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O Estado de S. Paulo: MPF aponta interferência de Bolsonaro no Exército

Procuradores da República abriram duas investigações para apurar ordem do presidente que revoga portarias publicadas pela Força sobre monitoramento de armas e munições

Patrik Camporez, de O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Sob suspeita de ingerência na Polícia Federal, o presidente Jair Bolsonaro entrou agora na mira do Ministério Público Federal (MPF) por indícios de violar a Constituição ao interferir em atos de exclusividade do Exército. Procuradores abriram dois procedimentos de investigação para apurar uma ordem dada por Bolsonaro ao Comando Logístico do Exército (Colog), no último dia 17, que revoga três portarias publicadas entre março e abril sobre monitoramento de armas e munições.

A procuradora regional da República Raquel Branquinho aponta a possibilidade de Bolsonaro ter agido para beneficiar uma parcela de eleitores e que não há espaço na Constituição “para ideias e atitudes voluntaristas” do presidente, ainda que pautadas por “bons propósitos”. O desdobramento do caso pode levar a uma ação de improbidade na Justiça Federal ou à abertura de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF).

As portarias 46, 60 e 61, revogadas pelo comandante do Colog, general Laerte de Souza Santos, por exigência de Bolsonaro, foram elaboradas em conjunto por militares, policiais federais e técnicos do Ministério da Justiça. “Determinei a revogação das portarias (...) por não se adequarem às minhas diretrizes definidas em decretos”, escreveu Bolsonaro no Twitter em 17 de abril.

Essas portarias estabeleciam o controle, rastreabilidade e identificação de armas e munições importadas e fabricadas pela indústria nacional, sob a finalidade de atividades esportivas, de colecionador e também para abastecer os quartéis. Na avaliação dos procuradores, ao revogá-las, o governo facilita o acesso do crime organizado a armas e munições desviadas. “A cidade do Rio de Janeiro é a face mais visível dessa ausência de efetivo controle no ingresso de armamento no País”, observou Raquel Branquinho em ofício obtido pelo Estado.

Ex-braço direito da então procuradora-geral da República Raquel Dodge na área criminal e uma das integrantes do grupo escolhido pelo atual chefe do MPF, Augusto Aras, para atuar na Lava Jato, Raquel Branquinho é considerada uma procuradora linha dura, conhecida por seu trabalho em processos importantes, como o mensalão.

As normas estabeleciam diretrizes para identificação de armas de fogo, bem como para a marcação de embalagens e cartuchos de munições. Umas das regras revogadas, por exemplo, determinava que armas apreendidas pela Justiça cuja identificação tenha sido suprimida ou adulterada poderiam ganhar uma nova numeração.

O pedido de investigação foi enviado por Raquel Branquinho no dia 20 deste mês ao chefe da Procuradoria da República no Distrito Federal, Claudio Drewes José de Siqueira. No ofício, a procuradora argumenta que Bolsonaro fere princípios constitucionais.

“Ao assim agir, ou seja, ao impedir a edição de normas compatíveis ao ordenamento constitucional e que são necessárias para o exercício da atividade desempenhada pelo Comando do Exército, o Sr. Presidente da República viola a Constituição Federal, na medida em que impede a proteção eficiente de um bem relevante e imprescindível aos cidadãos brasileiros, que é a segurança pública, e possibilita mecanismos de fuga às regras de controle da utilização de armas e munições”, escreveu Raquel Branquinho.

Agora, o MPF vai avaliar os motivos da conduta de Bolsonaro de determinar a derrubada das portarias do Exército. Numa avaliação inicial, Raquel Branquinho entendeu que a finalidade da revogação das portarias pode ter sido a de “atender uma parcela de eleitores.”

Procuradores ouvidos pelo Estado sob a condição de anonimato observaram que o texto de cancelamento das portarias, publicado no Diário Oficial da União, no dia 17, não apresentou motivação. “Caso o Exército não apresente justificativas plausíveis, que não seja uma postagem do presidente no Twitter, tudo fica ainda mais grave”, disse um procurador.

‘Voluntarismo’

A tentativa de ingerência de Bolsonaro num órgão de Estado foi o argumento usado pelo ex-ministro Sérgio Moro para pedir demissão na sexta-feira passada. O ex-juiz da Lava Jato acusou o presidente de tentar interferir politicamente ao trocar o delegado-geral da Polícia Federal e de cobrar acesso a relatórios sigilosos de inteligência.

Ao analisar o caso envolvendo o Exército, Raquel Branquinho diz “não restar dúvidas” da competência da Força na fiscalização de armas e munições. A procuradora ressalta, ainda, que a atitude de Bolsonaro nesse caso de derrubada das portarias “representa uma situação extremamente grave” e que tem o potencial de agravar a crise de segurança pública vivenciada no País. Outro risco, argumenta, é que organizações criminosas podem ser “fortalecidas na sua estrutura operacional, abastecidas por armas e munições, cujas origens são desconhecidas pelo Estado”.

Outra frente

Além do procedimento aberto a pedido de Raquel Branquinho, uma outra frente para apurar interferência de Bolsonaro no Exército foi iniciada em conjunto pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e pela Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional (7.ª CCR). Os dois órgãos são vinculados diretamente à chefia da Procuradoria-Geral da República (PGR), mas podem abrir processos sem passar pelo comando do órgão.

Neste procedimento, os procuradores Deborah Duprat e Marlon Alberto Weichert, dos Direitos do Cidadão, e Domingos Sávio Dresch da Silveira, da 7.ª CCR, pediram, no dia 20 último, explicações ao Comando Logístico do Exército para prosseguirem no trabalho. Eles querem saber se o órgão vai admitir a suposta ingerência do presidente. No ofício ao general Laerte de Souza Santos, comandante Logístico do Exército, os procuradores solicitam ainda o envio da cópia integral do procedimento de origem da portaria que revogou os atos.

Os procuradores ressaltam que as portarias revogadas concretizavam os princípios estabelecidos pelo Estatuto do Desarmamento e seus regulamentos e “preenchiam relevante lacuna” na regulamentação do rastreamento de produtos controlados pelo Exército. “Essas providências, imprescindíveis para a fiscalização do uso de armas de fogo e para a investigação de ilícitos com o emprego de armas de fogo, eram reclamadas por especialistas em segurança pública e também pela Procuradoria Federal”, diz trecho do ofício.

Defesa e Planalto

Procurados durante o fim de semana, o Ministério da Defesa e a Presidência da República não se manifestaram.

PARA ENTENDER: Portarias Revogadas

As três portarias revogadas pelo Comando Logístico do Exército (Colog) foram elaboradas por integrantes do Exército, Ministério da Justiça, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal. As discussões duraram mais de um ano e tiveram como base dados fornecidos por instituições públicas e organizações civis.

Editadas entre março e abril, as portarias 46, 60 e 61 estabeleciam controle, rastreabilidade e identificação de armas e munições importadas e fabricadas pela indústria nacional, sob a finalidade de atividades esportivas, de colecionador e também para abastecer os quartéis. O Ministério Público Federal abriu dois procedimentos de investigações para apurar a revogação dos atos.


El País: SUS e planos de saúde ainda não acertaram regras para distribuir leitos

ANS libera 15 bilhões de fundo emergencial para operadoras. Atendimento de inadimplentes está condicionado a renegociação do contratos. “É um cheque em branco", critica pesquisador

Prestes a alcançar o pico de contágio por coronavírus, previsto pelo Ministério da Saúde para as semanas entre abril e maio, o Brasil ainda não tem uma coordenação entre SUS e rede privada para ampliar a capacidade de assistência e o número de leitos hospitalares, principalmente de UTIs (unidades de terapia intensiva). O país, que já registra 941 óbitos por Covid-19 e 17.857 casos, pode chegar ao colapso de ambos sistemas de saúde ainda este mês. Uma nota técnica da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostrou que, se 0,1% dos brasileiros estiverem contaminados até o fim de abril já haverá falta de leitos. E esse é o cenário otimista. Na projeção mais pessimista, com 1% da população infectada até o final do mês, 53% das microrregiões (agrupamentos de municípios) colapsariam. Ao mesmo tempo, os planos de saúde enfrentam uma “incerteza” com o aumento exponencial de seus gastos e confirmam, nas entrelinhas, que isso pode ser repassado para o bolso do consumidor.

“Os custos incorridos em um exercício servem de parâmetro para definir os valores das mensalidades no exercício seguinte. Logo, as variações de volumes de utilização e custos dos procedimentos médicos durante a pandemia serão consideradas nos cálculos vindouros”, explica Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), que reúne empresas do setor. Ela ressalta, no entanto, que ainda não é possível estimar a magnitude desses gastos e de seu impacto no valor dos planos. Anualmente, as operadoras, que atendem cerca de 47 milhões de pessoas, vêm segundo autorizadas a aumentar as mensalidades acima da inflação.

“É evidente a necessidade de ampliar o investimento na instalação de novos leitos clínicos e de UTI, em aquisição de novos equipamentos, bem como em assistência ambulatorial. Por outro lado, é preciso garantir esses recursos financeiros, necessários para o adequado atendimento. O aumento de demanda por serviços médicos em decorrência da disseminação do novo coronavírus fez crescer também as despesas relacionadas, o que exige um reforço de caixa às operadoras”, informa, em nota, a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde).

Os 32.000 leitos de UTI para adultos no país, divididos praticamente ao meio entre os sistemas público (cerca de 163 milhões de pessoas dependem dele) e privado, e existentes em apenas 500 municípios, já funcionavam com mais de 80% de ocupação antes da pandemia —no SUS, entretanto, essa taxa é mais alta: fica entre 90% e 95% habitualmente, segundo a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB). Na semana passada, o Ministério da Saúde afirmou, através do secretário-executivo João Gabbardo, que está monitorando tanto os leitos públicos quanto os particulares. “Se [o SUS] precisar [de leitos privados], vai usar”, reiterou Luiz Henrique Mandetta, ministro da Saúde, mas essa solicitação, segundo apurou o EL PAÍS, ainda não foi feita. No Ceará, um dos principais focos da doença no país, o Governo do Estado tomou para uso emergencial o hospital privado Hospital Leonardo da Vinci, que dispõe de 230 leitos de internação e de UTI. O local, entretanto, estava fechado havia 13 anos.

Em 13 de março, o Ministério da Saúde publicou orientações para adiar cirurgias eletivas e demais procedimentos não urgentes, com o objetivo de liberar mais leitos para pacientes com Covid-19. A Abramge ressalta que eles “serão realizados em algum momento”, e que há o risco de uma “avalanche” de procedimentos. “Isso exigirá recursos que seriam despendidos em meses, em poucos dias”, diz a nota. Uma semana depois, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), tida como sob forte influência do setor que deveria regular, anunciou a liberação de cerca de 15 bilhões de reais de um fundo garantidor aos planos de saúde, para afiançar sua solvência durante a crise. Esse valor corresponde a 20% de um fundo formado para emergências com dinheiro das próprias operadoras privadas, que há anos vêm pleiteando sua liberação pelo Governo. Na quarta-feira (08/04), a ANS acrescentou que, para ter acesso a esse recurso, as operadoras terão que assinar um termo comprometendo-se a atender usuários inadimplentes durante a pandemia desde que eles renegociem suas dívidas. Em princípio, a medida será válida até 30 de junho, mas depende da adesão das empresas.

Mario Scheffer, pesquisador da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), critica a decisão de flexibilizar o acesso a esse capital. “É um cheque em branco, porque os planos de saúde não apresentaram nenhum plano de uso desse capital. Essa ajuda deveria fazer com que o valor das mensalidades fosse reduzido. É o que várias escolas particulares, por exemplo, estão fazendo. Além disso, o ajuste dos planos deste ano nada têm a ver com a crise do coronavírus", diz o especialista.

Scheffer lembra que 80% dos planos de saúde são coletivos, feitos por sindicatos ou empresas, que, devido à crise, podem ficar inadimplentes. “As operadoras precisam ter um plano para lidar com essa inadimplência, devem criar uma moratória para as rescisões. E deveria ser proibida a rescisão unilateral do contrato por parte dos planos”, argumenta. O pesquisador também defende uma “regulação única de vagas, principalmente dos leitos de UTIs”, sob comando do SUS. “Em momentos como esse, de emergência sanitária, a rede privada deve subordinar-se ao Governo”, afirma.

O advogado Frederico Barbosa, sócio da consultoria estratégica BPGA, concorda em parte com Scheffer. “O Governo poderia vincular a liberação do dinheiro do fundo garantidor ao aumento da capacidade de leitos para o SUS. Poderia ser uma proposta, por exemplo, de 70% dos leitos para o SUS e 30% para a rede privada, hipoteticamente falando”.

Barbosa é um dos autores de uma proposta apresentada ao Ministério da Saúde —e ainda sem resposta— de parceria entre o SUS e os planos de saúde para gerir a escassez de leitos. Ele argumenta que, apesar de o Ministério da Saúde poder requisitar até mesmo todos os leitos privados diretamente aos hospitais, indenizando-os por possíveis prejuízos, isso seria “traumático”, pois deixaria os usuários dos planos sem atendimento. “Uma transferência mais eficiente envolveria apenas a cessão parcial de leitos existentes e a serem implantados pelos hospitais privados, por meio de um protocolo para a equidade dos leitos em ambos sistemas. Na prática, isso implicaria a transferência urgente e transitória de leitos privados para atendimento das necessidades do SUS”, diz.

Barbosa acredita que esse protocolo incentivaria a expansão do número total de leitos, principalmente com o apoio das operadoras de saúde, porque ficaria clara a responsabilidade do SUS em pagar à rede hospitalar privada pelos leitos que lhe fossem transferidos os mesmos valores pagos pelos planos de saúde. “Assim, as operadoras gastam menos e o SUS também pagaria por esses leitos um preço menor do que aquele que seria indenizado diretamente aos hospitais particulares”, explica.


Ricardo Noblat: O Palácio do Planalto virou um puxadinho do QG do Exército

Ou não, segundo o Exército

Seus colegas de farda ainda se lembram dos argumentos esgrimidos pelo general Walter Souza Braga Netto em 2018 quando ele era Interventor Federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro depois de ter sido Comandante Militar do Leste.

Nas reuniões, em Brasília, do Alto Comando do Exército, Braga Neto se destacava por defender a tese de que a Arma à qual servia com muito orgulho deveria manter-se distante das eleições, especialmente do candidato Jair Bolsonaro.

Que a soldadesca reverenciasse o ex-capitão, afastado do Exército por indisciplina e conduta antiética, tudo bem. Ou melhor: ninguém poderia impedi-la de agir assim. Mas não faria bem à imagem do Exército se oficiais se comportassem da mesma forma.

Como Braga Neto, sempre pensou a maioria do Alto Comando – à frente o general Eduardo Villas Boas. Contudo, quando a vitória de Bolsonaro desenhou-se como quase certa, alguns generais debandaram ostensivamente para o lado dele.

Foi um desses generais, o atual ministro da Secretaria de Governo Luiz Eduardo Ramos, quem ajudou Bolsonaro a convencer Braga Neto para que aceitasse a vaga de Chefe da Casa Civil da presidência da República aberta com a saída de Onyx Lorenzonni.

O anúncio do nome de Braga Neto só foi feito ontem porque Bolsonaro quis saber antes do Comandante do Exército, general Edson Pujol, e do ministro da Defesa, general Fernando Azevedo, se o Exército estava de acordo com a escolha que ele fizera.

Os dois responderam que sim. Braga Neto será o segundo general da ativa a ter um cargo no governo. O primeiro foi Eduardo Ramos, que continua na ativa. O Palácio do Planalto virou uma espécie de quartel. Ali, doravante, só haverá ministros militares.

Em nenhum governo anterior foi assim – nem na época da ditadura e dos seus generais-presidentes. Dos 22 ministros de Bolsonaro, seis são militares. De 1964 para cá, a Casa Civil coube a 27 civis e apenas a um militar. Braga Neto será o segundo.

Generais da reserva presidem os Correios, a Itaipu Binacional, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes. Um coronel, a Telebrás. Um delegado, a Agência Brasileira de Inteligência.

Nos primeiros nove meses de governo, segundo levantamento da Folha de S. Paulo, havia pelo menos 2.500 militares em cargos de chefia ou de assessoramento. Bolsonaro admite que há “civis excepcionais”. Mas prefere a companhia de fardados e ex-fardados.

“A gente (os militares) tem a característica de ser muito quadradinho, mais cartesiano”, disse ao GLOBO o general Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo. E completou: “É o que o presidente quer. O político tem que pensar em política”.

É Ramos que cuida da coordenação política do governo. Faz o meio do campo com deputados, senadores e governadores. Aprende rápido. Onyx prometera 40 milhões de reais por cada voto pela aprovação da reforma da Previdência. Foi o general que pagou.

Em tempo: por seus porta-vozes formais e informais, o Exército renova o aviso de que nada tem a ver com o governo Bolsonaro, como nada teve a ver com governo nenhum da redemocratização do país em 1985 para cá. Atém-se ao que manda a Constituição.

Para calar a voz da oposição, fora com ela!

Conselho da Amazônia

Sabe por que o presidente Jair Bolsonaro pôs seu vice, o general Hamilton Mourão, no comando do Conselho da Amazônia Legal e, do conselho, expurgou os 9 governadores da Amazônia Legal?

Pôs Mourão para dar-lhe algum tipo de ocupação menos decorativa. Um vice sem ter o que fazer sempre preocupa presidente muito ocupado. Esse não é bem o caso de Bolsonaro, mas, vá lá.

Expurgou os 9 governadores porque 7 deles são da oposição ou independentes demais para seu gosto. Mourão promete ouvi-los sobre os problemas da Amazônia, mas separados.


Marcos Lisboa: O exemplo do general

O que parece importar para Villas Bôas

Noite. Depois de deitado na cama, não há nada a fazer. Não há como se levantar e passear pela casa ou mesmo mover os braços para ler um livro.

Na imensidão da noite, resta apenas recontar o passado. A doença inviabiliza os músculos, porém não o cérebro. Pode-se pensar, mas não coçar o nariz.

Existem muitas variações da doença. A mais conhecida tem o nome de um jogador de beisebol, Lou Gehrig.

Famoso pela vitalidade, foi apelidado de “cavalo de ferro” e admirado pela sua técnica e tenacidade. Participou de 2.130 jogos consecutivos, façanha que apenas foi batida em 1995, 56 anos depois. Seus muitos recordes tornaram-no celebridade. Apesar disso, despediu-se da vida nomeando uma síndrome devastadora.

Em 1939, aos 35 anos, Gehrig pediu para ficar no banco de reservas. A força nos braços e nas pernas se esvaia. Ele foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica (ELA) e o prognóstico era de morte em três anos.

Em sua despedida no estádio de basebol, Gehrig foi aclamado por uma multidão: “Nas últimas duas semanas, vocês têm lido sobre o golpe do azar que recebi. No entanto, hoje me considero o homem mais sortudo do mundo”.

No discurso, ele agradece às pessoas com quem tivera a sorte de conviver, e elas eram muitas. Gehrig morreu dois anos depois. Ele tinha 37 anos.

Tony Judt escreveu um livro monumental sobre a Segunda Guerra Mundial e a Europa da segunda metade do século 20. São muitos os dados surpreendentes. A Alemanha de Hitler, por exemplo, precisou de menos de 2.000 servidores para administrar a França ocupada. A resistência de verdade ao nazismo ocorreu na Europa do leste.

Há pouco mais de dez anos, Judt descobriu que sofria da mesma doença que afligiu Lou Gehrig. O historiador, devastado pela doença, ignorou a revolta. Preferiu passar suas noites longas resgatando memórias para ditá-las na manhã seguinte.

Seus artigos foram publicados na New York Review of Books. Foi lá que me surpreendi com o perturbador e comovente “Noite”, que veio a ser o primeiro capítulo do seu último livro, “Chalé da Memória”.

Conheci o general Villas Bôas já em meio a sua longa noite. A máscara de oxigênio dificulta-lhe a fala, mas não os argumentos. O homem gentil e curioso queria ouvir sobre a economia e os nossos desafios. Encontrei-o mais tarde em seminários de dia inteiro em que se discutiam temas de política pública, como educação.

Impressionou-me assistir ao ex-comandante do Exército atento aos temas técnicos e querendo conversar com quem pensa diferente. A sua força não está nos braços e nas pernas. Está na compaixão. Está na compaixão. O enfrentamento dos problemas que afligem a maioria, em meio a intrigas bizarras da corte, parece ser o que importa para o general durante a sua longa noite.

*Marcos Lisboa é presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005) e doutor em economia.


O Globo: Pensionistas de militares ganham até R$ 58 mil por mês

Acúmulo de benefícios custa R$ 5 milhões mensais; gastos com pensões de filhas casadas impactam em mais de R$ 200 milhões aos cofres públicos

Por André de Souza, de O Globo

BRASÍLIA — Em meio ao debate sobre a reforma da Previdência, as pensionistas de militares não têm muito do que reclamar. Há na Aeronáutica e no Exército pelo menos 281 mulheres acumulando duas pensões. Elas custam aos cofres públicos mais de R$ 5 milhões por mês, recebendo, em média, quase R$ 19 mil mensais cada uma. Na Marinha, elas são 345, mas não há informações sobre valores. São, em geral, viúvas que, por serem filhas de militares, tiveram direito a duas pensões: dos maridos e dos pais. Na ponta de cima da tabela está uma pensionista da Aeronáutica que recebe todo mês mais de R$ 58 mil.

Além dos pagamentos em dobro para uma mesma pensionista, há um outro aspecto do benefício que fará com que ele continue pesando nas contas públicas por décadas. Até o fim de 2000, qualquer filha de militar falecido tinha direito à pensão, independentemente da idade. Houve então uma mudança na lei, extinguindo o benefício. Quem já recebia, contudo, continuou recebendo. E uma brecha permitiu que novos benefícios fossem autorizados.

Hoje são cerca de 110 mil filhas pensionistas nas três forças. Dados parciais obtidos pelo GLOBO referentes a 37,8 mil mulheres mostram que pouco menos de 23 mil, ou três de cada cinco, conseguiram o benefício após a mudança na lei.

Limite desde 2000
Isso ocorre porque o direito à pensão é definido pela data de entrada do militar em uma das três Forças, e não pela data da morte dele. Desde o fim de 2000, a pensão é garantida apenas a filhos ou enteados de até 21 anos, ou 24 se forem estudantes universitários. Mas, no caso de militares que ingressaram no Exército, Marinha ou Aeronáutica até aquele ano, suas filhas ainda poderão ter o benefício, ainda que os pais venham a morrer só daqui a 50 anos. Para isso, é preciso apenas que o militar pague uma contribuição adicional de 1,5%.

Os dados são da folha de julho de 2018, podendo variar mês a mês, e foram obtidos pelo GLOBO em setembro e outubro após um ano e oito meses solicitando-os por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Eles foram repassados somente depois que a Controladoria-Geral da União (CGU) aceitou um recurso e mandou as três forças levantarem as informações pedidas. A Marinha, cujo prazo para responder terminou em outubro, não cumpriu a decisão.

No caso das mulheres que recebem mais de uma pensão, são 221 na Aeronáutica e 61 no Exército. Os maiores valores são pagos a uma pensionista nascida em 1935. Em 1993, ela obteve da Aeronáutica o direito a uma pensão de R$ 27.254,45. Em 2016, conseguiu outra de R$ 30.999,62, fazendo com que seus vencimentos superem os R$ 58 mil. No Exército, a campeã de rendimentos nasceu em março de 1935, recebendo mais de R$ 52 mil por mês.

A concessão da pensão a filhas de militares passou por várias fases. Uma lei de 1960 permitia o benefício "aos filhos de qualquer condição, exclusive os maiores do sexo masculino". Em outras palavras, podia até mesmo ser casada. Em 1991, a lei foi modificada e passou a permitir apenas filhas solteiras. Mas em 1993 o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou essa alteração inconstitucional e as casadas voltaram a ter o benefício. Em 28 de dezembro de 2000, a lei foi mudada novamente extinguindo o benefício daquele ponto em diante.

O GLOBO também solicitou, via Lei de Acesso, informações sobre os benefícios pagos às filhas casadas. Os dados mostram claramente que a extinção da pensão em 2000 não impediu que ela continuasse sendo concedida. No Exército, são 31.630 filhas casadas que recebem ao todo quase R$ 200 milhões por mês. Delas, 18.182 tiveram a pensão concedida após lei que a extinguiu, recebendo mensalmente mais de R$ 108 milhões. Na Aeronáutica são 6.162, uma despesa de cerca de R$ 35 milhões por mês. Delas, 4.724 obtiveram o benefício após a alteração na legislação no fim de 2000, recebendo no total mais de R$ 26 milhões por mês.

O GLOBO excluiu dos cálculos pensionistas que tinham até 24 anos em julho de 2018, uma vez que, mesmo pela nova lei, elas continuam tendo direito à pensão caso sejam universitárias. A maior parte nasceu nos anos 40, 50 e 60, mas a variação de idade é grande, havendo até mesmo algumas centenárias e outras bem mais jovens. À medida que o tempo passar e elas morrerem, o total gasto com as pensões de filhas de militares vai diminuir, mas num ritmo mais lento do que o esperado justamente em razão de novos benefícios que ainda poderão ser concedidos.

Em maio do ano passado, o GLOBO mostrou que, segundo o próprio Exército, os gastos da força com o pagamento de pensões de filhas de militares, que hoje ultrapassam os R$ 5 bilhões por ano (incluindo tanto as solteiras como as casadas), ainda serão elevados em 2060. A partir de dados fornecidos pelo Exército, foi possível estimar que a despesa daqui a 41 anos ainda estará próxima a R$ 4 bilhões.

O economista Pedro Fernando Nery, consultor legislativo do Senado, sugere como medidas para minimizar o déficit das pensões um aumento das alíquotas dos militares de 1,5% para 6%, e a criação de uma contribuição para as próprias pensionistas. Elas passariam a ter um desconto dos benefícios, no valor de 11%. Nas estimativas do economista, isso poderia gerar uma receita de cerca de R$ 2 bilhões.

— No serviço público, pensionista contribui. Pensionista de militar não. Essa é uma alternativa para essas pensões — afirmou Pedro Nery, acrescentando: — Em que pese a defasagem salarial da carreira militar, os benefícios são maiores mesmo do que a média do serviço público. Muitos países diferenciam a carreira, mas se aposentar cedo com integralidade e deixar pensão vitalícia pra filha não é comum.

Em maio do ano passado, o Exército informou ter gasto R$ 407,1 milhões na folha de abril de 2018 com essas pensões, o que representa um gasto anual de mais de R$ 5 bilhões. Todas as receitas previdenciárias das três forças ao longo de 2018 — e destinadas ao pagamento desse e outros benefícios — ficaram bem abaixo disso: R$ 2,36 bilhões.

Se incluídos todos os gastos previdenciários, como aposentadorias, de Exército, Marinha e Aeronáutica, a despesa total foi de R$ 46,21 bilhões em 2018. Como a receita foi bem menor, o déficit chegou a R$ 43,85 bilhões. Em 2017, o déficit, embora grande, foi consideravelmente menor: R$ 38,85 bilhões. Proporcionalmente, é um rombo maior do que entre os servidores civis federais e muito acima do que o registrado entre os trabalhadores atendidos pelo INSS.

Por meio da assessoria de imprensa, a Marinha afirmou que o órgão se encontra em fase de transição, que as filhas casadas que ganham pensão têm direito adquirido e que, por questões judiciais, podem acessar o benefício. A Aeronáutica, por meio da assessoria de imprensa, se recusou a comentar o assunto. O Exército não retornou o pedido da reportagem.


Eliane Cantanhêde: O cheiro do poder

O Exército está irritado com o filho, mas quem gerou a crise foi o pai presidente

Nunca antes neste País se viu uma mera troca de chefia do Centro de Comunicação do Exército (Cecomsex) se transformar num super evento, não apenas pela grande presença de militares e civis como também pela duração. O papo foi longe.

O general que entra é Richard Nunes e o que sai é Otávio do Rêgo Barros, que virou porta-voz do presidente Jair Bolsonaro. Esse foi um chamariz para a solenidade e pesou também a eficiência e a gentileza no trato de Rêgo Barros com a mídia, mas o fator principal para o sucesso foi a força do Exército neste momento. Todo mundo sente o cheiro do poder.

Atenção: está-se falando especificamente do Exército, não genericamente dos militares ou das Forças Armadas. Aliás, uma curiosidade da transmissão de cargo é que, naquela selva verde, só havia uma farda azul da FAB e uma branca da Marinha. Eram os dois oficiais da imprensa nas duas Forças, que riam quando alguém brincava que pareciam “peixes fora d’água”.

O Exército está em alta. Ocupa quase todos os postos do Planalto e, além de não criar problemas, tem de resolver problemas criados pelos outros. Inclusive, ou principalmente, pelo próprio presidente e seus três filhos, o 01, o 02 e o 03. Numa fase da ditadura, quando cutucavam o presidente Figueiredo, ele ameaçava acionar o ministro do Exército, linha dura: “Chama o Pires!”. Agora, quando é preciso segurar os filhos do presidente, os generais gritam por um moderado: “Chama o Heleno!”.

No centro da festa, estavam justamente os generais Augusto Heleno, chefe do GSI e apagador-geral de incêndios da República, e Eduardo Villas Bôas, que o assessora no GSI. Ambos têm enorme responsabilidade para salvar o barco, que está sacudindo depois que o PSL foi flagrado fazendo peraltices e o filho 02 do presidente, Carlos Bolsonaro, desmentiu pelo twitter o ministro Gustavo Bebianno, presidente do partido nas eleições e agora sob risco de cair da Secretaria-Geral da Presidência e “voltar às origens”.

Todos ali sabiam que, num clima como esses, só uma pessoa tem coragem, legitimidade, respeito e jeito para alertar o presidente contra o excesso de poder dos filhos e para o excesso de problemas que eles estão jogando no colo do pai. Esta pessoa é Heleno. Os militares recorrem a ele, a quem cabe dizer verdades difíceis a Bolsonaro.

Na crise de Bebianno, porém, quem matou a charada foi o Estado, ao recompor a cronologia da quarta-feira, que deveria ser de comemoração da alta de Bolsonaro e virou uma guerra entre o filho do presidente e um dos únicos civis com algum poder no Planalto.

E qual foi a charada? Os mundos político, militar e econômico passaram o dia crucificando Carlos Bolsonaro por ter tido a audácia e o voluntarismo de atacar um ministro. Mas a história é diferente. Primeiro, o presidente desmentiu Bebianno ao gravar a entrevista para a TV Record ainda no Hospital Albert Einstein. Só depois, enquanto o presidente voava para Brasília, Carlos divulgou o desmentido do pai pelo twitter, inclusive com o áudio em que ele se recusa a falar com Bebianno. Por fim, Bolsonaro retuitou o ataque de Carlos.

Ou seja: todo mundo incomodado, aflito e preocupado com o ato de Carlos, mas o problema era outro: não foi o filho quem gerou o problema, nem foi o pai quem tomou partido dele a posteriori. Foi o presidente quem atacou o ministro, Carlos só amplificou a posição do pai. Logo, Carlos não age da própria cabeça, ele é a voz do presidente.

Conclusões: 1) desta vez, o problema não foi Carlos, foi Jair; 2) Bebianno está frito, mas ele também tem muito óleo na frigideira; 3) Se é assim com Bebianno, o que será com os demais? 4) Heleno pode fazer queixa de Carlos para Jair, mas pode dar uma bronca no presidente?


Merval Pereira: O risco militar

A presença de militares, da ativa e da reserva, em postos eminentemente civis chama a atenção no primeiro ministério do presidente Jair Bolsonaro, ele próprio um capitão da reserva do Exército. O cientista político Octavio Amorim Neto, professor da EBAPE/FGV, em artigo intitulado “O Governo Bolsonaro e a Questão Militar”, analisa essa “ampla fatia de poder” dos militares com cautela, advertindo para as consequências que podem afetar tanto a democracia brasileira quanto a própria corporação militar.

Estejam ou não exercendo funções, os militares têm, quase sempre, visões de mundo e preferências semelhantes, comenta Octavio Amorim Neto. Além disso, a população e as elites civis percebem e tratam os militares como um grupo coeso, usem ou não farda.

A ressalva que faz lembrando que os oficiais de alta patente hoje em dia diferem muito dos que lideraram o regime de 1964-1985, sendo mais liberais em temas econômicos e mais comprometidos com a democracia e os ditames constitucionais, não o impede de levantar duas questões relevantes: o grau de controle dos militares pelos civis (ou o grau de subordinação dos militares à autoridade política dos civis) e a elaboração e orientação da política de defesa.

“Não há democracia quando as Forças Armadas vetam decisões governamentais que não digam respeito à defesa nacional”, ressalta o cientista político da Fundação Getúlio Vargas do Rio. Ele admite que, até o momento, não se pode dizer que o Brasil esteja sob tutela militar, mas acha que o risco existe, sobretudo “se a corporação castrense contribuir decisivamente para a derrota da reforma da Previdência”.

A partir do final do século passado, muita coisa começou a mudar nas relações civis-militares em geral e no papel dos civis na política de defesa em particular, e Octavio Amorim Neto ressalta (1) a criação do Ministério da Defesa em 1999; (2) a publicação da Estratégia Nacional de Defesa em 2008, redigida tanto por civis como por militares; (3) o início, em 2009, de um amplo e ambicioso programa de reaparelhamento das Forças Armadas; (4) a promulgação da Lei da Nova Defesa em 2010; e (5) a publicação do primeiro Livro Branco da Defesa Nacional em 2012, escrito com considerável participação de civis.

“Aqueles fatos e eventos indicavam claramente o fortalecimento do controle dos militares pelos civis, um maior envolvimento destes na elaboração da política de defesa e uma maior saliência desta na agenda política nacional”, comenta Octavio Amorim Neto.

Além de evitar golpes de Estado, Octavio Amorim Neto diz que as elites democráticas têm “a obrigação de remover os militares da política, privando-lhes de qualquer veto às decisões de governo que não digam respeito à defesa nacional e reduzindo drasticamente sua autonomia”, estabelecendo assim a supremacia civil.

A eleição de Bolsonaro tem, como primeira consequência, a suspensão dessa etapa da transição para a democracia que os militares estavam aceitando até o momento. Octavio Amorim Neto pergunta: como ficará a participação dos civis na gestão do Ministério da Defesa e na elaboração da política de defesa, já que, desde fevereiro de 2018, o MD tem sido chefiado por um general?

Ele está convencido de que essas duas áreas ficarão sob total controle dos militares. “O Congresso e os partidos aceitarão passivamente isso?”. Outra questão que inquieta Octavio Amorim Neto: as Forças Armadas se concentrarão quase que exclusivamente em missões internas ao território nacional, sobretudo nas frequentes operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO)?

Os comandantes do Exército sempre afirmam que GLO é desvio de função e que gostariam de concentrar-se em suas tarefas precípuas. Contudo, lembra Octavio Amorim Neto, será que realmente crêem que, com tal presença de militares no governo em atividades eminentemente civis, haverá fortes incentivos para que as Forças Armadas se dediquem prioritariamente às suas missões fundamentais, nomeadamente a defesa das fronteiras nacionais, a manutenção da paz na América do Sul, o apoio à política externa e a prontidão para guerras interestatais?

Para Octavio Amorim Neto, “a história é farta em exemplos que mostram que, quando as Forças Armadas de um país passam a exercer excessivamente atividades políticas, o aprestamento (efetividade) militar é a primeira baixa”.

Correção:
O encontro do General Vladimir Padrino Lopez, ministro da Defesa da Venezuela, com então ministro da Defesa brasileiro, General Joaquim Silva e Luna, aconteceu em Caracas, e não em Brasília como escrevi ontem.


Mario Sergio Conti: O Haiti é aqui

As marcas da intervenção militar brasileira para apoiar um governo golpista

O governo Bolsonaro adquire feições militares a cada dia que passa. A última contagem, feita pela Folha, detectou 45 oficiais no primeiro e segundo escalões. São sete ministros, o porta-voz, diretores, gerentes, montes de assessores, chefes na Petrobras, nos Correios e na Funai.

A blitzkrieg deu um chega para lá nos evangélicos fanáticos, nos falcões neoliberais, nos trumpeteiros, nos udenistas de capa preta, no baixo clero e na bruta prole presidencial —a caserna virou a alma do governo. Tal armação não é legado da ditadura.

O PT reinventou os militares. Em que pese aos salamaleques de Sarney, Collor e FHC, eles estavam no desvio desde 1985. Não foram incriminados pelas atrocidades da ditadura, mas mofavam em casernas. O PT os tirou de lá e lhes conferiu uma missão nobre, intervir no Haiti.

Foi a mais longa operação militar da nossa história: 13 anos. Foi a que envolveu o maior contingente humano: 37 mil homens, contra 25 mil na Força Expedicionária na Itália. Foi a única missão na qual Brasil teve autorização para empregar força física.

A ingerência imposta aos haitianos foi sobretudo aquilo que Lula disfarçou: atentado à soberania de uma nação pobre; apoio a um governo fantoche; defesa dos privilégios de uma elite rapace.

A intromissão está sintetizada em “The Big Truck that Went By” (St. Martin’s Press, 320 págs.), de Jonathan Katz. Contudo, o tema do livro é outro. Partindo do terremoto de 2010, no qual 250 mil haitianos morreram, ele disseca a corrupção de grandes empresas e ONGs filantrópicas.

A conclusão de Katz, o único jornalista estrangeiro em Porto Príncipe no dia do sismo, está no subtítulo: “Como o mundo quis salvar o Haiti e provocou um desastre”. Amoldado, o subtítulo caberia à ação brasileira: “O Exército brasileiro foi salvar o Haiti, mas salvou-se a si mesmo”.

Jean-Bertrand Aristide, um ex-padre da teologia da libertação, foi o primeiro presidente eleito do Haiti. Derrubado por militares, voltou ao poder e tomou uma medida extremada para evitar futuros golpes: acabou com as Forças Armadas. Não deu certo.

Grupos paramilitares, gangues e a elite local o afrontaram. Mercenários americanos sequestraram Aristides e o despacharam para o exílio. Milhares dos seus adeptos foram assassinados.

Sob a orientação dos Estados Unidos, a ONU articulou a criação de uma força internacional e a encarregou de policiar o pobre Haiti. Foi esse triste papel, o de caudatário de um golpe, que coube ao Brasil.

Por que Lula topou? Porque embarcara na mística do país unido em torno de si, o líder popular pró-mercado. Ao Brasil apaziguador caberia um assento no Conselho de Segurança da ONU.

Ele também quis dar serventia aos milicos. A utilidade começaria em Cité Soleil e acabaria na Rocinha. O poder armado seria usado contra pardos, pobres e pretos lá fora, para depois aplicá-lo em favelas.

Por fim, a missão no Haiti obteve o apoio de duas bêtes noires do bolsonarismo, além do PT —a ONU, organização que o capitão tachou de “comunista”, e a Cuba de Fidel Castro.

A missão mobilizou a elite do Exército. Oficiais sêniores saíram de quartéis mecanizados, escolas de alto comando e academias militares. Reequipadas com badulaques de primeira, as tropas receberam salários em dobro.

“A experiência foi fundamental para a atual geração de oficiais do Exército brasileiro”, disse o primeiro comandante da missão de paz, general Augusto Heleno Pereira.

Bolsonaro o tornou ministro —e recrutou para o governo outros quatro comandantes da missão haitiana.
“A América Latina tem menos guerras que a Suíça e mais generais que a Prússia”, disse certa vez Fidel Castro. Acrescente-se que a experiência internacional de militares muitas vezes prefigura o uso da força internamente.

No Império Romano, milicos vitoriosos no exterior voltavam para casa e viravam ditadores —vide Júlio César. Na França revolucionária, um general corso liderou campanhas na Itália e no Egito antes de se sagrar imperador.

Nos anos 1930, o general Franco se amotinou no Marrocos e liderou a guerra civil contra a República proclamada em Madri. Nesses três casos, e no Haiti, militares disciplinaram povos distantes e depois se voltaram contra quem os deu poder.

O anjo da história continua a contemplar as ruínas do mundo se acumularem a seus pés. Resta ver, então, como os egressos da missão haitiana, que formam a espinha dorsal do governo Bolsonaro, reagirão aos atos do capitão que nunca saiu de casa.

Mario Sergio Conti é jornalista, é autor de "Notícias do Planalto".


Folha de S. Paulo: Ao passar comando do Exército, general elogia Bolsonaro por 'liberar de amarras ideológicas'

A maior entrega de Villas Bôas é o que conseguiu evitar, diz ministro da Defesa

Thais Bilenky , Gustavo Uribe e Rubens Valente, da Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Ao se despedir do comando do Exército, nesta sexta-feira (11), o general Eduardo Villas Bôas afirmou que a eleição de Jair Bolsonaro à Presidência trouxe uma "liberação das amarras ideológicas que sequestraram o livre pensar" no país.

"O senhor traz a necessária renovação e a liberação das amarras ideológicas que sequestraram o livre pensar, embotaram o discernimento e induziram a um pensamento único e nefasto", disse, dirigindo-se ao presidente, presente à solenidade.

O general Edson Leal Pujol assumiu o comando do Exército depois de quatro anos da gestão de Villas Bôas, que passou pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e uma crise política e econômica severa.

Segundo Villas Bôas, Bolsonaro fez com que despertasse no país um sentimento patriótico "há muito tempo adormecido".

Referindo-se ao presidente, ao ministro Sergio Moro (Justiça) e ao general Braga Netto, que conduziu a intervenção federal no Rio, Villas Bôas afirmou que "três personalidades se destacaram para que o 'Rio da História' voltasse ao seu curso normal. O Brasil muito lhes deve". Para ele, "todos demonstraram que nenhum problema no Brasil é insolúvel".

Moro, ex-magistrado que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi, em sua visão, "protagonista da cruzada contra a corrupção ora em curso".

No ano passado, às vésperas do julgamento do petista no STF (Supremo Tribunal Federal), o general afirmou que repudia a impunidade. A frase foi criticada por ter sido interpretada como uma pressão sobre a corte.

Com uma doença degenerativa, Villas Bôas delegou ao mestre de cerimônias a leitura de seu discurso, que também fez uma breve homenagem à imprensa. "Boas-vindas aos integrantes da imprensa que, permanentemente vigilantes, produziram o efeito de induzir o nosso aperfeiçoamento institucional", afirmou.

Emocionado, teve suas lágrimas enxugadas por um auxiliar. Bolsonaro o abraçou mais de uma vez. A primeira-dama, Michelle, sentada ao lado de Cida, mulher do ex-comandante, ambas fora do palco, cumprimentou-o depois do encerramento.

Ainda em seu discurso, Villas Bôas disse que enfrentou no período de seu comando "descontinuidade dos repasses orçamentários" e agradeceu os ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), responsáveis por sua permanência no posto.

"Um Exército democrático, apartidário e inteiramente dedicado ao serviço da nação, que desenvolve as sua estabilidade em ambiente respeitoso, humano e fraterno", disse.

Único a discursar na cerimônia além de Villas Bôas, o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, elogiou a capacidade do ex-comandante de conter ímpetos antidemocráticos entre militares.

"O general Villas Bôas é reconhecido pelo seu carisma de líder equilibrado, mas grandes feitos não podem ser medidos por olhos rasos", discursou Azevedo.

"A maior entrega deste comandante é o que ele conseguiu evitar. Foram tempos que colocaram à prova a postura do Exército como organismo de Estado, isento da política e obediente ao regramento democrático", afirmou o ministro.

"Bandeira esta [que serviu] como parceria do cotidiano militar e induziu a disciplina consciente como modelo de comportamento", prosseguiu Azevedo. Villas Bôas, ele concluiu, "fez do Exército solução, não parte do problema".

Uma intervenção militar foi aventada por membros do Exército como o general Hamilton Mourão, que se tornou vice de Bolsonaro.

Mourão estava no palco ao lado de Bolsonaro, acompanhado de membros do primeiro escalão do governo como o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e Onyx Lorenzoni, da Casa Civil.


Maria Cristina Fernandes: Os valores da farda que volta ao poder

Os oficiais do Exército brasileiro creditam à televisão, aos bancos, ao Congresso Nacional e às multinacionais, nesta ordem, o maior grau de influência política no país. Indagados que instituições deveriam exercê-la, os oficiais se incluem. Colocam as Forças Armadas em quarto lugar entre as aquelas que deveriam ter mais peso político, depois do Congresso, da academia e do Judiciário.

Confrontados com a afirmação do ex-ministro da Guerra do Estado Novo e ex-candidato à Presidência da República, general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, de que a política deveria ser mantida fora dos quartéis, a maioria dos oficiais do Exército manifestou discordância. A maior aderência à afirmação de que "cabe ao Exército agir, mesmo que politicamente, quando a pátria estiver em perigo" se dá entre jovens tenentes (63,5%). A adesão à tese agrega menos da metade (48,7%) dos coronéis e generais.

Os dados estão em "A Construção da Identidade do Oficial do Exército Brasileiro", publicado no ano passado pela editora da PUC-RJ. O autor, o major Denis de Miranda, é professor da Academia Militar das Agulhas Negras, escola de formação de oficiais e única porta para o generalato na Força. Por lá passaram o presidente Jair Bolsonaro (turma de 1977) e todos os generais do primeiro escalão, o vice Hamilton Mourão (1975), o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Heleno Ribeiro (1969), o titular da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz (1974) e o da Defesa, Fernando de Azevedo e Silva (1976).

O livro é resultado do mestrado em sociologia das instituições militares, da PUC-Rio, incentivado por convênio entre os Ministérios da Defesa e da Educação. Para escrevê-lo, Miranda enviou 2.015 formulários para oficiais formados na Aman. Recebeu de volta 643, o que deu à pesquisa uma margem de confiança de 98%. Entre aqueles que responderam, estão 90 generais e coronéis, 249 tenentes-coronéis e majores, 216 capitães e 88 tenentes.

No prelo, na mesma editora, está novo levantamento, ainda mais amplo, encabeçado pelo coordenador do núcleo de sociologia das instituições militares, Eduardo de Vasconcellos Raposo. Os primeiros tabulamentos sugerem uma convergência entre os valores militares e aqueles que se fizeram vitoriosos no eleitorado nacional.

A pesquisa de Miranda mostra que a geração de oficiais pós-redemocratização quis se notabilizar pelas operações militares propriamente ditas, mas foi tragada por atividades como o combate à seca e as operações de garantia da lei e da ordem. Mais da metade dos entrevistados reconhece que as ações subsidiárias lhes trazem mais reconhecimento da sociedade.

Esse perfil explica por que generais do Alto Comando do Exército têm demonstrado preocupação com a politização dos quartéis. A judicialização da política, como se viu, levou à politização do Judiciário. Não parecem infundados os temores de que a militarização da política leve à politização dos militares.

A corporação que se vê mais reconhecida em atividades civis e advoga o dever de agir politicamente quando a 'pátria' estiver em perigo revela sua maior insatisfação com os seus rendimentos. Este batalhão de insatisfeitos terá uma proeminência política inédita nos últimos 30 anos num governo supostamente comprometido com o ajuste fiscal.

A tabela de soldos das Forças Armadas é parte da explicação para o primeiro tiro do general Mourão no anunciado conflito com o Judiciário - "Eles não conhecem o Brasil" (Valor, 28/12/2018). O soldo de um tenente (R$ 7,5 mil) equivale a um terço do salário de entrada de carreiras do Judiciário e do Executivo.

A insatisfação salarial mitiga o espírito de corpo dos oficiais. Entre tenentes, grupo que tem menos de dez anos na carreira, mais da metade mudaria de carreira se pudesse preservar a estabilidade. No grupo de coronéis e generais, que já têm mais de 30 anos de Exército e estão às portas da aposentadoria, a intenção de virar a vida pelo avesso atinge apenas um em cada dez.

"Se não fosse militar, qual outra carreira seguiria?" A resposta demonstra o desacerto entre o espírito das Forças Armadas e o coração liberal do ministro Paulo Guedes. Ao ingressar na carreira, o oficial tem, a seu dispor, todo o plano de carreira das décadas seguintes, com as promoções e aperfeiçoamentos que precisará fazer para atingi-las. É essa mentalidade, e não o apetite da livre-iniciativa, que prevalece. Sem a farda, mais da metade rumaria para fazer um concurso público. Entre os mais jovens essa opção abocanha 72,7% de adesão.

Esse espírito de corpo se dilui no momento em que o Exército é mais endógeno do que nunca. A pesquisa de Miranda mostra que 45% dos oficiais são filhos de militares. Na década de 1960 a fatia de cadetes da Aman cujos pais estavam na carreira pouco ultrapassava um terço. Um outro estudioso das Forças Armadas e professor da Universidade Federal de São Carlos, Piero Leirner, atribui a essa endogenia o caldo de receptividade da base das Forças Armadas à candidatura de Jair Bolsonaro.
A primeira vez em que se deu conta disso foi em 2012, quando ministrou curso na Fundação Getúlio Vargas, no Rio, para uma turma majoritariamente de militares. Um major reclamou da Comissão da Verdade. Mais tarde, em viagem de pesquisa a São Gabriel da Cachoeira (AM), região que vivia sob uma onipresente liderança do general Heleno Ribeiro, o clima era o mesmo.

O relatório da Comissão colocaria sob o mesmo carimbo os brigadeiros Eduardo Gomes, patrono da Aeronáutica, e João Paulo Burnier, cuja ficha corrida vai da tentativa de golpe contra Juscelino Kubitschek à trama que planejava explodir o gasômetro do Rio em 1968 para incriminar os dissidentes da ditadura.

O relatório também teria abespinhado a geração da caserna que subiu a rampa com Bolsonaro por ter colocado no mesmo balaio Cyro e Leo Etchengoyen, respectivamente tio e pai do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional do governo Michel Temer, Sérgio Etchengoyen. O primeiro foi apontado pelo coronel Paulo Malhães como um dos responsáveis pelo centro de tortura de Petrópolis, que ficaria conhecido como Casa da Morte, mas o irmão foi chefe do Estado-Maior sem registro de envolvimento com tortura.

Ao relatório some-se a reação da ex-presidente Dilma Rousseff ao manifesto do Clube Militar contra o documento. A determinação para que a entidade, de caráter privado, se retratasse, foi seguida por outro manifesto, ainda mais duro. Foi depois desses fatos que Bolsonaro compareceu, pela primeira vez como convidado, à uma cerimônia de formatura da Aman, em 2014. Dava início ali a uma campanha marcada pela presença em cerimônias militares de toda ordem, às quais não compareceria sem a anuência dos comandantes.

O capitão, que ao longo de seus seis mandatos anteriores como deputado federal não ultrapassara as plateias de mulheres e viúvas de militares, cativaria, ao longo do sétimo, as bases das Forças Armadas e seu comando.

Na pesquisa do major Miranda, o tema aparece na caixinha 'revanchismo político' como um dos maiores problemas das Forças Armadas, ainda que atrás das limitações materiais dos 'soldos baixos' e 'orçamento inadequado'. Serviu de amálgama a uma corporação, que desgastada pela ditadura, se construiu em torno de valores que buscavam diferenciá-la das instituições civis.

Se o revanchismo, a corrupção da esquerda à direita e a crise pavimentaram o apoio militar, não bastarão como norte para o governo. Na bússola do presidente não faltam ímãs que o empurram em direções opostas, a começar pela abertura ao investimento externo e à aliança incondicional com Donald Trump.

Ao longo das três décadas em que os militares estiveram longe do poder, o anticomunismo perdeu lugar para a defesa da soberania contra a internacionalização das organizações não governamentais.

O discurso que embala a revisão da reserva Raposa Serra do Sol vem daí. Leirner identifica na ascensão da Batalha dos Guararapes, do século XVII, em que as três raças se uniram para derrotar os batavos, a construção simbólica de um exército em busca de inimigos externos.

Parece um discurso desbotado, particularmente na era de um militar bandeirante, como Bolsonaro, mas ainda encontra ressonância. A presença das multinacionais identificada na pesquisa de Miranda como um dos interesses que exercem influência demasiada no país, é uma evidência clara das pressões para que o governo Bolsonaro se encaixe nos moldes do ultradireitismo nacionalista que tem em Trump e em Viktor Orbán, o primeiro-ministro da Hungria que prestigiou sua posse, como os principais representantes.

O nacionalismo, no entanto, está longe de unificar os militares do governo, a começar por Hamilton Mourão, de quem se registram, ao contrário dos demais generais do governo, posições mais alinhadas com o pró-americanismo pregado pelo novo Itamaraty do chanceler Ernesto Araújo.

Um posto avançado desta batalha já se estabeleceu na Petrobras. O novo presidente, Roberto Castello Branco, foi ungido por Paulo Guedes para comandá-la porque comunga de suas convicções liberais.

O ministro da Economia já deixou claro que pretende se valer da cessão onerosa para recompor o caixa do governo, ainda que sua regulamentação esteja pendurada no Congresso. Duas semanas antes da posse, no entanto, o almirante Bento Leite de Albuquerque Junior, nomeado ministro de Minas e Energia, pediu à empresa que providenciasse acomodações para que lá se instalasse com nove assessores. A presença de um cozinheiro na comitiva é um sinal mais do que eloquente da batalha que está por vir.


Folha de S. Paulo: Comandante do Exército determina análise sobre Intentona Comunista

Villas Bôas disse que medida tem objetivo de evitar derramamento de 'sangue verde e amarelo'

Bernardo Caram, da Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, disse neste domingo (25) ter determinado que seja feita uma análise sobre a Intentona Comunista, de 1935. O objetivo, segundo ele, é evitar derramamento de “sangue verde e amarelo”.

Intentona Comunista foi a tentativa de derrubar Getúlio Vargas da presidência da República em novembro de 1935.

“Determinei ao Exército que rememore a Intentona Comunista ocorrida há 83 anos”, afirmou, em postagem no Twitter. “Antecedentes, fatos e consequências serão apreciados para que não tenhamos, nunca mais, irmãos contra irmãos vertendo sangue verde e amarelo em nome de uma ideologia diversionista”.

Deflagrada pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), a Intentona Comunista foi uma rebelião político-militar liderada pelos tenentistas, entre eles Luís Carlos Prestes – que antes havia criado a Aliança Nacional Libertadora.

Quando Vargas declarou a ANL ilegal, foram iniciados levantes em quartéis de Natal, Recife e Rio de Janeiro. A rebelião foi contida pelo governo, após batalhas que resultaram na morte de oficiais.

Anualmente, o Exército promove uma solenidade em homenagem aos mortos.

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) já se manifestou sobre a Intentona Comunista, em discurso na Câmara em 1995. Na ocasião, ele disse que os comunistas foram derrotados em 1935 e, depois, em 1960, década que se iniciou o regime militar. Bolsonaro ainda sugeriu que o movimento persistia por meio dos trabalhadores sem-terra.

“Incansáveis, os agentes do satanismo marxista-leninista, mesmo privados de um de seus eixos de poder geopolítico, Moscou, continuam assanhadíssimos. Prova concreta disso são essas tropas, bem treinadas, municiadas, apetrechadas e muito mal disfarçadas, no movimento dos sem-terra”, disse na época.


El País: Bolsonaro obedece hierarquia do Exército e anuncia novo comandante

Futuro ministro da Defesa também divulga nomes da Marinha e da Aeronáutica

Por Afonso Benites, do El País

O presidente eleito Jair Bolsonaro obedeceu a hierarquia militar e escolheu um colega de turma para comandar o Exército brasileiro a partir do ano que vem. O general Edson Leal Pujol será o chefe da força terrestre. Apesar de ser o mais velho entre os potenciais candidatos, ele não era o favorito do presidente. O preferido era o general Paulo Humberto César de Oliveira, atual número dois da instituição.

Além dele, outro concorrente era Mauro César Lourena Cid, chefe do departamento de Educação e Cultura do Exército. Os três se formaram na Academia Militar dia Agulhas Negras com Bolsonaro no ano de 1977. Eles chegaram ao topo da carreira, enquanto o presidente eleito abandonou a carreira para se dedicar à política.

Pesou a favor de Pujol o respeito à tradição do Exército de que o mais antigo quadro da ativa fosse o elevado ao comando. Atualmente ele ocupava o cargo de chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército.

O anúncio foi feito na tarde desta quarta-feira pelo futuro ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Também foram divulgados os nomes dos comandantes da Marinha, almirante de esquadra Ilques Barbosa Junior, e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Antônio Carlos Moretti Bermudez.

Em princípio, Bolsonaro cogitou a possibilidade de manter os atuais chefes das duas forças, respectivamente, Leal Ferreira e Nivaldo Rossato. Mas ele mudou de ideia e decidiu seguir também o critério de antiguidade entre os militares com as maiores patentes na ativa. O futuro ministro, general Fernando, disse que a Defesa é o ministério que menos terá mudanças. "Ele é baseado nas Forças Armadas, que são instituições sólidas e organizadas".