Legislativo

Folha de S. Paulo: Bloco de sucessão na Câmara é sinal forte sobre aliança para 2022, diz Maia

Presidente da Casa reclama de condução do governo Bolsonaro na pandemia e diz que marca de sua gestão foi recuperar 'protagonismo' do Parlamento

Danielle Brant  e Julia Chaib, Folha de S. Paulo

 BRASÍLIA - O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), encerra em fevereiro de 2021 o último de três mandatos seguidos à frente da Casa.

Em entrevista à Folha, ele avalia que a marca de sua gestão foi recuperar o protagonismo do Parlamento, além de ressaltar o papel do Congresso no combate à pandemia.star

Nos últimos dias, Maia anunciou a formação de um bloco para a disputa da sua sucessão que reúne 280 deputados, de partidos de centro-direita e direita (DEM, MDB, PSDB e PSL) e de oposição, como PT, PC do B, PDT e PSB.

O candidato é Baleia Rossi (MDB-SP), que vai disputar o cargo com Arthur Lira (PP-AL), líder do chamado bloco do centrão e apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O seu grupo na disputa, avalia Maia, é um ensaio para a eleição presidencial de 2022 e "um grande passo" para diminuir as radicalizações no país.

Como o senhor avalia a sua gestão? 

Nós tivemos durante um longo período do ano passado e até o meio da pandemia o entorno das redes sociais do governo, do presidente, com muita agressão ao Parlamento, ao Supremo e às instituições democráticas.

Na pandemia, se não fosse o Congresso, a maioria dos projetos mais importantes não teria andado. Acho que foram dois anos de uma experiência muito interessante e perigosa nesse enfrentamento, que chegou até a se jogar fogos em direção ao Supremo Tribunal Federal.

A experiência adquirida anteriormente me ajudou a manter o equilíbrio, manter o diálogo institucional e, principalmente, com os ministros técnicos do governo, para que a Câmara pudesse ter um protagonismo importante [após a entrevista, acrescentou, em mensagem, que seu maior arrependimento foi ter 'levado o Paulo Guedes a sério'].

O sr. teve uma trégua no relacionamento com o Paulo Guedes, mas depois desandou. O sr. conversou com ele no último mês? 

Não estou rompido com ele não. Mas eu não preciso [dialogar com ele]. Votamos tudo sem a gente precisar ter um diálogo.

Algumas votações defendidas pelo sr. não ocorreram. Por exemplo, a PEC Emergencial, que poderia abrir espaço para ampliar o Bolsa Família. 

Do meu ponto de vista, foi um erro [deixar para 2021]. A gente deveria ter avançado, com toda polêmica. Porque era um desgaste menor abrir espaço no Orçamento e garantir a ampliação do Bolsa Família do que deixar milhões de brasileiros sem nenhum tipo de proteção, mesmo que a proteção fosse um valor menor que o valor do auxílio emergencial.

Por isso que eu sempre defendi que a reforma mais importante naqueles últimos meses era a PEC Emergencial. Por isso defendi a não entrada em recesso por parte do Congresso, mas o governo interpretou isso como uma tentativa de usar o plenário da Câmara na minha sucessão.

O sr. chegou a dizer que havia maioria para aprovar a reforma tributária. Por que não pautou? 

Não votar a reforma tributária foi, do meu ponto de vista, um erro grave do governo. A gente não está aqui só para dizer que aprovou coisa, estamos aqui para aprovar com diálogo, e a tributária precisa do diálogo com o governo.

Mexer nos tributos sem estar organizado com a Receita, com os técnicos do governo... seria um capricho meu tentar avançar sem isso estar bem organizado. Voto tem, e tenho certeza de que no início do ano vai ser votado, mas a questão política prevaleceu em detrimento da sociedade brasileira.

Nessas semanas foram muitos projetos obstruídos pelos partidos da base do governo. O senhor viu uma tentativa do governo de tentar minar o final de sua gestão? 

Eu acho que sim, mas acho que erraram, né? A última semana de trabalho mostrou que a Câmara tem uma maioria que quer aprovar projetos. A equipe política, no final, fez política populista. Deixou a pauta em aberto para eu pautar. Mas tenho responsabilidade. E de nenhuma forma tento aprovar projetos que não sejam dialogados com os quadros técnicos de cada uma das áreas das matérias.

Ter conseguido vencer a obstrução pode ser encarado como um fator positivo? 

Acho que é uma sinalização forte que a base que o governo construiu na Câmara não é majoritária. Mostra que o que foi vendido ao presidente, que teria uma base majoritária na Câmara, não é um dado da realidade. Não significa que ele não tenha apoio para aprovar reformas que modernizem o Estado brasileiro, isso ele tem. Agora, ele não tem uma maioria política no plenário da Câmara dos Deputados.

Supondo que o Baleia [Rossi, candidato do bloco de Maia] vença as eleições, o senhor acha que ele pode enfrentar obstrução no início dos trabalhos? 

Não, porque a base do governo acabou sendo usada pelo interesse do candidato do presidente Bolsonaro. Acabada a eleição, acabou essa disputa.

Mas o seu grupo construiu uma candidatura de oposição ao governo. O que faz o senhor acreditar que esse diálogo com o Executivo vai se dar de forma harmônica? 

Não estamos em oposição a ninguém, estamos a favor da democracia, da liberdade, do meio ambiente. O nosso campo vota majoritariamente a favor da agenda econômica do governo. Após a sucessão, é óbvio que a agenda econômica vai continuar sendo liberal. Eu sempre disse que o perfil que eu acredito vencedor da Câmara vai ser alguém que seja independente.

O senhor acha que o Arthur Lira não é um candidato que garante independência à Câmara? 

Eu não vou tratar do candidato do Bolsonaro. Eu trato da candidatura que nós defendemos. O governo muitas vezes defende pautas que geram o conflito, o ódio na sociedade, como na pauta ambiental e de costumes.

Quando você transfere para o Congresso essas pautas, você transfere, primeiro para a Câmara, essa polarização que não tem sido boa para a sociedade. Temos convicção que esse bloco que nós representamos afirma a importância e defende a independência da Câmara.

A gente passou o ano na expectativa de uma definição no Supremo ou no Congresso sobre a possibilidade de reeleição. O sr. se arrepende de não ter deixado claro que não seria candidato? 

No meio do julgamento não ia dar a minha opinião. Mas antes disso todo mundo sabia. Eu disse claramente a alguns ministros do Supremo com quem conversei que não seria candidato. Mas eu não vou entrar nessa especulação, é besteira. Imagina se alguém tem poder de influenciar o plenário do Supremo. É diminuir e minimizar a importância de 11 ministros.

O sr. conversou com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, desde a decisão do Supremo? A decisão pelo nome do Baleia também passou pelo Senado? 

Não, não conversei, mas eu estou tratando da Câmara e ele do Senado. Não conversei com ninguém do Senado, nenhum senador, nenhum senador do MDB, do DEM.

O PT fez uma reunião no dia do anúncio em que colocou ressalvas a Baleia. Por que o Baleia, se o maior partido de oposição tem resistência a ele? 

Esse é um processo de construção política. E temos um bloco que representa 280 parlamentares. E a representação dos 280 de forma majoritária compreendeu que o melhor caminho seria pelo Baleia, que começaria unificando o MDB e, dali para frente, unificaria toda a base. E ele tem toda a condição, como o Aguinaldo [Ribeiro, do PP] tinha, de construir uma relação com o PT, com o PSB, PDT e PC do B para que a gente tenha todos os votos unidos da esquerda.

Há o compromisso com a oposição de não pautar privatizações? 

Não. Não há compromisso de deixar de pautar matéria alguma.

Esse bloco que o senhor formou pode ser um ensaio para 2022? 

A nossa demonstração é que a gente pode dialogar, que a gente pode sentar numa mesa, divergir, mas construir consensos, construir projetos que, de fato, caminhem no interesse da sociedade brasileira. Acho que isso é o que esse bloco mostra, que a gente é capaz, mesmo tendo muitas diferenças em muitos temas, de sentar numa mesa e discutir a nossa democracia e o interesse do Brasil. Eu acho que é um sinal forte de que parte desse bloco pode estar junto em 2022. Nós demos o grande passo para reduzir de vez a radicalização da política brasileira. O [Winston] Churchill tem uma frase muito interessante: 'Aqueles que nunca mudam de ideia nunca mudam nada'.

E, nesse sentido, o senhor acha que é difícil ter uma chapa com a oposição...

Olha, nós temos uma grande dificuldade na pauta econômica, mas nada que não possa ser pactuado para uma eleição em 2022 e parte desse bloco possa estar junto.

E quem se encaixa melhor nesse perfil pensando em 2022? O Luciano Huck ou o João Doria? 

Acho que são dois ótimos nomes. Tem o próprio ACM Neto [presidente do DEM] que é um ótimo nome, tem o Ciro Gomes [PDT] que é um ótimo nome, o Paulo Câmara [PSB] está terminando o governo [de Pernambuco], quem sabe ele também queira participar. Então acho que a gente tem que dialogar.

Qual vai ser a atuação do senhor nisso? 

Sou um deputado do DEM. Estou à disposição do DEM para ajudar na construção de uma chapa, que possa ser a mais ampla possível e que possa ter um projeto de nação. Hoje nós infelizmente não sabemos qual o projeto desse governo.

Vários países começaram a vacinar, e o Brasil mal tem um plano de vacinação. Como o sr. vê o enfrentamento do governo nessa questão? 

A vacina é o único caminho para que o Brasil retome a sua normalidade e a gente garanta vidas. É lastimável a posição do governo negando a vacina, não tendo um plano, não organizando e vendo os outros países inclusive da própria região começando a vacinar. E a cada dia de atraso na vacina são mil mortos no Brasil, vidas que a gente perde pela incompetência e falta de responsabilidade do governo.


Celso Rocha de Barros: Em ano trágico, livros sobre política foram ótimos

Ano teve competidores nacionais excelentes; lista não tem estrangeiros

Minha lista anual nunca incluiu reedições de clássicos, mas a coletânea “Por um Feminismo Afro-latino-americano”, que reúne textos da historiadora e filósofa negra Lélia Gonzalez editados por Flávia Rios e Márcia Lima, tem que ser citada porque grande parte do público ainda não sabe que a autora é clássica.

“Raça e Eleições no Brasil”, de Luiz Augusto Campos e Carlos Machado, é um trabalho muito inteligente de ciência política sobre as dificuldades de inserção dos negros no sistema eleitoral brasileiro, um tema cada vez mais quente.

“Mãe Pátria”, de Paula Ramón, é um belo relato, em tom pessoal, sobre a tragédia venezuelana recente. Não é antiesquerdismo, é só uma história real que a esquerda deveria levar a sério.

“A Bailarina da Morte”, de Lilia Schwarcz e Heloisa Starling, fala da pandemia de gripe espanhola do início do século 20 e sugere semelhanças assustadoras com a tragédia brasileira atual. Tive a impressão, entretanto, que mesmo as autoridades incompetentes da República Velha teriam comprado vacina para os brasileiros, se ela existisse na época.

Por algum motivo inexplicável, desde 2018 cresceu o interesse dos autores brasileiros pela história do Integralismo, a versão brasileira do fascismo nos anos 30. “Fascismo à Brasileira”, de Pedro Doria, conta a história do movimento com foco na trajetória de seu fundador, Plínio Salgado. “O Fascismo em Camisas Verdes”, de Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto, se destaca pela história da apropriação do legado dos integralistas até o dia de hoje.

“A República das Milícias”, de Bruno Paes Manso, é o estudo mais amplo e detalhado já publicado sobre essa forma de domínio territorial criminoso e suas ramificações políticas.

Mudando completamente de assunto, “O Brasil Dobrou à Direita”, de Jairo Nicolau, analisa detalhadamente dados sobre a eleição presidencial de 2018.

“A Máquina do Ódio”, de Patrícia Campos Mello, é o primeiro grande registro histórico da ofensiva autoritária pós-2018, lá onde ela já está avançada: na guerra à imprensa livre, realizada por campanhas de ódio e tentativas de estrangulamento financeiro.

“Ponto-final”, de Marcos Nobre, é uma análise do Bolsonarismo na pandemia, escrita “à quente”, no meio do ano. O argumento sobreviveu bem aos meses seguintes.

“As Políticas da Política”, organizado por Marta Arretche, Eduardo Marques e Carlos Aurélio Pimenta de Faria, reúne estudos que comparam políticas públicas dos governos tucanos e petistas. O livro gerou bons debates e, em 2020, deu saudade de dois momentos em que o Brasil teve governo.

“The Volatility Curse” (“A Maldição da Volatilidade”), de Daniela Campello e Cesar Zucco, mostrou como os resultados eleitorais brasileiros são correlacionados com os ciclos e choques da economia internacional e como isso pode prejudicar a capacidade dos eleitores avaliarem bem os governantes.

Em um ano de competidores nacionais excelentes, a ponto de não haver nenhum estrangeiro na lista, o melhor livro de política foi “A Organização”, de Malu Gaspar, que conta a história política da empreiteira Odebrecht. Um estudo de caso detalhado e, às vezes, chocante, sobre economia política brasileira, corrupção e os desafios da reforma de nossa democracia.

*Celso Rocha de Barros, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra)


Carlos Pereira: Subserviência do Legislativo?

Alinhamento entre os chefes do Executivo e do Legislativo não se traduz em autocracia

Tem existido uma crescente preocupação com a possibilidade de vitória de Arthur Lira (PP), candidato apoiado pelo Presidente Jair Bolsonaro, na eleição para a presidência da Câmara dos Deputados. Esse desassossego não é totalmente destituído de razão, pois o alinhamento político entre chefes do Executivo e do Legislativo sempre traz o risco de subserviência do poder Legislativo ao já extremamente poderoso Executivo no Brasil. 

Alguns, inclusive, enxergam que esta suposta subordinação do Legislativo ao Executivo traria perigos reais para a própria democracia brasileira. Essa preocupação ficou explícita no discurso de lançamento do deputado Baleia Rossi (MDB) como candidato de oposição ao governo Bolsonaro à presidência da Câmara. A narrativa construída buscou inspiração no “pai” da democracia brasileira e da “Constituição cidadã”, Ulysses Guimarães, repetindo o mote: “temos ódio e nojo da ditadura”. 

O cientista político Scott Morgenstern, Professor da Universidade de Pittsburgh, propõe uma tipologia para entender quando legislativos seriam proativos, situação na qual seria a força preponderante no processo de formulação e de aprovação das leis, ou reativos, quando o Legislativo raramente inicia uma legislação, atuando fundamentalmente em negociações ao reagir a iniciativas legislativas preponderantemente do Executivo.

Para Morgenstern, os legislativos na América Latina são de três perfis; 1) subserviente: não oferece qualquer veto ou resistência ao Executivo, inclusive aos seus potenciais desvios; 2) cooperativo: frequentemente concordando com projetos presidenciais, mas geralmente exigindo compromissos ou recompensas em troca do consentimento; e 3) recalcitrante: bloqueia a maioria das iniciativas do Executivo se posicionando como adversário do presidente. 

O alinhamento político entre os chefes do Executivo e do Legislativo não é condição suficiente para definir o perfil de atuação do Legislativo. Outros aspectos como sua profissionalização, padrão de carreira dos parlamentares e a proximidade de interesses entre o Executivo e o legislativo exercem papel decisivo no perfil e no padrão de atuação do Congresso vis-à-vis o Executivo. 

Legislativos que apresentam pouca profissionalização e baixo índice de reeleição tendem a ser subservientes. Por outro lado, quanto maior a motivação dos legisladores em permanecer no Legislativo e maiores os incentivos à sua profissionalização, mais proativo e influente será o Legislativo. Quando o governo não desfruta de maioria no Congresso, legislativos podem apresentar um padrão cooperativo com o Executivo ou mesmo migrar para o perfil recalcitrante com os interesses do Executivo em caso de polarização entre governo e oposição. 

O alinhamento político entre os poderes legislativo e executivo tem sido a regra e não a exceção no Brasil. Todos os presidentes da República que minimamente entenderam o funcionamento do presidencialismo multipartidário, fossem eles de esquerda, de centro ou de direita, atuaram ativamente para que a presidência das casas legislativas fosse ocupada por parlamentares do seu partido, ou, pelo menos, de partidos da coalizão. Portanto, não tem necessariamente nada de antidemocrático em o presidente buscar a congruência de interesses entre o Executivo e o Legislativo. 

É precipitado concluir que o Legislativo seria uma “vítima indefesa” dos poderes do presidente, pois, na medida em que esses poderes foram delegados pelos próprios legisladores, podem ser por eles também retirados. Um bom exemplo foi a restrição imposta pelos legisladores em 2001 à reedição indefinida de Medidas Provisórias, que aconteceu quando, pasmem, o presidente da Câmara dos Deputados, Aécio Neves (PSDB), era do mesmo partido do Presidente FHC. Ou seja, a despeito de um alinhamento político com o Executivo, o Congresso não se furtou em restringir os poderes do presidente. 

*Cientista Político e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV Ebape)


Bruno Boghossian: O centrão e os radicais

Presidente quer convencer apoiadores de que aliança no Congresso favorece agenda radical

A ansiedade de Jair Bolsonaro está em alta. Depois de tropeçar nas votações do Congresso ao longo de dois anos de mandato, o presidente conta com a vitória de aliados que possam garantir um caminho mais suave para seus planos nas chefias da Câmara e do Senado.

Bolsonaro começou a anunciar suas prioridades para o Legislativo em 2021. As propostas incluem a redução de punições para policiais que matam em serviço, a instalação do voto impresso e a mudança de regras de regularização de terras no país.

Em discursos nas últimas semanas, o presidente disse que terá chances de aprovar esses projetos a partir do ano que vem. A menção a essas pautas não foi acidente: Bolsonaro tenta encantar sua base fiel para neutralizar os danos causados pela aliança do governo com o centrão na disputa pelo comando do Congresso.

Ainda que o presidente tenha abandonado há tempos a fantasia da campanha, a aproximação com os velhos políticos ainda provoca abalos na relação do governo com seus apoiadores mais radicais. A ideia é convencê-los de que esse movimento se dá em nome de uma causa maior.

Na terça (15), Bolsonaro falou com otimismo sobre o plano que protege policiais. “Se Deus quiser, com a nova presidência da Câmara e do Senado, vamos botar em pauta o excludente de ilicitude”, declarou, num gesto àqueles que defendem uma política de segurança violenta. Em campanha, ele dizia que a proposta daria “carta branca para policial matar”.

O presidente também já afirmou que o novo comando do Congresso votaria a chamada MP da grilagem, que flexibiliza a regularização fundiária e pode favorecer os ruralistas. Ele disse ainda que vai trabalhar pela aprovação do voto impresso –pauta de extremistas que preparam terreno para contestar uma eventual derrota de Bolsonaro em 2022.

Não se sabe se essas ideias são distrações ou se o presidente vai gastar capital político para aprová-las. No centrão, muita gente acredita que ele só quer escapar do impeachment e livrar a família de investigações.


Alon Feuerwerker: A enésima morte da nova política

A ideia da necessidade de uma política de tipo inteiramente novo não é novidade na política nacional. Basta lembrar do “Brasil novo” prometido pelo então candidato a presidente Fernando Collor de Mello, três décadas atrás. A tentação é permanente. Quem não gostaria de resolver os próprios problemas e aporrinhações simplesmente apertando o botão de reset?

De tempo em tempos, mais agudamente em crises que esgotam a paciência, o eleitor cai nessa. É arrastado pela promessa de que a ponte para superar os impasses é trocar as pessoas erradas pelas certas. E nunca faltam candidatos a preencher a necessidade. E acabam chegando ao poder carregados da esperança de que vão finalmente passar o sistema a limpo.

Mas tão previsível quanto o apelo cíclico das promessas de renovação é o poderoso efeito permanente da inércia. Se até nas rupturas dignas do nome ela opera com impacto decisivo nas políticas pós-revolucionárias, quanto mais em transições de superfície, como às que nosso país está habituado na sua já relativamente longa história.

O Brasil é quase um laboratório permanente de experimentação da teoria que adverte sobre o peso opressor das ideias mortas sobre as ações dos seres vivos que se imaginam como o novo. Nada é mais previsível por aqui que a alternância entre a euforia diante da novidade e o conformismo quando o velho finalmente volta a se impor.

O surto mais recente de ansiedade por uma nova política vem de 2014, impulsionado pela explosão de junho de 2013, o embrião do momento por que o país passa hoje. Mas se ao longo destes anos você fosse perguntando às pessoas “afinal, o que é a nova política”, provavelmente constataria, surpreso, que ninguém tinha a menor ideia da resposta.

Ao final, a nova política acabou se vestindo de algo bastante velho, o clássico bonapartismo. O culto ao poder unipessoal exercido em ligação direta com o desejo difuso das massas. O obstáculo? Este projeto unipessoal precisaria impor-se na prática aos bolsões de poder estabelecido.

No Brasil isso é praticamente impossível, ou muito difícil, por várias razões. Uma singela: o sistema está organizado para impedir qualquer presidente de eleger com ele a maioria parlamentar. Presidente, governadores e prefeitos. O problema está nos três níveis da federação. Na teoria, trata-se de um sistema de freios e contrapesos. Na prática, a garantia de que nada vai mudar.

Neste final da metade do (primeiro?) governo Jair Bolsonaro, assistimos ao enésimo enterro de um ensaio da possibilidade de uma política inteiramente nova. Mas, a exemplo de Luiz Inácio Lula da Silva, o atual presidente teve a inteligência, e a prudência, de mandar a coisa toda do "novo" às favas enquanto ainda tinha força suficiente para dissuadir “a velha política” de tentar derrubá-lo.

Pois a coisa anda perigosa. Invocar questiúnculas para derrubar governantes que perderam a (ou nunca tiveram a) maioria parlamentar parece estar virando, como se diz, carne de vaca. Comprova-se, de maneira ineditamente disseminada, que governos “técnicos” estão sempre a caminho de cair. Ainda mais com a atual exuberância de um Judiciário inebriado de poder.

E de Legislativos que perceberam que podem derrubar quem for sem enfrentar reação ponderável.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação


Hélio Schwartsman: As regras do jogo

No país da gambiarra, nem o Legislativo tem apreço pela previsibilidade das regras

O forte da democracia não é assegurar a escolha de líderes competentes, do que dão testemunho Jair Bolsonaro e Donald Trump, para ficarmos em dois casos gritantes e recentes. É sempre possível comprar os eleitores com programas populistas ou iludi-los com promessas falsas. E isso não é uma falha circunstancial, mas uma característica do sistema. Não dá para livrar-se dela sem se livrar da própria democracia.

Ainda assim, ela é o melhor regime político de que se tem notícia. A aparente contradição se dissolve quando analisamos o pacote de instituições que costumam acompanhar as democracias. Falo de coisas como livre iniciativa, liberdade de expressão, Judiciário independente e previsibilidade das regras do jogo.

É sobre este último item que gostaria de me deter. Um dos mecanismos pelos quais sociedades democráticas tendem a ser mais prósperas que regimes arbitrários é que elas dão aos cidadãos segurança para investir esforços e economias em atividades produtivas. Se eu sei que o soberano não vai amanhã mudar as regras do jogo e se apropriar do que é meu, construo uma fábrica; se acho que ele vai criar problemas, converto tudo em diamantes com os quais posso fugir.

É claro que regras não precisam ser eternas. Elas existem para nos servir, e não nós a elas. Mas previsibilidade não é imutabilidade. Regras podem e devem ser atualizadas para acompanhar a realidade, mas sempre seguindo princípios de impessoalidade, publicidade e anterioridade, que assegurem que ninguém seja pego de calças curtas.

Não acho particularmente boa a regra que impede os presidentes da Câmara e do Senado de buscar reeleição na mesma legislatura, mas é óbvio que eventuais mudanças só poderiam valer para ocupantes futuros desses cargos, não para os atuais. Se nem o Legislativo tem apreço pela previsibilidade das regras, seria melhor decretar de vez que o Brasil é o país da gambiarra.


William Waack: Decidindo o dilema

O Legislativo está decidindo pelo Executivo qual é agora a reforma prioritária

Para um governo que demonstra dificuldades em afinar o foco, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, fez um grande favor. Quer que a reforma tributária comece a ser tratada como prioridade já na semana que vem, quando termina o recesso parlamentar. Se o Executivo ponderava ainda com qual começar entre as várias ambiciosas reformas que pretende, o Legislativo definiu.

Encontros para tratar de um texto único (são três conjuntos de propostas, mas a conhecida como PEC 45, do tributarista Bernard Appy) envolvendo relatores, deputados, senadores e especialistas – o cerne de uma Comissão Especial – começaram na terça-feira e vão pelo fim de semana. A ambição: votar até junho. Depois são férias e, na sequência, os senhores parlamentares vão se dedicar às eleições municipais. Ou seja, o prazo é dos mais apertados.

O sentido de urgência aumentou também com as demandas dos governadores, para os quais o socorro financeiro proposto pela União dentro de um novo Pacto Federativo foi por eles declarado insuficiente, e terá de ser reexaminado em função do impacto que simplificação e/ou novos tributos terão sobre arrecadação. Junte-se a isso reforma administrativa e PEC Emergencial, que pretendem, por outras vias, lidar com a questão fiscal, e tem-se o tamanho do trabalho político para o governo.

Embora a reforma administrativa (praticamente pronta, segundo Bolsonaro) figure como seu grande ataque ao aparelho de Estado, que a equipe econômica enxerga como principal obstáculo ao destravamento da economia, o presidente talvez entenda que não tem força política suficiente para tocar de forma simultânea dois ambiciosos projetos no Legislativo. Maia dá sinais de estar decidindo o dilema.

Os esforços para um mínimo de simplificação e ordenamento do sistema tributário brasileiro têm mais de 20 anos e sempre fracassaram diante da incapacidade (ou desinteresse) de sucessivos governos em ordenar os diversos interesses afetados. Ocorre que, passada a batalha da Previdência, a demanda de vários segmentos da economia clamando por algum tipo de jeito na maluquice tributária brasileira sugere uma situação já próxima de um “basta”, algo como uma genuína revolta.

Da mesma maneira como ocorreu com a Previdência, senadores e deputados parecem bem sensíveis à gritaria (plenamente justificada, aliás). Embora só desavisados ainda acreditem que reforma tributária seja sinônimo de redução de carga tributária, economistas e gestores empresariais admitem que a simplificação de tributos (mesmo que não diminua a carga) traria algum alívio às empresas, via redução de custos. No Brasil, manter-se em dia com os impostos também é caro.

As equipes técnicas da Câmara e da pasta de Paulo Guedes estão debruçadas no que seria um texto que incorporaria sugestões do Executivo (seria mais fácil do que o governo enviar projetos separados). Esse texto (o da 45) já “pactuado” passaria pela Comissão Especial, seria levado a plenário e daí ao Senado – rito que depende não só do interesse dos presidentes das Casas Legislativas, mas, também, do empenho do governo em se articular eficazmente no Congresso (reconhecidamente um problema até aqui).

Há espaço para avanços importantes. Onde o bicho pega? Onde sempre pegou: deputados se queixam de que as promessas que receberam lá atrás em termos de emendas, na votação da Previdência, ainda não foram cumpridas. Assessores do governo discordam das queixas, mas a má vontade existe. Pior ainda: os senhores parlamentares são hoje muito mais conscientes da sua capacidade de negociação, e consequente imposição de derrotas ao governo.

É o famoso limite da atuação de presidentes de Casas Legislativas, mesmo empenhados em reformas. Não são eles que impõem disciplina de voto.


O Globo: No primeiro mês, deputados apresentam a maior quantidade de projetos desde 1946

Foram 1.081 sugestões legislativas feitas em fevereiro. É o maior número mensal da história do Congresso desde o início da série histórica, em 1946.

Por Natália Portinari

No primeiro mês de trabalho da Câmara dos Deputados, parlamentares apresentaram 1.081 novos projetos de lei. É o maior número mensal da história do Congresso desde o início da série histórica, em 1946, segundo levantamento feito pelo GLOBO. Para efeito de comparação, em fevereiro de 2011, o mês recordista até então, foram protocolados apenas 612 projetos.

Boa parte dos projetos apresentados pelos deputados é focada em endurecimento da lei penal para combate à corrupção: “código penal”, “proibição” e “tipicidade penal” estão entre os termos mais usados nos textos dos parlamentares.

As novas proposições estão bem distribuídas entre partidos de todo o espectro ideológico. O Podemos lidera, com 168 projetos, seguido por PSB, PSL e PT. No partido do presidente, o deputado federal que mais propôs é Hélio Lopes (RJ), que fez campanha como Hélio Negão ou Hélio Bolsonaro. Ele apresentou proposta que institucionaliza a presença da Polícia Militar em todas as universidades, e outra que muda o tempo máximo de pena no país de 30 para 38 anos.

A empolgação dos recém-chegados é um fator importante. O deputado novato Rodrigo Agostinho (PSB-SP), por exemplo, é quem mais protocolou proposições, com 54 projetos de lei. São inovações na lei penal, direito administrativo e ambiental, além de projeto que dispõe sobre a guarda de animais de estimação após o divórcio. Agostinho também apresentou projeto para criminalização do caixa dois semelhante ao pacote enviado pelo ministro da Justiça Sérgio Moro.

— Eu trabalhei bastante no período de recesso para melhorar a redação desses projetos. Eles são fruto de um debate com a sociedade.

 

Propostas repetidas
Em segundo lugar no ranking de maiores propositores de projetos está Renata Abreu (PODE-SP). Em um projeto, ela sugere que seja proibida a cobrança de dívidas aos sábados, domingos, feriados e fora do horário comercial. Outra proposta é de que o código de barras dos produtos contenha a data de validade, e que estabelecimentos tenham sempre informações em braile.

Como muitos projetos de lei são repetidos e poucos chegam de fato à votação, o número de proposituras não sinaliza necessariamente que o parlamentar é produtivo. Um exemplo é o ex-deputado Wladimir Costa (SD-PA), que não se reelegeu. Ele ofereceu 12 propostas em 2018, mas faltou a 95 sessões, número maior do que as 42 presenças que marcou na Câmara.

O deputado Roberto de Lucena (PODE-SP), autor de 30 novos projetos no mês, conta que o ano eleitoral de 2018, com atividade legislativa reduzida, atrapalhou o andamento de projetos no plenário e nas comissões.

— Participo da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle. No ano passado, fizemos diversas audiências públicas, mas com o ano eleitoral, represamos um volume importante de encaminhamentos desse trabalho. Tivemos uma renovação muito grande, então é natural que os que estão em seu primeiro mandato tenham chegado com muitas sugestões.

Entre os 513 deputados eleitos, há ainda um total de 140 que ainda não apresentaram nenhum projeto de lei ou pedidos de desarquivamento de propostas. No Congresso, projetos são arquivados automaticamente se não passarem pelas comissões no fim do ano anterior.

Da proibição de barragens à paleontologia
O número recorde de projetos abrange os mais variados temas, boa parte deles vinculados a recentes fatos ocorridos no país, como a tragédia de Brumadinho, em Minas Gerais. O deputado Helio Lopes (PSL-RJ) apresentou proposta de emenda à Constituição que tenta proibir a construção de barragens de rejeito com a utilização do método “a montante” — aquele utilizado na barragem da Vale em Brumadinho. O deputado lembra que existem no Brasil, atualmente, 218 barragens de rejeito de mineração (de um total de cerca de 800) que são classificadas como “de alto dano potencial associado”.

Em outro projeto sobre o tema, Jesus Sérgio, do PDT do Acre, quer que o órgão fiscalizador seja obrigado a instalar um serviço de disque-denúncia para as pessoas relatarem a existência de barragens em situação de risco. O deputado também quer que os proprietários de barragens ou diretores de empresas e empreendimentos minerários sejam obrigados a assinar, em conjunto com os responsáveis técnicos, todos os documentos relativos à segurança das barragens — tornando-se assim co-responsáveis por qualquer tragédia. Pelo menos 11 projetos da atual legislatura tratam de barragens.

Na listas das propostas apresentadas há assuntos de interesse específico, como projeto apresentado pelo deputado João Roma (PRB-BA). Ele quer instituir o Dia Nacional do Paleontólogo — a ser comemorado no dia 7 de março de cada ano. Para tentar emplacar a proposta, o deputado justifica que a paleontologia, “ciência que estuda o passado e nos traz evidências científicas da evolução dos seres vivos, é muito importante na indústria de petróleo”. (Patrik Camporez)

 


Bruno Boghossian: Supremo precisa decidir se pode ou não se intrometer em outros Poderes

Um espectador desavisado poderia confundir as últimas sessões do STF com um ato de contrição. Lembrando o princípio da separação de Poderes, a maioria dos ministros sustentou que juízes não podem interferir nas competências de outras autoridades.

O argumento deve embasar a liberação do decreto de indulto natalinode Michel Temer. Não se deve esperar do tribunal, porém, uma revisão dos limites de sua atuação. O Supremo deixa intocada uma coleção de momentos em que se intrometeu no Executivo e no Legislativo.

Edson Fachin reconheceu a ironia. Ele ponderou que, se o STF não tem poderes para cassar o decreto, também não deveria anular a nomeação de ministros por um presidente.

A corte não teve esse espírito em episódios recentes. Em 2016, Gilmar Mendes suspendeu a nomeação de Lula como ministro da Casa Civil. Embora Dilma Rousseff tivesse autonomia para escolher sua equipe, o magistrado considerou o ato uma “falsidade” para proteger Lula.

No início deste ano, Cármen Lúcia deu aval à decisão de um juiz de primeira instância que proibiu a posse de Cristiane Brasil no Ministério do Trabalho. Uma decisão capenga dizia que ela não poderia assumir o cargo porque havia sido condenada em um processo trabalhista.

Os braços togados também alcançaram decisões econômicas. Ricardo Lewandowski chegou a travar a privatização de uma distribuidora de energia quebrada em Alagoas e proibiu o governo de adiar o aumento de salário de servidores.

Em 2017, na intromissão mais esdrúxula dessa classe, Luiz Fux cancelou a votação na Câmara do pacote anticorrupção. O ministro afirmava que o projeto de iniciativa popular não poderia ter sido alterado —ou seja, que os deputados não podem legislar como bem entenderem.

Nos próximos anos, o Supremo certamente será chamado para administrar tensões com o governo Jair Bolsonaro. O tribunal precisará se olhar no espelho para definir as fronteiras de sua atividade política.


Política Democrática: Congresso eleito é “mais pulverizado, liberal, atrasado e temerário”, afirma Antônio Augusto de Queiroz

Analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), analisa que o próximo Legislativo será o mais conservador desde a redemocratização

Por Cleomar Almeida

O novo Congresso Nacional é “mais pulverizado partidariamente, mais liberal economicamente e mais conservador socialmente, mais fiscalista quanto à gestão, mais atrasado do ponto de vista dos direitos humanos e mais temerário em questões ambientais do que o atual”. É o que avalia o analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz, em artigo publicado na edição de novembro da revista Política Democrática online.

O artigo, que recebe o título “O Congresso mais conservador desde a redemocratização”, aponta que o Legislativo eleito em 2018 sofreu “grande renovação quantitativa, embora não se possa dizer o mesmo sobre sua qualidade”. “Mesmo depois de os parlamentares terem elaborado regras para assegurar suas reeleições – como a janela partidária, o fundo eleitoral e a redução do tempo de campanha e de propaganda eleitoral –, a Câmara foi renovada em 52%, e o Senado, em 85% (em relação às 54 vagas em disputa)”, aponta o autor no artigo da revista, publicada e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Partido Popular Socialista (PPS).

» Acesse aqui a edição de novembro da revista Política Democrática online

Na avaliação dele, que também é jornalista e sócio-diretor da Queiroz Assessoria, o desafio das forças progressistas será enorme no combate às tentativas de retrocesso. “As pautas das bancadas conservadoras já estão postas, entre elas: demarcação de terras indígenas, liberação de agrotóxicos, escola sem partido, redução da maioridade penal, revogação do estatuto do desarmamento, eliminação de penas alternativas, extinção da progressão de pena, revogação da legislação que autoriza saídas temporárias de preso, tipificação como terrorismo de ações de movimentos sociais, proibição da ideologia de gênero, combate à liberdade sexual e reprodutiva da mulher, ampliação do 'excedente de ilicitude' aos policiais que matam no exercício da função”.

No Senado, de acordo com o analista político, o fenômeno foi ainda mais acentuado. “Dos 54 senadores em final de mandato, 32 tentaram a reeleição, e destes apenas oito conseguiram renovar seus mandatos; 46 serão novos ou não estavam no exercício de mandato. Destes, pelo menos nove nunca ocuparam cargo no Executivo nem no Legislativo”, observa Antônio Augusto.

No artigo, o diretor de documentação do Diap ressalta que “a renovação, como regra, é sempre saudável, porque, segundo ele, a alternância no poder é um dos principais pilares da democracia”. “Porém, a motivação da renovação foi mais de rejeição aos detentores de mandatos (bons e ruins) e menos uma escolha qualitativa, que fosse baseada em critérios, como o exame da trajetória política e profissional dos candidatos, das propostas e programas apresentados. Ao contrário, as motivações foram mais de ordem religiosa, de parentesco, de tietagem e policialesca, tanto que as escolhas incidiram sobre lideranças evangélicas, sobre parentes de políticos tradicionais, sobre celebridades e policiais 'linha dura'”.

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Voto distrital misto x distrital puro

Dê a alguém a prerrogativa de falar em seu nome e esse poder será abusado

Fernão Lara Mesquita

 

Lula, Dilma, Temer, o Ministério Público, a PGR, todos dizem que é armação. E é!

Quanto, em cada episódio, dá pra discutir até o fim dos tempos. Dê a alguém a prerrogativa de falar em seu nome e esse poder será abusado. Transforme uma instituição num gatilho e, mais cedo ou mais tarde, para o bem e para o mal, ele será acionado.

A legitimação do poder é a questão essencial da democracia. O melhor a fazer nesse quesito é não delegar nada: só o eleitor põe, só o eleitor despõe. A questão é como montar um sistema que viabilize isso com a necessária agilidade e economia de traumas. Há duas variações. Os sistemas de voto distrital puro com “recall” ou “retomada” de mandatos e o voto distrital misto com governo parlamentarista.

Aos exemplos. A Carolina do Norte elege 13 deputados federais e 170 estaduais. Toma-se o número total de eleitores e se divide pelo número de vagas dos Legislativos municipal, estadual ou federal. Isso dá o tamanho de cada distrito eleitoral. Cada distrito – nas eleições municipais, um bairro ou conjunto de bairros – elege apenas um representante. Como os candidatos só têm de pedir voto naquele distrito, acaba o problema do custo das campanhas e doenças correlatas. Nas eleições estaduais cada distrito (o número de eleitores dividido por 170 neste exemplo) será a soma de “N” distritos municipais. Ou, nas federais, quando o Estado será dividido em 13 distritos, eles serão a soma de “N” distritos estaduais.

Só senadores são eleitos pelo Estado inteiro. A conta, aí, é nacional: o número total de eleitores dividido pelo número total de vagas. Como representam pessoas, e não paisagens, onde houver mais população haverá mais senadores. Os demais representantes em Washington também não são deputados do Estado “tal”, são deputados “do distrito n.º tal do Estado tal”. Cada deputado de cada instância pode, se quiser, saber o nome e o endereço de todos os seus representados. Se alguém morrer ou cair, só haverá eleição para reposição no distrito dele. Nada de suplente.

As fronteiras de cada distrito são redefinidas a cada dez anos com base no censo. A Federal Election Comission é a única que pode legislar sobre financiamento de campanhas. Todo candidato é obrigado a prestar contas até 15 dias depois de receber cada contribuição ou fazer despesas iguais ou superiores a US$ 5 mil. Daí para baixo cada um pode ter a sua regra.

36 Estados adotam o “recall” ou “retomada” de mandato para representantes eleitos. 19 estendem o “recall” a todo funcionário eleito (e todos os que têm por objeto fiscalizar governos ou prestar serviços diretos à população, começando pelos promotores do equivalente ao Ministério Público, são diretamente eleitos).

Na maioria dos municípios nem se vota mais em prefeito. Elege-se uma “diretoria” colegiada (“Council”) de cinco ou seis membros, coordenada por um CEO, com metas a cumprir. Não cumpriu, rua! Só as megacidades têm prefeitos e Câmaras Municipais e, mesmo assim, nem todas. Cada uma faz como quiser. As eleições municipais são apartidárias. Concorre quem quiser, sem pedir ordem a ninguém. As grandes cidades têm até Constituições próprias regulando instrumentos como referendo, recall, leis de iniciativa popular, penas para crimes, gestão de escolas públicas, regras para endividamento, etc. Não estando em confronto com os 7 artigos e 28 emendas da Constituição (aqui a soma é de 330!), valeu.

Todo assunto sensível vindo dos Legislativos ou de iniciativas populares vai a referendo. Entra na cédula da próxima eleição pedindo sim ou não do eleitorado inteiro. Nada de “consultas a movimentos sociais” valendo decisão e outras tapeações do gênero. Voto, sempre, e de todos os afetados, sempre.

Todo e qualquer eleitor – até o morador de rua – pode derrubar seu representante. Basta iniciar uma petição. Não precisa haver razão específica ou crime. Um simples “não me representa” é suficiente. Se conseguir a assinatura de 5% dos eleitores do seu distrito, convoca-se uma votação de todo o distrito para destituí-lo, ou não, e eleger seu substituto. O resto do país pode continuar trabalhando em paz.

O voto distrital puro põe o eleitor mandando diretamente em cada pedacinho do país, o que lhe dá poder, mas não para tudo. Juntando grupos majoritários de pedacinhos do país, ele manda no país inteiro sem, no entanto, ganhar caminhos fáceis para golpes. Tudo tem sempre de ser aprovado passo a passo, na ida ou na volta, por todos os eleitores de cada pedacinho do país.

Agora vamos ao distrital misto. Ele também delimita a área em que cada candidato pode pedir votos. No resto, tudo fica meio como é no Brasil. Você vota diretamente num candidato, mas dá mais um voto ao partido que vai pro candidato que ele puser numa lista lá dele. Você nunca sabe ao certo representante de quem cada deputado é: de um pedaço “X” do eleitorado ou de um grupo dentro de um partido com poder para montar a tal da lista.

Para remover quem se comportar mal tem de parar o país, convocar eleições gerais e votar numa nova mistura de partidos que, somados, deem maioria e elejam um primeiro-ministro. Ou seja, você até pode expulsar o ladrão, mas tem de deixar para a quadrilha a escolha do novo chefe.

A pretexto de baratear o custo da eleição e fazer representar todas as “tendências” da população nas suas mínimas expressões temáticas, o voto distrital misto mantém um monte de partidos e caciques decidindo quem pode ou não se candidatar a quê e legislando sobre tudo dentro e fora da sua casa e até da sua cabeça.

Resumindo: com voto distrital puro com “retomada” e referendo, os políticos deixam de mandar e passam a obedecer. A partir daí você decide quais reformas fazer e quando. Com distrital misto com parlamentarismo, os políticos – índios e caciques – entregam alguns anéis, mas não os dedos com que continuarão te agarrando por todos os lados, especialmente na região do bolso.

Não é por outra razão que 9,99 entre 10 políticos preferem o voto distrital misto. É muito chato ter patrão!

* Fernão Lara Mesquita é jornalista

 


Freire diz que aumento da aprovação do governo Temer representa reconhecimento no combate da crise

O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), afirmou que o apoio da sociedade ao governo de Michel Temer começa a aumentar ao comentar pesquisa da Ipsos, divulgada nesta quinta-feira (13), que indica crescimento da aprovação da nova gestão. De acordo com o levantamento, o índice de aprovação subiu nove pontos atingido 30% enquanto que a reprovação caiu 8 pontos percentuais.

“As pesquisas de avaliação do governo Temer começam a demonstrar aquilo que era esperado pelas forças que apoiaram o impeachment de Dilma. Não poderia, como num passe de mágica, termos um governo com índices altíssimos de aprovação da sociedade brasileira. Começa a ficar evidente aquilo que a própria experiência histórica havia demonstrado no governo Itamar. Um governo que surge de um impeachment traz uma carga de responsabilidade tão grande que necessariamente tem aspectos positivos. Isso está se evidenciando”, disse

Freire lembrou ainda que o eleitorado deu um claro recado nas urnas ao eleger candidatos que apoiaram o impeachment da ex-presidente.

“Um governo que está enfrentando, com muita determinação, a questão da crise econômica. Além disso, demonstrou ter capacidade de superar a crise política no relacionamento entre o Executivo e o Legislativo. Isso Temer faz com maestria, até mesmo pela sua larga experiência como parlamentar e, em algumas oportunidades, como presidente da Câmara dos Deputados. A partir desta boa articulação política, ele iniciou o enfrentamento da crise econômica. Um outro elemento positivo foi a demonstração do eleitorado que deu ampla vitória às forças favoráveis ao impeachment e a fragorosa derrota daqueles que defendiam o governo do PT”, destacou.

O parlamentar apontou que a nova gestão tem apresentado medidas para combater o desmantelo nas contas públicas deixado pelo governo Dilma e citou a aprovação da PEC que estabelece limites dos gastos no orçamento que, na sua avaliação, representa o primeiro grande passo no combate da crise.

“O crescimento do índice de confiança tende a aumentar no momento que começa a surgir pontos positivos na própria superação da crise econômica. Já existem dados positivos relacionados ao aumento do índice de confiança de investidores e consumidores. Há indicadores que apontam para uma efetiva confiança de que vamos enfrentar e superar a crise econômica. Não será uma tarefa fácil e nem será resolvida a curto e médio prazo. Vai demorar um pouco, mas já demos início a esse processo”, defendeu.

A pesquisa

A pesquisa Ipsos apontou que a aprovação de Michel Temer subiu nove pontos percentuais em setembro e fechou o mês em 30%. Já a desaprovação do novo governo registrou queda de 8 pontos e ficou em 60%.

Além disso, o levantamento mostrou o nível de favorabilidade de reformas propostas pelo novo governo. Quatro em cada dez entrevistados (41%) se disseram a favor de que haja mudanças no sistema previdenciário e 43% se mostraram favoráveis a alterações trabalhistas. As outras possibilidades de mudanças foram reforma política (56% a favor), reforma da educação (52% a favor), em programas sociais (46%) e reforma tributária (41%).

A pesquisa foi realizada entre 6 e 16 de setembro em 72 cidades brasileiras com 1.200 entrevistas presenciais. A margem de erro da pesquisa é de três pontos percentuais.


Fonte: pps.org.br