emprego

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva apresenta seu indicado ao ministério da Fazenda, Fernando Haddad, no CCBB, sede do governo de transição - Pedro Ladeira/Folhapress

Lula assume com economia fraca, incerteza sobre inflação e recuperação menor do emprego

Folha de São Paulo*

Um cenário econômico que analistas costumam chamar de desafiador aguarda o novo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2023.

Para o próximo ano, as projeções indicam um crescimento menor do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, que tende a desacelerar devido a uma combinação de fatores.

Juros altos, perda de ritmo da economia mundial, fim do estímulo da reabertura após as restrições na pandemia e endividamento das famílias fazem parte dessa lista.

Com o possível freio do PIB, a expectativa é de um desempenho morno para o mercado de trabalho, enquanto as previsões sinalizam inflação ainda pressionada no país.

É claro que esse cenário pode mudar —para melhor ou pior— a partir das decisões do próximo governo. Por ora, analistas aguardam mais sinalizações sobre a política econômica de Lula e suas diretrizes na área fiscal.

O temor de elevação de gastos durante a gestão petista já provocou ruídos no mercado financeiro e segue como motivo de alerta para parte dos economistas.

Outro ponto de atenção é o cenário externo, especialmente em relação ao rumo da política monetária nos EUA.

"O cenário para 2023 é de crescimento mais baixo do que neste ano", afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados. A MB projeta avanço de 0,5% para o PIB do próximo ano, após previsão de alta de 3% em 2022.

O especialista menciona que a agropecuária tende a colher uma "safra excelente" em 2023, mas o campo, sozinho, não deve garantir um avanço mais expressivo para a atividade econômica.

Com isso, a taxa de desemprego deve ficar "mais estabilizada", segundo o economista, após o ciclo de queda que levou o indicador a 8,3% no trimestre até outubro, o mais recente com dados disponíveis.

"O que traz a taxa de desemprego para baixo é o crescimento econômico. Então, é provável que ela fique rondando 8% ou 9%."

O economista Luca Mercadante, da Rio Bravo Investimentos, projeta taxa de desocupação entre 9% e 10% no próximo ano, com uma alta "gradual", e "não abrupta".

Mercadante também aponta que o efeito defasado dos juros elevados deve frear a atividade econômica em 2023.

A Rio Bravo estima avanço de 0,7% para o PIB no próximo ano, mas não descarta um aumento de até 1%, após uma alta prevista de 3,1% em 2022.

"A atividade econômica vai crescer, mas bem menos do que neste ano, principalmente pelo efeito da política monetária", afirma.

"Tem outros pontos que merecem destaque, como o bom desempenho da agropecuária. A safra de grãos vai ser muito boa no ano que vem. A gente também deve ter alguma resiliência do mercado de trabalho. O rendimento, que ficou mais alto, deve ter impacto na atividade", diz.

O C6 Bank prevê um resultado mais baixo para o PIB de 2023. A estimativa do banco é de estagnação da atividade econômica, com o indicador marcando 0%, após avanço de 2,8% em 2022.

"A gente já vê sinais de desaceleração", aponta a economista Claudia Moreno, do C6 Bank.

Ela avalia que a provável perda de fôlego pode ser atribuída a pelo menos três fatores: o fim do processo de reabertura da economia, a desaceleração global e o impacto dos juros altos.

O C6 Bank também projeta que a inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), fechará o próximo ano em 5,9%, depois dos efeitos dos cortes tributários que devem levar o indicador para 5,6% em 2022.

Assim, 2023 marcaria o terceiro ano consecutivo de estouro da meta de inflação no país. "É um quadro de preços ainda pressionados", diz Moreno.

A Rio Bravo, por sua vez, prevê IPCA de 5,2% em 2023, depois de avanço de 6% estimado para 2022. A MB Associados projeta inflação de 5,3% no próximo ano, após alta de 6% em 2022.

Para esfriar a economia e tentar conter o aumento dos preços no país, o BC (Banco Central) elevou os juros básicos (Selic) a 13,75% ao ano. Analistas avaliam que a taxa só deve começar a cair a partir de meados de 2023.

O que pode atrasar o início dos cortes, diz Sergio Vale, da MB, é o risco fiscal. "O ponto-chave é entender qual será a regra fiscal a ser criada no primeiro semestre do ano que vem."

José Pena, economista-chefe da Porto Asset Management, está com uma projeção de crescimento mais otimista para 2023, de 1%, mas afirma que o número tende a ser revisto para baixo em breve. Essa possível revisão se deve a um nível de incerteza maior, no cenário interno e externo, em relação ao que se esperava há um ou dois meses.

O quadro atual é de risco de aumento das expectativas de inflação, com indicações de crescimento do gasto público para sustentar uma demanda que ainda é relativamente forte, em meio a uma baixa ociosidade, o que posterga o cenário de corte de juros.

O que pode ajudar a manter viva a expectativa de redução da taxa básica Selic em um futuro não tão distante seria uma reversão do ciclo de alta de juros no exterior, especialmente nos EUA, e a continuidade do processo de normalização das cadeias globais de suprimento.

"Se começar a se materializar uma perspectiva de que o Fed [banco central dos EUA] está prestes a acabar seu ciclo de alta, isso vai nos ajudar. Se o Fed surpreender com uma alta maior, isso vai punir ainda mais os ativos de risco mundo afora, os brasileiros entre eles", afirma Pena.

Texto publicado originalmente na Folha de São Paulo.


Busca por qualidade de vida move jovens de 18 a 24 anos a mudarem mais de emprego em pouco tempo - luckybusiness/Adobe Stock

Entenda o que é 'job hopping' e por que jovens aderem mais ao movimento

Vitoria Pereira,* Folha de São Paulo

Tema da semana: Por que jovens 'pulam' mais de emprego em curtos períodos?

"Eu não me vejo trabalhando na mesma empresa até meus 44 anos. É algo que me dá até ansiedade porque e o mundo lá fora? E as outras oportunidades?", diz Rafaela Castro, 24, que atua na área de marketing.

Rafaela trabalha desde os 15 anos de idade e já passou por sete empregos. O tempo máximo em que ela ficou empregada foi por um ano. Sua motivação é a busca por qualidade de vida, principalmente em ambientes que priorizam sua saúde mental.

Não é só a Rafaela que pensa assim. Dados do Ministério do Trabalho e da Previdência de 2020 mostram que os jovens são o grupo que mais muda de emprego em menos tempo.

A pesquisa indica que, dos 9,96 milhões de jovens 18 a 24 anos consultados pelo levantamento, 24,4% (2,47 milhões) ficam menos de três meses no mesmo trabalho.

Em contrapartida, 4,26 milhões de pessoas de 50 a 64 anos permanecem no mesmo emprego por dez anos ou mais.

Só a geração Z (os nascidos entre 1995 e 2010) está nesse quadro? Não. O levantamento também mostra que 2,43 milhões de profissionais de 30 a 39 anos também mudam de trabalho em menos de três meses.

Essa movimentação é conhecida como job hopping (pular de emprego, em inglês) em que pessoas mudam de trabalho com frequência e de forma voluntária.

Para o psicólogo organizacional Lucas Freire, o job hopping vem na esteira de outros fenômenos do mundo trabalho como a demissão silenciosa e a grande demissão. Esses movimentos mostram os sinais de esgotamento das relações tradicionais de trabalho e uma busca por novas formas de se relacionar com o emprego.

Quais os motivos dessa movimentação?

  • Olhando para o passado: era comum o trabalhador ter em mente que o emprego era a garantia para estabilidade financeira e aposentadoria. Mas, hoje, os jovens querem mais qualidade de vida e um emprego que dê sentido para sua carreira. Enquanto eles não encontram, não veem problema em mudar, diz Lilian Cidreira, CEO na Future Minds, consultoria especializada em carreira, liderança e inteligência emocional.
  • Falando em qualidade de vida. Os jovens buscam empresas com flexibilidade de horário para conciliar vida profissional com os gostos pessoais e desenvolver uma vida financeira que dê possibilidade para suas conquistas, diz Helenice Accioly, gerente de recrutamento e seleção na Nube (Núcleo Brasileiro de Estágios).
  • Eles fazem essa movimentação para ter autonomia, fazer aquilo que gostam e buscar novos desafios para não ficar estagnado na carreira.
    • Autonomia? Isso mesmo, para construir sua própria rotina, ter voz e participação no trabalho e sensação de pertencimento no emprego.
  • Efeito da pandemia? O job hopping não começou com a pandemia, mas foi potencializado pela crise sanitária.
    • "Diante da fragilidade que a pandemia nos trouxe, buscar maneiras mais produtivas de se viver tornou-se urgente. Será que vale a pena estar em determinadas condições de trabalho? Será que vale a pena a saúde mental ser comprometida?", diz Freire.

Essa movimentação é ruim?

  • Se o trabalhador prefere desistir em vez de se esforçar, sim.
    • "Quando o profissional transforma essa vontade de mudar de emprego em um comportamento, ele desenvolve a capacidade de se adequar a cultura da companhia", afirma Cidreira.
    • A ausência dessa capacidade pode gerar o efeito reverso: de ser demitido pela empresa, em vez de pedir demissão.
  • Pode afetar a contratação. O recrutador pode ficar inseguro em contratar alguém que ficou pouco tempo nos empregos anteriores, além de ver a pessoa como alguém instável, diz Accioly.

Mas, tem um lado bom.

  • Cada empresa se comporta de maneira diferente em relação às atividades de cada trabalhador e às missões e metas que desejam atingir. A pessoa que muda várias vezes de emprego consegue se adaptar melhor a diferentes ambientes de trabalho, já que passou por diversas culturas corporativas.
  • Gera autoconhecimento. As passagens nas companhias ajudam o profissional a entender quais caminhos quer seguir ou com quais ramos tem mais identificação.

Job hopping é comum na área de...tecnologia.

Por que? "Temos mais vagas do que profissionais, o que chamamos de mercado em oferta. Quando isso acontece, as empresas buscam esses profissionais e oferecem para eles melhores condições, o que faz com que a movimentação fique maior", diz Mariana Torres, especialista em carreira e recolocação.

Não é para todo mundo. Qual o perfil de quem está sendo seduzido por esse movimento?

  • Pessoas que buscam aceleração na carreira;
  • Pessoas inquietas e extrovertidas que gostam de mudanças;
  • E mais... podem ser chamados de nômades de carreiras, já que se deslocam de um emprego para o outro em busca de novos desafios.

Mas como mudar de emprego? Como fazer essa transição? Dá um scroll e veja na seção Pergunte ao especialista.

Mariana Torres, especialista em carreira e recolocação e professora convidada da FGV - Carol Fernandes

Para aqueles que querem mudar de emprego, como tomar essa decisão?

"O mais importante é se qualificar, apresentar resultados nas empresas que passar, fazer a diferença, ter referências, se posicionar no mercado e construir uma excelente rede de networking. Se o profissional fizer isso, não terá problemas para futuras contratações".

Antes de mudar, pergunte a si mesmo…

  • Neste novo emprego terei oportunidade de desenvolvimento?
  • Vou aprender coisas novas?
  • Por que estou mudando?
  • Será que o que me motiva a sair também não é uma realidade na empresa nova?
Lula é eleito presidente pela 3ª vez

O que esperar do presidente eleito?

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teve 2.139.645 votos a mais que o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), na eleição mais acirrada da história. O que podemos esperar do mandato do petista?

Saiba o que é e como deve funcionar o governo de transição de Bolsonaro para Lula:

  • Na economia: O primeiro desafio será trazer uma solução concreta para o novo Orçamento de 2023 e negociar uma licença para gastos extras acima dos R$ 100 bi.
    • Para empresários, Lula tem o desafio de unir o Brasil.
  • Internacional. Eleição de Lula reforça nova onda de esquerda que renasce pela América Latina. Agora, México, Argentina, Brasil, Peru, Colômbia e Chile passam a ter presidentes de esquerda ou centro-esquerda e enfrentam um cenário mais complicado em relação aos governos progressistas anteriores.
  • Congresso: Lula terá que buscar até o centrão para ter maioria no Congresso. Os deputados eleitos pela coligação do petista somam 122 das 513 cadeiras na Câmara, número que não é o suficiente para aprovar um projeto.
  • Opinião: Rombo fiscal, Congresso e STF desafiarão Lula em terceiro mandato, escreve o repórter especial da Folha Ricardo Balthazar. Vitória é apenas o primeiro passo na reconstrução de instituições democráticas, escreve Jorge Chaloub em opinião publicada na Folha.
Caminhoneiros bolsonaristas fazem protestos e bloqueiam estradas após vitória de Lula

Reações com os resultados das eleições presidenciais

Segue o fio de como foi a repercussão da vitória de Lula.

  • Bolsonaro. Silêncio total. O presidente se tornou o primeiro derrotado a deixar de se manifestar logo após o anúncio do resultado.
    • Na manhã desta segunda (31), o mandatário deixou o Palácio da Alvorada e se dirigiu para o Palácio do Planalto. Ele não deu declarações.
  • Reações: Alguns aliados de Bolsonaro reagiram sobre a vitória de Lula:
    • Deputada Carla Zambelli (PL): "O sonho de liberdade de mais de 51 milhões de brasileiros continua vivo. E lhes prometo, serei a maior oposição que Lula jamais imaginou ter."
    • Senador eleito Sergio Moro (União Brasil): "Vamos trabalhar pela união dos que querem o bem do país. Estarei sempre do lado do que é certo! Estarei na oposição em 2023, respeitando a vontade dos paranaenses".
  • Reação internacional: jornais estrangeiros como Le Monde, El País e NYT reagiram à vitória de Lula. "Fênix do Brasil" e "derrota da ultradireita" foram algumas das frases em referência às eleições.
  • Protestos: Caminhoneiros apoiadores de Bolsonaro fizeram bloqueios em estradas em protesto ao resultado do pleito. As manifestações ocorrem em ao menos 13 estadosVídeos que circulam na internet mostram pneus pegando fogo na pista. Vale lembrarEm 2018, os caminhoneiros foram uma base importante de Bolsonaro.
  • Nos grupos bolsonaristas no Telegram: mensagens dizem que teve fraude nas urnas e apelam por golpe das Forças Armadas.
  • #HASHTAG'Tchau, querido' e 'Adeus acima de tudo': veja reações à vitória de Lula nas redes.
  • Opinião: Opções golpistas encolhem e Bolsonaro encara abismo isolado, escreve Igor Gielow em análise publicada na Folha.

Texto publicado originalmente na Folha de São Paulo.


Mercado informal artigo | Imagem: reprodução/conexis

Revista online | Mercado informal e a recuperação fiscal

Eduardo Rocha*, especial para a revista Política Democrática online (48ª edição: outubro/2022)

A pandemia da covid-19 provocou tragédias humanas que afetaram os municípios, os estados e a União de forma sem precedentes com a rápida transformação da emergência sanitária numa crise econômica e social de grandes proporções. Isso provocou recessão econômica; queda do investimento, produção e consumo; fechamento de empresas; aumento do desemprego e precarização nas relações de trabalho; ampliação da economia informal; agravamento do endividamento, inadimplência e calotes de pessoas físicas e jurídicas; ampliação da vulnerabilidade financeiro-social das famílias; aumento dos gastos públicos, queda da arrecadação tributária e piora do desequilíbrio estrutural e conjuntural das contas públicas.

O avanço da vacinação durante 2022 contribuiu para amenizar e retomar positivamente alguns indicadores econômicos, mas o desafio fiscal ainda persiste e a sua superação exige, além da necessária reforma tributária, o enfrentamento da informalidade no Brasil.

Veja todos os artigos da edição 48 da revista Política Democrática online

Mais claramente coloca-se a questão de como trazer para o mundo fiscal formal o gigantesco mercado informal, que, segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 2019 as transações de bens e serviços operadas dentro da economia informal movimentaram R$ 1,2 trilhão. O montante é equivalente a 17,3% do PIB brasileiro. Valor este superior ao PIB das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Fica claro, assim, que essas transações informais de bens e serviços representam uma gigantesca perda de arrecadação fiscal para os três entes federativos, cujos atuais mecanismos arrecadatórios não as abraçam fiscalmente, além de provocar enormes prejuízos sociais e financeiros aos trabalhadores.

Em relação ao mercado de trabalho, o Brasil registrou uma taxa de informalidade de 39,7% no trimestre até agosto de 2022. Ou seja, o país atingiu o recorde de 39,307 milhões de trabalhadores atuando na informalidade no período, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), apurada pelo Instituto Brasileiro de Economia e Estatística (IBGE).

Confira, abaixo, galeria de imagens:

Mercado informal | Foto: J.M. Image Factory/Shutterstock
Indicador econômico | Foto: megaflopp/Shutterstock
Projeção econômica para 2023 | Foto: RenataP/Shutterstock
Produto interno bruto Brasil | Imagem: rafastockbr/Shutterstock
Macroeconomia | Imagem: TarikVision/Shutterstock
Salário no Brasil | Imagem: rafastockbr/Shutterstock
Mercado informal artigo | Imagem: reprodução/conexis
Pobreza no Brasil | Imagem: rafastockbr/Shutterstock
Inflação de mercado no Brasil | Foto: FJZEA/Shutterstock
Indicador econômico fundo desfocado | Foto: StunningArt/Shutterstock
Mercado informal
Indicador econômico
Projeção econômica para 2023
Produto interno bruto BRasil
Macroeconomia
Salário no Brasil
Mercado informal artigo
Pobreza no Brasil
Inflação de mercado no Brasil
Indicador econômico fundo desfocado
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Mercado informal
Indicador econômico
Projeção econômica para 2023
Produto interno bruto BRasil
Macroeconomia
Salário no Brasil
Mercado informal artigo
Pobreza no Brasil
Inflação de mercado no Brasil
Indicador econômico fundo desfocado
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O IBGE considera como trabalhador informal aquele empregado no setor privado sem carteira assinada, o doméstico sem carteira assinada e o que atua por conta própria ou como empregador sem CNPJ, trabalhadores por conta própria sem CNPJ, além daquele que ajuda parentes em determinada atividade profissional. Este trabalhador informal atua à margem do mundo formal sem beneficiar-se das garantias constitucionais, como, por exemplo, 13º salário, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) ou benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), como auxílio-doença, salário maternidade, Seguro-Desemprego etc.

A retomada sustentável no plano nacional exige medidas inéditas diante dessa crise inédita e a União, estados e municípios podem e devem tomar iniciativas que desenhem um ambicioso e abrangente plano de reativação de sua economia que pressupõe. Dentre outras variáveis macroeconômicas, a recuperação da saúde fiscal dos entes federativos (municípios, estados e União) e a elevação da renda pessoal disponível. E, para tanto, é preciso encontrar as vias para trazer ao mundo fiscal formal as transações de bens e serviços que se dão no mercado informal.

Todos sabem da fragilidade fiscal dos entes federativos (União, estados e municípios) seja para realizar investimento público para estimular o crescimento seja para ampliar a concessão de subsídios/benefícios fiscais ao setor privado – essa receita é impraticável nos curtos e médios prazos.

Portanto, é preciso criar uma nova relação quantidade/qualidade dos gastos públicos. Isto é: fazer mais e melhor com menos recursos, aumentando, assim, a eficiência e eficácia da gestão pública que promovam iniciativas inéditas que, combinadas às ações de saúde e defesa da vida, possibilitem criar de imediato as bases da retomada do crescimento e do desenvolvimento e articular os agentes econômicos nacionais e internacionais para criar um mecanismo de financiamento ao desenvolvimento, instrumento que será proposto e descrito à frente.

A saúde das finanças públicas é um grande desafio para a retomada do investimento público e privado, crescimento, emprego, renda, melhoria dos serviços e desenvolvimento no Brasil. É claro, também, que a obtenção da saúde fiscal demanda a realização de uma justa reforma tributária nacional, que recomponha a capacidade financeira dos três níveis do Estado brasileiro através de ações que potencializem a arrecadação, fortaleça e aprimore a gestão administrativa do aparato fiscal no combate à sonegação de tributos – estimada pelo Banco Mundial em 13,4% do PIB.

Para tanto, é preciso criar alternativas financeiro-fiscais inéditas que permitam, de um lado, a elevação das receitas públicas sem tirar mais um centavo de imposto do já espoliado, cansado e insatisfeito contribuinte, e, de outro, recompensar e valorizar cidadãos e empresas, ou seja, CPF e CNPJ, que terão alívio e retorno financeiro. Nos próximos artigos, apresentaremos as linhas gerais de uma proposta para trazer ao mundo fiscal formal boa parte das transações de bens e serviços que se dão na economia informal.

Sobre o autor

*Eduardo Rocha é economista pela Universidade Mackenzie, com pós-graduação em Economia do Trabalho pela Unicamp.

** O artigo foi produzido para publicação na revista Política Democrática online de outubro de 2022 (48ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não reflete, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Evandro Milet: ESG e a evolução do capitalismo

O grande economista Joseph Schumpeter foi preciso quando disse: “ A evolução capitalista significa perturbação.O capitalismo é essencialmente um processo de mudança econômica endógena. Na ausência de mudança a sociedade capitalista não pode existir… Por isso deve haver constante mudança vinda de dentro… Neste sentido, o capitalismo estabilizado é uma contradição em termos”.

E assim tem sido ao longo do tempo. A partir do início reconhecido do capitalismo no século XV, esse sistema conviveu com trabalho escravo, trabalho infantil, ausência de direitos trabalhistas, falta de segurança para investidores, falta de transparência na gestão, confusão entre recursos da empresa e dos proprietários, poluição do ambiente, ausência de preocupação com consumidores, qualidade deficiente de produtos, monopólios e cartéis, corrupção, e muitas outras mazelas, algumas que persistem até hoje. Mas as mudanças foram acontecendo ao longo do tempo, por demanda ou pressão de sindicatos, consumidores, cidadãos conscientes, políticos e concorrentes, empresários ou países.

Há algum tempo, o conceito de responsabilidade social se espalhou exigindo da empresa uma preocupação com seu entorno e contestando a postura definida por Milton Friedman, onde dizia que responsabilidade social da empresa era gerar lucro, porque gerava empregos e girava a economia. O conceito de responsabilidade social corporativa sucedeu a pura filantropia, já procurando associar as ações sociais ao negócio da empresa, porém ainda tentando misturar água com óleo e entendendo as ações como custo e obrigação.

Posteriormente, o conceito de valor compartilhado, lançado por Michael Porter, considerado por muitos como o maior consultor em gestão vivo, colocou definitivamente na mesma conta o negócio da empresa e sua atuação social, que deve estar vinculada ao negócio.

Todos esses conceitos convergem agora para os fatores ESG (ambientais, sociais, governança), com os quais consumidores cobram postura responsáveis dos seus fornecedores e o mercado financeiro reflete isso escolhendo investimentos a partir desses critérios.

A tendência acontece independentemente se você gosta ou não da Greta(eu gosto), se acha que é uma visão globalista comandada pela China com teses de Gramsci ou se o aquecimento solar é uma invenção.

Os fatores ESG incluem, entre outros, os listados a seguir:

Fatores ambientais: uso de recursos naturais, emissões de gases de efeito estufa (CO2, gás metano), eficiência energética, poluição, gestão de resíduos e efluentes.

Fatores sociais: políticas e relações de trabalho, inclusão e diversidade, engajamento dos funcionários, treinamento da força de trabalho, direitos humanos, relações com comunidades, privacidade e proteção de dados.

Fatores de governança corporativa: independência do conselho de administração, política de remuneração da alta administração, diversidade na composição do conselho de administração, estrutura dos comitês de auditoria e fiscal, compliance, ética e transparência.

O que vemos hoje é que investidores, consumidores e os novos entrantes da geração Z no mercado de trabalho estão prestando atenção nesses fatores para decidir onde investir, de quem comprar e onde trabalhar. É a evolução do capitalismo em direção a uma maior humanização. Milton Friedman foi ultrapassado nesse ponto. Schumpeter estava certo.


RPD || Mauro Oddo Nogueira: O Brasil tem jeito - Basta olhar para o BRASIL

Para falar sobre a economia brasileira, com bases reais, é preciso tratar da realidade dos autônomos e empregados informais invisíveis, que o Auxílio Emergencial tornou momentaneamente visíveis – e também, dos autônomos e empregados formais das nano, micro e pequenas empresas (MPEs), avalia Mauro Oddo

Por mais idas e vindas que se apresentem, a vacina não tarda. Então, é hora de refletir sobre como reconstruir o tecido produtivo do Brasil, após uma crise estrutural que se arrastava há 4 anos e à qual se somou o cataclismo da Covid-19. A resposta pressupõe uma reflexão sobre, afinal, de qual Brasil estamos falando? Pensamos somente no Brasil da Avenida Paulista ou incluímos o BRASIL no qual a renda média do trabalhador é de R$ 2.400,00 por mês (com uma mediana bem abaixo disso)?

Vamos, pois, falar um pouco do BRASIL. Ele é composto, basicamente, por dois segmentos de trabalhadores. O primeiro, autônomos e empregados informais, representando cerca da metade dos trabalhadores do país. São os invisíveis que o Auxílio Emergencial tornou momentaneamente visíveis. O segundo, os autônomos e empregados formais das nano, micro e pequenas empresas (MPEs): cerca da metade dos trabalhadores formais. Ou seja, ¾ dos trabalhadores é o contingente que dá forma à desigualdade no Brasil. Portanto, falar de economia brasileira sem falar deste BRASIL é falar de qualquer outra coisa, menos da economia brasileira.

Mas o fato é que só episodicamente essa realidade não foi marginal em nossos projetos de desenvolvimento. Desde a temática econômica da mídia às políticas públicas e às Universidades, com raríssimas exceções, esse mundo passa longe. Longe dos currículos dos cursos de Economia, Administração, Engenharia e Direito, aqueles que conformam o ethos das nossas “elites dirigentes”; das discussões na mídia; e, quando muito, é periférico nas ações governamentais. Não pensamos no BRASIL, pelo fato de o desconhecemos. O Brasil dos debates e das políticas econômicas é e sempre foi o Brasil da Avenida Paulista. O resto é “questão social” …

E o que nos diz o olhar em direção ao BRASIL? Diz, incialmente, que a lenda de “primeiro crescer o bolo para depois dividi-lo” – bordão da ditadura que continuou subjacente à boa parte das políticas econômicas que se seguiram – é uma falácia. Seja porque esse momento “da divisão” nunca chega, talvez seja porque a realidade mostra que a lógica deve ser exatamente a inversa. É pela criação de demanda que a economia se desenvolve. E criação de demanda em nosso país se traduz essencialmente em elevação da renda da população do BRASIL. Temos duas provas recentes disso. A política do salário mínimo conduzida por Lula é uma. A outra é a evidência de que só não ocorreu um colapso econômico por conta da pandemia, graças ao Auxílio Emergencial.

Mas aí caímos em uma outra questão: como elevar a renda dessa população? Não entrarei na questão das transferências e dos programas de renda mínima, tema merecedor de tratamento muito mais atencioso nos debates. Vou me ater à vertente produtiva e o que considero seu conceito chave: produtividade do trabalho. Como dito acima, o BRASIL produz, basicamente, na informalidade e nas MPEs. Apresentarei apenas uma comparação: aqui, a produtividade de um trabalhador de uma pequena empresa formal é 27% daquele de uma grande; e de uma micro, é de 10%.

Na Alemanha, essas relações são de 70% e 68%, respectivamente (dados da CEPAL de 2012). Imagine nas atividades informais! Por favor, não digam que esse trabalhador é, como indivíduo, muito menos produtivo que o alemão. Não! Se colocarmos um desses trabalhadores em um posto de trabalho de uma grande empresa nacional ou de uma microempresa alemã, sua produtividade rapidamente se igualará àquela normal dessa empresa. O problema está no conteúdo técnico do posto de trabalho. Em outras palavras, tecnologias de processo e de gestão.

Fica evidente que não há como aumentar a renda do trabalho sem aumento de produtividade. E não há como aumentar sistemicamente a produtividade sem demanda, isto é, sem renda. Assim, somente um círculo virtuoso de produtividade e renda pode nos levar a superar o atraso econômico e a desigualdade social. E não há outro caminho para tanto senão um investimento maciço por parte do Estado no conteúdo técnico dos postos de trabalho via modernização de processos organizacionais e produtivos das MPEs. Isso pressupõe profunda revisão (ou reinvenção) da arquitetura e dos montantes dos mecanismos de crédito, de apoio em qualificação gerencial e de regulação ora oferecidos para o BRASIL. O que, por sua vez, pressupõe tirar o binóculo da Avenida Paulista e colocar o BRASIL no “centro do prato” das políticas econômicas, deixando de destinar para ele apenas “as migalhas que caem da borda”, via programas sociais de “geração de emprego e renda”.

*Mauro Oddo Nogueira é doutor pela Coppe/UFRJ e pesquisador do Ipea. Autor de Um Pirilampo no Porão: um pouco de luz nos dilemas da produtividade das pequenas empresas e da informalidade no Brasil.


Luiz Carlos Trabuco: Emprego, o debate inadiável

Os crescentes indicadores de desemprego não podem ser vistos como normais

A pandemia agravou um problema já estrutural na economia brasileira: a falta de emprego. No final do ano passado, a sociedade somava 11,6 milhões de desocupados. Agora, a taxa subiu para 13,3%, atingindo 12,8 milhões de pessoas, segundo dados da Pnad Contínua, divulgada pelo IBGE no mês passado. O País tem ainda um contingente de mais de 32 milhões de trabalhadores informais ou autônomos, que atuam sem carteira assinada e por conta própria, em condições quase sempre precárias. A crise no mundo do trabalho atinge duramente os mais jovens, com a perda de milhares de vagas para aprendizes e estagiários.

Sem perspectiva de criação de vagas na economia, o consumo recua, as empresas postergam investimentos e a arrecadação cai, fazendo o País andar para trás. O quadro social se deteriora, a desigualdade aumenta. É urgente, portanto, inserir o tema do emprego no debate econômico, sob pena de sacrificarmos de modo irreversível carreiras promissoras e a vida de pessoas.

Historicamente, o mercado de trabalho sempre foi palco de grandes desafios. Transformações provocadas pelos ciclos econômicos e pelas inovações tecnológicas fazem o nível de emprego oscilar. Foi assim, por exemplo, na transição da primeira Revolução Industrial (1760-1850), que contemplou a mudança do processo de produção artesanal para manufatura em larga escala, para a segunda (1850-1950), com o desenvolvimento da energia elétrica, das indústrias do aço e do petróleo.

Hoje, as relações de trabalho também passam por um profunda reestruturação, mas em velocidade nunca vista. Ciclos que levavam até 100 anos para se completar, agora se dão em dez ou menos. A globalização emoldura essa cena. Os mercados nacionais operam no compasso da demanda mundial por produtos e serviços, adaptando-se aos sucessivos ganhos de eficiência proporcionados pela tecnologia.

Integrado à economia mundial, competindo em todas as cadeias globais de comércio e finanças, o Brasil reflete esse fenômeno. Não podemos nos deixar enganar. Em nosso País, a situação é premente. O reaquecimento do mercado de trabalho depende de medidas capazes de absorver grandes contingentes e reintegrar milhões de pessoas, rapidamente, por meio da geração de empregos diretos.

Essa reconstrução será mais demorada do que foi a deterioração do mercado de trabalho, o que só reforça a necessidade de iniciá-la o quanto antes.

A responsabilidade pela geração de empregos é do estabelecimento de um projeto econômico. Não serão encontradas soluções por meio de voluntarismos ou por ação exclusiva do setor empresarial. Só a partir de uma formulação macroeconômica o setor privado encontrará condições para tomar as decisões mais adequadas em cada um dos seus segmentos.

É como ocorre hoje na maioria dos países industrializados. O emprego é fundamental para a recuperação econômica. O exemplo mais recente se deu no final de agosto, nos Estados Unidos, com a divulgação da nova política monetária do Federal Reserve, francamente voltada para reativar a economia e sua capacidade de abrir vagas de trabalho.

Os crescentes indicadores de desemprego não podem ser vistos como normais. Conhecemos vetores tradicionais, como a construção civil e infraestrutura, que já se mostraram capazes de reverter quadros dramáticos. Incentivos a esses setores, nos limites do teto de gastos, não entram em contradição com a necessidade do ajuste fiscal. O desafio do emprego será tanto melhor enfrentado se houver a aguardada confirmação de um programa de privatizações e concessões. Um ritmo mais constante para as reformas tributária e administrativa igualmente se completa como mensagem positiva aos investidores.

Uma estratégia econômica que inclua a questão do mercado de trabalho na agenda de prioridades – e ganhe espaço no discurso dos agentes públicos – tem tudo para melhorar as expectativas sobre o desenvolvimento econômico e social do Brasil.

  • PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BRADESCO. ESCREVE A CADA DUAS SEMANAS

Crescimento econômico no Brasil deve ir além do ‘voo de galinha’, diz Sérgio C. Buarque

Em artigo publicado na revista Política Democrática online, economista indica caminhos para o país avançar

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

“O crescimento recente da economia será apenas um ‘voo de galinha’ se não forem enfrentados alguns dos graves estrangulamentos econômicos”. A afirmação é do economista Sérgio Cavalcanti Buarque, professor aposentado da FCAP (Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco) da UPE (Universidade de Pernambuco), em artigo que produziu para a 15ª edição da revista mensal Política Democrática online. Todos os conteúdos da publicação podem ser acessados gratuitamente no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), que produz e edita a revista.

» Acesse aqui a 15ª edição da revista Política Democrática online

Segundo Buarque, que também é consultor em planejamento estratégico com base em cenários e desenvolvimento regional e local, os resultados econômicos do ano de 2019 não constituem inflexão na trajetória da economia brasileira. Para ir além do que chama de “voo de galinha”, ele sugere começar pela reforma tributária e a desestatização em áreas estratégicas, de resultado rápido na melhoria do ambiente de negócios e nos investimentos no Brasil.

A grande virada histórica da economia brasileira, conforme o artigo publicado na revista Política Democrática online, será possível apenas quando o país decidir apostar todas as suas fichas na educação, na qualificação profissional e na inovação. “Nestes segmentos, cabe ao Estado papel decisivo, o que depende da recuperação das finanças públicas e de sua capacidade de investimento. Apesar dos pesares, 2019 deu alguns passos à frente”, afirma o professor.

Em sua análise, o economista observa que, depois da profunda recessão que afundou a economia brasileira, 2019 foi o terceiro ano consecutivo de crescimento econômico, bem modesto, mas confirmando a recuperação iniciada em 2017. Ele diz que não dá para comemorar, ao considerar os quase 12 milhões de desempregados (11,2% da População Economicamente Ativa) e 4,7 milhões de desalentados.

“Houve pequeno declínio do desemprego em 2019, acompanhado, contudo, da expansão da informalidade e da precarização do mercado de trabalho”, acentua Buarque. “Além da persistência do alto nível de desemprego, a economia brasileira terminou 2019 ainda com elevada ociosidade e baixíssima taxa de investimento, apenas 15,5% do PIB (Produto Interno Bruto)”, assevera.

Todos os artigos desta edição da revista Política Democrática online serão divulgados no site e nas redes sociais da FAP ao longo dos próximos dias. O conselho editorial da publicação é composto por Alberto Aggio, Caetano Araújo, Francisco Almeida, Luiz Sérgio Henriques e Maria Alice Resende de Carvalho.

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Vinicius Torres Freire: Cinzas no mundo do trabalho

Além de efeitos da crise, há sintomas de precariedades crônicas no emprego

A discussão do futuro das aposentadorias faz a gente lembrar que existem trabalhadores que dificilmente têm condições de contribuir para o INSS, por exemplo. De costume, a situação do trabalho é um assunto mais raro no debate público mais geral.

No entanto, é o caso de prestar atenção no que se passa, até porque um dos pilarzinhos da quase estagnação econômica, as estacas dessa palafita, é o consumo, que em parte grande depende da recuperação de emprego e salário.

Há cheiro de queimado no mundo do trabalho:

1) Emprego e salário desaceleram desde o terceiro trimestre do ano passado;

2) A precarização aumenta;

3) Setores em que houve grande devastação do trabalho, mal se recuperam (construção civil) ou têm sintomas de resfriado (indústria);

4) Não há decisões de políticas públicas que tratem da grande desgraça do emprego, de um setor ainda em recessão, o da construção civil;

5) O ritmo de criação de emprego formal desacelera e começa a ficar relevante a quantidade de empregados pelo regime de trabalho intermitente, o que suscita pelo menos uma dúvida séria sobre a qualidade do trabalho oferecido com carteira assinada.

Uma das categorias de emprego que crescem de modo mais rápido e relevante é o “por conta própria”, 23,9 milhões das 92,5 milhões de pessoas ocupadas. Destas “por conta”, 19,2 milhões não têm CNPJ. São informais de quase tudo.

Com razão, a gente se preocupa com o que vai ser das pessoas formalmente empregadas por trabalho intermitente. Por ora, são cerca de 10% dos novos empregos formais. Foi assim em 2018 (cerca 50 mil empregos intermitentes); foi assim em janeiro de 2019.

Não sabemos mesmo se essas pessoas de fato estão trabalhando, quanto ganham, como fica sua situação na Previdência (há um vácuo jurídico). Mas, repita-se, foram 50 mil contratados por essa invenção da reforma trabalhista. De um ano para cá, apareceram mais 400 mil pessoas ocupadas na categoria “por conta própria sem CNPJ”.

As estatísticas não são diretamente comparáveis (o intermitente aparece nos registros do Caged, o “por conta” nas amostras da Pnad do IBGE). Mas é possível notar a diferença de ordem de grandeza e a relativa indiferença do público em relação aos “por conta sem CNPJ” (para nem falar dos empregados sem carteira assinada)

Temos, pois, um problema de conjuntura que mal deixou de ser dramático combinado a uma bomba armada de gente desprotegida pela Previdência.

A criação de emprego formal cresceu ao ritmo anual de 1,2% em janeiro de 2019. Para refrescar a memória, a construção civil chegou a perder 33% de seus empregos formais. As indústrias extrativa e de transformação, algo na casa de 14%.

Os “por conta própria”, empregados sem CLT e mesmo empregados sem CNPJ são ainda parcelas crescentes do conjunto dos empregados. Não sabemos bem o que fazem os “por conta” nem de suas preferências de trabalho _são dos mais mal pagos. Para alguns otimistas, não se trata apenas de arranjo conjuntural, bico na crise, mas de gente que prefere se empregar de outro modo, “novas modalidades de trabalho que não são emprego”.

Por outro lado, sabemos é que empresas estão ociosas, com medo de contratar, de investir. Pode ser que algumas tenham se renovado e, estruturalmente mais enxutas, precisem de menos trabalho, tudo mais constante.

Seja qual for a combinação de crise de conjuntura e problemas estruturais, mesmo manter esse ritmo de crescimento ínfimo pode ficar difícil.


Cristovam Buarque: A pauta dos jovens

Não sobreviveremos se não formos capazes de formular causas comuns que nos unam como povo e nos construam como nação, com coesão social e rumo histórico. A mais importante dessas causas é o cuidado e a formação de nossas crianças e jovens. Os políticos devem unificar partidos e superar divergências para atender às necessidades da pauta desse público. E para cuidar dos jovens é preciso entender os problemas da cidade e do país na ótica deles.

Para os jovens, o emprego não é apenas questão de crescimento econômico, porque sabem que a robótica e a inteligência artificial não vão criar tantos postos de trabalho quanto no tempo de seus pais. O emprego futuro será resultado de educação comprometida com empregabilidade, de leis trabalhistas flexíveis adaptadas às mudanças no mundo e da capacidade dos jovens para o empreendedorismo. Eles querem uma economia dinâmica, que sirva não apenas para crescer a produção material, mas também para aumentar o tempo livre de cada pessoa, ampliar a criação cultural e respeitar o meio ambiente.

Para os jovens, a educação precisa de professores com melhor formação e boa remuneração, que sejam bem avaliados e motivados, trabalhando em escolas bonitas, confortáveis e modernamente equipadas, todas em horário integral, onde recebam a formação de que necessitam para entender, aproveitar e transformar o mundo, fazendo-o melhor para seus filhos e netos. Mas, para os jovens, o ensino de qualidade pouco tem a ver com as escolas de hoje; acham que a educação deve se fazer com o que há de mais moderno em tecnologia da informação, com liberdade para o aluno escolher o que quer estudar, com aulas a distância, sem necessidade de presença física permanente.

Eles querem aprender a conservar a natureza, respeitar a diversidade, adquirir um ou mais ofícios que lhes permitam trabalho ao longo da vida e conhecimento para mudar de profissão se necessário; aprender a comprometer-se com a defesa da democracia, da liberdade e dos direitos civis; aumentar a produtividade na economia, o sentimento e a prática da cidadania e da solidariedade.

Os jovens sabem que o problema das drogas não será resolvido com a proibição delas; que até agora não reduziu o consumo, mas promoveu o tráfico e encheu as cadeias. Eles desejam uma sociedade que, no lugar de proibir drogas, faça com que o uso delas seja desnecessário, graças ao bem-estar social e à realização pessoal e com felicidade.

Os nossos jovens querem segurança para se locomover, estudar, viver em paz, sem medo de bala perdida ou assalto; mas para eles a violência não deve ser enfrentada apenas com intervenção policial mas, sobretudo, com a construção de uma consciência de paz na sociedade.

Os jovens não querem aposentadoria imediata, mas, para eles, a principal qualidade da Previdência é a sustentabilidade ao longo de décadas. A política não deve ser apenas sem corrupção no comportamento dos políticos, mas também feita sem corrupção nas prioridades, atendendo às necessidades sociais, e garantindo equilíbrio ecológico e estabilidade monetária; feita por políticos com dignidade, austeridade e integridade, sem uso nem defesa de mordomias, nem desperdícios.

Apesar da desconfiança, é preciso que os jovens saibam que alguns candidatos oferecerão propostas para atender a pauta deles, recuperando ou apoiando projetos que Brasília já conheceu no governo entre 1995 e 1998, tais como: Escola em Casa, Poupança Escola, Projeto Saber, Temporadas Populares, Escola Candanga, Projeto Orla, Fecitec, PAS.

A pauta para os jovens só será possível se for a pauta construída por eles próprios. Os políticos devem identificar, entender e defender a pauta dos jovens, mas são eles que escolherão os políticos. No quadro atual, é difícil um jovem acreditar na política; eles sabem, porém, que só com a participação na política será possível construir um Brasil com coesão e rumo e que isso depende do envolvimento deles. Há pouco mais de um século parecia impossível um Brasil sem escravidão, mas os jovens abolicionistas conseguiram. (Correio Braziliense – 03/07/2018)


Arnaldo Jardim: Sustentabilidade que emprega

A economia verde pode criar 24 milhões de novos empregos no mundo todo até 2030. Muitos deles, no setor agro na agricultura com baixa emissão de carbono. Os dados são do relatório “Perspectivas Sociais e de Emprego no Mundo 2018″, elaborado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e divulgado nesta semana. É a sustentabilidade ambiental repercutindo também no social e no econômico.

Ao mesmo tempo, o documento aponta que os aumentos de temperatura projetados pelo aquecimento global poderão fazer com que o estresse térmico, particularmente na agricultura, leve a condições médicas extremas, incluindo exaustão e derrame, e cause uma perda global de 2% nas horas trabalhadas até 2030, devido a doenças.

Sempre defendi que preservar o meio ambiente não apenas poupa o nosso planeta, mas pode ser algo lucrativo e transformador. Com o relatório da OIT, isso fica ainda mais claro – ao mesmo tempo em que se torna mais urgente que adotemos um modo de produção cada vez mais harmônico com a natureza.

Em parte, esse avanço na geração de empregos deve ocorrer no setor de energia pela promoção do uso de veículos elétricos e a melhoria da eficiência energética de edifícios. No continente americano, as práticas sustentáveis têm potencial de gerar 3 milhões de vagas, enquanto na Ásia e Pacífico podem surgir 14 milhões. Já na Europa, a previsão é de 2 milhões de empregos criados.

O estudo também destaca que as medidas sustentáveis devem impactar serviços como os ligados à agricultura, turismo e pesca. Eles podem abranger desde a purificação do ar e da água, a renovação e fertilização do solo, o controle de pragas, a polinização, até a proteção contra condições climáticas extremas.

As principais conclusões do estudo da OIT dão conta ainda de que 6 milhões de empregos podem ser criados pela “economia circular” (reciclagem, reparos, aluguel e remanufatura), substituindo a “extração, fabricação, uso e descarte”.

2,5 milhões de postos de trabalho serão criados em eletricidade baseada em fontes renováveis, compensando cerca de 400 mil empregos perdidos na geração de eletricidade baseada em combustíveis fósseis. Ou seja, a geração de novos empregos pela economia verde vai superar com folga as perdas de vagas em alguns setores pelo mesmo motivo.

É atentos a isso que os países devem tomar medidas urgentes para antecipar as habilidades necessárias para a transição para economias mais verdes e oferecer novos programas de treinamento.

Ainda segundo o estudo, a transição para sistemas agrícolas mais sustentáveis poderia criar empregos em fazendas orgânicas de médio e grande porte, além de permitir que os pequenos proprietários diversifiquem suas fontes de renda, especialmente se os agricultores tiverem as habilidades certas.

O Brasil tem todas as condições necessárias para fazer isso acontecer. Temos solo, água e incidência solar que nos permitem sermos líderes na agricultura mundial. Mas precisamos também ser líderes em uma produção sustentável.

Esta renovação passa também por uma mudança mais radical na matriz energética, que deve ser menos dependente dos combustíveis fósseis e mais limpa. Um ótimo exemplo é o nosso etanol, que emite até 20 vezes menos gases causadores do efeito estufa, gera emprego e renda e ainda cuida do solo.

Uma renovação que pode incluir também outras energias verdes, como a eólica, que tem enorme potencial em Estados do Nordeste, por exemplo. Uma mudança que traz ganhos não apenas para a natureza, mas também para o bolso e o País.

Estudo realizado pela consultoria KPMG com 200 executivos de empresas em todo o mundo mostrou que há interesse mundial em investir no Brasil para esse tipo de geração de energia. 33% dos entrevistados se mostraram dispostos a investir em nosso País, número menor apenas do que as intenções para a gigante China, com 35% das respostas.

É preciso que o Brasil se abra de uma vez por todas para os ganhos trazidos pela economia verde. Forte produtor de etanol, território rico de ventos e abundante em luz solar, o País é um campo fértil para que se lancem sementes como energias eólica e solar.

Traz investimentos, gira a economia, destrava o desenvolvimento e faz bem à natureza. Não podemos mais esperar. Esta é a hora definitiva de transformarmos nossa matriz energética, resultando em ganhos econômicos, sociais e ambientais que são indiscutíveis.

A hora da economia verde é agora! E o brasil pode ser o grande protagonista mundial!

* Arnaldo Jardim é deputado federal pelo PPS-SP


Almir Pazzianotto Pinto

Almir Pazzianotto Pinto: Robotização e desemprego

Com a informatização, a globalização e o novelo trabalhista descobrimos a fórmula do fracasso

A recessão em que mergulhou a economia parece haver despertado a atenção para o problema do emprego. Emprego, aliás, não é problema, mas desemprego o é, e de gravíssima gravidade, como diria Ruy Barbosa.

Exceção feita a um ou outro momento de crise, durante décadas o Brasil conheceu a euforia do crescimento, com elevada capacidade de geração de vagas de trabalho. Nesse sentido, observou Mário Henrique Simonsen: “A feição mais surpreendente da inflação brasileira, no período pós-guerra, consiste na sua capacidade de ter coexistido, pelo menos até 1961, com uma elevada taxa de crescimento econômico. Com efeito, entre 1947 e 1961, não obstante a alta crônica dos preços, o produto real do País cresceu a uma taxa média de 5,8% ao ano – taxa das mais elevadas no cenário mundial do após-guerra. O produto real per capita expandiu-se, em média, de 3,0% ao ano – o que indiscutivelmente representa um ritmo de desenvolvimento econômico bastante satisfatório” (A Experiência Inflacionária no Brasil, Ed. Iepes).

Durante o governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), a implantação da indústria automotiva, a construção de Brasília, a expansão dos sistemas de comunicação, a geração e distribuição de energia elétrica dinamizaram o incipiente parque industrial, proporcionaram a criação de milhões de empregos diretos e indiretos e fortaleceram o mercado consumidor.

Apesar da inflação, que foi de 12% em 1956, alcançou 40% em 1959 e retrocedeu a 30% em 1961, o Brasil permaneceu firme na rota do crescimento, que passou a ter na indústria automotiva o melhor dos instrumentos de aferição. Quem pesquisar os anuários editados pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) constatará o rápido aumento do volume de veículos fabricados e do número de empregados a partir de 1957, quando 9.773 trabalhadores produziram o total de 30.542 automóveis, caminhonetes, caminhões e ônibus. Em 2007, passados 50 anos, a produção alcançou o número de 2.980.163 unidades e a quantidade de empregos diretos atingiu 104.274.

A Revolução Industrial do século 18 teve na expansão do proletariado uma das condições essenciais de sucesso. A constante evolução dos equipamentos mecânicos, para atender ao rápido crescimento da demanda, exigia, em quantidade sempre maior, a energia do trabalho humano.

Ao longo de décadas avaliava-se o sucesso do empreendimento pelo número de contratações. O setor têxtil, o primeiro a ser beneficiado com a invenção de máquinas revolucionárias, requeria elevado contingente de operários, operárias e aprendizes, submetidos a condições degradantes.

Decorrido pouco mais de um século, Valéry Giscard d’Estaing, presidente da França, percebeu que algo de inusitado ocorria no mundo industrial. Em dezembro de 1976, interessado em conhecer a nova realidade, ordenou ao inspetor-geral das Finanças, Simon Nora, a apresentação de relatório sobre o que denominou informatização da sociedade. No ofício que lhe endereçou, escreveu: “O desenvolvimento das aplicações da informática é um fator de transformação econômica e social e do modo de vida; convém que a nossa sociedade esteja em condições, ao mesmo tempo, de o promover e de o controlar para colocá-lo a serviço da democracia e do desenvolvimento humano”.

O desemprego é fruto perverso de vários fatores. Não se trata, como poderia parecer, de filho exclusivo da recessão. Para ele contribuem, além da engenharia da informática, também conhecida como robotização, a globalização, o descalabro administrativo causado pela incompetência lulopetista e a arcaica, emaranhada e questionada legislação trabalhista, na qual incluo as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego.

A rápida automação responde por parte considerável do problema, pois o desemprego que causa é irreversível. Volto a me referir à indústria automotiva, que em 2016, com o mercado em queda livre, fabricou 2.157.379 veículos com 104.414 empregados, produzindo 20,67 veículos por empregado (em 2013 conseguiu 27,6). Dito de outra forma, com a robotização a indústria reduz trabalhadores para fabricar maior número de produtos.

Em entrevista ao Estadão (1.º/1/2017) o presidente da Volkswagen, David Powels, relatou que a empresa, “após ver sua participação no mercado despencar nos últimos anos”, passou por “reestruturação dura, mas necessária”. Em seguida, afirmou: “Hoje temos 18 mil trabalhadores (nas quatro fábricas). Há dois anos eram 22 mil. São 4 mil a menos, mas todos saíram por meio de programas de demissão incentivada”. Para ser competitiva a Volks não admitiu, como faria no passado, simplesmente dispensou. É o que hoje todos fazem: as empresas reduzem o número de assalariados para eliminar despesas obrigatórias como horas extras, INSS, FGTS e adicionais diversos, evitar ações trabalhistas, afastar greves, melhorar resultados de produtividade.

O desemprego tecnológico está em toda a economia: construção civil, sistema financeiro, indústrias de transformação. Adicionando-se à informatização a globalização e o indecifrável novelo trabalhista, descobrimos a fórmula infalível do fracasso.

Quem padeceu sob a inflação galopante não deseja revivê-la. Não é disso que falo, mas da necessidade de maior liberdade para que o mercado volte a funcionar. O intervencionismo excessivo é prejudicial para as relações de trabalho. Como está não podemos permanecer. O desempregado não dispõe de recursos para esperar. O caminho para o revigoramento do mercado de trabalho passa pela reforma trabalhista. Não qualquer reforma, mas aquela que garanta segurança ao investidor.


* Advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho