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Luiz Carlos Azedo: Quando o conceito é fatal

De agosto/2020 a junho/2021, registramos os maiores índices de desmatamento. SP, GO, MG e MT registraram mudanças impressionantes

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

Houve uma mudança muito significativa na conjuntura política. Em primeiro lugar, a ameaça de um golpe de Estado, que deixou o país à beira de um ataque de nervos, desapareceu do horizonte próximo após o 7 de Setembro. Não houve a adesão militar contra o Supremo Tribunal Federal (STF) que o presidente Jair Bolsonaro esperava, as reações das instituições políticas e da sociedade esvaziaram a mobilização golpista. Desde então, o eixo da vida política nacional se deslocou da crise sanitária, cuja crônica política e criminal está no relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado sobre a pandemia da covid-19, para a crise da nossa economia, tendo por pano de fundo a antecipação da disputa eleitoral de 2022.

Especialistas em planejamento sabem que um erro de conceito pode ser fatal. Muitas vezes, o erro decorre de um falso diagnóstico; outras, de um conceito errado. A tempestade perfeita pode ser fabricada quando as duas coisas coincidem com uma concepção equivocada, por exemplo, o negativismo em relação à ciência. No caso da pandemia, o erro de diagnóstico foi considerar a covid-19 uma “gripezinha”; o de conceito, apostar na “imunização de rebanho” para manter a economia aquecida. Com isso, buscou-se toda sorte de atalhos para evitar a recessão, que passou a ser o objetivo do governo, em vez de salvar a vida das pessoas. A cloroquina entra nessa história como uma poção mágica. Havia outra solução simples para um problema tão complexo (acreditem, elas também existem) — a vacinação em massa.

Vejam bem, não estamos falando que a produção da vacina não é simples. Sua fabricação é um processo complexo, mas a pesquisa científica intensa resolveu o problema em pouco mais de um ano após a identificação do vírus e seu sequenciamento genético. Estamos falando do conceito — a imunização em massa — já consagrado mundialmente pelas autoridades sanitárias. A erradicação da poliomielite, que foi a doença infantil mais devastadora do século passado, é um excelente exemplo. A pólio era misteriosa e se expandia no verão, com causas desconhecidas. Nos Estados Unidos, a ignorância levou as pessoas a pôr a culpa nos sorvetes; e o preconceito, nos negros pobres e nos imigrantes, principalmente asiáticos.

Mesmo adultos corriam grande risco. O presidente Franklin Delano Roosevelt foi para a cadeira de rodas aos 39 anos, quando contraiu a doença. Cada surto de pólio deflagrava uma quarentena, como acontece agora com a covid-19. Em 1916, em Nova York, houve 8.990 casos, com 2.400 óbitos; em 1952, 57 mil casos, 3 mil mortes e 21 mil crianças com paralisia permanente. Um paciente com pólio no hospital custava US$ 900, quando o salário médio era de R$ 875.

Sem a vacina criada por Jonas Salk e Albert Sabin, estima-se que os Estados Unidos teriam 250 mil pessoas com paralisia, a um custo de US$ 30 bilhões. Não temos projeções de quanto já estamos economizando com a vacinação em massa da população, mas estima-se que o custo da pandemia no Brasil chegue a R$ 700 bilhões, cerca de 10% do nosso PIB, ou o equivalente a 20 anos de Bolsa Família. Ou seja, dá para ter uma noção do prejuízo causado pelo negativismo do presidente Jair Bolsonaro, que até hoje não tomou a vacina.

Aquecimento

Mais difícil de calcular é o prejuízo do negativismo em relação ao aquecimento global. Alguns números podem ser ilustrativos. Até o fim de setembro, somente 22% das verbas destinadas para o combate ao desmatamento e às queimadas foram utilizados pelo governo federal. O governo resolveu economizar o dinheiro do combate ao desmatamento e às queimadas: de R$ 384,9 milhões em caixa para isso, somente foram gastos R$ 83,5 milhões. De agosto do ano passado a junho deste ano, registramos os maiores índices de desmatamento. São Paulo, Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso registraram mudanças climáticas impressionantes. As mais espetaculares foram as tempestades de poeira. Quanto estamos perdendo de investimentos ao “passar a boiada”?

O Brasil já foi muito respeitado por sua política ambiental, agora é pária internacional. Bolsonaro não vai à Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), que começa hoje, em Glasgow, na Escócia, embora tenha participado da reunião do G-20 em Roma, na Itália, ontem. Não teria condições de participar de um fórum como esse sem passar constrangimentos.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-quando-o-conceito-e-fatal

José Serra: Um teto seguro e possível

PEC 182 propõe excluir despesas com benefícios do RGPS e o excesso de precatórios previsto para o ano seguinte

José Serra / O Estado de S. Paulo

O Orçamento do governo federal precisa do teto de gastos, e nossos concidadãos mais vulneráveis e mais duramente atingidos pela pandemia também precisam de um teto para morar, de comida no prato e de uma renda básica para viver dignamente. O governo alega que esses dois objetivos são incompatíveis, mas existe no Congresso uma proposta de legislação tecnicamente superior, que permite ao Executivo financiar novos gastos com assistência aos mais vulneráveis, mas preservando o arcabouço institucional na área fiscal e evitando postergar infinitamente o pagamento de dívidas do governo já sancionadas em definitivo pelo Judiciário (os afamados precatórios).

A proposta do governo federal para mudar a forma de calcular o teto de gastos, combinada com a fixação de um limite de pagamento de precatórios, pode ser encarada como uma bomba fiscal. Trata-se de uma aventura que terminará com a sociedade toda sem saber o rumo que o País resolveu seguir, vivendo com juros altos e inflação descontrolada.

Após a aprovação da reforma da Previdência em 2019, apresentei a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 182, com o objetivo de aperfeiçoar e harmonizar as instituições e regras fiscais em vigor no País. São pouquíssimos artigos, mas com efeitos importantes: amplia controladamente o espaço fiscal no teto de gastos e institui no Brasil um sistema de revisão periódica dos gastos públicos. É uma mudança que permite manter o Teto Constitucional até 2036, com possibilidade de alteração em 2026, tal como estabelece a Emenda Constitucional promulgada no final de 2016.

A proposta exclui as despesas com benefícios previdenciários da base de cálculo do teto de gastos de forma retroativa a 2016. No Orçamento do próximo ano, essa medida abre espaço de R$ 9,2 bilhões. O texto também deveria retirar o excesso de precatórios previsto para o ano subsequente, em relação ao que se espera gastar no ano corrente, o que amplia o espaço fiscal adicional para R$ 43,2 bilhões.

Uma simples matemática ajuda a entender por que é uma boa medida excluir o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) do limite para gastos. As despesas com previdência social ocupam cerca de metade do teto do Poder Executivo e crescem a taxas bem acima do indicador que corrige anualmente esse limite de gastos. Isso quer dizer que as demais despesas do Orçamento, como investimentos, saúde e educação, serão comprimidas pelo crescimento do RGPS, comprometendo o suporte estatal em áreas vitais para o desenvolvimento do País.

Propostas que buscam excluir do teto os gastos com investimentos, a saúde e a educação apenas acentuam o principal problema do teto: o efeito de compressão do RGPS sobre as demais despesas do Poder Executivo. São propostas que acabam com a regra constitucional aprovada em 2016.

Excluir do teto o excesso de precatórios envolve questões fiscais e morais. Primeiro, abrir espaço fiscal limitando o pagamento de precatórios, como propõe o governo federal, é uma pedalada fiscal: gasta-se mais gerando dívida que não aparece nas estatísticas fiscais oficialmente divulgadas pelo Banco Central e pelo Tesouro Nacional. Segundo, é simplesmente um calote. O País não pode sinalizar ao mundo que deixa de pagar despesas decorrentes de sentenças judiciais.

A aprovação da PEC 182 é oportuna porque abre espaço fiscal de R$ 43,2 bilhões no teto, viabilizando uma agenda social indispensável para enfrentar a fome e a pobreza extrema. Por outro lado, permite quitar as dívidas com precatórios, dando exemplo de responsabilidade aos credores do Estado brasileiro.

A PEC 182 também avança propiciando inovação institucional. Adotando princípios gerais de um sistema de revisão periódica de gastos públicos, lá fora conhecido como

Spending Reviews, a PEC coloca o País na rota dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em matéria de governança fiscal. Mais importante: busca instituir no País um modelo de gestão fiscal que pode revolucionar a forma de discutir o orçamento público. Não há quem possa racionalmente opor-se à revisão periódica dos gastos públicos, com transparência e método racional envolvendo toda a administração pública.

Sobre a proposta do governo, tenho pouco a dizer: é uma bomba fiscal. Sua fórmula de correção do teto abre espaço fiscal comprometendo o planejamento orçamentário, já que o Orçamento do ano subsequente será enviado ao Congresso sem a definição do teto que deveria orientar a gestão dos recursos públicos. Aí, sim, transforma nosso Orçamento em peça de ficção. Sobre o limite de pagamento de precatórios, convenhamos, é calote, é pedalada, é tudo, menos responsabilidade fiscal.

As lideranças do Poder Executivo e do Congresso Nacional devem entender que o País está à beira de um precipício fiscal. Nunca foi tão importante priorizar a assistência social e os gastos que permitem retomar o caminho da prosperidade. Precisamos manter a parcela da sociedade mais vulnerável protegida por um teto bem construído, sem inflação fora do controle e longe das taxas de juros elevadas.

*Senador (PSDB-SP)

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,um-teto-seguro-e-possivel,70003881843


Maria Cristina Fernandes: Jair, Paulo e Arthur

Presidente regateia com o Centrão e se vale do bloco para tirar de Guedes o que precisa para turbinar reeleição

Maria Cristina Fernandes / Valor Econômico

O presidente Jair Bolsonaro usa o ministro Paulo Guedes para regatear o preço do resgate cotidiano que lhe é cobrado pelo Centrão. E se vale do bloco para tirar do ministro da Economia o que precisa para turbinar sua reeleição. Não é um casamento de papel passado porque tem que ser renovado a cada ano no Orçamento. Tampouco é uma união estável. Trata-se de uma relação a três, eivada de infidelidades mútuas e que se sustenta na dependência crescente que cada um tem dos outros dois.

O embate orçamentário que hoje se assiste é uma demonstração de que o teto que os abriga, não bastasse o material de segunda com que foi feito, se desgastou na cobertura de tão atribulada relação. Como o teto já não comporta mais tantas claraboias, chaminés e remendos, eis que os três parecem ter concluído que é hora de derrubá-lo. O problema é que, ao longo desse tempo, acumularam-se desconfianças e ressentimentos, além de flertes extraconjugais. Se não há como sustentar o teto, tampouco se sabe como preservar uma relação exposta às intempéries dos próximos 14 meses.

Depois de convencer Guedes a abrir mão do teto, Bolsonaro busca a cumplicidade de seu ministro para resguardar um abrigo para si sem se importar se o Centrão pode acabar na chuva. Que indícios dá disso? Quisesse apenas viabilizar o auxílio emergencial o presidente poderia tentar fazê-lo via crédito extraordinário. É bem verdade que a calamidade que o justificaria é mais da ordem da inépcia do que do inevitável, mas esta relação já expôs outros tantos pecados públicos que ninguém se escandaliza mais. Bolsonaro vale-se do expediente porque quer trazer outras prebendas para seu abrigo, dos agrados a caminhoneiros a tantos quantos forem necessários para continuar a ser o eixo desta relação.

Estivesse interessado apenas em matar a fome dos miseráveis teria deixado prosseguir o projeto de lei de autoria do senador Eduardo Braga (MDB-AM), que teve a relatoria do senador Antonio Anastasia (PSD-MG) e entrou na terça-feira na pauta do Senado. Este projeto compatibiliza um benefício de R$ 120 a R$ 600 para os que têm uma renda familiar per capita de até ½ salário mínimo. E o faz a partir da revogação da isenção do IR sobre dividendos e da elevação da CSLL de instituições financeiras. Vale-se ainda da rubrica do abono salarial e do salário-família com uma compensação para os beneficiários mais vulneráveis desses programas. É uma proposta que tem a simpatia da Rede Brasileira de Renda Básica mas não serve aos propósitos do presidente, tanto que suas lideranças manobraram para tirá-lo de pauta.

O presidente da Câmara farejou o que o parceiro pretendia lá atrás quando começou essa conversa de destelhar a morada. Afinal, também quer muito mais do que o auxílio emergencial. Como disse em seu artigo semanal (FSP), Delfim Netto, testemunha de muitos casamentos desfeitos ao longo da República, “não é pelos R$ 400” que brigam. Acordos recentes já se desfazem. Haviam concordado, por exemplo, em chutar pra cima o fundo eleitoral, em R$ 6 bilhões, para que Bolsonaro vetasse e a prebenda ficasse em R$ 4 bi. Agora o Centrão quer subir o fundo para R$ 5 bi e, por óbvio, manter R$ 16 bi para as emendas de relator, que, em outros tempos, vinham embaladas em plástico opaco e ficavam longe do alcance das crianças. A lista ainda tem um caminhão de obras e desejos inconfessáveis. Quem nunca?

O stress foi tanto que no início da semana Arthur subiu o tom como nunca se havia visto naquele lar. “Ele vai pagar por isso”, disse, com cara de paisagem, sobre a declaração do parceiro na live da semana passada. É óbvio que Jair aloprou ao relacionar aids, vacina, aspirina e urubus. Mas Arthur descobriu agora que o parceiro mente? É compreensível o nervosismo. O presidente ameaça trocá-lo por Valdemar Costa Neto. Sabe-se que não é por boniteza mas por precisão.

O terceiro integrante da parceria está longe de ficar neutro na história. Se tiver que escolher um, é claro, Paulo fica com Jair. Afinal, (ainda) é dele o molho de chaves. E se um dia a casa vier abaixo é ao seu lado que precisa estar. E não é para salvar as obras completas (e na língua original) de Milton Friedman. É que ninguém sabe onde foi parar o extrato daquela conta perdida no paraíso fiscal. Ninguém sabe, ninguém viu. Mas os colegas do Arthur vão perguntar. No dia e na hora que ele marcar. O stress chegou ao ponto de Paulo se queixar em público que alguém foi bater à porta de outro amigo, o André, para saber se ele podia emprestar um de seus funcionários para colocar no seu lugar. Como o sócio do BTG confidenciou (para 40 pessoas) que vive de mexerico com Arthur, todo mundo ficou sabendo quem era esse alguém.

A relação que hoje é cheia de ressentimentos e decepções no início era de encantamentos quase idílicos. Em setembro de 2019 o ministro Paulo Guedes foi à Comissão Mista de Orçamento e lá abriu seu coração. Ele tinha acabado de chegar mas já percebera que seria difícil fechar as contas. O presidente da Câmara ainda era Rodrigo Maia, um companheiro de armas que se afastaria com a queixa de que Paulo traíra seus velhos ideais. Arthur já era a noiva prometida e a ela Paulo dedicou suas mais puras intenções.

O ministro se queixava de que o Orçamento estava comprometido com os carimbos da Constituição de 1988. E se os constituintes haviam feito história com aquela decisão, era chegada a hora de voltar ao panteão fazendo o inverso. “Controlar o Orçamento público é o grande desafio que pode levar este Congresso para a história”, conclamou o ministro. “A classe política não tem que andar atrás de ministro pedindo verba. Que história é essa? São os representantes da população, foram eleitos, as verbas têm que ser descentralizadas e exercidas, sem ser preciso um esforço enorme para tentar uma [emenda] impositiva para cada deputado poder ter 10 milhões ou 15 milhões de reais. Não! Há R$ 1,5 trilhão no governo”.

Paulo achou que podia contar com o novo parceiro, mas Arthur tinha outros planos. Queria mais era carimbar o que restava do Orçamento. Não bastasse o carimbo das emendas individuais, impôs o das emendas de bancada e, para o orçamento do próximo ano, ampliou a impositividade para as emendas de trator, ou melhor, de relator. Bolsonaro vetou, mas a turma de Arthur vai pra cima. Afinal, como disse o próprio Paulo naquela inesquecível tarde, “representar o povo é controlar os orçamentos públicos”. E no fim, burro é o astronauta.

Fonte: Valor Econômico
https://valor.globo.com/politica/coluna/jair-paulo-e-arthur.ghtml


O presidente pode ser punido pelos crimes apontados na CPI?

Presidente tem hoje a seu favor o foro privilegiado e a proteção da liderança da Câmara

DW Brasil

Com o fim da CPI da Pandemia na última terça-feira (26/10), começa agora o trabalho do Ministério Público de avaliar provas e depoimentos coletados pelos senadores e decidir se investiga e denuncia as pessoas vinculadas a possíveis crimes.

O alvo de maior impacto no relatório da CPI é o presidente da República, Jair Bolsonaro, que comandou decisões do governo federal sobre a pandemia e teve papel ativo em questionar o uso de máscaras e o distanciamento social e propagar o uso de remédios ineficazes contra a doença. Ele foi acusado pela CPI de ter cometido sete crimes comuns, além de crime de responsabilidade e crime contra a humanidade.

Entenda os próximos passos e a chance de Bolsonaro ser denunciado e condenado pelos crimes apontados pela CPI:

Três caminhos para Aras

O mais relevante dos crimes comuns atribuídos a Bolsonaro é o de epidemia com resultado morte, descrito no Código Penal como "causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos". Essa conduta é punida com pena de prisão de vinte a trinta anos quando ela provoca morte.

O presidente também foi acusado pela CPI de ter cometido os crimes de emprego irregular de verbas públicas, prevaricação, falsificação de documento particular, charlatanismo, incitação ao crime e infração de medida sanitária preventiva.

Devido ao foro privilegiado, somente o procurador-geral da República, Augusto Aras, pode investigar a denunciar Bolsonaro. Aras recebeu em mãos o relatório da CPI nesta quarta-feira, entregue por senadores da comissão, e disse que iria "avançar na apuração", sem mencionar contra quem.

O procurador-geral terá três caminhos possíveis a respeito do presidente:

  • - Determinar o arquivamento, se entender que não há indícios que justifiquem prosseguir com a investigação.
  • - Abrir um inquérito, se decidir coletar novas provas e depoimentos.
  • - Apresentar uma denúncia, se concluir que já há elementos suficientes que indicam que ele cometeu crime.


Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
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Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Posse do Procurador-Geral da República, Augusto Aras. Foto: Isac Nobrega/PR
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Novo procurador-geral da República, Augusto Aras, fala à imprensa no Palácio do Planalto depois da posse. Foto: José Cruz/Agência Brasil
Novo procurador-geral da República, Augusto Aras, fala à imprensa no Palácio do Planalto depois da posse. Foto: José Cruz/Agência Brasil
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
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Presidente já responde a inquéritos

A abertura de um inquérito contra Bolsonaro seria uma saída estratégica para Aras. Dessa forma, o procurador-geral não seria acusado de inação, mas tampouco provocaria no presidente o desgaste de uma denúncia. O inquérito também levaria tempo considerável para ser conduzido, empurrando a questão para o futuro.

Em abril de 2020, Aras abriu um inquérito contra o presidente, autorizado pelo Supremo, para investigar se ele interferiu na Polícia Federal após acusação do ex-ministro da Justiça Sergio Moro. A apuração ainda está em andamento. Em 6 de outubro, Bolsonaro informou que aceitaria depor presencialmente sobre o caso.

Holofotes estarão em Aras, que avaliará se dá continuidade às investigações da CPI contra o presidente

A Procuradoria-Geral da República (PGR) abriu em julho desde ano um segundo inquérito contra o presidente, para apurar se ele cometeu prevaricação no caso da compra da vacina indiana Covaxin, após o órgão ter sido pressionado pelo Supremo a se posicionar.

O presidente é alvo de outros dois inquéritos no STF, mas que não foram abertos a pedido da PGR. Um deles apura vazamento de investigação da Polícia Federal e o outro os ataques do presidente à urna eletrônica. Ambos foram instaurados pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, após queixa-crime de ministros do Tribunal Superior Eleitoral.

Tempo é curto

No caso do crime de epidemia com resultado morte seria possível, em tese, denunciar Bolsonaro se houver indícios de que ele conscientemente buscou uma estratégia de alcançar a imunidade de rebanho da população por meio da contaminação, por exemplo ao desincentivar o uso de máscaras ou o distanciamento social e promover medicamentos sem eficácia preventiva, que aceleraram a propagação do vírus e resultaram em mais óbitos.

Diversos estudos já mostraram que o discurso e as políticas de Bolsonaro e seu governo influenciaram o comportamento de brasileiros sobre a pandemia e provocaram milhares de mortes evitáveis. Cabe agora à PGR avaliar se há elementos suficientes para motivar uma denúncia criminal.

Dois aspectos reduzem a chance de que Bolsonaro seja denunciado por Aras por crimes comuns ligados à pandemia. Um é a proximidade do procurador-geral com o presidente, escolhido à margem da lista tríplice elaborada pelos membros do Ministério Público e cotado para uma possível vaga no Supremo. O outro é o tempo.

O atual mandato de Bolsonaro termina em 14 meses, e não é certo que um novo inquérito sob Aras seria concluído nesse período. Além disso, a iminência da campanha e da eleição seria considerada no cálculo político do procurador-geral sobre a conveniência de denunciar o presidente.

Câmara serve de escudo

Se, mesmo assim, Aras denunciar Bolsonaro por crime comum ao Supremo enquanto ele é presidente, a Corte não poderia iniciar a análise do caso antes de receber uma autorização da Câmara dos Deputados. É necessário o apoio de 342 deputados, dois terços do total, para dar andamento do processo.

O resultado das últimas votações de interesse do governo na Câmara indica que Bolsonaro tem o apoio fiel de mais de um terço dos deputados, o suficiente para bloquear uma denúncia do tipo.

A gestão do presidente tem sido generosa em relação às emendas parlamentares, o que contribui para que deputados sigam do lado do governo. Além disso, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), eleito ao posto com o apoio de Bolsonaro, já demonstrou diversas vezes que não apoia medidas drásticas contra o presidente.

Riscos na vida pós-Planalto

Quando o presidente deixar o governo, porém, perderá o foro privilegiado e investigações contra ele serão encaminhadas à primeira instância. O Ministério Público poderá apresentar novas denúncias contra Bolsonaro, que serão decididas por juízes de primeira instância.

Isso aconteceu, por exemplo, com o ex-presidente Michel Temer. Enquanto estava no cargo, o emedebista foi denunciado três vezes pela então procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Em duas, a denúncia foi bloqueada pelo plenário da Câmara, e na última o presidente já estava no final do mandato e não houve apreciação pelos deputados.

Quando Temer saiu do Planalto, os processos foram enviados à primeira instância. O vice-presidente chegou a ser preso preventivamente duas vezes, por um caso não relacionado às denúncias apresentadas quando ele era presidente.

Bolsonaro poderá ser alvo de outras denúncias e investigações depois que deixar o Planalto

Alguns senadores da CPI afirmaram que, se Aras não reagir ao relatório do comissão, acionariam o Supremo por meio de uma ação penal privada subsidiária, que permite que vítimas de crimes tomem a iniciativa em caso de omissão do Ministério Público.

Essa saída teria algumas dificuldades. Uma delas é que se a PGR decidir abrir um inquérito ou arquivar o tema, não seria possível alegar que ela tenha se omitido. A segunda é a necessidade de incluir nesse tipo de ação as vítimas ou representantes de vítimas. Como a pandemia teve efeitos coletivos, haveria um debate jurídico sobre se seria possível responsabilizar o presidente a partir do caso concreto de algumas vítimas ou de seus familiares.

Crime de responsabilidade

O relatório da CPI também aponta que Bolsonaro cometeu crimes de responsabilidade, por violar o direito à saúde pública e a probidade administrativa, que poderiam justificar um processo de impeachment.

A CPI não pode pedir o impeachment do presidente. O relatório, como o documento informa, "ficará disponível para que qualquer cidadão denuncie o Presidente da República por crime de responsabilidade".

Já há pelo menos 139 pedidos de impeachment apresentados contra Bolsonaro, por temas variados, inclusive relacionados ao gerenciamento da pandemia. A instauração de um processo de impeachment depende de Lira, que já indicou que não tem interesse em fazê-lo.

Os deputados fieis ao governo na Câmara também o protegem desse desfecho. E, com a proximidade das eleições, a chance de um processo de impeachment contra Bolsonaro ser deflagrado fica ainda menor. 

Crime contra a humanidade

O relatório também afirma que Bolsonaro teria cometido crimes contra a humanidade previstos no Tratado de Roma, que tem força de lei no Brasil. Esses crimes são julgados pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), sediado na cidade de Haia, na Holanda.

A CPI considera que o presidente cometeu "ato desumano que afete gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental" na condução da pandemia, especialmente pela forma como seu governo lidou com a crise do oxigênio em Manaus, apontada como um "laboratório humano" para os medicamentos do "kit covid", e pelas ações e omissões em relação à proteção dos povos indígenas contra a covid-19.

Uma cópia do relatório será enviada ao TPI, que então decidirá se inicia um procedimento contra o presidente sobre o tema. O TPI já recebeu pelo menos cinco representações criminais contra Bolsonaro, que o acusam de genocídio de comunidades indígenas e tradicionais, crime contra a humanidade na gestão da pandemia e crime contra a humanidade ligado ao desmatamento da Amazônia.

Um dos requerimentos para o TPI punir pessoas é comprovar que os meios para tentar responsabilizá-la em seu próprio país esgotaram-se, o que, no caso de Bolsonaro, ainda levará tempo.

Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/bolsonaro-pode-ser-punido-pelos-crimes-apontados-na-cpi/a-59644426


PGR pretende fatiar relatório da CPI da Covid para ações em curso no MPF

Equipe de Aras fez levantamento preliminar de procedimentos e procuradorias

Vinicius Sassine / Folha de S. Paulo

A PGR (Procuradoria-Geral da República) já tem um levantamento feito de procedimentos e áreas no MPF (Ministério Público Federal) para destinar fatias do relatório final da CPI da Covid no Senado, aprovado pelos senadores na noite desta terça-feira (26).

O relatório, que pede o indiciamento de duas empresas e 78 pessoas, entre elas o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), será entregue nesta quarta-feira (27) ao procurador-geral da República, Augusto Aras, segundo a previsão da cúpula da CPI.

A ideia dos congressistas é entregar o documento nas mãos de Aras.


Posse do Procurador-Geral da República, Augusto Aras. Foto: Isac Nobrega/PR
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Novo procurador-geral da República, Augusto Aras, fala à imprensa no Palácio do Planalto depois da posse. Foto: José Cruz/Agência Brasil
Novo procurador-geral da República, Augusto Aras, fala à imprensa no Palácio do Planalto depois da posse. Foto: José Cruz/Agência Brasil
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
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Posse do Procurador-Geral da República, Augusto Aras. Foto: Isac Nobrega/PR
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Sabatina do PGR Augusto Aras na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Novo procurador-geral da República, Augusto Aras, fala à imprensa no Palácio do Planalto depois da posse. Foto: José Cruz/Agência Brasil
Novo procurador-geral da República, Augusto Aras, fala à imprensa no Palácio do Planalto depois da posse. Foto: José Cruz/Agência Brasil
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
Posse do Procurador-Geral da República Augusto Aras. Foto: José Cruz/Agência Brasil - 26/09/2019
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O levantamento já feito pela PGR pressupõe que a CPI entregará o relatório final completo aprovado pelo colegiado.

Assim, além de decisões sobre investigações da atuação de Bolsonaro, de seus ministros e de parlamentares aliados na pandemia, Aras e sua equipe teriam a prerrogativa de definir para onde serão remetidos os demais apontamentos do documento.

A CPI também tem a intenção de enviar o relatório diretamente a procuradorias nos estados.

Caberá ao procurador-geral e à sua equipe tocar as investigações e diligências envolvendo as autoridades com foro especial junto ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Têm foro no STF Bolsonaro e seus quatro ministros com proposta de indiciamento: Marcelo Queiroga (Saúde), Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência), Walter Braga Netto (Defesa) e Wagner Rosário (CGU).

O mesmo ocorre com dois filhos do presidente —senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP)— e parlamentares federais aliados.

O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), tem foro junto ao STJ. Acusações que podem ser entendidas como improbidade administrativa teriam como destino a primeira instância da Justiça Federal.

Até o momento, o entorno de Aras não prevê a formação de uma força-tarefa para a análise do relatório aprovado e para definições sobre futuras investigações.

Os pedidos de indiciamento, embasados por provas reunidas ao longo de seis meses de investigação parlamentar, serão analisados especialmente pela assessoria criminal de Aras e pelo Giac (Gabinete Integrado de Acompanhamento da Covid-19), um grupo em funcionamento desde o início da pandemia para acompanhar medidas administrativas e de coordenação do MPF.

A assessoria criminal é formada por subprocuradores-gerais da República da estrita confiança de Aras, em especial o vice-procurador-geral, Humberto Jacques, e a coordenadora do grupo de trabalho para operações criminais no STF, Lindôra Araújo.

Existem procedimentos abertos em diferentes procuradorias da República, em especial em Brasília e no Amazonas.

O MPF no DF já havia pedido compartilhamento de provas —cópias de depoimentos prestados na CPI—para embasar um procedimento de investigação criminal que apura suspeitas de corrupção no contrato da vacina indiana Covaxin.

Os senadores que controlaram a CPI durante os seis meses de existência —o chamado G7— temem arquivamentos automáticos de acusações por Aras, em razão de sua atuação a favor de Bolsonaro e do governo ao longo do exercício do cargo de procurador-geral.

Lindôra, a principal aliada de Aras na esfera criminal, chegou a colocar em xeque a eficácia do uso de máscaras na prevenção da infecção pelo coronavírus, na contramão de um consenso científico a favor do equipamento de proteção.

Em manifestação enviada ao STF, a subprocuradora afirmou não ver crime na prática de Bolsonaro de não usar máscaras e de promover aglomeração dia após dia na pandemia.

A ministra Rosa Weber apontou perplexidade com o parecer e pediu uma nova avaliação à PGR.

Lindôra é tida na PGR como a auxiliar mais bolsonarista de Aras, inclusive com interlocução com o filho mais velho do presidente, Flávio Bolsonaro.

Dentro do órgão, a avaliação é que o papel mais decisivo na análise do relatório final da CPI não caberá a Lindôra, mas a Humberto Jacques, o número dois na hierarquia da PGR.

Jacques tentou adiar para depois da conclusão dos trabalhos da CPI a análise sobre investigar ou não o presidente da República por prevaricação.

Dentro do Palácio da Alvorada, Bolsonaro teria sido avisado sobre irregularidades no contrato bilionário da Covaxin e dito que acionaria a PF para investigar a suspeita e não o fez.

Mais uma vez, a ministra Rosa Weber discordou da posição da PGR e cobrou uma análise da notícia-crime apresentada por três senadores ao STF. Jacques, então, pediu a abertura de um inquérito para investigar o presidente, o que foi autorizado pelo STF no mesmo dia.

Aras também relutou em providenciar a abertura de um inquérito para investigar as suspeitas de crimes por parte do general da ativa do Exército Eduardo Pazuello, quando ele exercia o cargo de ministro da Saúde.

Após o acúmulo de evidências de omissão do ministro na crise do oxigênio no Amazonas, onde pacientes morreram asfixiados nos hospitais por falta do insumo , o procurador-geral instaurou inicialmente uma notícia de fato.

Este tipo de procedimento preliminar é o preferido no modus operandi de Aras em relação ao governo Bolsonaro. Muitos ficam pelo caminho, ou são arquivados.

No caso de Pazuello, o inquérito foi aberto, a pedido da PGR e por decisão do STF. As investigações, porém, pouco avançaram e logo precisaram ser deslocadas para a primeira instância da Justiça Federal em Brasília.

Pazuello foi demitido do cargo de ministro da Saúde. Abrigado em um cargo de confiança no Palácio do Planalto, o general não tem mais foro privilegiado.

Aras terá de se posicionar diante de apontamentos de crimes comuns atribuídos ao presidente da República: epidemia com resultado de morte, infração a medidas sanitárias preventivas, prevaricação, emprego irregular de verba pública, incitação ao crime e falsificação de documentos particulares.

A CPI concluiu ainda que Bolsonaro cometeu crimes contra a humanidade, o que levará a encaminhamento do relatório final ao Tribunal Penal Internacional, e crime de responsabilidade, cuja atribuição de apuração é do Congresso Nacional, por meio de uma ação de impeachment.

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/10/pgr-pretende-fatiar-relatorio-da-cpi-da-covid-para-acoes-em-curso-no-ministerio-publico-federal.shtml


CPI desafia o Brasil a punir Bolsonaro pela gestão insensível às mortes na pandemia

Aprovação do relatório final pressiona autoridades judiciais por punições e acua o presidente

Afonso Benites e Beatriz Jucá / El País

Depois de quase seis meses de trabalho, a CPI da Pandemia aprovou seu relatório final por sete votos a quatro, colocando o presidente Jair Bolsonaro no centro de uma gestão frouxa e intencionalmente insensível da pandemia de coronavírus. Os senadores acusam o presidente de ter cometido crime contra a humanidade, e outros oito delitos, entre eles, incitação e propagação da pandemia, além de charlatanismo. Os integrantes da CPI já anteveem um encontro com representantes do Tribunal Penal Internacional para tratar da acusação mais grave.

A CPI sistematizou todos os potenciais crimes, omissões e erros cometidos pela Governo federal no combate à pandemia, em busca de uma suposta imunidade de rebanho. O plano era retomar a economia a qualquer custo, deixando o vírus se espalhar. Bolsonaro foi o principal garoto propaganda da desobediências às regras sanitárias, ao não usar máscaras, promover aglomerações e defender o uso da cloroquina. Além do presidente, outras 77 pessoas e duas empresas foram implicadas por 24 delitos, de charlatanismo a epidemia com resultado morte; de incitação ao crime a corrupção ativa. A lista é longa e já resultou na abertura de 17 procedimentos iniciais em órgãos de controle, como Ministério Público e Tribunal de Contas. Senadores e especialistas calculam que milhares de vidas poderiam ter sido poupadas se tivesse havido uma gestão responsável da pandemia.

A comissão parlamentar desnudou um balcão de negócios no Ministério da Saúde, impediu uma compra de 1,6 bilhão de reais da suspeita vacina Covaxin, descobriu esquemas de lobby de empresas Precisa e VTCLog, que tinham contratos com o Governo, e revelou que seres humanos eram usados pelo plano de saúde Prevent Senior e por um médico como cobaias involuntárias de medicamentos como cloroquina e proxalutamida. “Esta comissão parlamentar de inquérito tirou o Brasil do cercadinho e colocou o negacionismo dentro do cercadinho”, sintetizou o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), em alusão ao local onde os militantes bolsonaristas costumam se concentrar para ouvir o presidente em frente ao Palácio da Alvorada. O senador Renan Calheiros, (MDB-AL), relator da Comissão, chegou a comparar Bolsonaro ao ditador chileno Augusto Pinochet, e ao comandante Carlos Brilhante Ustra, temido agente da ditadura, que chefiou um centro de tortura de adversários do governo militar.Mais informaçõesInvisíveis, órfãos da covid-19 encaram a pandemia da dor e do desamparo

O destino do relatório está nas mãos do Procurador Geral da República, Augusto Aras, que deve analisar oito crimes comuns atribuídos ao chefe do Executivo, e do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que vai avaliar se Bolsonaro cometeu o crime de responsabilidade que lhe é atribuído e deveria, portanto, sofrer um processo de impeachment. “A CPI fez bastante barulho, produziu um relatório sério e robusto, mas o presidente ainda tem dois guardiões, Lira e Aras. Tudo o que a CPI fez, agora, depende deles. No mais, o desgaste político de Bolsonaro já foi dado”, destaca o cientista político David Fleischer, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB).

Aras tem 30 dias para dar uma resposta aos senadores. Ele já disse que montará uma espécie de grupo de trabalho formado por procuradores para analisar as sugestões dos parlamentares para, só então, se manifestar. Lira, por sua vez, dificilmente dará andamento a um processo impeachment a menos de um ano da eleição. Como ressaltou Fleischer, portanto, é possível que a grande punição à política sanitária de Bolsonaro nos últimos meses venha das urnas no próximo ano, quando o presidente tentará a reeleição.

As mudanças

Correndo o risco de ver todo seu trabalho ser perdido por um rejeição do relatório pelo plenário da comissão, o relator Renan Calheiros recuou e decidiu apresentar um pedido de indiciamento do governador do Amazonas, o bolsonarista Wilson Lima (PSC), e do ex-secretário de Saúde do Estado Marcellus Campêlo pelo delito de prevaricação durante a crise de falta de oxigênio em Manaus. A inclusão de Lima era um pedido do senador Eduardo Braga (MDB-AM). O governador também responderá por epidemia com resultado morte e por crime de responsabilidade.

Calheiros acrescentou ao relatório outros 12 pedidos de indiciamento nesta terça-feira. No início do dia, o senador alagoano atendeu a um pedido do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e colocou no rol de possíveis culpados pelos erros na pandemia o senador Luz Carlos Heinze (PP-RS). Eles queriam que Heinze fosse indiciado por incitação ao crime pela divulgação de desinformação. Porém, uma intensa negociação com a cúpula do Senado levou à retirada do nome do parlamentar gaúcho, a pedido do próprio Alessandro Vieira, para evitar o constrangimento de envolver um senador da comissão entre os principais responsáveis pela crise que levou a mais de 606.000 mortes no país.

O nome de Heinze foi cogitado para a lista por ele ter propagandeado nos últimos seis meses o uso da cloroquina, entre outros medicamentos do ineficaz kit covid. É um comportamento semelhante ao de Bolsonaro, que foi apontado como o responsável por nove delitos. Heinze seria indiciado por incitação ao crime. “Não se gasta vela boa com defunto ruim. Esta CPI fez um trabalho, prestou um serviço para o Brasil, muitíssimo relevante. Não posso, a esta altura, colocar em risco nenhum pedaço desse serviço por conta de mais um parlamentar irresponsável”, justificou Vieira ao pedir a retirada do nome do colega do documento final.

Os senadores concordaram ainda em solicitar o banimento do presidente das redes sociais, pela insistência em disseminar desinformação. A última delas ocorreu na quinta-feira passada, quando, durante sua live semanal, ele associou a vacina contra coronavírus à infecção por HIV, o que é falso. “A responsabilidade é principalmente desse presidente da República, desse serial killer, que tem compulsão de morte e continua a repetir tudo que fez anteriormente. Agora, com a declaração de que a vacina pode proporcionar AIDS ele demonstra que não tem respeito nenhum pela vida dos brasileiros”, disse Calheiros, que chamou o presidente de homicida. “Bolsonaro agiu como um missionário enlouquecido para matar o próprio povo.”

O vídeo em que Bolsonaro mente sobre a vacina foi retirado do Facebook, do Instagram e do YouTube. Desta última plataforma o presidente ainda foi suspenso por uma semana. A intenção dos senadores opositores ao presidente é que ele sofra a mesma sanção que o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, suspenso depois de incentivar a invasão do Capitólio e reincidir diversas vezes na divulgação de fake news.

Parlamentares governistas protestaram contra o relatório aprovado. “É uma peça claramente de vingança, com requintes de crueldade, de ódio, com interesses de poder”, disse o senador Eduardo Girão (Podemos-CE). Já o primogênito do presidente, Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), disse que o documento é uma aberração jurídica e minimizou o resultado das apurações. “O maior escândalo que foi levantado aqui é de uma vacina que não foi comprada.”

Com o fim dos trabalhos, os senadores montaram uma espécie de observatório para acompanhar o andamento das denúncias apresentadas. A cúpula da CPI, formada por Randolfe, Renan e pelo presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), tentará conseguir uma agenda com representantes do Tribunal Penal Internacional. A ideia é levar o caso a Haia para que Bolsonaro seja julgado por crime contra a humanidade.

Depois de seis meses de atuação, a Comissão chega ao fim com um projeto de escapar das práticas bárbaras em que o país mergulhou, como discursou o senador Renan Calheiros. “É passada a hora de encerrar esta noite macabra que enluta o país dolorosamente”, concluiu, antes de os senadores fazerem um minuto de silêncio por quem não teve como se defender dos erros e omissões do Governo: os 606.000 mortos pela covid-19.

Fonte: El País
https://brasil.elpais.com/brasil/2021-10-27/cpi-desafia-o-brasil-a-punir-bolsonaro-pela-gestao-insensivel-a-dor-e-as-mortes-na-pandemia.html


CPI da Covid: Após aprovação de relatório, o que acontece agora?

O relatório final foi aprovado por 7 votos a 4 em sessão nesta terça-feira (26/10)

Mariana Schreiber / BBC News Brasil

O texto, votado pelos membros titulares da comissão, recomenda que o presidente Jair Bolsonaro seja investigado e, eventualmente, responsabilizado em três frentes devido à gestão do seu governo na pandemia de coronavírus: por crimes comuns, por crimes de responsabilidade e por crimes contra a humanidade.

Com o resultado, essas acusações contra o presidente serão analisadas em três órgãos.

Além do presidente, o relatório pede o indiciamento de 77 pessoas - incluindo ex-ministros, ministros, políticos, servidores públicos, empresários, membros do chamado "gabinete paralelo" - e duas empresas, a Precisa Medicamentos e a VTCLog.

Entre os que tiveram o pedido de indiciamento mencionado no relatório estão o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, o atual titular da Pasta Marcelo Queiroga, Ernesto Araújo (ex-chanceler), Walter Braga Netto, ministro da Defesa, Onyx Lorenzoni (ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência), Mayra Pinheiro (secretária do Ministério da Saúde conhecida como "capitã cloroquina"), Roberto Dias (ex-diretor de Logística do ministério), Francisco Maximiano (sócio da Precisa), Flavio, Eduardo e Carlos Bolsonaro (filhos do presidente e respectivamente senador, deputado e vereador), Bia Kicis e Carla Zambelli (deputadas governistas), os empresários Carlos Wizard, Luciano Hang e Otávio Fakhoury e os médicos Nise Yamaguchi, Paolo Zanotto e Rodrigo Esper, entre outros (veja o relatório completo da CPI aqui; o nome do senador Luis Carlos Heinze, do PP gaúcho, foi retirado na reta final das discussões).

Os pedidos de indiciamento serão encaminhados a outros órgãos.

No caso de Bolsonaro, as suspeitas de crime comum serão encaminhadas à Procuradoria-Geral da República (PGR), que avaliará uma possível denúncia criminal contra Bolsonaro. Já as de crime de responsabilidade vão para análise da Câmara dos Deputados, para possível abertura de processo de impeachment.

Por fim, as acusações de crimes contra a humanidade serão enviadas ao Tribunal Penal Internacional (TPI), onde o presidente poderia sofrer um processo.

No entanto, juristas ouvidos pela BBC News Brasil consideram que os três caminhos oferecem obstáculos hoje para que o presidente de fato venha a ser punido por possíveis crimes durante a pandemia de coronavírus, doença que já matou mais de 606 mil pessoas no Brasil desde março de 2020.

Durante viagem ao Ceará, enquanto Calheiros lia seu relatório na CPI, na semana passada, Bolsonaro negou qualquer responsabilidade nas mortes.

Renan Calheiros
Relatório de Renan Calheiros ainda precisa ser aprovado por maioria da CPI; votação ocorre na próxima semana. Foto: Agência Senado

"Como seria bom se aquela CPI tivesse fazendo algo de produtivo para nosso Brasil. Tomaram tempo de nosso ministro da Saúde, de servidores, de pessoas humildes e de empresários", criticou o presidente.

"Nada produziram, a não ser o ódio e o rancor entre alguns de nós. Mas sabemos que não temos culpa de absolutamente nada, fizemos a coisa certa desde o primeiro momento", disse ainda.

Entenda a seguir o que pode acontecer concretamente contra o presidente nos três tipos de crimes que Bolsonaro é citado no texto de Calheiros.

1) Acusações de crimes de responsabilidade

Calheiros ressalta em seu relatório que, entre os crimes de responsabilidade previstos na legislação brasileira, está o ato de atentar contra o exercício dos direitos sociais e contra a probidade na administração.

Além disso, ele destaca que o direito à saúde é previsto como um dos direitos sociais no artigo 6º da Constituição, enquanto o artigo 196 estabelece que "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

Na avaliação de Calheiros, porém, a investigação da CPI mostrou que a gestão de Bolsonaro agiu em sentido contrário: ao invés de proteger a vida dos brasileiros da covid-19, o presidente teria contribuído para o agravamento da pandemia ao demorar a comprar vacinas, incentivar o uso de medicamentos sem comprovação científica, promover aglomerações, entre outros comportamentos.

"A minimização constante da gravidade da covid-19, a criação de mecanismos ineficazes de controle e tratamento da doença, com ênfase em protocolo de tratamento precoce sem o aval das autoridades sanitárias, o déficit de coordenação política, a falta de campanhas educativas sobre a importância de medidas não farmacológicas, o comportamento pessoal contra essas medidas, e, por fim, a omissão e o atraso na aquisição de vacinas e a contratação de cobertura populacional baixa do consórcio da OMS foram algumas das condutas do chefe do Poder Executivo Federal que incontestavelmente atentaram contra a saúde pública e a probidade administrativa", diz trecho do relatório.

Apesar das duras acusações do relator, porém, hoje parece pouco provável que elas gerem abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro. O único que pode iniciar esse procedimento é o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que atualmente mantém boa relação com presidente.

E, a partir dessa aliança com Lira, o Palácio do Planalto construiu uma base de apoio entre os deputados do chamado Centrão (siglas de centro-direita de comportamento mais fisiológico), sustentada pela distribuição de cargos para indicados desses parlamentares e pelo envio de verbas federais para investimentos em seus redutos eleitorais. Com isso, hoje o presidente parece reunir o mínimo de 172 votos na Câmara necessários para barrar a aprovação de um processo de impeachment.

Outro elemento que reduz as chances desse processo ser iniciado é o fato de os protestos de rua realizados ao longo desse ano pedindo a cassação do presidente não terem reunidos um público tão grande quantos os atos que pressionaram pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016.

Já as pesquisas de opinião têm indicado que o governo Bolsonaro é reprovado pela maioria da população, mas ainda é bem avaliado por cerca de um terço dos brasileiros — patamar de aprovação superior ao que Dilma tinha quando foi cassada.

2) Acusações de crimes comuns

Para Calheiros, as condutas de Bolsonaro também podem ser enquadradas em sete crimes comuns, previstos no Código Penal.

São eles: epidemia com resultado de morte (por suspeita de propagar o vírus); infração de medida sanitária preventiva (por realizar aglomerações e não usar máscara); charlatanismo (devido ao incentivo de uso de medicamentos sem eficácia), incitação ao crime (por incentivar aglomeração e o não uso de máscara); falsificação de documento particular (por ter apresentado uma falsificação como sendo um documento oficial do Tribunal de Contas da União que provaria haver um excesso na contabilização de mortes por covid-19); emprego irregular de verbas públicas (por uso de recursos públicos na compra de medicamentos ineficazes); e prevaricação (por supostamente não ter mandado investigar denúncias de corrupção na compra de vacinas).

Caso o relatório seja aprovado, os elementos que baseiam essas acusações serão encaminhadas à PGR, pois o procurador-geral da República, Augusto Aras, é a única autoridade que pode apresentar uma denúncia criminal contra o presidente no Supremo Tribunal Federal (STF).

Aras é visto como aliado de Bolsonaro e hoje parece improvável que o denuncie, já que a PGR tem arquivado diversas queixas-crimes que já foram apresentadas solicitando a investigação criminal de Bolsonaro por sua conduta na pandemia.

A PGR, por exemplo, já arquivou pedido de investigação devido ao não uso de máscara por entender que isso configura infração administrativa, sujeita a multa, e não um crime.

O órgão também recusou pedido de investigação por causa das aglomerações provocadas pelo presidente. Segundo a PGR, Bolsonaro só poderia ser processado por disseminar coronavírus se estivesse contaminado com a doença e contrariasse ordem médica para se isolar.

Protesto em Brasília contra as mais de 600 mil mortes por covid
Protesto em Brasília contra as mais de 600 mil mortes por covid

Por outra lado, a PGR já abriu inquérito para investigar se Bolsonaro prevaricou ao não tomar providências após ser informado pelo deputado Luiz Miranda (DEM-DF) de supostas ilegalidades no contrato para compra da vacina indiana Covaxin. A investigação está em andamento.

Quanto a suspeitas de crimes pelo incentivo de Bolsonaro ao chamado "tratamento precoce" (uso de medicamentos sem eficácia contra covid-19), Aras informou ao STF em junho que havia iniciado uma apuração preliminar para avaliar a abertura de investigação. Críticos de Aras, porém, o acusam de usar esse tipo de procedimento para responder a pressões para investigar Bolsonaro sem de fato adotar medidas concretas contra o presidente.

Para o criminalista Pierpaolo Bottini, professor da Universidade de São Paulo (USP), é difícil cravar que Aras não dará qualquer encaminhamento as acusações do relatório da CPI.

"Não é só uma avaliação política, tem uma avaliação jurídica que ele terá que fazer. Ele vai ter que motivar (justificar juridicamente) seja qual for a decisão dele. Se tiver muito subsídio (sustentando as acusações), também é difícil ele deixar de dar qualquer encaminhamento", acredita.

Segundo Bottini, há um outro caminho jurídico para Bolsonaro ser denunciado no STF. Em caso de omissão da PGR, ou seja, se o órgão demorar para dar alguma resposta ao relatório da CPI, as próprias vítimas da pandemia poderiam processar o presidente por meio de uma ação penal privada subsidiária da pública.

A Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico) disse à BBC News Brasil que de fato analisa essa possibilidade. A organização apresentou em junho à PGR um pedido de investigação contra Bolsonaro, mas a análise desse pedido tem transcorrido em sigilo e a própria Avico enfrenta dificuldades para obter informações sobre seu andamento.

Eventual apresentação de uma ação contra Bolsonaro pelas vítimas da pandemia seria algo inédito. Segundo Bottini, provavelmente o STF faria uma primeira avaliação de admissibilidade (decidir se a ação está dentro dos requisitos jurídicos necessários) e depois encaminharia a denúncia para análise da Câmara dos Deputados.

O professor ressalta que a Constituição só permite que o Presidente da República seja processado após aval de 342 deputados (mesmo número necessário para abertura de um processo de impeachment).

3) Acusações de crimes contra a humanidade

Calheiros também defende em seu relatório que Bolsonaro seja investigado no Tribunal Penal Internacional (TPI), Corte sediada em Haia, na Holanda, que julga graves violações de direitos humanos, como genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra.

No entanto, são poucas as denúncias recebidas pelo Tribunal que de fato geram investigações - e, quando isso ocorre, os casos se alongam por muitos anos, explicou à BBC News Brasil o juiz criminal e professor da USP Marcos Zilli, estudioso do funcionamento do Tribunal Penal Internacional.

Em tese, diz ele, o TPI pode condenar criminosos a penas de 30 anos de prisão e até a prisão perpétua, mas essas punições máximas nunca foram aplicadas pela Corte.

A intenção inicial de Calheiros era acusar o presidente de crime de genocídio contra populações indígenas, mas essa ideia foi abandonada devido à oposição de outros membros da CPI. Com isso, a proposta do relator é enviar ao TPI duas acusações de crimes contra a humanidade por parte do presidente.

Esses crimes estão previstos no Tratado de Roma, incorporado ao direito brasileiro desde setembro de 2002.

Flavio Bolsonaro
Senador Flavio Bolsonaro e seus irmãos Carlos e Eduardo estão entre os políticos com pedido de indiciamento pela CPI

Uma das acusações propostas por Calheiros sustenta que Bolsonaro cometeu crime contra a humanidade a praticar "ato desumano que afete gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental". Isso teria ocorrido, segundo o senador, quando vidas humanas foram usadas como "cobaias" em estudos fraudulentos para aplicação de tratamentos sem eficácia contra covid-19.

Ele cita, por exemplo, a promoção do "tratamento precoce" pelo Ministério da Saúde durante a crise de falta de oxigênio em Manaus, no início de 2021. Outro argumento usado pelo senador foi o uso em massa de hidroxicloroquina pelo plano de saúde Prevent Senior. Resultados de um suposta pesquisa da empresa atestando a eficácia do remédio contra covid foram divulgados por Bolsonaro - no entanto, o estudo não havia sido autorizado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e ex-médicos da Prevent Senior acusaram o plano de fraudar os resultados.

A outra acusação é de crime contra a humanidade devido à postura do governo Bolsonaro em relação aos povos indígenas. O relatório destaca a decisão do STF de determinar em julho de 2020 a adoção de um plano emergencial pelo governo de apoio a essas populações durante a pandemia "diante das muitas falhas na política de enfrentamento à pandemia junto aos povos indígenas e da preocupação com a rápida interiorização da doença, que prenunciavam um desastre".

Ainda segundo o parecer de Calheiros, "esta CPI identifica o Presidente da República Jair Messias Bolsonaro como o responsável máximo por atos e omissões intencionais que submeteram os indígenas a condições de vida, tais como a privação do acesso a alimentos ou medicamentos, com vista a causar a destruição dessa parte da população, que configuram atos de extermínio, além de privação intencional e grave de direitos fundamentais em violação do direito internacional, por motivos relacionados com a identidade do grupo ou da coletividade em causa, que configura atos de perseguição".

Segundo o professor Marcos Zilli, essas acusações, caso sejam realmente apresentadas pela CPI ao TPI, passarão por um longo processo de análise e não necessariamente vão gerar investigações internacionais contra o presidente brasileiro.

Todas as representações criminais feitas ao TPI são analisadas pela Procuradoria da Corte, órgão responsável por realizar investigações de forma independente. Um filtro inicial da procuradoria descarta casos em que os crimes denunciados claramente não são de competência do Tribunal.

Se a representação passar dessa etapa, ela é submetida a um exame preliminar, em que a Procuradoria avalia a presença dos elementos necessários à instauração de uma investigação formal. Nesse momento, é analisado, por exemplo, a gravidade dos crimes apontados na representação e se há omissão da Justiça nacional em apurar esses delitos.

"A experiência que nós temos no Tribunal Penal Internacional revelam que os casos demandam muitos anos de investigação, caso uma investigação seja instaurada, e muitos anos de processo também, caso o processo seja aberto", explica Zilli.

Na sua avaliação, a acusação envolvendo populações indígenas é a que teria mais potencial de prosperar no TPI, devido ao contexto mais amplo de ações da gestão Bolsonaro relacionadas a esses povos, como a redução da proteção aos seus territórios e falas recorrentes do presidente defendendo a exploração econômica das terras indígenas.

O TPI, inclusive, já recebeu algumas acusações contra Bolsonaro, envolvendo tanto os povos indígenas como a conduta na pandemia. Por enquanto, apenas uma relacionada aos indígenas, apresentada em 2019, avançou para a etapa de análise preliminar pela procuradoria.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-59057279


Bernardo Mello Franco: Genocídio com outro nome - CPI recua, mas enumera provas contra Bolsonaro

Índios não foram convidados nem para a sessão que ouviu parentes de vítimas da pandemia

Bernardo Mello Franco / O Globo

Em quase seis meses de trabalho, a CPI da Covid ouviu 68 pessoas em depoimentos transmitidos ao vivo na TV. Os senadores questionaram políticos, militares, empresários e lobistas. Mas não deram voz a um único representante dos povos indígenas.

Os índios não foram convidados nem para a sessão que ouviu parentes de vítimas da pandemia. Isso ajuda a explicar o tratoraço que removeu a acusação de genocídio do relatório final da CPI.

O texto do senador Renan Calheiros sugeria o indiciamento de Jair Bolsonaro pela prática do crime, tipificado na lei brasileira e no Estatuto de Roma. Também seriam enquadrados o presidente da Funai, Marcelo Xavier, e o secretário especial de Saúde Indígena, Robson Santos da Silva.

As propostas de indiciamento não significavam que os três seriam condenados. Mas retirá-los do relatório significa absolvê-los antes da abertura de uma investigação formal.

A CPI enumerou diversas ações e omissões do governo que transformaram os povos indígenas em alvo fácil para o coronavírus. Bolsonaro chegou a vetar 16 pontos de uma lei que o obrigava a proteger as aldeias. Negou-se a fornecer água potável, comida e material de higiene. O capitão ainda iludiu os índios com a distribuição de remédios ineficazes. E resistiu a incluí-los no grupo prioritário da vacinação, o que só ocorreu por ordem judicial.

Em parecer enviado ao Senado, a Comissão Especial de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da OAB apontou “graves indícios da prática do crime de genocídio”. O texto original de Renan concordava com a tese. “O que distingue a morte de centenas de indígenas da morte de centenas de milhares de concidadãos é, fundamentalmente, a intenção de submeter esse grupo específico da população ao risco de contágio. Atitudes deliberadas do governo ajudaram a produzir esse efeito”, escreveu o relator.

Na reta final da CPI, os senadores Omar Aziz e Eduardo Braga articularam a retirada da acusação de genocídio. Eles se elegem pelo Amazonas, onde vigora a máxima de que índio não dá voto. Militares, ruralistas e pastores evangélicos costumam endossar o discurso anti-indigenista do Planalto.

Para evitar uma derrota, Renan cedeu à pressão horas antes de ler do relatório. O presidente da Funai, delegado da PF, e o secretário de Saúde Indígena, coronel do Exército, livraram-se de qualquer tipo de indiciamento. No caso de Bolsonaro, o crime de genocídio foi trocado por crime contra a humanidade.

Apesar do recuo, o documento preservou 77 páginas que podem complicar o capitão num eventual julgamento no Tribunal Penal Internacional. O texto mostra que ele já perseguia e discriminava os índios antes da pandemia. Depois passou a sabotar as medidas que poderiam protegê-los.

“O estímulo à presença de intrusos nas terras indígenas e a negligência deliberada do governo federal em proteger e assistir os povos originários foram aliados do vírus, produzindo efeitos combinados”, afirma o relatório. “Com relação aos indígenas, o governo tratou o vírus não como um risco, mas como uma oportunidade”, conclui.

As marcas do genocídio ainda estão lá, mesmo que seja com outro nome.

Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/bernardo-mello-franco/post/genocidio-com-outro-nome-cpi-recua-mas-enumera-provas-contra-bolsonaro.html


CPI da Covid: o que pode acontecer com Bolsonaro após a divulgação do relatório

Caso o relatório seja aprovado pela maioria da comissão na próxima semana, essas acusações contra o presidente serão analisadas em três órgãos

  • Mariana Schreiber / BBC News Brasil

O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, apresentado nesta quarta-feira (20/10) pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), recomenda que o presidente Jair Bolsonaro seja investigado e, eventualmente, responsabilizado em três frentes devido à gestão do seu governo na pandemia de coronavírus: por crimes comuns, por crimes de responsabilidade e por crimes contra a humanidade.

As suspeitas de crime comum serão encaminhadas à Procuradoria-Geral da República (PGR), que avaliará uma possível denúncia criminal contra Bolsonaro. Já as de crime de responsabilidade vão para análise da Câmara dos Deputados, para possível abertura de processo de impeachment. Por fim, as acusações de crimes contra a humanidade serão enviadas ao Tribunal Penal Internacional (TPI), onde o presidente poderia sofrer um processo.

No entanto, juristas ouvidos pela BBC News Brasil consideram que os três caminhos oferecem obstáculos hoje para que o presidente de fato venha a ser punido por possíveis crimes durante a pandemia de coronavírus, doença que já matou mais de 600 mil pessoas no Brasil desde março de 2020.

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Durante viagem ao Ceará, enquanto Calheiros lia seu relatório na CPI, Bolsonaro negou qualquer responsabilidade nas mortes.

"Como seria bom se aquela CPI tivesse fazendo algo de produtivo para nosso Brasil. Tomaram tempo de nosso ministro da Saúde, de servidores, de pessoas humildes e de empresários", criticou o presidente.

"Nada produziram, a não ser o ódio e o rancor entre alguns de nós. Mas sabemos que não temos culpa de absolutamente nada, fizemos a coisa certa desde o primeiro momento", disse ainda.

Entenda a seguir o que pode acontecer concretamente contra o presidente, caso o relatório seja aprovado pela maioria da CPI, nos três tipos de crimes que Bolsonaro é citado no texto de Calheiros.

1) Acusações de crimes de responsabilidade

Calheiros ressalta em seu relatório que, entre os crimes de responsabilidade previstos na legislação brasileira, está o ato de atentar contra o exercício dos direitos sociais e contra a probidade na administração.

Além disso, ele destaca que o direito à saúde é previsto como um dos direitos sociais no artigo 6º da Constituição, enquanto o artigo 196 estabelece que "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

Relatório de Renan Calheiros ainda precisa ser aprovado por maioria da CPI; votação ocorre na próxima semana. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Na avaliação de Calheiros, porém, a investigação da CPI mostrou que a gestão de Bolsonaro agiu em sentido contrário: ao invés de proteger a vida dos brasileiros da covid-19, o presidente teria contribuído para o agravamento da pandemia ao demorar a comprar vacinas, incentivar o uso de medicamentos sem comprovação científica, promover aglomerações, entre outras posturas.

"A minimização constante da gravidade da covid-19, a criação de mecanismos ineficazes de controle e tratamento da doença, com ênfase em protocolo de tratamento precoce sem o aval das autoridades sanitárias, o déficit de coordenação política, a falta de campanhas educativas sobre a importância de medidas não farmacológicas, o comportamento pessoal contra essas medidas, e, por fim, a omissão e o atraso na aquisição de vacinas e a contratação de cobertura populacional baixa do consórcio da OMS foram algumas das condutas do Chefe do Poder Executivo Federal que incontestavelmente atentaram contra a saúde pública e a probidade administrativa", diz trecho do relatório.

Apesar das duras acusações do relator, porém, hoje parece pouco provável que elas gerem abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro. O único que pode iniciar esse procedimento é o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que atualmente mantém boa relação com presidente.

E, a partir dessa aliança com Lira, o Palácio do Planalto construiu uma base de apoio entre os deputados do chamado Centrão (siglas de centro-direita de comportamento mais fisiológico), sustentada pela distribuição de cargos para indicados desses parlamentares e pelo envio de verbas federais para investimentos em seus redutos eleitorais. Com isso, hoje o presidente parece reunir o mínimo de 172 votos na Câmara necessários para barrar a aprovação de um processo de impeachment.

Outro elemento que reduz as chances desse processo ser iniciado é o fato de os protestos de rua realizados ao longo desse ano pedindo a cassação do presidente não terem reunidos um público tão grande quantos os atos que pressionaram pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016.

Já as pesquisas de opinião têm indicado que o governo Bolsonaro é reprovado pela maioria da população, mas ainda é bem avaliado por cerca de um terço dos brasileiros — patamar de aprovação superior ao que Dilma tinha quando foi cassada.

2) Acusações de crimes comuns

Para Calheiros, as condutas de Bolsonaro também podem ser enquadradas em sete crimes comuns, previstos no Código Penal.

São eles: epidemia com resultado de morte (por suspeita de propagar o vírus); infração de medida sanitária preventiva (por realizar aglomerações e não usar máscara); charlatanismo (devido ao incentivo de uso de medicamentos sem eficácia), incitação ao crime (por incentivar aglomeração e o não uso de máscara); falsificação de documento particular (por ter apresentado uma falsificação como sendo um documento oficial do Tribunal de Contas da União que provaria haver um excesso na contabilização de mortes por covid-19); emprego irregular de verbas públicas (por uso de recursos públicos na compra de medicamentos ineficazes); e prevaricação (por supostamente não ter mandado investigar denúncias de corrupção na compra de vacinas).

Caso o relatório seja aprovado, os elementos que baseiam essas acusações serão encaminhadas à PGR, pois o procurador-geral da República, Augusto Aras, é a única autoridade que pode apresentar uma denúncia criminal contra o presidente no Supremo Tribunal Federal (STF).

Aras é visto como aliado de Bolsonaro e hoje parece improvável que o denuncie, já que a PGR tem arquivado diversas queixas-crimes que já foram apresentadas solicitando a investigação criminal de Bolsonaro por sua conduta na pandemia.

A PGR, por exemplo, já arquivou pedido de investigação devido ao não uso de máscara por entender que isso configura infração administrativa, sujeita a multa, e não um crime.

O órgão também recusou pedido de investigação por causa das aglomerações provocadas pelo presidente. Segundo a PGR, Bolsonaro só poderia ser processado por disseminar coronavírus se estivesse contaminado com a doença e contrariasse ordem médica para se isolar.

Por outra lado, a PGR já abriu inquérito para investigar se Bolsonaro prevaricou ao não tomar providências após ser informado pelo deputado Luiz Miranda (DEM-DF) de supostas ilegalidades no contrato para compra da vacina indiana Covaxin. A investigação está em andamento.

Quanto a suspeitas de crimes pelo incentivo de Bolsonaro ao chamado "tratamento precoce" (uso de medicamentos sem eficácia contra covid-19), Aras informou ao STF em junho que havia iniciado uma apuração preliminar para avaliar a abertura de investigação. Críticos de Aras, porém, o acusam de usar esse tipo de procedimento para responder a pressões para investigar Bolsonaro sem de fato adotar medidas concretas contra o presidente.

Para o criminalista Pierpaolo Bottini, professor da Universidade de São Paulo (USP), é difícil cravar que Aras não dará qualquer encaminhamento as acusações do relatório da CPI.

"Não é só uma avaliação política, tem uma avaliação jurídica que ele terá que fazer. Ele vai ter que motivar (justificar juridicamente) seja qual for a decisão dele. Se tiver muito subsídio (sustentando as acusações), também é difícil ele deixar de dar qualquer encaminhamento", acredita.

Segundo Bottini, há um outro caminho jurídico para Bolsonaro ser denunciado no STF. Em caso de omissão da PGR, ou seja, se o órgão demorar para dar alguma resposta ao relatório da CPI, as próprias vítimas da pandemia poderiam processar o presidente por meio de uma ação penal privada subsidiária da pública.

A Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico) disse à BBC News Brasil que de fato analisa essa possibilidade. A organização apresentou em junho à PGR um pedido de investigação contra Bolsonaro, mas a análise desse pedido tem transcorrido em sigilo e a própria Avico enfrenta dificuldades para obter informações sobre seu andamento.

Eventual apresentação de uma ação contra Bolsonaro pelas vítimas da pandemia seria algo inédito. Segundo Bottini, provavelmente o STF faria uma primeira avaliação de admissibilidade (decidir se a ação está dentro dos requisitos jurídicos necessários) e depois encaminharia a denúncia para análise da Câmara dos Deputados.

O professor ressalta que a Constituição só permite que o Presidente da República seja processado após aval de 342 deputados (mesmo número necessário para abertura de um processo de impeachment).

Mulheres protestam contra Bolsonaro. Foto: EPA/MARTIAL TREZZINI

3) Acusações de crimes contra a humanidade

Calheiros também defende em seu relatório que Bolsonaro seja investigado no Tribunal Penal Internacional (TPI), Corte sediada em Haia, na Holanda, que julga graves violações de direitos humanos, como genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra.

No entanto, são poucas as denúncias recebidas pelo Tribunal que de fato geram investigações - e, quando isso ocorre, os casos se alongam por muitos anos, explicou à BBC News Brasil o juiz criminal e professor da USP Marcos Zilli, estudioso do funcionamento do Tribunal Penal Internacional.

Em tese, diz ele, o TPI pode condenar criminosos a penas de 30 anos de prisão e até a prisão perpétua, mas essas punições máximas nunca foram aplicadas pela Corte.

A intenção inicial de Calheiros era acusar o presidente de crime de genocídio contra populações indígenas, mas essa ideia foi abandonada devido à oposição de outros membros da CPI. Com isso, a proposta do relator é enviar ao TPI duas acusações de crimes contra a humanidade por parte do presidente.

Esses crimes estão previstos no Tratado de Roma, incorporado ao direito brasileiro desde setembro de 2002.

Uma das acusações propostas por Calheiros sustenta que Bolsonaro cometeu crime contra a humanidade a praticar "ato desumano que afete gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental". Isso teria ocorrido, segundo o senador, quando vidas humanas foram usadas como "cobaias" em estudos fraudulentos para aplicação de tratamentos sem eficácia contra covid-19.

Ele cita, por exemplo, a promoção do "tratamento precoce" pelo Ministério da Saúde durante a crise de falta de oxigênio em Manaus, no início de 2021. Outro argumento usado pelo senador foi o uso em massa de hidroxicloroquina pelo plano de saúde Prevent Senior. Resultados de um suposta pesquisa da empresa atestando a eficácia do remédio contra covid foram divulgados por Bolsonaro - no entanto, o estudo não havia sido autorizado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e ex-médicos da Prevent Senior acusaram o plano de fraudar os resultados.

A outra acusação é de crime contra a humanidade devido à postura do governo Bolsonaro em relação aos povos indígenas. O relatório destaca a decisão do STF de determinar em julho de 2020 a adoção de um plano emergencial pelo governo de apoio a essas populações durante a pandemia "diante das muitas falhas na política de enfrentamento à pandemia junto aos povos indígenas e da preocupação com a rápida interiorização da doença, que prenunciavam um desastre".

Ainda segundo o parecer de Calheiros, "esta CPI identifica o Presidente da República Jair Messias Bolsonaro como o responsável máximo por atos e omissões intencionais que submeteram os indígenas a condições de vida, tais como a privação do acesso a alimentos ou medicamentos, com vista a causar a destruição dessa parte da população, que configuram atos de extermínio, além de privação intencional e grave de direitos fundamentais em violação do direito internacional, por motivos relacionados com a identidade do grupo ou da coletividade em causa, que configura atos de perseguição".

O relatório final da CPI da covid foi lido no Senado nesta quarta-feira. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Segundo o professor Marcos Zilli, essas acusações, caso sejam realmente apresentadas pela CPI ao TPI, passarão por um longo processo de análise e não necessariamente vão gerar investigações internacionais contra o presidente brasileiro.

Todas as representações criminais feitas ao TPI são analisadas pela Procuradoria da Corte, órgão responsável por realizar investigações de forma independente. Um filtro inicial da procuradoria descarta casos em que os crimes denunciados claramente não são de competência do Tribunal.

Se a representação passar dessa etapa, ela é submetida a um exame preliminar, em que a Procuradoria avalia a presença dos elementos necessários à instauração de uma investigação formal. Nesse momento, é analisado, por exemplo, a gravidade dos crimes apontados na representação e se há omissão da Justiça nacional em apurar esses delitos.

"A experiência que nós temos no Tribunal Penal Internacional revelam que os casos demandam muitos anos de investigação, caso uma investigação seja instaurada, e muitos anos de processo também, caso o processo seja aberto", explica Zilli.

Na sua avaliação, a acusação envolvendo populações indígenas é a que teria mais potencial de prosperar no TPI, devido ao contexto mais amplo de ações da gestão Bolsonaro relacionadas a esses povos, como a redução da proteção aos seus territórios e falas recorrentes do presidente defendendo a exploração econômica das terras indígenas.

O TPI, inclusive, já recebeu algumas acusações contra Bolsonaro, envolvendo tanto os povos indígenas como a conduta na pandemia. Por enquanto, apenas uma relacionada aos indígenas, apresentada em 2019, avançou para a etapa de análise preliminar pela procuradoria.

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58990125


CPI vai retirar acusação de genocídio e homicídio contra Bolsonaro

Mudanças foram decididas em reunião na noite desta terça. Renan: 'está refeita a convergência' entre senadores do G7

André Shalders / O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA — O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, do Senado Federal, não acusará o presidente Jair Bolsonaro de homicídio qualificado e nem de genocídio contra as populações indígenas. O indiciamento do presidente por estes dois crimes estava presente na minuta mais recente do relatório final preparado por Renan Calheiros (MDB-AL), mas os senadores do chamado "G7" da CPI fecharam um acordo para remover os dois crimes durante uma reunião na noite desta terça-feira, 19. 

O encontro foi no apartamento do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). Conforme mostrou o Estadão, Bolsonaro ficou especialmente irritado com o indiciamento por homicídio qualificado -- na reunião da noite desta terça, o tipo penal acabou removido por sugestão do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). 

Após o encontro, o presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM), disse que o crime de homicídio seria "absorvido" em outro tipo penal pelo qual Bolsonaro também será indiciado, o de crime de epidemia com resultado morte. "É só um ajuste no tipo penal", disse ele. Aziz também argumentou que não havia consenso entre os senadores sobre a acusação de genocídio. Antes do acordo, o possível indiciamento de Jair Bolsonaro por homicídio chamou a atenção do mundo: o jornal norte-americano The New York Times mencionou o fato em sua página principal nesta terça-feira.

"O indiciamento por genocidio foi substituído por crime contra a humanidade. E foi retirado o homicídio por sugestão do Alessandro Vieira. Foi tudo bem e está refeita  a convergência", disse o senador Renan Calheiros ao Estadão após a reunião. 

Após o acordo para suavizar as acusações contra o presidente, a lista de imputações contra o mandatário cairá de 12 para 10 crimes. Estão mantidas as acusações de crime de epidemia com resultado morte; infração de medida sanitária preventiva, charlatanismo, incitação ao crime, falsificação de documento particular, emprego irregular de verbas públicas, prevaricação, crime contra a humanidade  e crimes de responsabilidade. 

A reunião noturna na casa de Tasso Jereissati também terminou com a remoção de uma acusação contra o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), que é filho do presidente da República. Ele foi poupado da acusação de advocacia administrativa, por supostamente ter atuado a favor da empresa Precisa Medicamentos. No entanto, continuará sendo acusado de incitação ao crime por comandar a estrutura de propagação de notícias falsas, junto com o pai. A mesma acusação está mantida para os outros dois filhos do presidente com carreira política, Carlos e Eduardo.

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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,senadores-da-cpi-fecham-acordo-para-retirar-acusacao-de-genocidio-e-homicidio-contra-bolsonaro,70003873787


Carlos Pereira: Um controle desequilibrado

Um Ministério Público ‘incontrolável’ garante o equilíbrio entre Poderes

Carlos Pereira / O Estado de S. Paulo

Existem vários modelos estáveis de democracia, da mais majoritária (com poucas restrições às preferências de uma maioria parlamentar) à mais consensualista (com vários pontos de veto capazes de proteger interesses minoritários). 

Não se pode dizer qual modelo é o melhor. O importante é que exista equilíbrio entre os mais variados componentes do sistema.

Os founding fathers da democracia brasileira de 1988 constituíram um sistema político essencialmente consensualista, com vários elementos de proteção, tais como separação de Poderes, federalismo, multipartidarismo e, o que aqui interessa, independência do Judiciário e do Ministério Público

Para contrabalançar e gerar governabilidade, os legisladores delegaram uma grande quantidade de poderes ao presidente para que ele tivesse condições de atrair suporte político majoritário, mesmo em um ambiente fragmentado. 

Neste desenho, cumpre papel fundamental para o equilíbrio do jogo a existência de um MP e Judiciário independentes. Um MP “incontrolável” teria condições de controlar chefes do Executivo poderosos. Naturalmente que essa escolha não é destituída de custos. A falta de controle pode levar a potenciais excessos e desvios. Mas esse foi o preço que o legislador constituinte decidiu pagar. 

Preferências podem ser alteradas, já que constituições não são “camisas de força”. Mas deve-se atentar para os custos dessa alteração.

O controle externo do MP já existe em alguns países. Mas os elementos que garantem o equilíbrio do sistema são diferentes dos daqui. Portanto, o que funciona lá não necessariamente vai funcionar aqui.

A indicação de membros do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e do seu corregedor pelo Legislativo, bem como a possibilidade desse conselho passar a rever atos do MP, como proposta na PEC 5/21, certamente aumentará o controle sobre os membros do MP, desestimulando potenciais excessos e desvios. 

Mas não podemos esquecer o outro dado da moeda. Na medida em que um presidente constitucionalmente poderoso tem condições de montar maiorias legislativas, serão essas maiorias que terão capacidade de interferir na composição do CNMP e, por consequência, na própria atuação do MP. 

Se o problema é a falta de controle do MP, poder-se-ia criar um controle exógeno que fosse exercido pela minoria parlamentar de oposição. Um controle exercido por uma maioria parlamentar, proposto na PEC 5/21, é uma “bomba atômica” que tem o potencial de dessensibilizar o equilíbrio de todo o sistema político em prol do Executivo. 

Professor titular FGV EBAPE, Rio

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,um-controle-desequilibrado,70003871511


Alessandro Vieira: “É preciso aplicar os melhores valores éticos na vida pública”

Pré-candidato à Presidência da República pelo partido Cidadania ministrou a Aula Inaugural do curso Jornada Cidadã 2022

João Rodrigues, da equipe da FAP

Com mais de 500 inscritos, o curso Jornada Cidadã 2022 teve início na última quarta-feira (13). A capacitação telepresencial visa preparar pré-candidatos do Cidadania 23 e suas equipes para as eleições do próximo ano. O podcast Rádio FAP desta semana faz um balando da Aula Inaugural do curso, ministrada pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Pré-candidato à Presidência da República, é membro titular do Diretório Nacional do partido e foi eleito senador em 2018 com 474.449 votos. É delegado da polícia civil, casado e tem três filhos. Faz parte dos movimentos RenovaBR e Acredito.



A relação entre a ética na vida pessoal e atuação pública, como fazer uma campanha bem-sucedida com respeito a princípios morais sólidos e a importância de uma postura coerente desde o início do mandato são alguns dos temas do programa. O episódio conta com áudios do canal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) no Youtube.

O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google Podcasts, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues. A edição-executiva é de Renato Ferraz.