020

O ser humano tem esta estranha mania de partir o tempo. Como se a vida não fosse um moto-contínuo. Mas a quebra do calendário tem uma função simbólica importante. É como se fosse uma pausa para respirar fundo, revisitar e avaliar o presente e o passado e projetar o futuro. O fim de um ano acende a fogueira das previsões. O que se dirá sobre o fim de uma década? 2020 bate à porta! Essa é a senha para que cartomantes, videntes, economistas, analistas políticos se assanhem a prever o que ocorrerá no novo ano, na nova década.

E isso se agrava no Brasil. Aqui temos sempre o sentido da urgência e a ideia de que vamos começar do zero. Aqui, nos trópicos, tudo é aventura e desafio de curto prazo.

Certamente, o plano mais importante é o da economia. Viramos o ano com o nível de desemprego alto, a desigualdade extrema intacta, a produtividade insuficiente, as finanças públicas gravemente combalidas e os investimentos em patamares pífios. Isso apesar da retomada que projeta um crescimento do PIB de 2,5% no próximo ano, ancorado na enorme capacidade ociosa da indústria e no crescimento do consumo e do crédito, nos juros baixos e na inflação controlada. Mas nada que nos permita “dormir em berço esplêndido”, já que choques externos podem mexer com variáveis que parecem sob controle.

Há uma vasta agenda a ser enfrentada rumo a um crescimento vigoroso e sustentado. É fundamental concluir a reforma da previdência, estendendo seus efeitos a estados e municípios. Para diminuir o “Custo Brasil” e aumentar a produtividade da economia é central debater e aprovar uma reforma tributária que simplifique e torne mais equânime a relação dos empreendedores e cidadãos com o fisco. A reforma do Estado tem que prosseguir com o aprofundamento das privatizações e a aprovação de mudanças profundas na organização administrativa do setor público. Reformas microeconômicas também se somam a esta agenda. Mudanças como o 5G nas telecomunicações, as novas regras para licitações, PPPs, licenciamento ambiental, falências e concordatas, setor do gás ou a ampliação do acesso à saúde suplementar podem produzir resultados importantes alimentando o círculo virtuoso da geração da renda e do emprego.

Mas aí vem a questão política. Vivemos uma situação inédita. O governo atual, dentro de sua postura disruptiva, findou com a tradição do presidencialismo de coalização, presente desde a transição liderada por Tancredo Neves, e ainda não colocou nada em seu lugar. A dinâmica das mudanças necessárias foi transferida para o Congresso Nacional, já que não há base de apoio político organizada – até o minoritário PSL implodiu. Felizmente, este vácuo político tem sido ativamente ocupado pelo Congresso, apesar de sua composição diversa e fragmentada. Da capacidade das lideranças parlamentares levarem a frente as reformas essenciais depende o nosso sucesso em 2020.

Também no front externo é necessário retomar o velho e bom pragmatismo do Itamaraty, que sempre focou a atuação brasileira nos interesses econômicos e sociais de nosso povo e não em enviesadas convicções ideológicas. Vale a máxima: nas relações internacionais não há amizades e identidades, há interesses. Mas é fundamental que não desperdicemos energia e cacife com agressões inúteis a líderes, personalidades e países estrangeiros.

Que venha 2020, que seja bom para todos!


Marcus Pestana: O desafio do emprego no Brasil atual

Nosso desafio central continua sendo a retomada vigorosa do crescimento e a geração de empregos. A taxa de desemprego no Brasil fechou o terceiro trimestre em 11,8%, atingindo doze milhões e meio de brasileiros. O número de pessoas ocupadas cresceu, porém, novo recorde de informalidade foi verificado, são atividades de baixa qualificação e conteúdo tecnológico, salário médio menor e sem cobertura previdenciária. E há também a informalidade high tech quando milhões de brasileiros procuram seu sustento na UBER ou no IFood.

Por um lado, o avanço tecnológico gera empregos, como nos casos da UBER e do iFood. Entretanto, a Amazon, as fintechs e os bancos digitais, entre outros, têm efeito líquido negativo sobre o nível de emprego, embora mobilizando mão de obra qualificada com salários maiores.

A crise das duas maiores redes de livrarias brasileiras, a Saraiva e a Cultura, que fecharam lojas e demitiram funcionários, certamente tem a ver com a facilidade de se comprar livros sem sair de casa. Já os bancos virtuais e as fintechs finalmente ameaçam afetar a concentração no setor financeiro, podendo, caso consolidados, baratear o crédito e desonerar as empresas e as pessoas das taxas sobre serviços financeiros. Mas é evidente que os cinco grandes bancos brasileiros, que concentram 85% do crédito, se ajustam e fecham agências e demitem funcionários.

Os sinais atuais da economia brasileira são contraditórios. A inflação e os juros estão baixos. Mas a taxa de crescimento do PIB não deve chegar a 1% e a capacidade ociosa na indústria continua alta. O câmbio se desvalorizou: o que é bom para as exportações e ruim para os preços do componente importado inclusive máquinas, equipamentos, medicamentos, serviços tecnológicos e insumos essenciais. Além disso, haverá, em 2019, uma expressiva fuga de capitais estrangeiros da Bolsa de Valores. Apesar da melhoria do ambiente institucional com a Lei do teto dos Gastos, as Reformas Trabalhista e Previdenciária, a confiança do investidor na economia brasileira ainda não se firmou. Mostra disso foi a frustração das melhores expectativas em relação ao recente leilão do pré-sal.

A retomada de um crescimento vigoroso e sustentado depende do equilíbrio fiscal do setor público como um todo, que hoje é o calcanhar de Aquiles a abalar as expectativas dos investidores. E também, da melhora da percepção e da confiança na economia brasileira, não só dando continuidade às grandes reformas - o restante da previdenciária, a tributária e a administrativa, as privatizações, como prosseguindo nas reformas microeconômicas como o cadastro positivo, o projeto de lei da liberdade econômica, as mudanças no marco regulatório das telecomunicações.

Há, como sempre, ameaças e oportunidades. Mas é preciso também um pouco de juízo. A irresponsabilidade fiscal, a quebra de contratos, os controles artificiais de preços e as iniciativas heterodoxas do Governo Dilma ainda estão vivos na memória dos agentes econômicos relevantes. Neste sentido, declarações improdutivas e agressivas contra outros países, atitudes impensadas como a do prefeito Marcelo Crivela de resolver, na marra, os impasses com a concessionária da Linha Amarela ou a tentativa da Assembleia de Goiás de reestatizar a Enel, distribuidora de eletricidade comprada por investidores italianos, não ajudam.


Marcus Pestana: Sobre polarização, intolerância e consensos

Com a libertação do ex-presidente Lula se instalou uma intensa discussão sobre o agravamento da polarização política no Brasil. O debate franco e aberto é da natureza do sistema democrático. A intensidade é variável dependendo da conjuntura. Isto pressupõe um acordo tácito entre as mais diversas correntes do pensamento político e ideológico sobre a legitimidade de todas as partes que participam do jogo e o respeito ao império das leis, da Constituição e das instituições permanentes. O fortalecimento da democracia depende de que qualquer polarização tenha como produto consensos progressivos que permitam o avanço de soluções em torno da agenda que interessa à sociedade.

O pano de fundo que preocupa na radicalização do processo político brasileiro é a ocorrência de crises agudas e impasses em países como Bolívia, Equador, Chile e Hong Kong. Também nas democracias avançadas o desemprego, os movimentos migratórios e as ameaças introduzidas pela globalização produziram o crescimento da radicalização no Reino Unido, na França e nos EUA, entre outros.

No Brasil e no mundo, os velhos paradigmas ideológicos entraram em crise. As respostas não são lineares e fáceis e os fundamentos estão embaralhados. A divisão superficial e rasa entre direita, centro e esquerda é limitada diante de um mundo novo e complexo.

Há uma enorme confusão conceitual entre o que é ser conservador, liberal, reacionário, socialista, socialdemocrata, nacionalista, patriota, globalista. Há conservadores na visão de mundo e nos costumes e liberais na economia. Há liberais na economia e nos costumes, mas há também liberais conservadores e reacionários. Há conservadores antiglobalistas e socialistas globalistas. Há esquerda moderna e retrógrada, e mesmo conservadores nos costumes à esquerda. Há liberais progressistas que se preocupam com as desigualdades e socialdemocratas e socialistas que defendem a economia de mercado democraticamente regulada. Não é mero jogo de palavras. Em verdade há muito mais do que cinquenta tons de cinza.

O próprio governo brasileiro e sua base política e social de sustentação não são monolíticos. A esquerda também não é homogênea. O Brasil tem pressa e vive uma crise conjuntural e estrutural a exigir respostas. A radicalização retórica e da ação política imaginada a partir da polarização entre bolsonarismo e lulopetismo não contribuirá para o avanço da agenda nacional. O núcleo duro na sociedade de posições radicalizadas não passa de 20% da população para cada lado. Há um campo de 60% das pessoas que fazem um movimento pendular conforme as alterações da realidade.

O surgimento de um forte movimento de centro democrático mais racional, contido, propenso ao diálogo, será positivo e necessário para que o Brasil encontre os caminhos para a saída da crise. De certa forma, isto tem acontecido no Congresso. O sectarismo e a intolerância formam o caldo de cultura necessário para posições radicalizadas. O diálogo e o reconhecimento que ninguém é dono de uma verdade absoluta confundem o militante sectário. Cabe ao centro democrático ganhar parcela importante da sociedade com uma mobilização e comunicação social eficientes para que posições radicalizadas não aprisionem o processo de decisões tão necessário para que o país não caminhe para o impasse e confrontos evitáveis.


Marcus Pestana: Pacto intergeracional e ajuste fiscal

Em todas as facetas da trajetória do desenvolvimento social não podemos ter foco só nos desafios presentes, mas também um sólido compromisso com as futuras gerações. Seja na economia ou na questão ambiental, não é justo resolver os problemas de curto prazo a qualquer preço, sacrificando o horizonte de vida de nossos filhos e netos.

James Freeman Clarke cunhou a famosa frase; “O estadista pensa nas próximas gerações, o populista nas próximas eleições”.

Digo isto, a propósito da gravíssima crise fiscal brasileira e o papel das privatizações e venda de ativos no processo de ajuste. Usarei o exemplo de Minas Gerais, não por ser mineiro e como ex-secretário de Planejamento conhecer melhor a sua realidade orçamentária. Falo de Minas porque, infelizmente, hoje, o estado ocupa o nada honroso posto de pior situação fiscal do Brasil. Mas as conclusões tem validade geral.

No próximo dia 20 de novembro, a Assembleia Legislativa votará a autorização para que o governo capte no mercado recursos entre 5 a 6 bilhões de reais dando como garantia doze anos de arrecadação futura dos direitos de exploração do nióbio extraído em Araxá. Recursos que serão direcionados para o pagamento do 13.o salário e regularização da folha de salários. Ou seja, estamos vendendo a geladeira e o fogão para quitar as despesas das refeições já feitas. E o futuro? Em 2020, teremos novamente as mesmas despesas. De onde sairá o financiamento do rombo?

A Secretaria do Tesouro Nacional tem um ranking sobre a situação fiscal dos Estados. Somente o Espírito Santo tem nota A. Dez estados possuem avaliação B, 13 estados recebem avaliação C e, na zona do rebaixamento, Minas, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro possuem a nota D. A pior situação é a de Minas. As despesas correntes correspondem a 106,5% das receitas correntes. Senhores deputados, o fluxo de caixa não gera soluções e sim novos e crescentes problemas. A dívida consolidada de Minas representa 208,7% das receitas correntes líquidas. Não há possibilidade de ampliar o endividamento.

Vender os ativos mais preciosos do Estado para pagar despesas correntes de um fluxo de caixa gravemente deficitário é como gozar de uma felicidade ilusória e passageira. É também uma perversidade com as futuras gerações. Diante de tal desajuste, não se podendo contrair novas dívidas, só restam três saídas não excludentes: reduzir despesas, aumentar impostos ou promover o ajuste patrimonial.

É preciso saber que uma decisão como a que está na mesa implica em eleger vencedores e perdedores. Receitas extraordinárias como as do nióbio ou da privatização da CEMIG e da COPASA só deveriam ter uso nobre: pagamento de dívida para desonerar o fluxo futuro de juros e amortizações ou soluções permanentes para parte do déficit previdenciário. Isto permitiria que as despesas com educação, saúde e segurança não fossem sacrificadas no futuro. Ou ao menos, os recursos deveriam ser revertidos para investimentos estruturantes como a BR-381 ou o metrô da RMBH, por exemplo.

Entendo a preocupação do governo e dos deputados com o incêndio do dia. Mas ou enfrentamos de vez o desafio do equilíbrio do fluxo corrente ou queimaremos o patrimônio dos mineiros sem contribuir uma vírgula para a solução do desajuste fiscal. Nossos filhos e netos certamente não se orgulharão da herança recebida.


Marcus Pestana: Uma última palavra sobre as privatizações

Quanto mais o debate das privatizações abandonar o terreno ideológico e ganhar objetividade, tanto melhor. Vamos lembrar a máxima do Plano Diretor da Reforma do Estado: “nem tudo que é estatal é público, nem tudo que é público tem que ser estatal”. Mostra disso é apropriação do espaço estatal ao longo da história por interesses patrimonialistas manifestos na corrupção, no clientelismo e no nepotismo. Por outro lado, existem milhares de entidades filantrópicas que exercem funções públicas sem serem estatais.

As privatizações podem atender a diversos objetivos: contribuir com o ajuste fiscal, ganhar eficiência para a economia como um todo, atrair investimentos privados inalcançáveis para o setor público, estancar transferências do governo para empresas deficitárias e concentrar as energias das políticas públicas.

Já aqui, neste espaço, manifestei minha posição totalmente aberta às privatizações no setor elétrico. Não há nenhuma perda pelo setor ser gerido pela iniciativa privada se houver uma boa modelagem da desestatização, com metas qualitativas e quantitativas claras, e boa regulação pública dos serviços concedidos. Como Chefe de Gabinete do Ministério das Comunicações presenciei de perto o “day after” da privatização das telecomunicações. Na época havia a mesma discurseira ideológica: “vai beneficiar apenas os ricos”, “vai ameaçar a segurança nacional”, “vai encarecer os serviços”. Mais de vinte anos depois, o que vemos? Saímos de três milhões de celulares para mais de 230 milhões. A realidade derrotou os argumentos daqueles que ferozmente combateram a privatização da TELEBRAS.

Nas hipóteses levantadas, particularmente em Minas, sobre o saneamento básico e a exploração do nióbio, os mesmos princípios e argumentos defendidos neste e nos dois últimos artigos são válidos. Nada é sagrado ou “estratégico” que não possa ser entregue a gestão privada desde que haja uma correta modelagem e uma boa regulação.

No saneamento, os indicadores brasileiros são vergonhosos. Em pleno ano de 2019, mais de 100 milhões de brasileiros não têm coleta de esgoto. E o setor público não tem fôlego financeiro para tirar este atraso rapidamente. Há questões complexas envolvidas na modelagem: metas de universalização, padrões de qualidade, método de reajuste de tarifas. Mas os dois assuntos mais importantes no caso de se pensar na privatização da COPASA são: o fato do poder concedente ser do município, com grande peso na economia da empresa da receita obtida em Belo Horizonte, e o subsídio cruzado existente entre regiões e cidades lucrativas e as outras deficitárias. Mas não são problemas insuperáveis.

Já a exploração do nióbio não está na órbita dos serviços públicos. É uma riqueza mineral onde o Governo de Minas é possuidor do direito de lavra e recebe uma importante receita anual da CBMM. O Nióbio é um minério do futuro e a avaliação, seja para a securitização ou venda, deve levar em conta isto.

Mas o ponto central a ser refletido é o pacto intergeracional. No caso de Minas, a CEMIG, a COPASA e o nióbio são as “Joias da Coroa”.

Não há problemas em vendê-las. Podemos usar os frutos para gerar soluções permanentes para as gerações futuras. Ou, numa atitude egoísta e perversa, queimar nossos melhores ativos em gastos e consumo presente. Não será uma boa herança que deixaremos!