O Brasil tinha todos os recursos para se transformar em imenso edifício, mas esqueceu de construir a base sobre a qual edificaria seu futuro. Entre as muitas causas desta fragilidade estão a falta de base educacional e de credibilidade financeira. A conquista de credibilidade é condição básica para construir o Edifício Brasil. É neste sentido que o país debate a decisão radical de impor constitucionalmente limite nos gastos do setor público.
Pode-se discutir se o teto deve ser reajustado apenas pela inflação ou levar em conta parte do aumento da receita de um ano para o outro, seja por melhor eficiência na arrecadação, pelo crescimento do PIB ou por aumento de impostos; mas com a falência financeira do setor público e o descrédito de décadas de irresponsabilidade e inflação, a proposta de levar em conta a aritmética financeira é condição necessária para retomar a credibilidade e, em consequência, o crescimento do emprego.
Caso a regra já existisse, talvez não tivéssemos feito milagres econômicos, mas teríamos um Edifício Brasil sólido, diferente do instável no qual vivemos e que deixaremos para as nossas crianças. Além disso, o teto forçará debates sobre quais são as prioridades que a sociedade define, fazendo surgir os conceitos de “direita” e “esquerda” na escolha do destino dos recursos públicos limitados e sem a ilusão da inflação.
No lugar da mentira de aumentar gastos em todos setores, sem disputas, como nos acostumamos, a política cairá “na real” e demonstrará quem escolhe os gastos sociais, dentro das possibilidades de uma economia eficiente, sem ilusões, acomodamento ou desperdícios e com finanças equilibradas Mas, o teto pode impedir a construção da base educacional necessária, se o Congresso não for capaz de agir para elevar os gastos no setor, graças à redução de outros gastos supérfluos ou injustos.
Dependendo de força política, o teto não impede mais recursos para Saúde ou Educação, nem impede a continuação de obras faraônicas; ou as políticas de subsídios a setores industriais ineficientes; nem evita privilégios salariais a marajás. Tudo dependerá da força política. Será possível descobrir quem estará a favor da Educação, porque agora precisará ficar contra gastos em outros setores. Os recursos limitados induzirão também quem é capaz de fazer mais, com menos gastos, graças à maior eficiência.
Não se deve esquecer que este teto pode ser mais um fracasso, se limitar às despesas sem ao mesmo tempo impedir a avassaladora pressão que existe, inclusive na Constituição, por mais gastos e se não transferirmos para o setor privado os investimentos que não exigem exclusividade estatal. Sem estas ações, em poucos anos a PEC se esgotará e exigirá nova reforma da Constituição para liberar os gastos, aceitar a inflação e a crônica falta de credibilidade. Neste caso, a crise fiscal se transformará em crise constitucional: será a crise do teto.
Cristovam Buarque é senador (PPS-DF)
Fonte: pps.org.br