Legislativo

Merval Pereira: Legislativo intervém no Ministério Público

Obstrução é o mecanismo parlamentar para impedir que escândalos como esse tenham sucesso no Congresso

Merval Pereira / O Globo

Aumentar a influência do Poder Legislativo sobre o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), por meio de uma emenda constitucional, representa grave conflito de interesses, marcado pela tentativa de neutralização da autonomia do Ministério Público, uma de suas mais básicas e fundamentais características. Mesmo atendendo a uma necessidade pessoal de muitos parlamentares, ou à simples vingança, a PEC está tendo tramitação difícil, porque a reação da minoria que ainda resiste ao desmonte dos mecanismos de combate à corrupção está forte.

A obstrução é o mecanismo parlamentar para impedir que escândalos como esse tenham sucesso no Congresso, impostos por uma maioria formada pela união espúria de interessados em se blindar de seus crimes. Ou, caso a proposta seja aprovada, para que pelo menos fique gravada na testa de seus apoiadores a marca da vergonha.

Esse desfiguramento do CNMP é mais uma obra do presidente da Câmara, Arthur Lira, que controla o Centrão, em parceria com o PT e todos os partidos ou parlamentares investigados e punidos pelo MP, o que o torna um escândalo. Todas as medidas aprovadas ultimamente por inspiração do Centrão para desmontar a máquina de combate à corrupção tiveram apoio do PT.

Pela proposta, o CNMP passa a ter poderes de até mudar as decisões do MP, e terá mais gente do Congresso em sua composição, o que significa que o espírito de corpo favorecerá que nunca mais políticos sejam punidos. Bolsonaro está fazendo acordos políticos para nomear antecipadamente ministros para o Tribunal de Contas da União (TCU), já desmontou o Coaf, aparelhou todos os órgãos de fiscalização e agora quer manietar o MP.

Hoje existe a possibilidade de o CNMP anular decisões do MP, mas dentro de parâmetros que precisam ser cumpridos, diante de uma composição de membros que não favorece uma corporação específica como os parlamentares. A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) diz que o texto original já continha previsões que aumentavam a influência do Poder Legislativo sobre o CNMP, como a transferência de uma vaga hoje destinada ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) para o Congresso Nacional e a possibilidade de o corregedor-geral do MP ser escolhido entre membros de fora da carreira, que passariam a ser maioria no conselho.

A proposta original, que já era ruim, foi feita pelo deputado petista Paulo Teixeira, mas, para demonstrar que tudo pode piorar, o relator, deputado Paulo Magalhães, do PSD, incluiu dispositivos que não haviam sido discutidos e que, caso aprovados, violarão o próprio desenho institucional do MP. Como exemplo, a previsão de os procuradores-gerais de cada ramo do MP escolherem dois terços dos integrantes de seus respectivos conselhos superiores introduz um modelo hierarquizado que enfraquece a democracia interna, na visão de muitos procuradores.

A intenção da PEC de controlar as decisões do Ministério Público está revelada na proibição de seus membros de “utilização do cargo com o objetivo de interferir na ordem pública, na ordem política, na organização interna, e na independência das instituições e dos órgãos constitucionais”, o que seria uma definição vaga que daria pretexto para uma intervenção do CNMP.

Segundo mais de cem entidades ligadas ao meio ambiente, para cujo trabalho o MP tem sido fundamental, “são princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional”. E esses princípios “formam a espinha dorsal do modelo constitucional do Ministério Público”.

A PEC, que pode ir a votação ainda nesta semana, é conhecida como “PEC do Gilmar”, referência ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que, no entanto, garante que nada tem a ver com ela. Pode ser que não tenha colocado a mão na massa, mas a inspiração é, sem dúvida, sua ojeriza, tão grande quanto a dos parlamentares atingidos, aos procuradores do Ministério Público de Curitiba que, junto com o ex-juiz Sergio Moro, levaram adiante a Operação Lava-Jato. Gilmar chegou ao ponto de afirmar, dias atrás, que estivemos mais próximos de um golpe durante a Operação Lava-Jato que no governo Bolsonaro.

Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/merval-pereira/post/legislativo-intervem-no-mp.html


Reforma eleitoral opõe Senado e Câmara: entenda o impasse

Um dos articuladores da reforma, Arthur Lira quer evitar que Rodrigo Pacheco deixe a matéria indefinidamente na gaveta

Bruno Góes, Evandro Éboli e Paulo Cappelli / O Globo

BRASÍLIA - Aprovada em primeiro turno pelos deputados na noite de quarta-feira, a volta das coligações partidárias nas eleições de 2022 pode não resistir no Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), classificou ontem a proposta como um “retrocesso”. A palavra tem sido usada por cientistas políticos para analisar este ponto da reforma eleitoral, que deverá ser apreciada em segundo turno na Câmara na próxima terça-feira para, depois, seguir para o Senado.


Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, presidentes da Câmara e do Senado


Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
 Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Votação às pressas e remendos de última hora: como a Câmara aprovou o primeiro turno da reforma política

Rodrigo Pacheco adiantou que, entre os senadores, há uma “tendência” pela manutenção do sistema atual. Ele defendeu ainda a reforma eleitoral sancionada em 2017, quando as coligações foram proibidas.

— Eu mantenho minha posição pessoal. Eu considero, sim, que é um retrocesso. Nós fizemos uma opção inteligente em 2017, e um dos itens é justamente o fim das coligações e, com a cláusula de desempenho, fará com que nós tenhamos menos partidos políticos e uma melhor representatividade na política — argumentou o presidente do Senado ao G1.

- Foto: Editoria de Arte
- Foto: Editoria de Arte

Lira articula

Os deputados aprovaram a retomada das coligações por larga maioria — 333 votos favoráveis e 149 contrários — após um acordo entre líderes partidários. Nessa mesma negociação, os parlamentares acertaram a derrubada do chamado distritão, modelo em que são eleitos os candidatos a deputados federal e estadual mais votados em cada estado, independentemente do tamanho da bancada de seus partidos, critério levado em consideração atualmente. O próprio presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), participou diretamente das articulações para a mudança da regras eleitorais.

Veja também: Volta das coligações favorece partidos de aluguel e diminui representatividade, alertam especialistas

Antevendo as dificuldades que a proposta vai enfrentar, Lira já começou a trabalhar na Casa vizinha. Ele jantou com o presidente do Senado na noite de quarta-feira em Brasília e fez um apelo para que o colega paute o tema no plenário. Pacheco respondeu que vai submeter o assunto ao plenário quando houver consenso entre líderes e pontuou que há outros temas prioritários, como a reforma tributária.

Um dos articuladores da reforma, Lira quer evitar que Pacheco deixe a matéria indefinidamente na gaveta — as mudanças nas regras eleitorais precisam ser aprovadas até outubro para valerem já no ano que vem. A declarada resistência de Pacheco gerou ruídos entre as duas Casas. Relatora da reforma na Câmara, a deputada Renata Abreu (Podemos-SP), reagiu duramente.

— Vai gerar uma crise institucional (se o Senado barrar o que foi aprovado na Câmara) — afirmou.

- Foto: Editoria de Arte
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Retorno a jato

Com o propósito de ajudar a reduzir a fragmentação do quadro partidário e impedir que votos dados a um candidato ajudem a eleger outros, inclusive de outros partidos, a proibição das coligações valeu apenas na eleição de 2020. Agora, os deputados querem derrubar a medida aprovada pelo Congresso em 2017.

Em condição de anonimato, o presidente de um partido do Centrão justificou a decisão de voltar atrás da decisão de 2017. Sem as coligações, legendas menores — por vezes usadas como siglas de aluguel para captação de fundo partidário — deixariam de existir em consequência da chamada cláusula de barreira. Essa regra estabelece um número mínimo de votos que cada partido precisa obter para receber recursos do fundo partidário.

Leia mais: Câmara aprova união de partidos em 'federação', que facilita acesso ao fundo partidário

Na última eleição, houve redução drástica na participação das legendas menores nas Câmaras municipais. Essas siglas, porém, ainda são consideradas importantes, em muitos casos, para a busca do votos em eleições majoritárias.

Para a cientista política Maria do Socorro Braga, professora da Universidade Federal de São Carlos, a volta das coligações foi uma forma encontrada pelos partidos para ampliar o alcance nas eleições de 2022, diante da polarização no cenário presidencial.

— Os grandes, as siglas do centrão, não conseguiram retomar a força que tiveram antes de 2016. Por maiores que sejam, eles perderam capilaridade. Mostra um movimento desses partidos preocupados na disputa por 2022 com as coligações. Há um cálculo político para tentar se reforçar para uma disputa imprevisível — afirma a professora.

Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/reforma-eleitoral-opoe-senado-camara-entenda-impasse-em-torno-da-volta-das-coligacoes-25153440


O Estado de S. Paulo: Entenda a Operação Formosa

Inédito, evento desta vez vai incluir militares das três Forças no dia em que Câmara vota PEC do voto impresso

Felipe Frazão, Marcelo Godoy e Roberto Godoy, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – O presidente Jair Bolsonaro acompanha da rampa do Palácio do Planalto, na manhã desta terça-feira, 10, o desfile de um comboio de veículos militares blindados que vai passar pelos arredores do Congresso Nacionalno dia em que a Câmara dos Deputados incluiu na pauta de votação a PEC do voto impresso. O evento inédito faz parte da Operação Formosa, da Marinha, que acontece todos os anos, desde 1988, mas que desta vez vai incluir homens do Exército e da Aeronáutica. Será a primeira vez que os blindados vindos do Rio passarão por Brasília e serão recebido por um presidente da República.

O principal objetivo da operação Formosa é treinar militares da Força de Fuzileiros da Esquadra, sediada no Rio. Apesar da pandemia, a operação será maior do que nos anos anteriores. Em 2019, foram 1,9 mil militares, em 2018, 1,6 mil. Em 2020, porém, apenas 500 militares participaram.

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O custo total da operação não foi informado pela Defesa, tampouco pela Marinha. Há despesas diversas, como pagamento de diárias, alimentação, deslocamento de equipamentos e construção de estruturas de apoio ao treinamento. O adestramento ocorre no Campo de Instrução de Formosa, em Goiás. A área de cerrado pertence ao Exército e é cedida à Marinha por ser a única do País em que é possível realizar esse treinamento com uso de munição real.

O treinamento reunirá pela primeira vez militares das três forças. Serão 100 do Exército, que já participou antes da operação, e 30 da Aeronáutica. Os fuzileiros fazem simulações de guerra, com aviões, paraquedistas, helicópteros, blindados, anfíbios, bateria antiaérea, detonação de explosivos, descontaminação por agentes químicos, nucleares, biológicos e bacteriológicos. Também treinam salvamentos.

No passado, militares de Forças Armadas estrangeiras já participaram como dos Estados Unidos, Portugal, Paraguai, Equador, Chile, Namíbia e Uruguai.

Por causa do tamanho do efetivo empregado e da quantidade e variedade de equipamentos testados – serão cerca de 150 – os preparativos levam cerca de dois meses, com deslocamento do Rio, a 1,4 mil quilômetros.

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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,entenda-a-operacao-formosa,70003805886


Luiz Carlos Azedo: Tanqueata na Esplanada

A solenidade militar corrobora supostas ameaças feitas por Braga Netto, de não se realizarem as eleições caso o voto impresso não seja aprovado

A Câmara deve votar, hoje, o relatório do deputado Raul Henry (MDB-PE) que rejeita a proposta de emenda à Constituição (PEC) 135/2019, que propõe a adoção do voto impresso, de autoria da deputada Bia Kicis (PSL-DF). Estima-se que a proposta tenha mais de 320 votos contrários, contra menos de 100 a favor, quando precisaria de, no mínimo, 308 votos para ser aprovada. Caso se confirme o placar, será uma derrota acachapante do presidente Jair Bolsonaro, expondo seu isolamento político e a fragilidade da base parlamentar bolsonarista. Trocando em miúdos, o voto impresso só contaria com o apoio dos deputados de extrema-direita. A votação será a constatação de que o governo Bolsonaro não tem como sobreviver sem o apoio do Centrão, que ficará com a faca e o queijo na mão na Esplanada.

Esse será o resultado, também, de um gesto equivocado de Bolsonaro, com apoio do ministro da Defesa, general Braga Netto, empenhado em constranger os comandantes militares a fazerem demonstrações de alinhamento político com o presidente da República. Nesta manhã, está programada uma cerimônia militar na Praça dos Três Poderes, na qual o presidente da República será convidado a participar de exercícios militares da Marinha no campo de manobras da Operação Formosa (GO), a cerca de 50 quilômetros de Brasília. Tanques, carros anfíbios, lançadores de foguetes e obuseiros da Marinha, que estão sendo deslocados do Rio de janeiro para Goiás, desfilarão pela Esplanada dos Ministérios e estacionarão defronte ao Palácio do Planalto, ou seja, na Praças dos Três Poderes, ao lado do Congresso e em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF). Para gregos e baianos, soa como uma intimidação.

Entretanto, trata-se de um exercício realizado periodicamente, para adestramento dos fuzileiros navais da Esquadra, que simulam operações de combate com emprego de munição real e apoio do Exército e da Aeronáutica. Desta vez, porém, o deslocamento dos veículos e da tropas do Rio de Janeiro para Goiás foi. transformado numa espécie de “tanqueata”, para demonstração de apoio político aos propósitos golpistas do presidente da República, justo no dia em que a Câmara deve rejeitar a proposta de voto impresso. Bolsonaro não faz outra coisa que não seja pôr em suspeita a lisura das eleições com urna eletrônica. Tenta intimidar o Congresso, para restabelecer o voto impresso, com a ameaça de não permitir a realização das eleições. Consegue ofuscar até as propostas do próprio governo que visam criar uma agenda positiva.

A solenidade militar corrobora supostas ameaças feitas por Braga Netto, de não se realizarem as eleições caso o voto impresso não seja aprovado; na real, é mais um constrangimento para as Forças Armadas, indispondo-as com o Congresso, numa hora em que já se discute limitar a presença de militares da ativa na administração pública. A repercussão no Congresso é péssima; na sociedade, também, porque nos remete às quarteladas do século passado.

Ordem unida
Também nos lembra uma velha piada dos estertores do Estado Novo, logo após a volta da Força Expedicionária Brasileira (FEB) dos campos de batalha da Itália, onde lutaram contra o Exército alemão. O general Góes Monteiro, chefe militar da Revolução de 1930 e ministro da Guerra no Estado Novo, às vésperas de destituir Getúlio Vargas, era um dos alvos preferidos da oposição. Fora simpatizante do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), no período em que Vargas vacilava entre se aliar ao nazifascismo ou entrar na II Guerra Mundial ao lado dos Estados Unidos e do Reino Unido. Em visita à Alemanha, Monteiro ficou impressionado com a disciplina das Wehrmacht, ao ver um sargento alemão se atirar da janela do terceiro andar, após receber ordens expressas de seu comandante, estatelando-se no pátio do quartel. No Japão, se impressionou mais ainda, ao visitar um porta-aviões e assistir uma cerimônia de seppuku, suicídio ritual na qual um camicase dedicou a vida ao Imperador e à vitória do Japão.

Ao voltar para o Brasil, Góes Monteiro não teve dúvidas. Madrugou no Palácio do Catete, sede do governo, no antigo Distrito Federal (Rio de Janeiro), e mandou tocar a alvorada às 5h. A Guarda Presidencial saiu dos alojamentos assustada, sem entender o que estava acontecendo, com os dragões desalinhados, rabo de cavalo do capacete para a frente, coturnos desamarrados, túnicas fora da calça, remelas nos olhos… O general aproximou-se do sargento Tião, velho conhecido, que liderava o pelotão. Em alto e bom som, deu a voz de comando: “Dragões, sentido!” A tropa se endireitou. “Esquerda, volver!”. A tropa perfilou. “Apresentar armas!”. Tião ficou cara a cara com o general, com quem tinha até certa intimidade, e sentiu o bafo carregado de uísque. Não se conteve: “Senhor, bêbado a uma hora dessa?”.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-tanqueata-na-esplanada/

Tanques na Esplanada: Forte representação política e histórica

No dia em que a Câmara votará em plenário a PEC do voto impresso, um comboio de blindados militares passará pelo Congresso e seguirá para a Praça dos Três Poderes. Iniciativa inédita é vista no Legislativo como uma tentativa de intimidação

Sarah Teófilo e Renato Souza / Correio Braziliense

No dia em que a Câmara votará a proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto impresso — amplamente defendido pelo governo —, um comboio de blindados militares passará pelo Congresso a caminho do Palácio do Planalto. As tropas integram a Operação Formosa, realizada todos os anos pela Marinha, mas que nunca incluiu a Praça dos Três Poderes no trajeto até a cidade goiana.

Outro fato inédito é a participação do Exército e da Aeronáutica, além de a coordenação ficar sob a responsabilidade do Ministério da Defesa. A decisão é vista como uma tentativa de intimidação do Parlamento e provocou críticas de congressistas e ações na Justiça.

No anúncio sobre a passagem pela Esplanada dos Ministérios, a Marinha justificou que a intenção é entregar convite ao presidente Jair Bolsonaro e ao ministro da Defesa, Braga Netto, para participarem da cerimônia de abertura do evento no Entorno do DF, marcada para o próximo dia 16.


DESFILE MILITAR - OPERAÇÃO FORMOSA 2021


Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
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Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
Desfile militar na Esplanada - Operação Formosa. Foto: Pedro França/Agência Senado
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No Judiciário e no Congresso, a ação é vista como uma tentativa de pressionar os deputados, tendo em vista o cenário de forte rejeição à PEC. Prevendo derrota na Câmara, o governo estaria fazendo uma demonstração de suposta lealdade política das Forças Armadas à escalada autoritária de Bolsonaro.

Com 2.500 militares envolvidos na Operação Formosa, os blindados partiram do Rio de Janeiro, e a expectativa é de que o comboio chegue ao centro de Brasília por volta das 8h. A ação causou surpresa até mesmo a integrantes do alto escalão do Exército, que dizem não terem sido informados com antecedência do evento. Fontes militares consultadas pelo Correio, sob a condição de anonimato, afirmam que a ordem para seguir até o Planalto, passando em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Congresso, partiu do Ministério da Defesa.

Ameaça
A presença de blindados no centro do poder é mais um capítulo em torno de polêmicas provocadas pelo alinhamento de militares com o governo. As imagens da Esplanada com tanques devem ter forte representação política e histórica. A cena é incomum e preocupa o Legislativo.

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) chamou o desfile de intimidação e disse que se trata de ação inconstitucional. “Tanques na rua, exatamente no dia da votação da PEC do voto impresso, passou do simbolismo à intimidação real, clara, indevida, inconstitucional. Se acontecer, só cabe à Câmara dos Deputados rejeitar a PEC, em resposta clara e objetiva de que vivemos numa democracia e que assim permaneceremos”, declarou.

Já o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) vê ensaio de golpe. “Colocar tanques na rua não é demonstração de força e, sim, de covardia. Os tanques não são seus, pertencem à nação. Quer tentar golpe, senhor Jair Bolsonaro? É o crime que falta para lhe colocarmos na cadeia”, frisou.

Por sua vez, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) questionou os gastos de verba pública envolvidos no desfile, que foi avisado com um dia de antecedência. “Pedi à Justiça que impeça o gasto de recursos públicos em uma exibição vazia de poderio militar. As Forças Armadas, instituições de Estado, não precisam disso. Os brasileiros, sofrendo com as consequências da pandemia, também não. O Brasil não é um brinquedo na mão de lunáticos”, destacou pelas redes sociais.


BOLSONARO - OPERAÇÃO FORMOSA 2021


Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
Bolsonaro recebe convite da Demonstração Operativa a ser realizado pela Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Vieira protocolou a ação popular na Justiça Federal da 1ª Região. A deputada Tabata Amaral (sem partido-SP) também é signatária do processo. “Está claro que Bolsonaro quer intimidar o Congresso na sessão que vai decidir sobre o voto impresso. É inadmissível esse comportamento do presidente”, escreveu a parlamentar nas redes sociais.

Opinião semelhante foi expressada pela deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC). “Há homens fracos e frouxos que usam da força para mostrar poder. Bolsonaro é desses. Em baixa nas pesquisas, traz veículos de artilharia e combate, usados em treinamentos militares, para a Esplanada.

Mais uma vez, usa as instituições militares para impulsionar seu projeto anarquista de poder”, escreveu nas redes sociais. “É um necessário exercício da Marinha, mas que Bolsonaro transforma num espetáculo político, quando o traz pra Esplanada, com a clara intenção de aumentar especulações. Bolsonaro vive de especulações e sobrevive de tensões políticas.”

Após a repercussão, a Marinha emitiu nota negando pressão pelo voto impresso. “Cabe destacar que essa entrega simbólica foi planejada antes da agenda para a votação da PEC 135/2019 no plenário da Câmara dos Deputados, não possuindo relação com a mesma, ou qualquer outro ato em curso nos Poderes da República”, diz um trecho do comunicado.

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/08/4942746--imagens-de-tanques-na-esplanada-devem-ter-forte-representacao-politica-e-historica.html

*Título do texto original foi alterado para publicação no portal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP)


Desfile militar dura 10 minutos e termina sem discurso de Bolsonaro

Desfile dos veículos na Esplanada dos Militares provocou reação por ocorrer em um momento de tensão institucional entre os Poderes

Ricardo Della Coletta / Folha de S. Paulo

O desfile desta terça-feira (10) em frente ao Palácio do Planalto reuniu pela manhã dezenas de veículos militares, entre blindados, tanques, caminhões e jipes.

A parada militar, realizada no dia da votação do voto impresso na Câmara dos Deputados e criticada como mais uma tentativa de politização das Forças Armadas, começou por volta de 8h30.

Nesse horário, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já estava na rampa do Palácio do Planalto, acompanhado dos comandantes das três forças. Também estavam diversos ministros, entre eles Walter Braga Netto (Defesa), Ciro Nogueira (Casa Civil), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Anderson Torres (Justiça).

No início do desfile, que durou aproximadamente 10 minutos, um militar em traje de combate desceu de um dos veículos, subiu a rampa e entregou a Bolsonaro um convite para comparecer a exercício militar da Marinha programado para agosto.

Durante a passagem dos veículos, um grupo de apoiadores de Bolsonaro se reuniu na Praça dos Três Poderes e entoou gritos em defesa da intervenção militar. Eles gritaram "Eu Autorizo" e "142", em referência a dispositivo constitucional que bolsonaristas dizem justificar uma eventual intervenção fardada.

Um dia antes, em meio à polêmica causada pelo desfile de blindados, Bolsonaro postou em suas redes sociais um convite para que autoridades de Brasília, como os presidentes das Casas Legislativas e do Judiciário, recebam também os veículos militares.

O desfile dos veículos provocou reação por ocorrer em um momento de tensão institucional, além de ser a data prevista para que a Câmara dos Deputados vote a PEC (proposta de emenda à Constituição) do voto impresso. O presidente já assume a possibilidade de derrota.

Mesmo aliados do presidente reagiram ao evento militar. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que se trata de uma "coincidência trágica" que o desfile dos blindados aconteça no mesmo dia previsto para a votação da PEC.

Após a passagem por Brasília, os veículos militares seguem para Formosa (GO), onde será realizado um grande exercício militar, com a presença de membros não apenas da Marinha como também do Exército e da Aeronáutica.

Embora seja um exercício de adestramento tradicional da Marinha, essa seria a primeira vez que os blindados entrariam em Brasília. Além disso, eles passaram pela Praça dos Três Poderes, em um momento de grande tensão entre os poderes, em particular entre o Executivo e o Judiciário.

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/desfile-militar-em-dia-do-voto-impresso-dura-10-minutos-e-tem-bolsonaro-no-alto-da-rampa-do-planalto.shtml

*Título do texto original foi alterado para publicação no portal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP)


Ricardo Noblat: Os fatos teimam em contrariar as falas do presidente

Diário do dia de ontem

O dia em que o presidente Jair Bolsonaro disse que “está fazendo a coisa certa e que não é fácil fazer a coisa certa “foi também o dia em que ele, em live no Facebook, reforçou o desejo de que as torcidas voltem a frequentar os estádios. Em suas palavras:

Temos que voltar a viver, pessoal. Sorrir, fazer piada, brincar. Voltar (o público) nos estádios de futebol o mais cedo possível, que seja com uma quantidade menor, 20%, 30% da capacidade do estádio.

Foi também o dia em que Bolsonaro aconselhou a um grupo de devotos admitido nos jardins do Palácio da Alvorada:

Se eu fosse um dos muitos de vocês, obrigados a ficar em casa, ver a esposa com três, quatro filhos, e eu não ter, como chefe do lar, como levar comida para a casa, eu me envergonharia. Sempre disse que a economia anda de mãos dadas com a vida.

E foi também o dia que em visita a Propriá, na divisa entre Sergipe e Alagoas, ele discursou para uma pequena multidão:

A Europa e alguns países aqui da América do Sul não têm vacina. Sabemos que a procura é grande. Nós assinamos convênios, fizemos contratos desde setembro do ano passado com vários laboratórios. As vacinas começaram a chegar. E vão chegar, para vacinar toda a população em um curto espaço de tempo.

Nesse dia, o Brasil registrou o terceiro maior número de novas mortes por covid-19 em um intervalo de 24 horas. Foram 1.439 óbitos e 60.301 novos casos da doença. No total são 221.676 óbitos até agora e 9.060.786 pessoas contaminadas.

E o Instituto Butantã revelou que tem 54 milhões da vacina Coronavac em estoque, mas que o governo federal não quer dizer se irá comprá-las ou não. Há Estados e países interessados em comprar, mas o silêncio do Ministério da Saúde é um empecilho.

E o Lowy Institute, centro de estudos baseado em Sydney, na Austrália, apontou em relatório que o Brasil foi o país que teve a pior gestão pública durante a pandemia. Ficou na última posição entre 98 governos avaliados.

Ainda nesse dia, recém-nomeado assessor especial do Ministério da Saúde, o general Ridauto Fernandes afirmou que Manaus tem quase 600 pacientes de Covid-19 na fila de atendimento e que, caso evoluam para quadros graves, “vão morrer na rua”.

Em reunião da comissão externa do coronavírus na Câmara dos Deputados, Fernandes enfatizou que o gargalo está na falta de oxigênio. “Abre o leito, bota o paciente e ele vai morrer asfixiado no leito. E aí, vai adiantar abrir o leito?”.

O alerta do general foi ampliado por Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde, em entrevista à TV Cultura. Ao comentar a disseminação da nova variante do coronavírus detectada em Manaus, Mandetta previu:

Provavelmente, a gente vai plantar essa cepa em todos os territórios da federação e daqui a 60 dias a gente pode ter uma mega epidemia. 

Pergunta que não cala: a quem os militares devem obediência?

Pandemia é uma guerra

O presidente da República manda a imprensa enfiar latas de leite condensado (você sabe onde) e desce ao nível mais baixo da cadeia alimentar dos seres vivos. Para manter o mesmo diapasão: alguém aqui imaginou ver general e coronéis interventores do Ministério da Saúde fazendo c* doce para comprar mais vacinas do Butantan?

Logo as únicas que o país produz até agora no decorrer de uma pandemia que não para de piorar. Não passa pelo terreno baldio que eles carregam em cima do pescoço que, se demorar a comprar, a China e a Sinovac não terão mais insumos para fornecer este ano? E que a produção é limitada e todo o mundo corre atrás?

Existe corte marcial no Brasil, como em todos os países do mundo que têm forças armadas, para julgar crimes de guerra e contra a humanidade? Combater a pandemia é um tipo de guerra. Angela Merkel, chanceler da Alemanha, disse que a pandemia é o pior evento enfrentado pela humanidade desde a Segunda Guerra.

O povo brasileiro ainda faz parte da humanidade? Os generais e coronéis do Ministério da Saúde não enfrentarão nenhum julgamento? Ou vamos, de novo, anistiar geral e criar outra Comissão Nacional da Verdade para expor seus crimes daqui a cinquenta anos em cima de uma montanha de cadáveres?

O pretexto da luta contra o comunismo absolveu no passado torturas e mortes. E agora? Alegar “obediência devida” a um superior hierárquico no limite da insanidade absolverá outra vez? O Exército acredita mesmo que está desvinculado do ministério militarizado da Saúde e comandado por um general da ativa?

Se o Brasil estivesse em um conflito bélico, e as vidas dos soldados corressem grave risco, os generais refugariam mais munição e armamento? Pediriam quatro meses para pensar a respeito? Os soldados ainda teriam uma vantagem sobre nós: poderiam desertar e sumir no mundo. Nós não temos para onde fugir.

As Forças Armadas brasileiras juram obediência à Constituição e lealdade ao povo ou a um indivíduo que, por palavras, exemplos e ações induz à morte os que o elegeram e também os que votaram contra ele?


Reinaldo Azevedo: Lira não é só o antirreforma; ele é a contrarreforma

Deputado encarnaria antiliberalismo na sua modalidade reacionária

É evidente que considero desastrosa para o país a eventual vitória do deputado Arthur Lira (PP-AL) na disputa pela presidência da Câmara. E de várias maneiras. Com ele, eleger-se-ia não só a antirreforma, mas a contrarreforma.

Se já há dificuldade para emplacar no Congresso qualquer coisa que possa lembrar, de longe, uma pauta liberal, o parlamentar encarnaria esse antiliberalismo na sua modalidade reacionária.

Uma mágoa de Jair Bolsonaro com Rodrigo Maia (DEM-RJ) faz sentido. O atual presidente da Câmara, de fato, criou obstáculos civilizatórios para que o outro levasse adiante sua agenda fúnebre na Casa --que Lira, se vencer, promete retomar.

Bolsonaro admite —com o despudor com que anseia enfiar leite condensado na parte terminal do aparelho digestivo da imprensa— que resolveu meter a mão grande na disputa. Seu escolhido é uma espécie de Eduardo Cunha redivivo nos transes da ventura e nos dons do pensamento.

Há, no entanto, uma diferença: Cunha fez-se presidente da Câmara na contramão da tentativa de Dilma Rousseff de emplacar um nome. Bolsonaro, consta, pode ser mais feliz na empreitada, mas isso não muda a natureza e o caráter do seu parceiro. Perderá ganhando ou perdendo.

Lira foi um dos algozes no governo na Câmara ao longo de 2019. Ele e o presidente começaram a trocar juras de amor eterno no começo de 2020. No dia 19 de abril do ano passado, num ato golpista em frente ao QG do Exército, em Brasília, o "Mito", na prática, incitou as tropas a aderir a um autogolpe, sob seu comando.

Discursou: "Nós não queremos negociar nada. Nós queremos é ação pelo Brasil. O que tinha de velho ficou para trás. Nós temos um novo Brasil pela frente. Todos, sem exceção, têm que ser patriotas e acreditar e fazer a sua parte para que nós possamos colocar o Brasil no lugar de destaque que ele merece. Acabou a época da patifaria. É agora o povo no poder".

No dia seguinte, recebeu Lira no palácio para marcar "o fim da patifaria". Ambos fizeram uma selfie. Imagino um deles soprando aos ouvidos do outro: "Acho que este é o começo de uma bela amizade", como Rick, o amoralista charmoso e do bem, em conversa com Louis, o policial corrupto, no fim do filme "Casablanca". "Quem é o Rick da relação, Reinaldo?" Ninguém.

O "velho ficou pra trás"? Reportagem do Estadão evidencia que 250 deputados e 35 senadores foram premiados com R$ 3 bilhões, além das emendas parlamentares previstas, em obras para seus redutos. Maia estima as promessas em R$ 20 bilhões. Não há esse dinheiro.

Presidente fraco e destrambelhado azeita o mercado das adesões. A sua eficiência está em ser incompetente, o que dificulta a formação de base de apoio —e observo que isso nosso mandatário não tem nem terá. Sem a adesão orgânica de partidos ou parlamentares, resta ir às compras. E, como é sabido, o centrão não dá nem empresta. Vende.

Dilma chegou a ter a maior base de apoio das democracias no Congresso. Parte considerável era formada por esses patriotas. Aquele espetáculo grotesco do "eu digo sim (ao impeachment) em nome da minha mãe, do meu cachorro e da perereca da vizinha presa na gaiola" era a turma em ação.

Enquanto escrevo, Bolsonaro, Lira e os contemplados pelas verbas cantam seu triunfo. Se o deputado do Progressistas (que nome!!!) derrotar Baleia Rossi (MDB-SP), não leva só a presidência da Câmara. Também terá um refém em cativeiro: o presidente da República.

Por mais que seja apaixonado por si mesmo, o "Mito" não é tolo o bastante para acreditar que seu governo é bom. Deve ter noção dos desastres em curso e sabe que o futuro não é sorridente. Quer a garantia de que o presidente da Câmara jamais porá para tramitar um pedido de impeachment.

O centrão é essa garantia? Enquanto Bolsonaro dividir com o grupo o governo e as verbas, sim. Se o troço desandar, sempre se pode evocar o "fato novo" e dar o cavalo de pau no que foi dito no dia anterior. Saindo tudo como quer o presidente, mal posso esperar para ver Paulo Guedes a debater com Lira a "recuperação em V".


Bruno Boghossian: Governo não consegue apresentar plano de saída para o auxílio emergencial

Bolsonaro não mostra interesse em manter uma rede de proteção até que a economia se recupere

Jair Bolsonaro foi ao Nordeste para lançar a obra de uma ponte entre Sergipe e Alagoas. De um lado, em Propriá (SE), um terço da população recebeu o auxílio emergencial. Do outro, em Porto Real do Colégio (AL), o benefício chegou a 43% dos moradores. Se algum deles esperava uma luz sobre os próximos meses, continuou no escuro.

O governo tem o direito de se opor a novas parcelas do auxílio. A equipe econômica, aliás, resistiu ao pagamento de R$ 600 desde o início da crise do coronavírus, e Bolsonaro avisou que o benefício não seria permanente. Todos eles sabiam que o programa terminaria em 2020, mas, até agora, não quiseram apresentar um projeto de saída viável.

O plano do presidente para a economia continua o mesmo: empurrar os brasileiros para um mercado de trabalho vacilante e abalado pelo avanço contínuo de uma doença que mata mais de mil pessoas por dia.

No palanque de Sergipe, ele pediu que prefeitos e governadores evitassem medidas de distanciamento e disse que "o povo brasileiro não tem medo do perigo". Afirmou ainda: "Nós sabemos quem são os vulneráveis, os mais idosos e os com comorbidades. O resto tem que trabalhar".

Além de protagonizar um espetáculo de lentidão na compra de vacinas que poderiam preservar a saúde desses trabalhadores, o presidente não demonstra interesse em manter uma rede de proteção econômica até que a atividade se recupere.

Na terça (26), Bolsonaro disse a investidores que o governo não permitiria "que medidas temporárias relacionadas com a crise se tornem compromissos permanentes de despesas". Ele afirmou que a retomada se daria, no futuro, com o "dinamismo do setor privado". No Planalto, a palavra "emergência" perdeu o sentido.

No mesmo evento, Paulo Guedes lembrou que a prorrogação desses gastos não cabe no Orçamento e disse que a solução é cortar custos. Depois, comparou o aumento de despesas a uma bomba atômica. "Vai ter tragédia para todo lado", afirmou. O ministro deve estar desatualizado.


José Serra: Por um Congresso autônomo

Nas eleições do Legislativo, devemos preservar o Estado democrático de Direito

A autonomia do Poder Legislativo é a espinha dorsal da democracia representativa, especialmente no regime presidencialista. Nossa Constituição é cristalina em seus dois primeiros artigos: o Brasil constitui-se em Estado democrático de Direito e os Poderes da União —Legislativo, Executivo e Judiciário— representam, cada um em sua esfera, a soberania popular.

Note-se que o primeiro dos sete artigos da Constituição norte-americana —famosa por ser sintética e objetiva— trata do Poder Legislativo. É a parte mais extensa do documento que configura uma das democracias mais importantes do mundo. Pode-se dizer que a primeira emenda constitucional, introduzida em 1789 por James Madison, é considerada o coração da democracia americana: “...que o Congresso não faça nenhuma lei submetido a uma religião ou proibido de seu livre exercício”.

Com a convicção de que precisamos preservar nosso Estado democrático de Direito e a independência do Poder Legislativo, participarei do processo de escolha do presidente do Senado Federal, a quem caberá presidir o Congresso Nacional nos próximos dois anos.

O desafio de conduzir o Senado nesses tempos de pandemia de Covid-19 é imenso. Assim sendo, cabe ao senadores escolher com completa independência, dada a agenda de deliberações decisivas que o Congresso terá pela frente em colaboração com o Poder Executivo.

A primeira da lista é a luta contra a pandemia, o que envolve custos consideráveis. E aqui não faço referência somente ao aspecto financeiro. Tempo e energia são despendidos para administrar e coordenar políticas públicas, assim como para harmonizar as conflitantes demandas populares.

É preciso notar que todo o esforço do governo federal para banalizar o vírus e combater a vacinação vem, ao fim e ao cabo, promovendo uma ação descoordenada extremamente custosa e que coloca em risco vidas de famílias e de empresas. A sociedade e a mídia incorrem, literalmente em custos desnecessários, para restaurar a verdade e sinalizar o óbvio: o vírus é perigosíssimo, e a vacina é insubstituível!

Para otimizar esses custos de coordenação e sinalização, o Poder Legislativo deverá atuar de forma independente, promovendo uma agenda capaz de assegurar saúde, renda e empregos, sobretudo para os grupos mais afetados pela pandemia, sem descuidar do processo de recuperação econômica do país. São agendas complementares, na medida em que o controle do novo coronavírus é condição necessária para a retomada do crescimento.

Por um lado, faz-se necessário priorizar uma agenda social para sustentar o SUS, assegurar renda básica e atrair mais investimentos. Isto supõe a provisão de crédito mais barato, em subsídios, se necessário, a empresas atingidas pela crise. É inadmissível o setor público não agir diante de situações como a que ocorreu em Manaus: pessoas morrendo em hospitais por asfixia por falta de equipamentos básicos, como balões de oxigênio. Da mesma forma, não se pode deixar que pessoas e empresas atingidas pelas consequências da Covid-19 sejam abandonadas à sua própria conta.

Ademais, deve-se priorizar também uma agenda econômica para fomentar a recuperação econômica do país. Para tanto, é fundamental discutir reformas que tornem o setor público mais eficiente e que estimulem o setor privado a investir no país. Cito, por exemplo, reformas como a administrativa e os projetos de lei tidos como relevantes para dinamizar os investimentos em infraestrutura.

Por fim, vale lembrar que não iremos longe se não promovermos uma ação governamental planejada e coordenada, mais pragmática e menos ideológica. Para isso é fundamental apostarmos as fichas na independência do Congresso Nacional.

*Senador da República (PSDB-SP), ex-governador de São Paulo (2007-2010), ex-prefeito de São Paulo (2005-2006) e ex-deputado federal (1987-1991); doutor em economia pela Universidade Cornell (EUA)


Zeina Latif: Levanta, sacode a poeira...

Desafio das instituições democráticas é evitar nova década perdida no País

A crise atual é grave, mas será ainda mais perversa se não tirarmos lições dos erros e também dos acertos.

Começando pelos acertos, o Legislativo não ficou paralisado. Além das medidas anticrise, foram aprovadas reformas – marco do saneamento básico, lei de licitações, nova lei de falências – e outras tantas avançaram – lei do gás, marco legal de cabotagem e independência do Banco Central.

Câmara, liderada por Rodrigo Maia, teve importante papel em frear centenas de iniciativas irresponsáveis, que iam desde suspender o pagamento de contas de consumo à proibição de cobrança de juros pelos bancos. Medidas que desorganizariam a economia e pesariam nas contas públicas. Agravariam a crise e deixariam um rastro de insegurança jurídica.

Congresso tampouco deu ouvidos a recomendações equivocadas de política econômica, como a de permitir o financiamento dos gastos públicos com emissão monetária. A PEC do orçamento de guerra proveu maior poder de ação ao Banco Central de forma prudente. A aceleração recente da inflação serve de alerta contra propostas inadequadas para um país emergente com graves problemas fiscais.

Houve muitos acertos do Banco Central, no timing e no desenho das medidas para injetar liquidez no sistema monetário e, de forma inédita, elevar substancialmente a capacidade de empréstimo dos bancos, medida que ultrapassou R$ 1,5 trilhão. Além disso, teve participação nas políticas de socorro a empresas. Também merece destaque o avanço da agenda estrutural, como o lançamento do Pix – desconhecido por Bolsonaro. O prêmio internacional de “presidente de Banco Central do ano” recebido por Roberto Campos Neto diz muito.

Os bancos contribuíram para o bom funcionamento do mercado de crédito. O setor reagiu bem às políticas governamentais. Houve expressivo aumento da repactuação de dívidas e do chamado crédito direcionado, que inclui as medidas de socorro governamental, com destaque para o crédito a micro, pequenas e médias empresas.

Na recessão anterior, os bancos foram muito conservadores. A frágil situação das empresas foi agravada pela falta de crédito, aprofundando a crise. Lições foram aprendidas. O aumento do estoque de crédito livre em novembro estava em 17% na comparação anual (25% na pessoa jurídica), ante recuo de 3% no biênio 2016-17 (queda de 12% na PJ).

Moral da história: aqueles muitas vezes vistos como “vilões” tiveram importantes acertos. Congresso, Banco Central e bancos foram parte da solução.

Já os erros foram bastante discutidos ao longo do ano, a começar pela gestão da saúde, que deixa uma sensação de que 2020 não acabou. Sem vacinação, a incerteza da recuperação da economia é grande, com graves consequências sociais. As medidas de socorro a indivíduos e empresas expiram, mas a doença, não.

O baixo crescimento torna a economia mais vulnerável a choques. Não convém se iludir com a projeção de crescimento de 3,4% em 2021 das instituições financeiras. Ela embute um quadro de estagnação, pois a cifra reflete basicamente o que os economistas chamam de carrego estatístico – uma combinação de base de comparação baixa (a média de 2020) e ponto de partida mais elevado por conta da recuperação no último semestre.

Do lado fiscal, as falas do presidente revelam grande incômodo com as restrições orçamentárias e, ao mesmo tempo, indisposição para avançar com reformas estruturais, mesmo em meio à crise, que costuma ser estímulo para enfrentar o custo político de reformas. Aumentou a chance de “furo” do teto de gastos, o que implicará mais incertezas, ainda que não a ponto de haver um choque de juros pelo BC este ano.

Apesar dos riscos para 2021, essa não é a maior preocupação, mas, sim, um governo que, ao não agir à altura dos desafios, coloca a cada dia mais um tijolo na construção de outra década perdida.

Impedir esse cenário é o grande desafio das instituições democráticas, contendo retrocessos, promovendo o debate público, reconhecendo erros e acertos e construindo alternativas políticas para o futuro. 

*Consultora e doutora em economia pela USP


Pedro Cafardo: Nobres que aqui legislam não legislam como lá

A omissão do governo federal deixou na mão de prefeitos e governadores a tarefa de tentar socorrer os brasileiros sem emprego e renda a partir deste mês

Nossos nobres deputados e senadores saíram para suas merecidas férias deixando para trás a discussão do prolongamento do auxílio emergencial, necessário enquanto não passa a pandemia da covid-19. Observem que não foram colocadas aspas, na frase acima, nem em “nobres” nem em “merecidas”. Mesmo assim, talvez o leitor veja ironia no emprego desses dois adjetivos.

Seja por culpa do Executivo ou do Legislativo, deixar para depois do recesso uma discussão tão importante é, no mínimo, um desrespeito à população atingida pela crise. O auxílio emergencial, que começou em abril com R$ 600 por mês e acabou em dezembro com R$ 300, foi responsável pela relativa estabilidade do país durante a pandemia, até agora. Desculpem o catastrofismo, mas sem essa ajuda seria impossível prever o que teria ocorrido nas ruas e nos supermercados, diante do desespero e da fome.

O auxílio foi um sucesso porque reduziu a miséria e estimulou o consumo. Mas aumentou a popularidade do presidente, lamentam críticos. Dane-se a popularidade do presidente, embora ele não a mereça, porque atrapalhou e ainda atrapalha o país no combate à doença. Importante é socorrer pessoas que ficaram sem renda, seja lá qual for a consequência política dessa iniciativa.

Ao adiar sem remorsos a discussão do auxílio para 2021, prevaleceu a tese da austeridade fiscal, segundo a qual o país não tem recursos para isso. Entendem teóricos que seria uma irresponsabilidade gastar mais dinheiro com o auxílio porque estaríamos transferindo às gerações futuras o ônus do enfrentamento da crise de hoje. Seria bom perguntar a esses teóricos quais serão os reflexos nas próximas gerações se as atuais forem assoladas pela extrema pobreza.

Os gastos com o auxílio, dizem os teóricos, teriam impacto na dívida pública, porque o governo seria obrigado a fazer emissões de moeda e títulos. No meio do ano passado, esses “falcões fiscais” - expressão usada nos EUA por J. Bradford DeLong, ex-secretário adjunto do Tesouro - previam que o Brasil terminaria 2020 com a dívida interna próxima de 100% do PIB. Isso seria um desastre, porque desestimularia os investimentos estrangeiros no país. Mas a previsão falhou. A relação deve ficar abaixo de 90% do PIB, mesmo depois de o governo ter gastado mais de R$ 600 bilhões com a pandemia, sendo R$ 300 bilhões com o auxílio.

Sim, é um erro buscar no gasto público a salvação para a atual crise. Mas tampouco se pode buscá-la no corte de despesas. Trata-se de uma situação excepcionalíssima que, aqui e em qualquer outro lugar, exige decisões excepcionais. É inegável que o auxílio emergencial teve e terá, se for prorrogado, impacto positivo no consumo e na produção, o que tende a melhorar a relação dívida/PIB, preocupação-mor dos falcões. Segundo DeLong, “a lição mais importante [da atual crise] que ainda não foi absorvida é que, em uma economia profundamente deprimida, os empréstimos e gastos do governo aumentam a prosperidade de curto e longo prazo do país”. Por isso, esses gastos mais expandem a capacidade fiscal do que aumentam o peso da dívida.

A continuidade do auxílio emergencial, no Brasil, esbarraria em limitações constitucionais relativas a gastos da União e isso obrigaria o Congresso a votar a extensão do Orçamento de Guerra, que vigorou até 31 de dezembro. E daí? Que seja votada. Afinal, a ameaça de calamidade pública continua, porque os índices de infecção e morte pela covid-19 crescem de forma assustadora e a vacina, por causa de incompetências, ainda é um sonho no país. E, segundo o líder do Governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), não houve “nenhuma iniciativa, de qualquer parte [antes do recesso] para que se prorrogasse ou se renovasse o Orçamento de Guerra”.

Lá no norte, porém, num dos países mais ricos do mundo, os parlamentares dos Estados Unidos fizeram a lição de casa antes do fim de ano. Aprovaram um pacote de ajuda equivalente a R$ 4,7 trilhões (US$ 900 bilhões) para o combate à pandemia. Embora tenha recursos de apenas 40% do pacote anterior, baixado no início da pandemia, o novo conjunto de medidas atende a variados setores da economia. Dá um bônus de US$ 600, que ainda pode ser aumentado para US$ 2 mil, a quem ganha até US$ 75 mil por ano; US$ 300 adicionais por semana durante 11 semanas aos desempregados; US$ 325 bilhões em empréstimos para pequenas empresas, sendo US$ 284 bilhões “perdoáveis” se o dinheiro for empregado para pagar salários, aluguéis e outros gastos primordiais; US$ 100 por semana a empreendedores individuais; US$ 69 bilhões para a distribuição de vacinas contra o coronavírus; US$ 22 bilhões para programas de testagem nos Estados; US$ 13 bilhões para assistência nutricional; US$ 7 bilhões para acesso à banda larga; US$ 45 bilhões para agências de transporte e trânsito; e US$ 25 bilhões em ajuda para aluguel.

Um pacote desse é de dar água na boca. Inclui bilhões em crédito direcionado a empresas, em especial a pequenas, apoio também suspenso aqui pelo BC desde o dia 1º. A omissão do governo federal deixou na mão de prefeitos e governadores a tarefa de tentar socorrer os brasileiros sem emprego e renda a partir deste mês.

Claro que um pacote brasileiro similar ao americano não teria tamanha dimensão. Mas a pergunta que fica no ar é: por que os americanos já têm e o Brasil ainda não tem medidas para combater os estragos sociais da segunda onda da covid-19 e iniciamos 2021 sem sequer discutir o tema nas áreas oficiais?

Para a resposta, vale pedir ajuda aos universitários, ou melhor, aos pré-universitários que vão fazer o Enem. Escolham uma das opções: a) o povo americano é, de fato, mais necessitado que o nosso e não tem como atravessar a pandemia sem ajuda do governo; b) as autoridades americanas são mais irresponsáveis do que as nossas e põem em risco as gerações futuras gastando trilhões para atender e tentar salvar a geração presente; c) os EUA podem gastar com o auxílio porque têm uma situação fiscal mais confortável do que a nossa (relação dívida/PIB é de 106% e a do Brasil, de 89%); d) nossos teóricos são mais competentes que os deles para evitar desastres fiscais; e) nossas autoridades são mais realistas; f) nenhuma das anteriores.