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Cristiano Romero: Construção - No meio do caminho tinha uma pedra

Oligopólios jogam preços nas alturas e freiam setor

Responsável por cinco a 6% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, a construção civil foi o setor que mais gerou empregos formais no ano passado - 106 mil. Considerando toda a cadeia produtiva da construção, o setor representa 10% de tudo o que economia brasileira produz. Em 2014, quando se verificou o pico recente do setor, chegou a 11,5%.

A participação da cadeia da construção no PIB só é menor que a da agroindústria. Outro dado relevante é a fatia do setor na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), isto é, na taxa de investimento da economia em bens de capital (máquinas e equipamentos) e construção: 50%, segundo a média histórica.

O setor de construção, como se sabe, é o que mais gera empregos no país: 12,5 milhões no total. Seu efeito multiplicador na economia é formidável. Estima-se que cada R$ 1,00 investido na construção civil gere R$ 1,88 na atividade. Para cada 10 empregos diretos gerados no setor, são gerados outros cinco indiretos. Embora seja um setor pouco importador de materiais e serviços, é exportador de bens e serviços.

A cadeia da construção compreende quatro áreas. Na primeira, estão as construtoras, incorporadoras e prestadoras de serviços auxiliares de construção, responsáveis por realizar obras de edificação e infraestrutura. Na segunda, estão as indústrias que produzem materiais de construção, máquinas e equipamentos.

Na terceira parte da cadeia, está o comércio varejista e atacadista. Por fim, há as atividades de prestação de serviços, tais como serviços técnico-profissionais, financeiros e de seguros.

Abrindo-se a participação de cada segmento, temos aproximadamente o seguinte: a construção responde por 61% do setor, seguida pela indústria de materiais (11,4%), o comércio de materiais (9%), os serviços (5%), o segmento de máquinas e equipamentos (0,6%) e por outros fornecedores (13,1%). Em termos de fatia do PIB, a construção lidera com 6,4%, seguida de materiais de construção (2,8% do PIB), serviços (0,7%), máquinas e equipamentos (0,2%) e outros materiais (0,1%).

Há uma forte correlação positiva entre a variação do PIB brasileiro e o setor de construção. A história mostra que, quando o PIB sobe, o PIB da construção cresce acima de sua variação; quando o primeiro cai, o do setor cai abaixo da queda da economia.

Depois de atingir o pico em 2014, primeiro ano da grande recessão brasileira (2014-2016), que nos subtraiu mais de 7% do PIB e desorganizou a economia de tal maneira que, até hoje, não houve efetivamente recuperação digna desse nome, o setor da construção amargou longo e penoso declínio. No fim do ano passado, estava 36,18% abaixo do pico.

Mas, foi em 2020, o primeiro ano da pandemia _ nenhum cidadão imaginou que, na Ilha de Vera Cruz, não teríamos vacina após 14 meses de tragédia _, que o setor começou a reagir graças a dois fatos inusitados: brasileiros de praticamente todas as classes sociais aproveitaram a economia forçada de dinheiro, provocada pelo isolamento social, para fazer reformas e também para construir e o fato de a taxa de juros dos financiamentos imobiliários está nos menores níveis da história.

Números da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) mostram que, no quarto trimestre de 2020, os lançamentos de novas unidades avançaram 33,2% em relação ao trimestre anterior, enquanto as vendas aumentaram 3,9%. Quando comparado ao quarto trimestre de 2019, lançamentos e oferta final caíram, mas isso não é necessariamente ruim.

"O mercado imobiliário vendeu mais 10 % em 2020, comparado com 2019; os lancamentos reduziram 13 %, logo, precisaremos construir o que foi vendido e repor o estoque, portanto, 2021 seria um ano para trabalhar à vontade", explica Luiz Carlos Martins, presidente da CBIC. "No caso de obra pública, os governos estaduais estão com dinheiro, estão contratando e pagando em dia."

O bom desempenho gerou confiança no setor, como demonstra o gráfico. Índice acima de 50 pontos mostra expectativa dos participantes do mercado de crescimento nos próximos meses. Mas, já começou a cair e a razão é uma só: a explosão dos preços dos insumos. Até as pedrinhas da rua sabem que o custo de insumos cresceu uma barbaridade porque tanto a sua produção doméstica quanto a internacional recuaram no início da pandemia.

Olhando a situação mais de perto, porém, o que se vê é muito feio: aprveitando-se de seu poder de mercado, isto é, do grau de concentração e das barreiras que Brasília impõe a concorrentes estrangeiros, várias indústrias, a siderúrgica e a de resinas à frente, estão tirando proveito do momento para elevar suas margens de lucro. O problema é que a prática asfixia o setor e o inviabiliza.


Cristovam Buarque: A crise do teto

O Brasil tinha todos os recursos para se transformar em imenso edifício, mas esqueceu de construir a base sobre a qual edificaria seu futuro. Entre as muitas causas desta fragilidade estão a falta de base educacional e de credibilidade financeira. A conquista de credibilidade é condição básica para construir o Edifício Brasil. É neste sentido que o país debate a decisão radical de impor constitucionalmente limite nos gastos do setor público.

Pode-se discutir se o teto deve ser reajustado apenas pela inflação ou levar em conta parte do aumento da receita de um ano para o outro, seja por melhor eficiência na arrecadação, pelo crescimento do PIB ou por aumento de impostos; mas com a falência financeira do setor público e o descrédito de décadas de irresponsabilidade e inflação, a proposta de levar em conta a aritmética financeira é condição necessária para retomar a credibilidade e, em consequência, o crescimento do emprego.

Caso a regra já existisse, talvez não tivéssemos feito milagres econômicos, mas teríamos um Edifício Brasil sólido, diferente do instável no qual vivemos e que deixaremos para as nossas crianças. Além disso, o teto forçará debates sobre quais são as prioridades que a sociedade define, fazendo surgir os conceitos de “direita” e “esquerda” na escolha do destino dos recursos públicos limitados e sem a ilusão da inflação.

No lugar da mentira de aumentar gastos em todos setores, sem disputas, como nos acostumamos, a política cairá “na real” e demonstrará quem escolhe os gastos sociais, dentro das possibilidades de uma economia eficiente, sem ilusões, acomodamento ou desperdícios e com finanças equilibradas Mas, o teto pode impedir a construção da base educacional necessária, se o Congresso não for capaz de agir para elevar os gastos no setor, graças à redução de outros gastos supérfluos ou injustos.

Dependendo de força política, o teto não impede mais recursos para Saúde ou Educação, nem impede a continuação de obras faraônicas; ou as políticas de subsídios a setores industriais ineficientes; nem evita privilégios salariais a marajás. Tudo dependerá da força política. Será possível descobrir quem estará a favor da Educação, porque agora precisará ficar contra gastos em outros setores. Os recursos limitados induzirão também quem é capaz de fazer mais, com menos gastos, graças à maior eficiência.

Não se deve esquecer que este teto pode ser mais um fracasso, se limitar às despesas sem ao mesmo tempo impedir a avassaladora pressão que existe, inclusive na Constituição, por mais gastos e se não transferirmos para o setor privado os investimentos que não exigem exclusividade estatal. Sem estas ações, em poucos anos a PEC se esgotará e exigirá nova reforma da Constituição para liberar os gastos, aceitar a inflação e a crônica falta de credibilidade. Neste caso, a crise fiscal se transformará em crise constitucional: será a crise do teto.

Cristovam Buarque é senador (PPS-DF)


Fonte: pps.org.br