Jair Bolsonaro

Quando se mobilizam retoricamente as paixões, sempre se coloca sob suspeição a civilidade e se constitui uma ameaça à democracia | Foto: Shutterstock

Revista online | Editorial: O problema e suas raízes

Editorial da revista Política Democrática online (53ª edição)

Assistimos todos, neste fim de março, ao retorno ao Brasil do candidato derrotado nas eleições presidenciais de 2022. Foram quase três meses de ausência, passados na Flórida, estado norte-americano governado pelos Republicanos, que vem se constituindo em refúgio de próceres da extrema direita latino-americana.

O desembarque, projetado para ser um ato político expressivo em seu apoio, reuniu poucos partidários, frustrados pelas medidas de segurança tomadas pelas autoridades, que, ao proteger o viajante, impediram, simultaneamente, qualquer manifestação política dos presentes. Não houve discursos nem carreatas, apenas a dispersão dos presentes.

O evento foi, contudo, revelador da estratégia adotada pelo comando político da direita autoritária, após sua derrota nas urnas. Manifestações, marchas, motociatas e carreatas serão organizadas, o contraponto presencial necessário aos comandos de agitação permanente, lançados nas redes sociais. O propósito desses chamados, nas redes e nas ruas, é manter aceso o ânimo dos correligionários e simpatizantes, o apoio a seu líder e sua hostilidade profunda ao conjunto de inimigos imaginários que alimentam a adesão ao movimento: globalistas, comunistas, ambientalistas, ideologia de gênero, entre outros. Além de, claro, prosseguir nesse rumo até as eleições de 2024, momento em que um bom resultado eleitoral, ao menos similar ao conseguido nas eleições legislativas do ano passado, é esperado.

O chamado às ruas dificilmente terá respostas positivas, dado que as mobilizações presenciais chamadas pela extrema direita deveram, como sabemos agora, muito do seu sucesso relativo ao investimento pesado de recursos públicos. No entanto, trazer periodicamente um punhado de militantes às ruas pode ser o contraponto suficiente para a agitação permanente divulgada nos diversos grupos de partidários organizados nas redes sociais.

A estratégia pode ter sucesso, se considerarmos principalmente o percentual de eleitores convencidos pelas notícias falsas despejadas todos os dias, ao longo de mais de quatro anos, nas redes sociais. Pesquisa recente revelou, por exemplo, que quase metade dos eleitores considera a transformação do Brasil num país comunista uma possibilidade real, ao longo do atual governo.

Compete aos democratas de todos os matizes, socialistas, social-democratas, liberais e conservadores, trabalhar, de forma coordenada e permanente, contra a situação de desinformação que assola hoje parte importante do eleitorado. Repetir os argumentos em favor da ciência e da democracia, contra as teorias da conspiração, os diversos negacionismos, as soluções violentas e autoritárias de problemas políticos.

Dizer, sempre, que não há maquinações globalistas, mas problemas globais; que nas democracias a definição dos culpados de corrupção é monopólio da Justiça; que a mudança climática já é uma ameaça que pesa sobre todos; que não existe um perigo comunista que nos aflige; que ideologia de gênero é o nome de um fantasma criado há pouco tempo para assustar os cidadãos; que pobreza, desigualdade e exclusão social são os verdadeiros problemas deste país, cuja solução é premente e indispensável para todos nós; finalmente que racismo, sexismo e homofobia são também problemas reais, responsáveis por uma extensa gama de violências praticadas contra seus alvos, violências que chegam, em muitos casos, à morte das vítimas.

Esse é o debate de fundo, que deve ser travado por todos os democratas contra os temores que alimentam a adesão à extrema direita no país.

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Eduardo Bolsonaro ganha apelido de desafetos após curtir jogo no Catar

Terra*

A ida do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) ao Catar para curtir a vitória da Seleção Brasileira contra a Suíça na última segunda-feira, 28, rendeu muitas críticas de opositores e desafetos e até um apelido.

Após aparecer em fotos ao lado da esposa, Heloisa Bolsonaro, no Estádio 974, o filho do presidente Jair Bolsonaro (PL) foi chamado de “radical de ar-condicionado”, segundo informações da coluna de Bela Megale, do jornal O Globo.

Eduardo Bolsonaro e esposa curtem jogo do Brasil no Catar
Eduardo Bolsonaro e esposa curtem jogo do Brasil no CatarFoto: Reprodução

O batismo foi feito por moderados do partido de Eduardo - e também do presidente Jair Bolsonaro - o PL, que consideram um tiro no pé a viagem do parlamentar ao País da Copa em meio à turbulência política envolvendo o pai, que contesta o resultado de parte das urnas utilizadas no pleito.

Nas redes sociais, Eduardo também foi alvo de críticas de outros parlamentares, como Kim Kataguiri (União-SP) e o deputado federal eleito Guilherme Boulos (PSOL-SP).

https://twitter.com/KimKataguiri/status/1597299233559699456?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1597299233559699456%7Ctwgr%5Eaccafee040fa2501c3cddddb1aa97f879fcaae16%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.terra.com.br%2Fnoticias%2Fbrasil%2Fpolitica%2Feduardo-bolsonaro-ganha-apelido-de-desafetos-apos-curtir-jogo-no-catar76a400e28882c08b8159f19dd05057d7g7583yfy.html
https://twitter.com/GuilhermeBoulos/status/1597295648990457859?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1597295648990457859%7Ctwgr%5Eaccafee040fa2501c3cddddb1aa97f879fcaae16%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.terra.com.br%2Fnoticias%2Fbrasil%2Fpolitica%2Feduardo-bolsonaro-ganha-apelido-de-desafetos-apos-curtir-jogo-no-catar76a400e28882c08b8159f19dd05057d7g7583yfy.html

Além do delicado momento político no Brasil, o deputado ainda viajou para outro país com a intenção de assistir a um jogo de futebol em um dia que tinha compromissos na Câmara. O Terra consultou a agenda do parlamentar e encontrou dois compromissos de Eduardo no Brasil na mesma data em que foi para o Catar.

*Texto publicado originalmente no site Terra


Foto: Khaled Elfiqi/EFE

Lula 'toma posse' no exterior em meio a vácuo deixado por Bolsonaro

Laís Alegretti*, BCC News Brasil

Mais de 40 dias antes de assumir o Palácio do Planalto e com Jair Bolsonaro recolhido, Luiz Inácio Lula da Silva é tratado, na prática, como se já fosse presidente em compromissos no exterior e consegue atenção internacional com pauta ambiental.

Após participar da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27), Lula tem encontros em Lisboa, nesta sexta-feira (18/11), com o presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, e com o primeiro-ministro, António Costa. Na manhã de sábado (19/11), Lula tem previsto encontro com a comunidade brasileira no Instituto Universitário de Lisboa

Na COP27, no Egito, Lula teve encontros com autoridades de outros países e foi aguardado por um grande público internacional - o que levou a imprensa francesa, por exemplo, a dizer que o brasileiro foi recebido "como uma estrela de rock" (jornal econômico Les Echos) e a descrever que foi "acolhido com um imenso fervor" (Le Monde).

O diplomata Rubens Ricupero avalia que Lula tem dominado a agenda "um pouco pelo acerto dele, um pouco pela omissão de Bolsonaro".

"Para todos os efeitos, é como se (Lula) já fosse presidente, até porque o outro esvaziou. Nunca vi isso antes, é como se não tivesse mais presidente, há não sei quantos dias. A agenda (de Bolsonaro) está completamente abandonada", disse o ex-embaixador e ex-ministro à BBC News Brasil ao comentar a viagem de Lula.

O silêncio de Bolsonaro e a escassez de compromissos oficiais vêm sendo destacados na imprensa brasileira. Além de poucos compromissos na agenda em Brasília e de um ritmo baixo de postagens no Twitter, Bolsonaro também não participou da cúpula do G20, na Indonésia.

'Legitimidade reforçada'

Ricupero diz que o fato de Lula ter conseguido imprimir um tratamento de presidente no exterior antes da posse "reforça a legitimidade em um momento em que aqui há um movimento muito grande de pessoas que contestam as eleições", em referência aos protestos de parte dos apoiadores de Bolsonaro.

Lula tira fotos com os presentes logo após o pronunciamento na COP27
Jornal francês Le Monde descreveu que Lula foi "acolhido com um imenso fervor" na COP27

O diplomata considera que Lula acertou no momento da viagem, no início do período de transição. Agora, ele diz, "o calendário tende a favorecer o Lula", já que há a Copa do Mundo e as festas de fim de ano até a posse.

"Com a Copa do Mundo, eu acho que boa parte desse sentimento de mobilização política (contra as eleições) vai abrandar. Terminando a Copa do Mundo, entra nas festas de Natal. Aí Ano Novo e posse, e é outra história", diz. "O momento mais crucial era agora."

Ao deixar o Brasil no início do governo de transição, Lula também se distancia, em certa medida, da disputa por espaço entre partidos aliados na formação do novo governo.

Ricupero, que já foi ministro do Meio Ambiente e da Fazenda lembra, ao mencionar viagens de Tancredo Neves e de Juscelino Kubitschek em momentos semelhantes, que "esse período de transição no Brasil é sempre muito carregado de risco, porque há muita intriga, além da chateação dos pedidos de todo tipo, porque todo mundo cai em cima do presidente".

O destaque negativo ficou para a carona que Lula pegou, para chegar ao Egito, no jato do empresário José Seripieri Filho, fundador da Qualicorp e dono da QSaúde, que chegou a ser preso em 2020 em operação que investigava supostas irregularidades na campanha de José Serra (PSDB-SP) ao Senado, em 2014.

"Eles deveriam ter calculado que cairia mal. Não creio que terá desdobramentos maiores, mas foi um descuido", diz Ricupero.

Ao lembrar que viagens de Tancredo foram feitas em aviões comerciais, Ricupero pondera que "naquela época não havia ameaça à segurança que há hoje" e diz que, no atual contexto, "também seria penoso pegar um avião comercial e ser vítima de manifestações de bolsonaristas, como essas contra os ministros do supremo em Nova York".

O diplomata Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington, diz que não há problema jurídico na carona de Lula no avião particular. "Há um problema ético aí, se você quiser. Um problema ético de você aceitar um oferecimento de um empresário para viajar num avião privado."

Barbosa destaca problemas de segurança em uma eventual viagem em voo comercial e diz que, idealmente, o presidente eleito teria se deslocado de carona em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) que tivesse viajado para o Egito.

Lula em Portugal

Ao noticiar a previsão de visita de Lula a Portugal, a imprensa portuguesa destacou que Bolsonaro nunca esteve no país enquanto presidente e que, no Brasil, cancelou um encontro com Marcelo Rebelo de Sousa em julho deste ano porque o português encontraria Lula.

O jornal Expresso escreveu que a visita de Lula "marca uma nova etapa das relações luso-brasileiras, que tinham sido objeto de um distanciamento institucional durante a Presidência de Jair Bolsonaro". O jornal Público disse que há "carga simbólica" na visita de Lula "por decorrer no ano do bicentenário da independência brasileira e por acontecer meses depois de Bolsonaro ter rejeitado receber o chefe de Estado português".

A visita do presidente português ao Brasil no 7 de setembro deste ano, que marcou o bicentenário, também é lembrada.

Rubens Barbosa diz que houve uma "desconsideração" com o presidente português no desfile. "Ele estava ao lado do presidente, o presidente não falava com ele, entrou o cara da Havan (Luciano Hang), ficou no meio... Isso foi uma coisa, diplomaticamente, muito ruim".

Bolsonaro, Luciano Hang e presidente de Portugal no centro da primeira fila da tribuna de honra do 7 de setembro
Bolsonaro, Luciano Hang e presidente de Portugal no centro da primeira fila da tribuna de honra do 7 de setembro

Ricupero já havia declarado que considera que o tratamento dado ao presidente de Portugal no governo Bolsonaro foi "inqualificável" e voltou a defender uma reparação.

"Os portugueses fizeram tudo o que nós pedimos, mandaram até aquela coisa do coração de Dom Pedro 1º, com aquele aspecto um pouco lúgubre... Colaboraram em tudo para que se pudesse comemorar o bicentenário, que acabou sendo um fracasso por culpa nossa, não deles".

Ricupero diz que "os portugueses foram maltratados". "Quando houve o 7 de Setembro, ele (Bolsonaro) deixou o presidente Portugal ao lado dele no palanque, mas não deu atenção nenhuma. E fez um tipo de discurso completamente fora do espírito da celebração", diz o diplomata.

E a falta de uma visita de Bolsonaro aos portugueses?

Para Rubens Barbosa, a ausência de uma visita de Bolsonaro a Portugal diz mais sobre a política externa do governo Bolsonaro em geral do que sobre a relação entre os dois países em si.

"Bolsonaro não visitou quase país nenhum, não tem nada de discriminação contra Portugal. Ele tem uma política externa muito complicada", disse. "A relação com Portugal é muito intensa e eu acho que o Lula, passando por lá, vai retomar essa tradição de contato estreito entre os dois países."

Presidente Jair Bolsonaro ao centro, com o braço apontado para o céu, acompanhado da primeira-dama e do presidente de Portugal
No 7 de Setembro, 'Bolsonaro deixou o presidente Portugal ao lado dele no palanque, mas não deu atenção nenhuma', diz Ricupero

Lula na COP27: meio ambiente e a atenção internacional

A atenção internacional que Lula conseguiu logo após sua eleição também tem a ver com o tema central da viagem, já que a pauta ambiental é o maior interesse internacional no Brasil, devido principalmente à Amazônia.

"Lula foi para uma conferência que é, nesse momento, a mais importante da agenda internacional e na qual o Brasil é relevante", destaca Ricupero.

Na COP27, Lula disse que "não medirá esforços para zerar o desmatamento de nossos biomas até 2030" e afirmou que todos os crimes ambientais vão ser combatidos "sem trégua". Ele também propôs que a COP de 2025 ocorra na Amazônia.

Ricupero, que conta ter se filiado à Rede Sustentabilidade, diz que a pauta ambiental "deveria dominar grande parte da política externa" do novo governo Lula. "Tem outros aspectos da política externa do PT que são mais controversos - por exemplo, ele vai ter em algum momento que se posicionar em relação à Nicarágua, Cuba e Venezuela. No passado, sempre teve simpatia ideológica do PT (a governos desses países) e eu não sei o que ele vai fazer", disse.

"(A pauta ambiental) é um assunto que pode render enormes retornos ao Brasil a curto prazo, sem muito custo. O custo que tem é interno, de enfrentar os grileiros, mineradores, garimpeiros ou os madeireiros. De qualquer forma, ele é obrigado a enfrentar, porque são todas atividades criminosas, ilegais", diz.

*Texto publicado originalmente no site BBC News Brasil


Foto: Flickr/Cidadania

Revista online | Roberto Freire: “Votar em Lula é salvar a democracia”

Entrevista concedida a Caetano Araújo, Luiz Sérgio Henriques, João Rodrigues e Paulo Fábio Dantas Neto, especial para a revista Política Democrática online (48ª edição: outubro/2022)

Na reta final do segundo turno da campanha presidencial, diversos fatos ainda movimentam o xadrez político nacional. No último domingo (23/10), por exemplo, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) atacou policiais federais com granadas e tiros de fuzil, após resistir a uma ordem de prisão expedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Para analisar a conjuntura política e o futuro da democracia no Brasil, a equipe da revista Política Democrática online entrevistou o presidente do Cidadania, Roberto Freire. “Votar 13 no próximo domingo é a nossa única chance de salvar o Estado Democrático de Direito no Brasil”, resumiu Freire.

Ex-senador e deputado federal, líder do governo Itamar Franco e candidato a presidente da República em 1989 pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), Roberto Freire defende que o voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é essencial para frear o projeto fascista do bolsonarismo. Freire também foi membro da Assembleia Nacional Constituinte e um dos responsáveis pela transformação do antigo PCB no Partido Popular Socialista (PPS), em 1992.

O papel estratégico da senadora Simone Tebet (MDB-MS) na campanha do ex-presidente Lula (PT), a ampliação da federação PSDB Cidadania, com uma eventual inclusão do MDB, e a importância de movimentos de renovação política estão entre os temas abordados. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista com Roberto Freire.

Confira, abaixo, galeria de imagens do entrevistado:

Roberto Freire em escritório |Foto: reprodução/Wikimedia Commons
Simone Tebet e Roberto Freire aparecem juntos no estande da Fundação Astrojildo Pereira | Foto: João Rodrigues/FAP
Roberto Freire fala sobre radicalização provocada por Lula e Bolsonaro (Foto: Reprodução/Internet)
Roberto freire. Foto reprodução: Cidadania23
Roberto Freire, presidente do Cidadania, durante sessão na Câmara dos Deputados em 2015 | Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados
Brasília 19.12.2016  Ministro da Cultura, Roberto Freire.  Fotos: Acácio Pinheiro/MinC
Roberto Freire em escritório
Simone Tebet e Roberto Freire aparecem juntos no estande da Fundação Astrojildo Pereira
Roberto Freire fala sobre radicalização provocada por Lula e Bolsonaro (Foto: Reprodução/Internet)
Roberto freire. Foto reprodução: Cidadania23
Roberto Freire, presidente do Cidadania, durante sessão na Câmara dos Deputados em 2015 | Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados
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Roberto Freire vai assumir o Ministério da Cultura
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Ministro da Cultura, Roberto Freire
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Roberto Freire em escritório
Simone Tebet e Roberto Freire aparecem juntos no estande da Fundação Astrojildo Pereira
Roberto Freire fala sobre radicalização provocada por Lula e Bolsonaro (Foto: Reprodução/Internet)
Roberto freire. Foto reprodução: Cidadania23
Roberto Freire, presidente do Cidadania, durante sessão na Câmara dos Deputados em 2015 | Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados
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Roberto Freire vai assumir o Ministério da Cultura
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Ministro da Cultura, Roberto Freire
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Política Democrática (PD): Como você avalia esta reta final da campanha, com todas as incertezas que este complexo processo eleitoral tem demonstrado?

Roberto Freire (RF): Em primeiro lugar, gostaria de registrar que considero as pesquisas eleitorais confiáveis e acredito que elas devem ser consideradas. No primeiro turno, as pesquisas acertaram o percentual de votos atingido pelo ex-presidente Lula (PT). O problema maior foi em relação ao presidente Bolsonaro (PL). Porém, como muitos eleitores bolsonaristas, por orientações de ministros do atual governo, inclusive, se recusaram a responder os levantamentos, pode ter ocorrido influência. Estou em Brasília, não tenho percorrido o Brasil neste segundo turno. Até porque não adianta muito a gente andar na rua, pois a campanha é majoritariamente digital. Contudo, penso que a eleição está mais ou menos decidida. Esse episódio do Roberto Jefferson – que atacou com granadas e tiros de fuzil agentes da Polícia Federal para descumprir uma decisão do STF – pode fazer com que pessoas que antes diziam votar nulo agora decidam votar 13, no Lula. Certamente, houve um impacto muito negativo para a campanha do Bolsonaro. Foi algo patético, bizarro. Você imagina se fosse um negro, favelado, pobre? Atirar na polícia é inaceitável. O apoio da Simone Tebet e da Marina Silva, em diversos eventos pelo país afora, também ajuda o Lula a diminuir o receio de alguns setores da sociedade. A minha impressão é de que está bem encaminhada a vitória do ex-presidente Lula no próximo domingo, 30 de outubro. A não ser que surja um fato novo, algo imponderável.

Veja todos os artigos da edição 48 da revista Política Democrática online

PD:  Qual a sua avaliação do desempenho de Simone Tebet no primeiro turno da eleição presidencial e como analisa o papel estratégico dela na campanha do ex-presidente Lula (PT)?

RF: O desempenho foi ótimo. Infelizmente, tivemos poucos votos. Talvez, tenha sido a terceira via com menor percentual de votos absolutos nas eleições. A rejeição dos dois principais candidatos e a polarização foram fatores decisivos para esse cenário. Mas a Simone Tebet é muito maior do que os votos que conquistou. Ela obteve um crescimento exponencial, saiu bastante fortalecida do processo eleitoral e está consolidada como uma das maiores lideranças políticas do país. A presença dela no palanque do Lula é um diferencial, ajuda muito. Logo no início do segundo turno, eu me lembrei da campanha de 1989, quando mandamos fazer camisas e adesivos com a frase: ‘Sou Freire e estou Lula’. Reproduzimos esse slogan agora com a Simone. Nosso objetivo é passar aquela ideia: ‘com a Simone a gente vai’. Digo isso porque esse fato abriu um pouco alas para as pessoas que ficavam meio encabuladas, pois vinham perguntar: mas você não vivia esculhambando com o Lula? Ou qualquer outra coisa desse tipo. A partir dessa ideia (“Sou Simone e estou Lula”), conseguimos um anteparo. São diversos economistas, o pessoal do Plano Real, intelectuais, artistas, que agora passam a apoiar mais efetivamente o voto em Lula neste segundo turno. Todos esses atores têm um papel importante. A Marina Silva, por exemplo, que já foi do PT, mas tinha se afastado, exemplifica esse esforço por um bem maior, que é a democracia brasileira e o compromisso com o progresso nacional.

A militância do partido da Cidadania está muito ativa no lulismo, tem participado energicamente em tudo quanto é lugar do Brasil. O que a Simone está fazendo também é de uma militância impressionante. Ela está colada em Lula, até parece a vice, que não descola da vinculação com o titular. É algo praticamente inédito, de ter um apoio tão efetivo de uma candidata que não foi ao segundo turno, mas está totalmente comprometida com a candidatura. Isso é uma coisa que está engrandecendo-a. Aqueles que estavam decepcionados com Bolsonaro imaginavam que não iriam para o Lula de jeito nenhum e ela foi. Então, ela cresceu no conceito e no respeito de todos exatamente por conta dessa integração com muita ênfase na campanha presidencial. É uma militante que alguns petistas mais ativos devem estar mirando como exemplo.

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PD:  Pensando em um cenário pós-eleitoral, você acredita que, assim como Tancredo Neves foi chamado de “candidato da conciliação nacional”, o ex-presidente Lula poderia ajudar a pacificar o país?

RF: Essa é a questão em que a gente vai ter que se concentrar a partir de segunda-feira (31/10). Que quadro nós vamos ter? Vitória de um ou de outro. Vamos admitir que hoje não temos essa definição, apesar de certo favoritismo do ex-presidente Lula. Mas é um grande debate. Hoje já fui confrontado com isso em uma entrevista que dei a uma rádio de Pernambuco (PE). Eu disse que não estamos definidos. Eu dizia que Lula seria presidente, mas que nós não tínhamos definido se estaríamos no governo ou ficaríamos na oposição. Sem grandes problemas. Até porque oposição sistemática tivemos apenas na ditadura. O fato concreto é de que nós vamos ter que nos debruçar sobre isso. Vamos usar mais uma vez a Simone Tebet como exemplo. Como é que a Simone vai se posicionar? Estou querendo conversar com ela e ainda não pude. Ela tem viajado bastante. Falei pelo telefone, mas não avançamos em nada, por enquanto. Eu acredito que ela não queira participar de um novo governo Lula. Estava até discutindo uma questão colocada na ampliação da federação PSDB Cidadania, com a integração do MDB, para criar talvez a terceira ou quarta bancada. Se conseguirmos, podemos estar nos preparando para planos maiores em 2024 e 2026, fugindo desses dois polos que vão continuar. Qualquer que seja o resultado é fundamental para nós discutirmos, inclusive com a Simone, MDB e PSDB, ela liderando e nós vamos ter que discutir enquanto Cidadania. Pode oferecer a Lula a possibilidade de ele brigar contra seus radicais e entender que precisa minimamente não pacificar, mas, ter uma ampla maioria para evitar uma radicalização bolsonarista. Garantir a capacidade da sociedade de impedir que isso frature ainda mais o que já está fraturado. A presença da Simone, dos economistas, do setor liberal, de setores empresariais em apoio a sua candidatura tem que ficar junto dele no seu governo. Esses economistas, que vão ter um certo peso para contrabalançar o programa econômico de Lula, precisam estar junto também para dizer a ele: ‘olhe, você tem que ter o cuidado no governo de buscar pacificação, tolerância. Não pode excluir parte da sociedade que porventura não tenha votado em você.’ Embora a Lei não permita nenhum revanchismo, qualquer distúrbio que porventura possa existir deve ser suprimido. Não vamos pensar que esse episódio Roberto Jefferson, que ocorreu agora como um sinal de sedição, não sei, mas depois de uma derrota, isso pode se tornar algo comum. Indivíduos que queiram não admitir os resultados. Precisa ter um governo que tenha capacidade de juntar na realidade aqueles que estão votando para ter um processo democrático e não retrocessos. A gente não fala muito do Viktor Orbán e fala muito da Venezuela. O Bolsonaro não vai ser aquele que vai tentar experimentar um sistema de estatização da economia, de provocar aquilo que a Venezuela provocou concretamente, um empobrecimento da própria sociedade. Nós somos muito mais para a economia da Hungria, que cresce, do que para a economia da Venezuela, que vai lá para baixo. O governo Bolsonaro, autoritário, pode ter amplo apoio da sociedade. Não gerar o que gerou a Venezuela do empobrecimento, de uma decadência como ocorreu.Esse é o risco! Vamos analisar a Venezuela apenas como processo, mas não como base. Isso vai ficar mais para Polônia, para aquele sistema inserido na economia de mercado, que não vai sofrer retrocesso. O perigo está aí. Não é um processo de ruralização. Não vamos ter uma venezuelização por aqui, nesse sentido. Eu me lembro, quando vim de Cuba, em 1981, com o Goldman (Alberto), que estava sentado comigo, quando descemos em São Paulo, no aeroporto de Guarulhos, e vimos que aquilo era uma imensidão, uma potência. E eu brinquei com Goldman: ‘se a gente quiser fazer o que Cuba fez, vamos precisar de cinco Stalin e cinco Miami.’ Em Cuba, precisou de um só, mas por aqui precisariam de cinco. É uma economia que não tem como você imaginar que vai implantar isso e continuar. Eu acredito que esse é um grande desafio que a gente tem que pensar. É levar esse movimento que está ocorrendo no segundo turno para uma base efetiva do governo Lula. Nem mesmo participando necessariamente, não é isso. Mas é tendo o apoio crítico, mesmo com a independência, mas dando sustentação. E Lula entendendo que é fundamental ter isso. E não pensar que vai pegar o Centrão com qualquer movimento de aceitar processos de orçamento secreto ou qualquer outra forma para garantir o apoio meramente fisiológico. Ele tem que buscar esse apoio nesse sentimento democrático da sociedade. A Simone pode exercer o papel de liderança junto ao MDB e ao PSDB e, claro, nós do Cidadania estamos integrados nisso. Até porque esse objetivo, independente de quem for, a gente sempre teve.

https://open.spotify.com/episode/0GZjTu7gFPbt5klrK4tihV?si=f9733f937ad84ce0

PD: O que poderemos chamar de “centro democrático” no Brasil pós-eleição, ganhando Lula ou Bolsonaro?  Quais são as condições para se articular com a razoável autonomia?

RF: Esse é o nosso grande desafio. Eu fico imaginando, tem um pouco de torcida, mas começa a ser um pouco de realidade. É um favoritismo. Vamos admitir que o governo Lula é o melhor para nós. O centro democrático se consolida mais com o governo Lula. Um eventual segundo governo Bolsonaro seria terrível para o Brasil. Teríamos que tomar uma série de medidas para não conviver com uma clara escalada golpista. Se Bolsonaro for eleito, o STF vai ter novos membros. Eles vão, talvez, abrir alguns impeachments de ministros do Supremo no Senado Federal. Caso ganhem, eles teriam uma postura autoritária e fascista, com forte presença no Senado, com figuras que terão lideranças importantes até vinculadas às Forças Armadas, como é o caso do atual vice-presidente, Hamilton Mourão, senador eleito pelo Rio Grande do Sul (RS). Ele foi um dos primeiros a verbalizar a ideia do aumento de ministros no STF. Esse é apenas o passo inicial. Eles vão querer modificar as relações com o Judiciário, que hoje é o poder mais frágil do Estado brasileiro. Precisamos reconhecer que o Supremo foi importante para conter avanços antidemocráticos nos últimos anos. Com Arthur Lira no comando da Câmara Federal, o Congresso não agiu em praticamente nenhum movimento para conter arroubos autoritários. Na época do Rodrigo Maia, ainda tivemos algumas votações de decretos legislativos, impedindo retrocessos. Se Bolsonaro ganhar, o STF ampliado por novos ministros eventualmente bolsonaristas pode ser bastante prejudicial para a nossa democracia. Acabou. A partir daí, controla tudo. Isso é o modelo do Chaves na Venezuela. O Bolsonaro tem fortes aliados. Parte do setor de bancos, a maior parcela do agronegócio, que pode ajudar tremendamente a que isso se transforme em uma atitude de separação dos poderes, afirmando que o Executivo não pode ser impedido de governar, independente do Legislativo e, especialmente, do Judiciário. É preciso ter cuidado. Quem ganhar a eleição tem espaço para ajustar discurso do futuro democrático do Brasil. Agora, se ganhar o Lula, nós podemos, a partir da presença que Simone pode ter – e eu fico imaginando que ela não participe – porque poderíamos construir uma federação ampliada, da qual ela seja a presidente, passando a ter um papel político importante na sociedade brasileira. Uma federação ampliada com o MDB, com todos os eventuais problemas, poderíamos, sim, chamar de ‘frente democrática brasileira’, que não é ampla como a uruguaia, que foi feita a partir das esquerdas. Porém, nós podemos e devemos encaminhar isso. Vamos ter alguns bolsonaristas que vão querer fazer uma oposição maior, mas isso a gente terá que trabalhar para segurar. É mais fácil segurar quem quer fazer oposição do que quem adere. Nós, do Cidadania, podemos, com o governo Lula, manter a independência e ao mesmo tempo construir uma possibilidade, pois não vamos construir uma alternativa democrática à direita. O campo da direita durante algum tempo vai ser hegemonizado pela parte mais extremada.

PD: Você acha que isso acontecerá mesmo com a vitória do ex-presidente Lula?

RF: Com certeza. O bolsonarismo permanecerá, independente do resultado das urnas neste segundo turno. É ótimo que estamos aqui com pessoas que têm a visão da esquerda que quer ser contemporânea desse mundo que está aí, uma esquerda moderna. Ao contrário da esquerda dogmática, que pensa que é ainda revolucionária dos tempos do capitalismo industrial, bolchevique ou quer outros tipos de revoluções. E a América Latina tem muito disso. A América Latina é refratária a toda movimentação que houve no pensamento de esquerda, que é hoje o sustentáculo da União Europeia. Outro exemplo é a esquerda norte-americana, que consegue entender que para derrotar Donald Trump era melhor colocar Joe Biden do que Bernie Sanders. Essa esquerda que é democrática no mundo e entende a globalização, essa nova economia, as mudanças nas relações de trabalho e a evolução da própria sociedade.

A tendência do mundo, quando se fala de reforma trabalhista, é de querer regulamentar esse novo que está surgindo e não modificar o do passado. O próximo governo vai ter que lidar com um mundo que já não corresponde mais à mentalidade metalúrgica de Lula, daqueles que falam de classe operária enchendo a boca como a gente enchia, imaginando que o mundo era da classe operária no futuro. Era uma marcha que nós devíamos fazer na história. Não conseguem entender que não foi derrotado, houve a superação desta realidade, desta sociedade. E isso vai gerar crise lá dentro. Estou imaginando que esta força, o crescimento desta terceira via, é o avanço de uma visão que envolva também pensamentos – vamos chamar de social-democrata, centro-esquerda, o referencial que teremos para o futuro de uma esquerda democrática. A Europa democrática entende que deve se posicionar contra Putin em defesa da soberania da Ucrânia. Isso é um pouco essa visão progressista, e não da visão que aproxima Lula, também Bolsonaro a Putin. O eventual novo governo Lula vai ter essa contradição muito maior do que teve, por exemplo, em 2003, no início do primeiro mandato do PT, quando eles pensaram em fazer alguma reforma ali e, como reação, foi criado o Psol, de Heloísa Helena e tantos outros. Depois veio o mensalão, o que aumentou ainda mais as dissidências internas e tudo mais. Agora, vai ser muito mais concreto, não vai ter condições de alguém pensar na economia com a visão de que vamos fazer protecionismo, vamos construir uma indústria nacional, como disseram: ‘na pandemia, tivemos problema com agulhas, com máscaras, que poderiam não ter existido’. Por favor, isso foi um colapso da logística do mundo. Não é um problema para ficar imaginando que precisamos estar lá nas fronteiras produzindo algumas dessas coisas como se voltássemos ao mundo das barreiras alfandegárias.

Esse processo de globalização só vai se intensificar. Precisamos de um governo que tenha capacidade de administrar o país com a essa nova realidade e nenhum dos dois que estão aí está tendo capacidade para isso. Lula pode vir a ter, e vai ser necessário, porque ele precisa ampliar a sua base, mas, no momento que ele tomar determinadas decisões, pode enfrentar dissidências pela extrema esquerda. Vai ter problemas com aqueles que não permitem o que chamam de neoliberalismo, não admitem que você tenha uma visão de integração na economia mundial. Que diga que são sustentáveis, que isso seja mais importante que a economia do petróleo, do pré-sal. Teremos conflito com as corporações, haverá discussões sobre as necessárias reformas que estão em pauta. Por isso, fico imaginando que nós – e é dramático porque o MDB, com muito setor bolsonarista, o PSDB também, e até nós do Cidadania – como vamos gerar uma unidade para entender que nem Bolsonaro nem as posições majoritárias no PT são o futuro? O amanhã promissor nasce a partir da liderança da Simone Tebet, que também precisa entender que tem um grande papel. Esse é o nosso grande desafio. Concretizando essa federação ampliada, com o MDB, é até um desafio que se possa imaginar que tem que se criar uma nova formação política com esse setor, mas isso precisaria ter lideranças e eu não sei se o Eduardo Leite, eleito no RS, e se a Raquel Lyra, provavelmente eleita em PE, terão força suficiente para trazer o PSDB minimamente para um projeto desse porte. Nós, do Cidadania, estamos com dificuldade, poderíamos exercer esse papel se tivéssemos muita unidade com a nossa bancada. Esse é o drama. Não termos o velho Partidão, que enfrentou na época da ditadura a esquerda em cima, resolução, aventura, romantismo, outras tantas dificuldades e a gente se segurou e dentro do MDB, construindo uma alternativa democrática. Foi demorado, não foi fácil. As pessoas pensam que foi no final, quando as Diretas Já eram realidade, mas poucos sabem dos percalços. Nós acompanhamos. E agora, eu não sei qual força pode fazer isso. O PSDB não tem força para fazer. Esse é o drama que estamos vivendo. Mas é necessário construirmos. Se a gente tivesse esse setor que está indo para o Lula com a compreensão de que temos, desde já, buscar maior integração e construir novas alternativas políticas ao país, seria um avanço importante. Tem que tentar desde agora construir essa alternativa: a frente democrática que vai disputar 2026 não como um azarão, mas como uma força política que supere essa polarização que se afirmou novamente agora.

Sobre o entrevistado

Roberto Freire é presidente nacional do Cidadania, advogado, ex-senador, ex-deputado federal e foi candidato a presidente da República em 1989 pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB).

** Entrevista produzida para publicação na revista Política Democrática Online de outubro de 2022 (48ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.

Equipe de entrevista

Caetano Araújo: Doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília (UnB), consultor legislativo do Senado Federal e diretor-geral da Fundação Astrojido Pereira (FAP)

Luiz Sérgio Henriques: tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das “Obras” de Gramsci no Brasil, além de integrante do Conselho Consultivo da FAP

João Rodrigues: jornalista, sociólogo, mestre em Ciência Política e coordenador de Audiovisual da FAP

Paulo Fábio Dantas Neto: cientista político, economista, professor da Universidade Federal da Bahia e integrante do Conselho Consultivo da FAP

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Lula e Bolsonaro se enfrentam no primeiro debate presidencial do segundo turno das eleições presidenciais | Imagem: Reprodução/Twitter

Debate: Bolsonaro distorce dados sobre desmatamento

Paulo Motoryn*, Brasil de Fato

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu, durante o debate na TV Bandeirantes, na noite deste domingo (16), a preservação ambiental, enquanto o presidente Jair Bolsonaro (PL) distorceu os dados do desmatamento durante o seu governo. O tema dominou boa parte do terceiro bloco do confronto entre os candidatos ao Palácio do Planalto.

"Foi no nosso governo o menor desmatamento da Amazônia. Foi no nosso governo. E o seu é o maior todo ano. Vocês estão brincando de desmatar, vocês estão brincando de abrir cerca, vocês estão brincando de derrubar árvore, vocês vão ver o que vai acontecer com o comércio brasileiro, porque o brasileiro do agronegócio que é sério, aquele que quer ganhar dinheiro, aquele que quer exportar, sabe que não pode invadir a Amazônia", afirmou Lula.

"Nós vamos ganhar as eleições para poder cuidar da Amazônia e não permitir que haja invasão em terra indígena, em garimpo ilegal, e muito menos alguém querer plantar milho, soja ou algum outro produto no lugar que não se pode plantar", declarou o petista.

Na resposta, Bolsonaro disse: "Dá um Google em casa aí: 'Desmatamento 2003 a 2006', quatro anos do governo Lula. Depois dá um Google: 'Desmatamento, Jair Bolsonaro, 2019 a 22'. No seu governo foi desmatado mais do que o dobro do que o meu. Dá um Google em casa. Deixa eu terminar, Lula. Dá um Google em casa. Você desmatou duas vezes e meio mais do que no meu governo".

Logo em seguida, contudo, entidades que atuam com o tema contestaram o presidente nas redes sociais. O Observatório do Clima, rede da sociedade civil que luta contra a crise climática, publicou a seguinte mensagem no Twitter: "Jair Bolsonaro MENTE sobre desmatamento no governo Lula. O PT pegou o desmatamento em 25 mil km2 e reduziu a 4.500 km2. Bolsonaro pegou com 7.500 km2 e levou a 13.000 km2", escreveu.

https://twitter.com/obsclima/status/1581812948343083011?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1581812948343083011%7Ctwgr%5E75d687c7deed192fd355cbc84f39f70784e96de9%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.brasildefato.com.br%2F2022%2F10%2F16%2Fdebate-bolsonaro-distorce-dados-sobre-desmatamento-lula-diz-que-vai-acabar-com-garimpo-ilegal
https://twitter.com/obsclima/status/1581805764955770880?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1581805764955770880%7Ctwgr%5E75d687c7deed192fd355cbc84f39f70784e96de9%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.brasildefato.com.br%2F2022%2F10%2F16%2Fdebate-bolsonaro-distorce-dados-sobre-desmatamento-lula-diz-que-vai-acabar-com-garimpo-ilegal

*Texto publicado originalmente no Brasil de Fato. Título editado.


Pastor Alexandre Gonçalves | Foto: arquivo pessoal

Esquerda precisa focar em emprego contra 'identitarismo de maioria'

Shin Suzuki*, BBC News Brasil

O pastor Alexandre Gonçalves, presidente do Movimento Cristãos Trabalhistas, ligado ao PDT, diz que "emprego, saúde e trabalho têm que ser o foco para a esquerda". "Porque se for entrar com a luta identitária, o Bolsonaro ganha com o identitarismo de maioria."

Ele se refere à substancial fatia da população brasileira que é evangélica e conservadora e se reúne em torno do ideal de "defesa da família" — associado a plataformas contra o aborto e o casamento gay.

Projeção do doutor e pesquisador em demografia José Eustáquio Alves aponta que os evangélicos serão o maior grupo religioso do Brasil em dez anos.

Gonçalves considera que atualmente há uma ênfase excessiva do que ele chama de "nova esquerda" na questão identitária (luta contra a discriminação racial, feminista e LGBT) em lugar de temas sociais, ligados a mais garantias e bem estar dos trabalhadores.

Para o pastor, que assessorou o candidato derrotado Ciro Gomes (PDT) no primeiro turno, isso, somado a uma atitude que ele chama de "condescendente" da esquerda em relação aos evangélicos, leva os neopentecostais conservadores a cerrar fileiras pela candidatura de Jair Bolsonaro (PL).

Gonçalves decidiu declarar voto em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por sua oposição ao atual presidente, que considera o introdutor de uma "seita pseudocristã chamada 'bolsonarismo dentro da igreja'".

"Nós estamos indo para o caminho de uma ex-nação."

Carioca de 52 anos, ele é pastor da Igreja de Deus, uma denominação pentecostal, fundada em 1836 nos Estados Unidos, "conservadora e tradicional" e "que de 2014 para cá vem tendo umas ideias muito erradas em relação à questão política".

"Mesmo com todas as dificuldades, problemas e as nossas contradições, me mantenho ali porque ainda acredito que é um ambiente que a gente ainda pode de alguma forma viver sem que fique insalubre."

Em meio a pressões na igreja, Gonçalves deixou de ser pastor em tempo integral e desde 2004 é concursado da Polícia Rodoviária Federal. Mora hoje em Santa Catarina.

O Movimento Cristãos Trabalhistas, que ele ajudou a fundar no final de 2017, inicialmente era formado apenas por evangélicos como Assembleia de Deus, Presbiteriana, Batista e Quadrangular, e mais tarde agregou católicos.

O grupo ainda vai se reunir para definir a posição conjunta sobre o segundo turno — a declaração de voto em Lula é uma posição pessoal de Gonçalves.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista com o pastor:

BBC News Brasil - Por que Lula e a esquerda têm dificuldades de obter o voto evangélico?

Pastor Alexandre Gonçalves - Se você pergunta para os evangélicos se eles querem ter saúde e escola públicas de qualidade, um transporte público ágil para não ficar 3 horas no trânsito e direitos trabalhistas como férias, eles vão dizer que sim. É dessa forma que a gente consegue se conectar com as igrejas.

Se você inicia um diálogo com temas transversais, ainda que eles tenham a sua importância, mas que são dominados por um identitarismo de minoria, isso acaba fazendo surgir um identitarismo de maioria. Isso faz muito bem à direita. A direita ganha nesse campo.

A prioridade hoje da chamada nova esquerda, que a gente acredita que é oriunda de uma tendência norte-americana, é de defesa de um identitarismo que entendemos ser raso e dissociado da luta universal dos trabalhadores em prol de sua emancipação.

E se você quer impor através do Estado conceitos de família, seja o conceito cristão tradicional ou o conceito liberal da esquerda, você vai causar conflito.

Emprego, saúde e trabalho têm que ser o foco para a esquerda ganhar alguma eleição majoritária. Porque se for entrar com a luta identitária, o Bolsonaro ganha com o identitarismo de maioria. É só saber matemática.

O candidato do PDT à Presidência Ciro Gomes, derrotado no primeiro turno da eleição
Alexandre Gonçalves assessorou o candidato do PDT à Presidência Ciro Gomes, derrotado no primeiro turno da eleição

BBC News Brasil - Quais são os problemas de comunicação da esquerda com essa fatia da população?

Gonçalves - Se uma pessoa fala qualquer termo que não está de acordo com a linguagem da nova esquerda, o que acontece com essa pessoa? Ela não é ensinada: ela é massacrada. Não há uma pedagogia para essa pessoa. Ela não é, com amor, induzida a mudar o seu modo de pensar, ela é destruída.

Querem mudar uma estrutura brutal de opressão mudando a linguagem, ou seja, de fora para dentro. Eles acham que alterando a forma vão conseguir alterar o conteúdo. Primeiro, você tem que mexer lá dentro, no conteúdo. A forma vem depois.

Isso é ensinamento de Jesus: "Lave o copo por dentro". Ou seja, primeiro é ali dentro, tem que mexer nessa estrutura. E como mexe nessas estruturas? Justamente mexendo na economia.

A esquerda fica mais preocupada em falar "vamos legalizar o aborto". Não estou dizendo que essas pautas não sejam importantes. Elas têm a sua importância. Mas não vão resolver o problema estrutural. Qual é o motivo que faz as pessoas abortarem? Qual o motivo que faz com que pessoas transsexuais sejam discriminadas?

Outro ponto [ruim na comunicação] é a fragilidade moral da nova esquerda. Quando ela se tornou governo, houve uma realidade de roubalheira generalizada que é injustificável. Houve o lavajatismo? Houve sim, mas a autoridade moral que a esquerda tinha quando era oposição foi perdida.

BBC News Brasil - Mas por que denúncias de corrupção relacionadas ao governo e à família Bolsonaro, além de declarações do presidente que afrontam valores das igrejas cristãs, como a defesa do aborto feita no passado, não afetam o apoio majoritário dos evangélicos a ele?

Gonçalves - Aí são dois problemas: um na esquerda e outro dentro da igreja. No Brasil, entre os anos 1950 e 1960, entraram duas teologias: a do domínio e a da prosperidade, uma com ligação à outra. A do domínio pregava que o reino de Deus será estabelecido aqui na Terra pela igreja. Daí o nome.

E como é esse domínio? A igreja tem que exercer influência nas principais áreas da sociedade: política, economia, cultura, arte, tudo. E aí uma grande parte das igrejas, principalmente as neopentecostais, tomaram essa teologia podre, que veio para cá importada dos EUA, e colocaram na vida política.

Vários falam para mim: "Bolsonaro não é cristão, a gente sabe que ele não é. A gente sabe que ele tem um monte de erros, mas ele defende os valores cristãos".

Bom, mas você não vota num governante para que ele imponha princípios cristãos à sociedade. Você vota no governante para que ele possa administrar o bem público de forma que todos possam se beneficiar. Isso se inverteu na cabeça de grande parte dos evangélicos, principalmente por causa do aumento das igrejas mercantilistas massivas.

E a igreja evangélica tem o olhar reducionista sobre a esquerda: diz que todo mundo é comunista e não consegue separar entre sociais-democratas, trabalhistas etc. Reduz a esquerda a casamento gay, aborto e maconha. A esquerda, por sua vez, se sente superior, tem um olhar condescendente com os evangélicos.

Jair Bolsonaro ao lado de Silas Malafaia, líder da igreja neopentecostal Assembleia de Deus Vitória em Cristo
Jair Bolsonaro ao lado de Silas Malafaia, líder da igreja neopentecostal Assembleia de Deus Vitória em Cristo

BBC News Brasil - Há como a esquerda usar uma linguagem, usando as palavras do senhor, "menos condescendente" e defender temas como o combate à violência homofóbica e a legalização do aborto?

Gonçalves - Não numa eleição majoritária. Candidatos a presidente, a governador, não tem que entrar nessas pautas. Quem tem que entrar, quem vai entrar, são os candidatos a cargos proporcionais. É esse o ponto. Até porque o presidente não pode fazer nada sobre isso. Presidente não pode legalizar o aborto. Isso é tarefa do Congresso Nacional. Um candidato a presidente tem que fugir dessas cascas de banana. Numa campanha majoritária você não quer só o voto da esquerda, você quer o voto da maioria da população.

O que aconteceu no Chile recentemente foi uma oportunidade imensa de mudar o sistema previdenciário e introduzir uma nova Constituição. A nova esquerda do Chile introduziu esses temas na reforma constitucional. O que aconteceu? 60% de rejeição.

Nós temos um Brasil de interior com muita gente que não tem a mentalidade das grandes cidades. E mesmo dentro das grandes cidades, nas periferias, há pessoas com um pensamento muito diferente do que se vê nas novelas, nos filmes, na arte… e eles são brasileiros.

O caminho é não falar e deixar isso para as representações legislativas. Houve eleição de representantes transsexuais para a Câmara Federal. Essas pessoas terão que levar debates, por exemplo, sobre se o SUS [Sistema Único de Saúde] poderá bancar cirurgias de mudança de sexo, fazer projetos de lei e, dentro da democracia do país, ou seja, no Congresso Nacional, levar isso à votação, que será aprovado ou não.

BBC News Brasil - Nesta segunda-feira (8/10), Lula afirmou ser contra o aborto e que a discussão sobre o assunto é "papel do Legislativo". O que achou do anúncio?

Gonçalves - Eu acho que é a declaração correta. Ele falou aquilo que ele pensa. Com toda certeza se outra pessoa declarasse isso seria cancelada para o resto da vida na internet. Mas como é o Lula não tem problema, ele pode falar.

Marcha para Jesus no Rio
Apoio a Bolsonaro é grande maioria dentro de lideranças de igrejas evangélicas

BBC News Brasil - Qual é a visão do senhor como pastor sobre o casamento gay e a comunidade transsexual?

Gonçalves - Nós temos uma posição clara no nosso movimento dos Cristãos Trabalhistas que não somos contra a união civil de pessoas do mesmo sexo e a existência de qualquer pessoa. Isso são fundamentos do Estado laico. Não somos contra que possam estabelecer seus direitos previdenciários, de plano de saúde, tudo.

O que nós nos colocamos contra é uma imposição para que, dentro das igrejas, pastores sejam obrigados a efetuar o casamento religioso de pessoas do mesmo sexo. Eu acho que aí deve ser de acordo com a consciência de cada pastor. Tem igrejas que fazem e tem igrejas que não fazem. É uma questão teológica, doutrinária, que diz respeito à liturgia dentro de cada igreja, e elas devem ter essa independência, que é um pressuposto do estado laico.

As pessoas num estado laico são livres para o que anteriormente se via como escolha e hoje pode ter uma força biológica. Isso não é algo que a igreja tenha que se intrometer. Essas pessoas têm todo o direito de existir e ter a sua plena cidadania. Dentro do movimento a gente tem bastante respeito.

BBC News Brasil - Como o senhor vai se posicionar no segundo turno?

Gonçalves - O nosso movimento está para se reunir, mas a minha posição pessoal é de voto silente no Lula. E as minhas razões não são de cunho econômico ou social porque eu entendo que Lula e Bolsonaro têm o mesmo modelo. É por conta de que, embora eles causem mal ao país de maneiras diferentes, Bolsonaro introduziu o que a gente chama de uma seita pseudocristã chamada "bolsonarismo dentro da igreja". É um mal que ele causa à igreja, muito maior do que o mal que, de maneira abstrata, Lula poderia causar. O mal do Bolsonaro é concreto porque tem entrado na estrutura da igreja usando símbolos cristãos em nome do poder. Não há como não me posicionar contra ele. E o que tem hoje contra ele é o Lula. Então, a minha posição é o voto em Lula.

*Texto publicado originalmente no site BBC News Brasil. Título editado


Luiz Inácio Lula da Silva discursando | Foto: Isaac Fontana/Shutterstock

Lula precisa dar guinada ao centro se quiser governar, dizem economistas

Alexa Salomão, Folha de S. Paulo

Logo após a contagem dos votos no primeiro turno das eleições neste domingo (2), o presidente Jair Bolsonaro (PL) atribuiu o resultado a sua bem-sucedida estratégia na economia, que elevou o valor do Auxílio Brasil, ao mesmo tempo em que reduziu o preço dos combustíveis e a inflação às vésperas do pleito. Economistas que acompanham a cena política discordam.

A economia até pode ter ajudado um pouco, como ocorre em qualquer eleição. No entanto, analistas atribuem a arrancada bolsonarista ao avanço da uma onda conservadora —e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai precisar se adaptar a esse movimento para ganhar a eleição e, depois, governar com um Congresso mais a direita.

Terminada a contagem, Lula recebeu 48,4% dos votos válidos, resultado dentro da margem de erro sinalizada pelas pesquisas. Bolsonaro teve 43, 22%, uma diferença de quase sete pontos percentuais, que fortalece o presidente no segundo turno.

"Para ocorrer essa diferença no resultado do Bolsonaro em relação às pesquisas, cujos votos foram subestimados vergonhosamente, [o motivo] não foi a economia —o que estamos vendo é uma onda conservadora", afirma a economista e advogada Elena Landau, que coordenou o programa econômico de Simone Tebet (MDB).

"Tem o astronauta Marcos Pontes virando senador por São Paulo, Hamilton Mourão ganhando no Rio Grande do Sul, Magno Malta voltando pelo Espírito Santo, Eduardo Pazuello, o ex-ministro da Saúde, como deputado federal mais votado no Rio. Isso não tem nenhuma relação com a economia."

Elena sai satisfeita com o resultado de sua candidata. "Simone foi de completa desconhecida à terceira mais votada", afirma. No entanto, ela se declara muito preocupada com os futuros efeitos do conservadorismo em duas áreas específicas, caso Bolsonaro se reeleja: o meio ambiente e o STF (Supremo Tribunal Federal).

"O próximo presidente poderá indicar dois ministros para o Supremo", diz ela. "Imagine o efeito disso."

Elena aguarda a posição de sua candidata no segundo turno, que deve ser divulgada até terça-feira. Se Simone apoiar Lula, existe a expectativa de que parte de suas propostas para a economia possa ser levada para o PT.

O economista Nelson Marconi, que atuou na coordenação econômica nas campanhas de Ciro Gomes (PDT) em 2018 e 2022, também não acredita que a melhora da economia explique o resultado.

"No levantamento que encomendamos, dá para ver que o governo Bolsonaro injetou cerca de R$ 450 bilhões na economia neste segundo semestre, com medidas em diferentes áreas, então, as pesquisas teriam de estar muito erradas para não captarem isso antes", diz Marconi. "Acredito que ocorreu outro movimento, mais ligado a agenda dos costumes."

Marconi garante que o seu candidato não vai apoiar Bolsonaro, mas ainda não tem uma definição sobre um eventual apoio a Lula.

O economista Edmar Bacha, um dos pais do Plano Real, espera uma reação petista nos próximos dias. "Lula precisa dar uma guinada dramática ao centro se quiser segurar essa onda conservadora", diz Bacha, histórico apoiador do PSDB que participou da campanha de Tebet para "ajudar na construção da terceira via".

Para o economista, Lula precisa atuar para fortalecer sua coalizão no segundo turno.

Membro da Academia Brasileira de Letras, Bacha tem forte atuação nos bastidores do debate econômico como sócio-fundador do Casa das Graças, um instituto de estudos de política econômica no Rio de Janeiro voltado à promoção de debates sobre o desenvolvimento do Brasil. Neste ano, no entanto, preocupado com os rumos da política, assumiu uma posição mais pública.

Bacha diz que o primeiro passo do PT é concentrar esforços em São Paulo, onde Fernando Haddad (PT) chega ao segundo turno com 35,70% dos votos válidos, abaixo do que previam as pesquisas. O ex-ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas (Republicanos), apoiado por Bolsonaro, terminou o primeiro turno na frente, com 42,32%.

"Foi isso que fez a diferença para Bolsonaro, e será preciso reverter essa situação", afirma ele.

Petista histórico e ex-ministro do Planejamento e da Fazenda, o economista Nelson Barbosa, costuma estar em campos opostos aos colegas egressos do PSDB. Desta vez, porém, concorda com a importância das alianças mais amplas.

"Pelo aspecto político, o resultado indicou que Lula estava certo em construir uma frente ampla, pois só assim há chance de derrotar Bolsonaro", afirma Barbosa, que é colunista da Folha.

No segundo turno, Barbosa acredita, essa frente será mais ampla, com colaboração de pessoas que apoiavam Tebet e Ciro.

O economista Arminio Fraga, ex-presidente do BC (Banco Centra) e colunista da Folha, destaca que uma revisão na estratégia do PT é importante também por causa do perfil que a eleição deu ao Legislativo. "Bolsonaro sai muito forte no Congresso", diz ele. "Erros monumentais precisam ser corrigidos."

Cartas pró-democracia são lidas na Faculdade de Direito da USP

Público acompanha de dentro do pátio das Arcadas e na parte externa a leitura dos manifestos pela democracia na Faculdade de Direito da USP

O PL de Bolsonaro ganhou ao menos 23 deputados, chegando a 99. Tornou-se a maior bancada eleita na Câmara nos últimos 24 anos. A sigla terá praticamente um em cada cinco votos , consolidando-se como um ator essencial nas negociações políticas entre os deputados. Terá praticamente um em cada cinco votos entre os deputados, consolidando-se como um ator essencial nas negociações políticas.

Um terço do Senado foi renovado, e.o resultado também consolida o PL como a maior bancada. Terá 14 cadeiras, 5 a mais do que tinha no primeiro semestre deste ano, e ainda pode chegar a 15. Entre os eleitos estão ex-ministros bolsonaristas, como Damares Alves (Republicanos-DF) e Rogério Marinho (PL-RN).

Sócio-fundador da Gávea Investimentos, Fraga prefere a a discrição e não gosta de exposição pública. Neste ano, porém, à medida que o cenário político ficava mais tenso, aderiu a movimentos de apoio ao equilíbrio institucional.

Em agosto, numa atitude inédita, discursou no evento da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP (Universidade de São Paulo), em que foi lançado um manifesto de apoio à democracia.

O economista Bernard Appy, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda na gestão de Lula, chama a atenção para a necessidade de alianças mais conservadoras para exercer o governo em caso de vitória.

"Será preciso levar a coalizão mais para o centro não apenas para ganhar a eleição, mas para garantir a governabilidade em caso de vitória", afirma ele. "Há muito a ser feito, em várias áreas, principalmente na economia, que depende do Legislativo."

Diretor do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), Appy integra o Grupo de Seis, que redigiu propostas de reformas para os presidenciáveis em diferentes áreas. Também fazem parte os economistas Francisco Gaetani, Marcelo Medeiros e Pérsio Arida, o professor Carlos Ari Sundfeld (FGV Direito SP) e o cientista político Sérgio Fausto. Eles redigiram uma proposta de governo com reformas, entregue aos presidenciáveis

*Texto publicado originalmente na Folha de S. Paulo


Lula e Bolsonaro confirmaImagem: reprodução/o Globo

Nas entrelinhas: Debate não alterou polarização entre Lula e Bolsonaro

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

A pesquisa Ipec (a turma do antigo Ibope), divulgada na segunda-feira, mostra um quadro estabilizado há duas semanas na disputa eleitoral entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente Jair Bolsonaro. O primeiro com 44% de intenções de voto; o segundo, com 32%. Ciro Gomes, Simone Tebet e Felipe D’Ávila subiram um ponto cada, estão com 7%, 3% e 1%, respectivamente, todos na margem de erro. A pesquisa funcionou como uma espécie de “calma, o Brasil é grande” na cúpula das campanhas de Lula e Bolsonaro, que foram muito mal avaliados nos trackings do debate de domingo na Band e no monitoramento das redes sociais. Os demais candidatos se saíram melhor, principalmente Simone Tebet (MDB).

Vista com lupa, a nova pesquisa mostra que houve pequenas movimentações localizadas. Por exemplo, Lula continua liderando entre os que recebem o Auxílio Brasil, com 52%, mas Bolsonaro subiu um pontinho: passou a 29%. Ciro Gomes, também, chegando a 8%. Entre os que não recebem o auxílio, não houver alteração, mas a distância de Lula para Bolsonaro é menor: o petista tem 40%, e o presidente, 33%. Entretanto, nas capitais, houve uma mudança muito significativa: a vantagem de Lula para Bolsonaro caiu para 2%, ou seja, estão em empate técnico. Há duas semanas, Lula estava com 45%, e Bolsonaro, com 31%. No interior, Lula cresceu um 1%, e Bolsonaro caiu o mesmo percentual: estão como 45% e 32%, respectivamente. O que é isso?

Eis uma boa pergunta para os estrategistas da campanha de Lula, porque esse é um movimento de placas tectônicas. Existe vida inteligente na campanha de Bolsonaro, cujo estado-maior procura explorar os pontos fracos de Lula e recuperar os votos de 2018 que o presidente da República havia perdido. Isso está muito claro nos programas eleitorais e nas intervenções bolsonaristas nas redes sociais. O problema da campanha de Bolsonaro não é falta de estratégia, é o próprio candidato. Isso ficou claro no debate da Band, ao atacar a jornalista Vera Magalhães (TV Cultura). Tornou-se o grande derrotado, exatamente no momento em que crescia para cima de Lula.

A apatia de Lula no debate da Band foi flagrante, mas não provocou mais do que uma tempestade em copo d’água, se considerarmos a pesquisa divulgada na segunda, em contradição com repercussão negativa registrada nas redes sociais por sua atuação no domingo. Lula continua dando uma surra em Bolsonaro no Nordeste (57% a 25%), vence no Sudeste por uma margem de seis pontos (39% a 33%) e, mudança importante, inverteu a situação no Sul: agora está com 36%, contra 34% de Bolsonaro. Porém, Lula caiu 6% entre os eleitores que recebem até um salário mínimo, e Bolsonaro cresceu 2%. Entre os eleitores com renda acima de cinco salários mínimos, Lula caiu oito pontos, está com 28%, contra 47% de Bolsonaro, que subiu um ponto.

Triângulo

Bolsonaro trabalha para reduzir sua rejeição e aumentar a de Lula. É uma estratégia eficiente, para levar a eleição ao segundo turno e, nele, tentar virar o jogo e se reeleger. A resposta de Lula, num primeiro momento, foi tentar ampliar sua candidatura para vencer no primeiro turno. Essa possibilidade ainda existe, segundo a pesquisa Ipec, porque Lula tem 1% a mais do que a soma das intenções de votos de Bolsonaro com as dos demais candidatos. No entanto, as placas tectônicas sinalizam que essa possibilidade pode ser volatilizada.

O recorte regional da campanha sinaliza que a eleição será decidida no Sudeste, o chamado Triângulo das Bermudas. Lula (PT) oscilou três pontos para baixo em São Paulo – de 43% para 40% -, e três para cima em Minas Gerais – de 42% para 45%. No Rio de Janeiro, todos os candidatos oscilaram dentro da margem de erro. Lula tem 39% (tinha 41%), Bolsonaro 36% (tinha 37%), Ciro 6% (tinha 7%) e Tebet 3% (tinha 2%).

Lula teceu alianças minoritárias no Rio de Janeiro e em Minas. O atual governador fluminense, Cláudio Castro (PL), com 26% das intenções de voto, apoia Bolsonaro. Aliado de Lula, Marcelo Freixo (PSB) tem 19%. Depois, vêm Rodrigo Neves (PDT), com 6%, e Cyro Garcia (PSTU), com 4%. Juliete Pantoja (UP) tem 3%. Eduardo Serra (PCB), Wilson Witzel (PMB) e Paulo Ganime (Novo) empatam com 2%. O candidato Luiz Eugênio (PCO) somou um ponto percentual.

Em Minas, o amplo favoritismo de Lula não alavancou até agora a candidatura de Alexandre Kalil (PSD), com 24%, que enfrenta o governador Romeu Zema (Novo), franco favorito, com 44%. Carlos Viana (PL), com 3%; Cabo Tristão (PMB), com 1%; Lorene Figueiredo (PSol), com 1%; Marcus Pestana (PSDB), com 1%; Renata Regina (PCB), com 1%; e Vanessa Portugal (PSTU), com 1%.

Em São Paulo, o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) lidera com 32% das intenções de voto, mas o candidato de Bolsonaro, o ex-ministro da Infraestrutura Tarcísio de Freitas, está com 17%, enquanto o atual governador, Rodrigo Garcia (PSDB), tem 10%. Depois aparece Carol Vigliar (UP), com 2%. Elvis Cezar (PDT), Vinicius Poit (Novo), Gabriel Colombo (PCB), Antonio Jorge (DC) e Altino Junior (PSTU) empatam com 1%.

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Quem ganhou o debate dos candidatos à Presidencia | Imagem: reprodução/shutterstock

Nas entrelinhas: No debate dos presidenciáveis, todos os homens são mortais

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

As feministas da geração de Simone Tebet (MDB) e Soraya Thronicke (União Brasil) têm como uma das referências a escritora francesa Simone de Beauvoir, que foi casada com o filósofo existencialista francês Jean Paul Sartre. O livro Todos os homens são mortais (Nova Fronteira), de sua autoria, que empresta o título à coluna, conta a história de Régine, uma atriz ambiciosa e invejosa, e o Conde Raymond Fosca, rei de Carmona, personagem nascido no ano de 1279 (séc. XIII), que havia tomado o remédio da imortalidade.

Régine é uma anti-heroína que reconhece seus defeitos e se arrepende deles, mesmo sabendo que não conseguirá mudá-los. Fosca surge no romance pelos olhos da atriz: “Esse homem! — disse ela. — Por que se levanta tão cedo?”. Dele se aproxima. O antigo rei lhe conta seu segredo, o de ser imortal, e a partir daí, Régine torna-se obcecada pela ideia. Para demovê-la, Fosca narra a história de sua vida, desde 1279 até o seu encontro com Régine, num passeio da Idade Média à Modernidade.

O livro foi lançado em 1946. Fosca apresenta vantagens e desvantagens de ser imortal. Com o passar dos anos — das guerras, das pestes, das mortes de amigos e inimigos e de entes queridos, como esposas e filho —, Fosca desanima da vida e passa a buscar respostas para suas perguntas nos outros, assim como é através deles que tenta viver. Não se percebe mais capaz de ser um ser humano como os demais. Quando termina sua história, Fosca deixa Régine sozinha. Cabe a ele seguir por milênios, amaldiçoado. O livro de Simone de Beauvoir nos revela que cada um tem “a dor e a delícia de ser o que é”.

Fora da dicotomia

O debate presidencial de domingo serviu para mostrar que há mais opções além da polarização entre os candidatos que a promovem. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) podem não ser “imortais” como Fosca, que podia fazer qualquer escolha, mesmo a mais sanguinária e/ou desastrosa, e sobreviveria aos seus próprios erros e aos prejuízos que causaram.

Segundo o analista de redes sociais Sérgio Denícoli, da Modalmais/APExata, “há vida política fora da dicotomia bolsonarismo x lulismo”. Ao processar a análise de 400 mil tuítes, Denícoli constatou que há um cansaço nas redes sociais com o embate entre as duas maiores forças políticas do país, explícito não apenas nas falas dos candidatos, mas nos sentimentos provocados pelo debate: a tristeza foi a emoção predominante, representando 18,7% dos posts; em seguida, a raiva (14,66%) e o medo (16,69%). A confiança foi apenas o quarto sentimento mais presente: 13,34% dos tuítes.

A rejeição a Bolsonaro e a Lula passou ser o fator determinante da polarização eleitoral, paradoxalmente, mantendo-os na liderança por serem antagônicos. Quem rejeita um vota no outro, acredita que o candidato escolhido é o único com chances de derrotar o adversário. “Entretanto, o debate trouxe uma lufada de ar fresco, mostrando que há outras equipes no páreo. O desempenho de Simone Tebet e Soraya Thronicke surpreendeu”, destaca Denícoli.

Os dados da AP Exata mostram que as duas candidatas mulheres foram as mais aprovadas pelos internautas. Simone teve 41,29% de aprovação entre os que a mencionaram, enquanto Soraya alcançou 41,25%. Ciro ficou em terceiro com 39,96%, Felipe D’Ávila veio na sequência (37,41%), seguido de Lula (36,16%) e Bolsonaro (36,07%). Simone ainda liderou nos sentimentos de confiança, surpresa e alegria. Bolsonaro foi o líder em tristeza, e Lula, em desgosto e medo.

“O debate foi mais negativo para os protagonistas da disputa, que chafurdaram em suas rejeições e em suas fraquezas, claramente expostas”, conclui Denícoli. Em termos de menções, Simone foi a que mais cresceu ao longo do debate. Iniciou com 3,6% e finalizou com 10,5%, um aumento de 191,6%. Ciro cresceu de 14,5% para 15,3%. Soraya ampliou sua visibilidade de 2,5% para 7,6%, e D’Ávila de 1,7% para 3,4%. Lula e Bolsonaro encolheram. O petista iniciou abarcando 41,3% das menções e finalizou com 33,1%. Já o presidente saiu de 36,3% para 30,2%.

Considerando como os termos “voto” e “votar” se associaram aos candidatos no Twitter, Bolsonaro teve a queda mais acentuada, passando de 35,7% para 27,04%. Lula também caiu, de 39,12% para 32,9%. Ciro cresceu de 19,46% para 26,59% e Simone passou de 4,3% para 10,27%. Nos próximos dias, o comportamento das redes mostrará se os efeitos do debate vão se consolidar como tendência ou foram momentâneos.

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Debate político | Imagem: jenny on the moon/Shutterstock

Nas entrelinhas: Bolsonaro ganhou mais do que perdeu no JN

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

O presidente Jair Bolsonaro se saiu melhor do que a encomenda na entrevista concedida a Willian Bonner e Renata Vasconcellos no Jornal Nacional, segunda à noite. Cobrado insistentemente pelos dois apresentadores sobre temas que são as causas de sua alta rejeição, como a atuação durante a pandemia de covid-19 e a questão ambiental, saiu pela tangente, mentiu às vezes, porém, não perdeu a cabeça e partiu para a agressão verbal, como acontece na maioria das entrevistas “quebra-queixo” que concede, quando é confrontado por algum jornalista.

Nas redes sociais, durante a entrevista, bolsonaristas e petistas, principalmente, travaram uma guerra virtual que repercutia a sabatina em tempo real. Principalmente no Twitter, Bolsonaro perdeu as batalhas quando tratou das urnas eletrônicas e das ameaças de golpe, da crise da falta de oxigênio nos hospitais de Manaus e das vacinas. Também não ficou bem na fita quando negou corrupção no governo. Mas, se saiu melhor quando falou do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e da aliança com o Centrão. Na métrica do monitoramento das redes sociais, teve em torno de 35% de menções positivas e 65% de menções negativas. Não foi um mau resultado.

Por que a conclusão de que se saiu melhor do que a encomenda? Porque Bolsonaro alcançou seu objetivo de não frustrar seus eleitores e não afrontar os que votaram nele nas eleições passadas e, agora, estão voltando para sua base eleitoral. Essa foi a estratégia do seu estado-maior para a entrevista. O outro lado da moeda é a cobrança que está sendo feita aos jornalistas da TV Globo, principalmente pelos petistas, que acaba favorecendo também o presidente da República.

A reação contrária dos bolsonaristas já estava prevista; a dos petistas, não. Parece que tinham a expectativa de que Bolsonaro seria “nocauteado” por Willian Bonner e Renata Vasconcellos, que foram bastante agressivos e contundentes, mas não perguntaram tudo o que os petistas gostariam, quando nada, porque os questionamentos foram longos demais e, em alguns momentos, geraram réplicas e tréplicas.

Temas como o caso das “rachadinhas”, escândalo na Assembleia Legislativa do Rio envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o envolvimento do clã com as milicias do Rio de Janeiro ficaram fora da pauta. Como Bolsonaro levou uma “cola” anotada na palma da mão, surgiu a versão de que eram anotações que visavam intimidar os dois entrevistadores, com referências negativas à emissora, cuja concessão vencerá no dia 5 de outubro e precisa ser renovada. Outros, porém, e não apenas os bolsonaristas, avaliam que os dois jornalistas se comportaram como se fossem debatedores, e de forma desrespeitosa.

Padrão Globo

Mas, o que incomoda mesmo aos petistas é saber que o favorito nas pesquisas de intenção de voto até agora, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, receberá o mesmo tratamento dado a Bolsonaro por Bonner e Renata. A TV Globo precisa manter uma posição de independência e neutralidade em relação aos candidatos, o que exige tratamento isonômico. Isso será um problema para o petista. Sua entrevista ao Jornal Nacional, na quinta-feira, pode exumar pautas muito desconfortáveis, como os escândalos do “mensalão” e da Petrobras, além de outros assuntos negativos para Lula ou comentários infelizes, que sua campanha procura contornar a todo custo.

A avaliação dos marqueteiros de Bolsonaro sobre sua atuação na entrevista é tão otimista que o presidente da República já está cogitando comparecer ao debate entre candidatos à Presidência organizado pelo consórcio de emissoras de TV, que antes havia rechaçado, assim como o ex-presidente Lula. É uma decisão estratégica que faz todo o sentido, porque Bolsonaro parece ter consolidado seu lugar no segundo turno e não teria mais nada a perder num confronto aberto com Lula: seria a antecipação do debate do segundo turno. A estratégia de Bolsonaro é reduzir sua rejeição e aumentar a de Lula, para ganhar a eleição.

Em princípio, Bolsonaro reafirmou suas posições: manteve as suspeitas sobre as urnas eletrônicas; atacou o Ibama e os ambientalistas que criticam o governo por causa da Amazônia; reiterou seu negacionismo quanto à pandemia, criticou o lockdown e defendeu o tratamento precoce da covid-19 com cloroquina. Tentou resgatar a bandeira da ética ao negar a existência de corrupção no seu governo e capitalizar a queda da inflação, o pagamento do Auxílio Emergencial e geração de empregos. Esse é o rumo da sua campanha. De acordo com essa estratégia, Bolsonaro não subiu o tom contra o ministro Alexandre de Moraes, que, ontem, autorizou uma operação de busca e apreensão contra empresários bolsonaristas suspeitos de envolvimento com disseminação de fake news e articulações golpistas.

ObsComo escrevi a coluna antes da entrevista de Ciro Gomes ao Jornal Nacional, ontem à noite, comentarei seu desempenho na edição de amanhã.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-bolsonaro-ganhou-mais-do-que-perdeu-no-jn/

Tchutchuca do centrão | Imagem: reprodução/Diario da Serra de Maracaju

"Tchuchuca do Centrão": Bolsonaro se revolta e parte para cima de youtuber

Brasil de Fato*

Ouça áudio:

O presidente Jair Bolsonaro (PL) partiu pra cima do youtuber Wilker Leão, nesta quinta-feira (18), na saída do Palácio da Alvorada. O youtuber costuma fazer vídeos provocado apoiadores do presidente e também militantes de esquerda.

Próximo ao carro do presidente, o blogueiro começou a fazer perguntas quando foi empurrado por alguém da segurança de Bolsonaro. Irritado, xingou Bolsonaro de “vagabundo”, “safado”, “covarde” e “tchutchuca do Centrão”. Esse último termo, inclusive, chegou ao topo dos trending topics da rede social no país, sendo o assunto mais comentado na manhã desta quinta.

Bolsonaro entrou no carro, mas não aguentou e saiu e partiu pra cima de Leão, tentando tirar seu celular. Depois do caso, ele chegou a topar conversar com Wilker Leão, de acordo com jornalistas presentes no local.

Assista vídeo:

https://twitter.com/jnascim/status/1560283771613626373?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1560283771613626373%7Ctwgr%5E06b65754525754eabe5c5dbde607a4d1c0f680ea%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.brasildefato.com.br%2F2022%2F08%2F18%2Ftchuchuca-do-centrao-bolsonaro-se-revolta-com-critica-e-parte-para-cima-de-youtuber

Leia a repercussão

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https://twitter.com/LUIZPATRIOTA39/status/1560281213390139393?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1560281213390139393%7Ctwgr%5E06b65754525754eabe5c5dbde607a4d1c0f680ea%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.brasildefato.com.br%2F2022%2F08%2F18%2Ftchuchuca-do-centrao-bolsonaro-se-revolta-com-critica-e-parte-para-cima-de-youtuber
https://twitter.com/henrybugalho/status/1560278845130829824?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1560278845130829824%7Ctwgr%5E06b65754525754eabe5c5dbde607a4d1c0f680ea%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.brasildefato.com.br%2F2022%2F08%2F18%2Ftchuchuca-do-centrao-bolsonaro-se-revolta-com-critica-e-parte-para-cima-de-youtuber
https://twitter.com/PedroOctavioLB/status/1560282746433552384?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1560282746433552384%7Ctwgr%5E06b65754525754eabe5c5dbde607a4d1c0f680ea%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Fwww.brasildefato.com.br%2F2022%2F08%2F18%2Ftchuchuca-do-centrao-bolsonaro-se-revolta-com-critica-e-parte-para-cima-de-youtuber
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*Texto publicado originalmente em Brasil de Fato. Título editado.


Corrida política | Imagem: reprodução/Correio Braziliense

Nas entrelinhas: Agenda de rua esquenta largada das eleições

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

A campanha eleitoral propriamente dita começou ontem, com os candidatos procurando marcar presença nas ruas da forma mais simbólica possível. O ex-presidente Luiz Inácio da Silva (PT) começou a campanha no berço de sua trajetória como líder sindical, uma fábrica de automóveis em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, ao lado dos candidatos da coligação ao governo de São Paulo, Fernando Haddad(PT), e ao Senado, Márcio França (PSB). Ao lado da primeira-dama Michele, o presidente Jair Bolsonaro (PL) lançou sua campanha à reeleição em Juiz de Fora, em Minas, cidade na qual foi esfaqueado, em setembro de 2018, episódio que para muitos analistas foi decisivo para consolidar sua imagem de “mito” predestinado e alavancar sua vitória eleitoral.

Em São Bernardo, Lula ressaltou seus vínculos históricos com os metalúrgicos de São Paulo, relembrou episódios de sua vida sindical e comparou os anos de seu governo com os dias atuais. “Não é por falta de dinheiro, é por falta de vergonha das pessoas que governam. As pessoas não têm sentimentos, não sabem o que é fome, não sabem o que é um cidadão ficar mendigando no seu vizinho por um prato de comida”, disse.

Em Juiz de Fora, no Aeroporto da Serrinha, Bolsonaro se encontrou com pastores evangélicos e discursou para um pequeno grupo de apoiadores. Estava acompanhado também do general Braga Netto, seu vice; e do senador Carlos Viana (PL-MG)), candidato ao governo de Minas Gerais. Depois, de participar de uma “motociata”, discursou de um carro de som, no centro da cidade, defendendo sua pauta conservadora. Falou contra o aborto e a legalização das drogas; citou a Bíblia, fez louvações a Deus e enfatizou a redução do preço dos combustíveis e da inflação.

Pesquisas

Segundo a pesquisa Ipec divulgada na última segunda-feira, o Sul é a única região do país na qual Bolsonaro supera Lula (39% a 36%). Também está em vantagem entre os evangélicos (47% a 29%), entre quem recebe de 2 a 5 salários mínimos (41% a 32%) e quem recebe acima de 5 mínimos (46% a 36%). Há empate técnico entre quem tem ensino superior (Lula 36%, Bolsonaro 35%), na faixa dos 35 a 44 anos (Lula 39%, Bolsonaro 38%) e entre os entrevistados que se declaram brancos (Lula 39%; Bolsonaro 35%).

Lula vence tanto entre as mulheres quanto entre os homens, idade, raça/cor, escolaridade, renda familiar, religião, número de habitantes da cidade, capital, interior ou periferia. Vence disparado entre quem recebe até 1 salário-mínimo (60% a 19%), inclusive entre quem recebe benefícios do governo federal (52% a 27%). Esses números surpreenderam o estado-maior de Bolsonaro, que aposta no pacote de bondades do governo para virar o jogo nas eleições. Apesar do volume de recursos que estão sendo liberados, essa transferência de renda ainda não está repercutindo na ponta ou perdeu impacto, por causa do anúncio antecipado e/ou da inflação.

Outra hipótese é a liberação desses recursos estar sendo atribuída ao favoritismo de Lula nas eleições, o que seria uma leitura política da própria população. Se essa tese for correta, Bolsonaro estará no sal. A estratégia do Centrão, de focar a campanha nos resultados da economia, estará fragilizada, o que fará recrudescer a narrativa do bolsonarismo raiz, que já predomina nas redes sociais. Essa questão está no centro das divergências sobre os programas de radio e tevê de Bolsonaro.

Oportunidade

A propósito, até o próximo dia 26, quando começará o horário eleitoral de radio e tevê, a movimentação de rua dos candidatos pautará a cobertura das eleições pelos meios de comunicação. Tanto Bolsonaro como Lula precisam de grandes aparatos para se movimentar, o que demanda muitos recursos e grande logística, além de cuidados redobrados com a segurança.

Isso também abre uma janela de oportunidade para que os demais candidatos, principalmente Ciro Gomes (6%) e Tebet (2%), tentem sair do canto do ringue em que estão sendo colocados pelas pesquisas. Ambos podem ir às ruas sem a necessidade de grandes aparatos. Embora Ciro Gomes tenha que lidar com desafetos petistas e bolsonaristas, esses conflitos também abrem espaço na mídia. Simone Tebet está sendo “cristianizada” pelos caciques do MDB, porém não precisa de muito aparato para realizar uma boa agenda de rua.

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