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RPD || Alessandro Vieira: A CPI que fez a diferença

Comissão expôs erros e omissões graves da desastrosa atuação do governo Bolsonaro no combate à pandemia

À medida que a CPI da Pandemia se aproxima de seu término, aumenta, na mesma proporção, a cobrança por resultados práticos dos seis meses de depoimentos, quebras de sigilo e milhares de documentos colhidos, em um país que, a essa altura da tragédia, beira os 600 mil brasileiros mortos pelo coronavírus. Você já viu muitas CPIs atravessarem momentos históricos difíceis, mas certamente nunca testemunhou uma comissão parlamentar que fez tanto de fato pelo país - os porões que abriu, as portas que lacrou e, sem falsa modéstia, as vidas que salvou. A CPI tirou o foco do cercadinho e escancarou erros e omissões graves do Governo Federal. Ademais, descobriu indícios da existência de um mecanismo de favorecimento de empresas para desvio de recurso público operando dentro do Ministério da Saúde.  

Já tivemos muitas comissões de inquérito, retratos de seus momentos políticos, da realidade do país. Algumas mornas, outras efervescentes. Algumas mero conchavo entre amigos - terminando em 'pizza' -, outras esmagadas pelos tentáculos do Estado. Mas nenhuma - e não tenho dúvida em cravar isso - como a CPI da Pandemia. Uma CPI realizada na era das tecnologias da informação e comunicação e da efervescência das redes sociais, que de forma inédita tem de lidar com o gabinete das fake news, mas também com a checagem de fatos em tempo real. Estamos chegando aos derradeiros dias de trabalho, da CPI das CPIs, como já foi consagrada. E o que lhe garante esse título é o volume de erros, omissões, irregularidades e evidências de crimes de corrupção que estão sendo desvendados à medida que ainda se vive a Pandemia, e que a cada dia novos fatos se revelam. 

Mais de 600 mil brasileiros perderam suas vidas – pais, mães, irmãos, amigos, que não retornarão. Algumas ceifadas por falta de vacinas, outras por falta de orientação e comunicação acerca de medidas não farmacológicas e tantas outras pela falta de políticas concretas de gestão e contensão e propagação do vírus. Não há precedente para tal massacre - ainda mais turbinado por um esquema corrupto e desumano, em diversos escalões e com diferentes fardamentos. Mas a CPI da Covid também reflete uma ruptura no que considero ser um momento particularmente baixo da degradação da atividade parlamentar, com o esforço do Executivo para reduzir as Casas Legislativas a um entreposto de emendas e cargos. A CPI da Covid é, mesmo em meio a esse cenário hostil, uma luz no fim do túnel para o povo, mostrando que, mesmo em tempos sombrios, ainda que em menor número, existem pessoas sérias que pensam no Brasil e que lutam pela justiça, pela ciência e pela verdade. 

Foram desafios marcantes. Graças ao equilíbrio de seus líderes, e membros mais combativos, a CPI terminará seus trabalhos sem se desviar do caminho. Muito claramente, narramos, ao longo desses meses, um enredo terrível - longe de poder ter um final feliz. Além da omissão fatal do Governo Federal, comprovada nos depoimentos que convocou e documentos que analisou, a CPI expôs a vergonhosa atuação do presidente e de seus subordinados, ele que favoreceu a disseminação da epidemia causada pelo novo coronavírus, sendo incapaz de proteger seu povo - que continua enterrando centenas de brasileiros por dia. Pior: isso não foi casual, foi deliberado, baseado numa crença negacionista, anticiência e antivacina. 

A CPI expôs um governo sem um pingo de empatia com seu povo, com os hospitais lotados e os cemitérios cheios passando longe das agendas das autoridades. A CPI seguiu o dinheiro, e o mau-cheiro, chegando aos mais altos escalões da República. Internações, intubações, dores lancinantes, cadáveres em carros frigorífico, covas coletivas, sequelas de todo tipo, tomaram o noticiário, mas não entraram nos amplos salões do Planalto - e de muitos de seus equivalentes locais. Tivemos, tragicamente, o pior governo do mundo contemporâneo no pior momento de nossa história administrativa recente. Com base em provas documentais e depoimentos, a CPI mostra que o governo não foi só inepto, é ganancioso, favorecendo a disseminação da epidemia e o enriquecimento de empresários e políticos aliados. Despejando toda sua ignorância, despreparo, ideologia, ambição, e misturando jalecos com fardas, transformou a política de saúde pública em um genocídio.  

Quanto mais avançamos, mais desafios tem a comissão para que a sociedade, num novo momento, por meio de seus mecanismos legais, dê prosseguimento ao que não será possível concluir agora. Por seu tempo de vida, e por nossas próprias limitações, a CPI não conseguirá investigar todos os âmbitos de corrupção. Não acabaremos com a escuridão. Mas certamente teremos jogado muita luz sobre muitas realidades ocultas. E aberto espaços novos para o exercício da cidadania. Nossos frutos estarão espalhados por quem sabe, outras CPIs - spin-offs depois da nossa última temporada - investigações do Supremo Tribunal Federal, do Tribunal Superior Eleitoral, do Tribunal de Contas, do Ministério Público, da Polícia Federal. E, especialmente, em nossas consciências, valores e práticas. 

__Esse texto é uma homenagem póstuma a um amigo que, no meio da pandemia, perdemos para a Covid. E que, presente em nossas vidas, nos animou a enfrentar o que enfrentamos. Dor e saudade, Senador Major Olímpio. Um Brasil melhor vai nascer, muito graças a seu espírito. 

*Alessandro Vieira é senador da República (Cidadania-SE). Integra o Movimento Acredito e o RenovaBR. Pautou sua campanha  política no combate à corrupção e é um dos senadores que mais se destacaram nas sessões da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid.


Luiz Carlos Azedo: As almas mortas e a montanha

Milhões de pacientes passaram pelas enfermarias. O que mudou no modo de vida e na forma de pensar dessas pessoas?

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

“Diga- me, mãezinha, têm morrido camponeses seus? — Nem me fale paizinho — dezoito homens! Disse a velha com um suspiro. — E tudo gente boa que morreu, bons trabalhadores. É verdade que nasceram outros depois, mas o que valem? É tudo criançada; mas o fiscal chegou, mandando pagar a taxa por alma, da mesma forma. Os homens estão defuntos, mas eu tenho que pagar como se estivessem vivos.”

No livro Almas mortas, o escritor ucraniano Nikolai Gogol ironiza a servidão russa na época do czar Pedro, o Grande, que resolveu cobrar impostos sobre todas as almas. Cobrava até de quem não era católico, apesar de não ser nada religioso. Os proprietários de terras eram obrigados a pagar os impostos pelo número de servos, inclusive os que haviam morrido. Pável Ivánovitich Tchítchicov, o personagem central do romance, resolve ganhar dinheiro com isso.

Charmoso, educado, sagaz e boa pinta, usa de convencimento para enganar pequenos proprietários. Aproveita-se da burocracia russa ineficiente, e do regime de servidão e da miséria, para hipotecar almas como se todas estivessem vivas e, com isso, obter lucro. Se o proprietário vende uma alma, para Tchitchicov, o vendedor não perde nada. Pelo contrário, ele economiza no imposto que teria que pagar e ainda ganha uma quantia em rublos. Quanto ao comprador, essas almas mortas passarão a fazer parte do seu patrimônio.

O plano de Tchitchicov é simples. Ao comprar almas mortas a partir de pequenos proprietários de terra, esses servos permanecem em livros dos fazendeiros até o próximo recenseamento e, muito embora mortos, são tributáveis. Ao comprá-los, aliviam a carga fiscal dos proprietários. Seu plano é instalar esses servos mortos nas listas fiscais de uma propriedade distante, em que ele vai, então, ser capaz de obter uma hipoteca generosa do governo e sair com uma pequena fortuna. Certos aspectos da pandemia de covid-19 aqui no Brasil lembram o romance de Gogol.

Ultrapassamos a marca de 600 mil mortes por covid-19, mantendo, porém, uma média de 500 óbitos por dia. Na sexta-feira, quando atingimos esse patamar, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, deu uma entrevista coletiva minimizando o fato, para destacar que: (1) o governo está empenhado em viabilizar a terceira dose da vacina contra a covid-19 e (2) um número muito maior de pessoas diagnosticadas com a doença se recuperou. De fato, cerca de 20,6 milhões de pessoas tiveram covid-19 e sobreviveram; no momento, 285.032 estão enfermas.

O trauma coletivo
A forma burocrática da entrevista e a falta de empatia do ministro estão em linha com a política sanitária do governo federal. Contaminado na viagem do presidente Jair Bolsonaro à ONU, mesmo sem sintomas, teve que fazer três semanas de quarentena em Nova York, para voltar ao Brasil. Sua desastrosa atuação durante a pandemia também está sendo investigada pela CPI do Senado. Os senadores deverão concluir seus trabalhos nas próximas semanas e, segundo o relator, senador Renan Calheiros (MDB-AL), as consequências serão inquéritos civis e criminais, a serem conduzidos pelo Ministério Público, a Polícia Federal e o Tribunal de Contas da União (TCU). O relator proporá a demissão do ministro Queiroga e/ou a abertura de um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro, por crime de responsabilidade. Estamos no Brasil, a um ano das eleições, e o nosso país, como dizia o maestro Antônio Carlos Jobim, não é para principiantes: nada de demissão nem impeachment.

Nossa realidade vai além das obras de ficção. Muita incompetência e espertezas macabras foram desnudadas pela CPI da Saúde, porém, nada se aproxima tanto da história de Gogol como o caso macabro da Prevent Sênior, empresa que se especializou no atendimento de idosos, em cuja estratégia de tratamento, além do “kit cloroquina”, nos casos graves, segundo denúncias de médicos e pacientes, os “cuidados paliativos” seriam uma espécie de eutanásia não consentida, para dizer o mínimo. O trauma coletivo da pandemia no Brasil é irreversível, principalmente para os familiares e amigos desses 600 mil mortos por covid-19.

Graças ao SUS, milhões de pacientes passaram pelas enfermarias dos hospitais, alguns com longas internações. O que mudou no modo de vida e na forma de pensar dessas pessoas? O escritor alemão Thomas Mann, cuja mãe era brasileira, ao descrever as polêmicas entre pacientes num sanatório de Davos, nos Alpes suíços, fez um mosaico do que estava acontecendo na Europa à beira da I Guerra Mundial. N’A montanha mágica, a tuberculose muda a noção de tempo durante a internação, enquanto a vida segue o curso trágico da História e médicos charlatães oferecem aos ricos pacientes falsas opções de cura. Naquela época não existia a penicilina; hoje, temos também as vacinas contra a covid-19.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-as-almas-mortas-e-a-montanha

William Waack: Nem o Centrão resolve a situação de Bolsonaro

Caciques enxergam a chance de ocupar de vez o Executivo, pela via eleitoral

William Waack / O Estado de S. Paulo

O parlamentarismo com dois primeiros-ministros é o mais novo evento político “jabuticaba”, aquilo que só existe no Brasil. Os presidentes das duas casas legislativas é que estão lidando diretamente com dois assuntos de enorme e imediato impacto sobre o bolso de todos e de ampla repercussão política: preços dos combustíveis e tamanho dos impostos.

A taxa de sucesso até aqui é baixa. As duas operações lidam com assuntos terrivelmente técnicos e complexos, afetados pelos naturais conflitos de interesses entre os mais variados segmentos, e dependem ainda do entendimento precário entre os entes da Federação, problemão por último evidenciado na pandemia. Mas o fato político expressivo é que a agenda política está nas mãos dos dois primeiros-ministros.

Sim, o ministro da Economia – sofrendo evidente desgaste político por conta de sua offshore – compareceu a reuniões com os dois primeiros-ministros que incluíam ainda representantes de municípios, Estados e Receita Federal. Pelo menos formalmente o Executivo estava lá, mas os presidentes da Câmara e do Senado deixaram bem claro ao público que são eles os condutores de todos os processos. São eles que se dirigem à população dizendo como e quando pretendem resolver os problemas.

O Executivo tem noção clara do que precisa – arrumar um jeito de sustentar programas assistenciais que, fora o indiscutível mérito de mitigar a miséria de milhões de pessoas, são também ferramentas políticas no esforço de Jair Bolsonaro em se reeleger. Mas ainda não disse exatamente como realizar esses programas, numa exibição espetacular da dificuldade em estabelecer prioridades: é para resolver primeiro o Bolsa Família ou o preço da gasolina?

Tudo está subordinado a esse eufemismo chamado de “espaço fiscal”, que, por sua vez, é função direta de rearranjo de impostos (para não falar em reforma ampla), propostas de emendas constitucionais que tratem de pagamentos de dívidas (os tais precatórios) e intrincadas negociações sobre o próximo orçamento. Os dois primeiros-ministros perceberam que, no fundo, trata-se da velha questão do ovo ou a da galinha.

Para escapar desse falso dilema, os dois primeiros-ministros teriam de puxar um fio da meada, ou seja, proceder ao que o Executivo mostrou-se incapaz de fazer: estabelecer claramente prioridades e arranjar-se com as várias forças políticas e os vários interesses setoriais. É a queixa recorrente de relatores de todo tipo de matéria demandando coordenação e articulação dentro e fora do Legislativo: não entendem muito bem o que pretende o Palácio do Planalto.

Neste ponto, o da agenda política, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco são atrapalhados não só por desentendimentos causados por diferentes objetivos políticos pessoais. Ocorre que os dois primeiros-ministros são, ao mesmo tempo, operadores e vítimas daquilo que o sociólogo Bolívar Lamounier chama de sistema político do “pluricorporativismo” (mascarado de pluripartidarismo), por meio do qual se propaga e se reforça a capacidade “extrativa” das mais diversas corporações.

Podemos chamar isso também de “sistema do Centrão”, que está claramente se consolidando na fusão gigante de DEM e PSL, e na busca dentro dessas forças políticas da alternativa eleitoral ao embate Bolsonaro-lula. A despeito do que possam dizer as pesquisas de opinião sobre o momento, dando conta do amplo favoritismo eleitoral de Lula, na visão desses operadores políticos a força e o sentido do eleitorado apontam para o que se chamaria de tendência de “centro-direita” – daí a dificuldade em costurar acordo com o PT.

Bolsonaro teve um pouco atrás a possibilidade de “caminhar para o centro” e ser abraçado eleitoralmente pelo Centrão. Essa oportunidade parece ter sido jogada fora por ele mesmo, que hoje não sabe se receberá um tapinha nas costas pelo fato de ter aberto uma chance inédita de consolidação do poder a esses caciques, agora enxergando a possibilidade de tomar conta eles mesmos do Executivo, e pela via eleitoral.

Ou se receberá desses caciques um chute nos glúteos, dependendo das circunstâncias.

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,nem-o-centrao-resolve,70003862095


Maria Cristina Fernandes: Aos eleitores, o inferno

Câmara desconvocou Braga Netto mas confirmou Guedes

Maria Cristina Fernandes / Valor Econômico

A publicidade da conta em paraíso fiscal da principal autoridade econômica do país era tudo o que os dirigentes do PP que trabalham pela filiação do presidente da República poderiam almejar. A filiação traz otimismo para as ambições da legenda, que passam pelo cargo do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, mas se concentram mesmo é no Orçamento de 2022. O constrangimento do ministro da Economia vem num momento tão propício que, não fosse a independência cristalina da fonte das informações que vieram à lume, daria pra pensar que foram encomendadas.

A retaguarda governista na comissão que aprovou o requerimento de convocação de Paulo Guedes era tão frágil que a defesa do ministro coube a um deputado do Novo que nem da base do presidente é. Da leitura do requerimento de convocação até sua aprovação, por 12 votos a 8, passaram-se duas horas, tempo suficiente para uma articulação capaz de transformá-la em convite, como no Senado, adiá-la ou cancelá-la, mas isso não aconteceu.

Até num governo de base mais frágil, como o da ex-presidente Dilma Rousseff, o então presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), foi capaz de anular a convocação de um ministro, Antonio Palocci, acusado, em 2011, de acumular um vertiginoso crescimento de sua consultoria. O atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foi ágil o suficiente para encontrar firula regimental capaz de anular a convocação do ministro da Defesa, Walter Braga Netto, em abril deste ano, para explicar a picanha superfaturada na Defesa.


Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Coletiva do ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcos Corrêa/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Paulo Guedes durante cerimônia do Novo FUNDEB. Foto: Isac Nóbrega/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes e o presidente Jair Bolsonaro. Foto: Marcos Corrêa/PR
Paulo Guedes e Bolsonaro durante o Latin America Investment Conference. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante palestra. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
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Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Coletiva do ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Marcos Corrêa/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Paulo Guedes durante cerimônia do Novo FUNDEB. Foto: Isac Nóbrega/PR
O Ministro da Economia, Paulo Guedes e o presidente Jair Bolsonaro. Foto: Marcos Corrêa/PR
Paulo Guedes e Bolsonaro durante o Latin America Investment Conference. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante palestra. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
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Guedes, porém, não teve a mesma sorte. Lira viajou para Roma enquanto todos os caminhos do ministro o levavam para o labirinto. Sua convocação foi aprovada em plenário por mais do que o dobro dos votos. O líder do PP foi o primeiro a aderir à oposição.

Nada melhor para uma Câmara que quer destelhar o Orçamento do que ter um ministro da Economia na berlinda. Não que lhe faltem pecados. Todos serão abundantemente expostos na campanha. Darão trabalho à única Pasta que funciona no governo, a da comunicação.

Nem se Jim Carville viesse comandar a campanha do presidente Jair Bolsonaro daria conta da exposição do eleitor, cuja renda é corroída por inflação de dois dígitos, às reservas financeiras protegidas do titular da política econômica. No limite, poderia recriar a máxima da campanha de Bill Clinton: não é crime, estúpido, é escárnio.

Mas qual seria mesmo o interesse do PP em colocar Guedes na berlinda? O mesmo que impera sobre a aliança. As políticas lideradas pelo partido têm conduzido o país a um buraco fiscal sem fim, mas o PP passa bem. Pode se manter como uma das maiores bancadas da Câmara em 2023 e reeleger Lira à presidência, desde que disponha de recursos para tanto.

Não está fácil. Tome-se, por exemplo, as dificuldades da MP 1055, que imporia uma conta de R$ 33 bilhões para o consumidor de energia em benefício de um único empresário. Muitos daqueles que votaram a privatização da Eletrobras o fizeram, sob desgaste, sabendo que a fatura viria. Se resistem agora a dar continuidade ao despautério é porque o modelo de repartição está em crise.

À medida que se aproxima a eleição aumenta também a cobrança de promessas não cumpridas junto à base parlamentar. Por isso, o inferno de Guedes é, no momento, a canção do paraíso. Nem que o espaço a ser conquistado no Orçamento se dê em detrimento do país. Os parlamentares ouviram de uma autoridade econômica que há U$ 13 trilhões que hoje rendem zero de juro e não vêm para o Brasil pela turbulência. A publicidade dos Pandora Papers deu ainda mais veracidade ao relato.

Do que os aliados de Bolsonaro precisam? No PP, por exemplo, calcula-se que um fundo eleitoral num total de R$ 4 bilhões, o dobro do atual, permitiria ao partido reservar até R$ 50 milhões de sua cota apenas para abrigar Bolsonaro sem desfalcar as campanhas proporcionais.

Mas as ambições extrapolam o fundo eleitoral. Se sobem o preço para realizar seus desejos é porque os parlamentares apostam na solvência do credor - o governo -, o que não significa que esta se estenda ao eleitor.


Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
 Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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O combustível do embate

A primeira solução apresentada por Lira para a redução no preço dos combustíveis, a de uma subvenção financiada pelo Petrobras, esbarrou na resistência do general Joaquim Luna e Silva, que se mantém prestigiado, a abrir um novo rombo na estatal.

Sobrou a mudança no cálculo do ICMS dos combustíveis que deixaria de ser sobre o preço dos últimos 15 dias para incidir sobre o dos últimos dois anos - um puxadinho à altura dos tempos em que se vive.

A fartura das emendas jogou no passado remoto o tempo em que governador tinha bancada. Agora os parlamentares comandam o jogo. A ponto de quererem mexer nos impostos estaduais sem alteração constitucional.

A saída ainda colide com o Senado, que avança numa reforma tributária para mexer nisso tudo. Sua relevância não está na chance de que prospere mas no apoio de governadores, prefeitos e até de Guedes, num movimento contrário ao da Câmara.

Não se confrontam apenas duas Casas legislativas em defesa de suas prerrogativas. PP, PL e Republicanos constituem o núcleo duro da base bolsonarista, dominam a Câmara e privilegiam, acima de tudo, a formação de bancada para manter o presidente sob permanente sequestro.

O PSD, por outro lado, partido em torno do qual gira o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), mantém-se próximo da sigla que emergirá da fusão DEM-PSL e, assim, também cultiva a ambição de formar um bloco de poder. Mas vai além. É hoje um dos partidos mais aplicados na montagem de palanques estaduais. Está ancorado na expectativa de ocupar espaços na federação que extrapolam a sucessão presidencial.

Agora vai

A indicação do ex-advogado-geral da União, André Mendonça, ao Supremo voltou a respirar, ainda que por aparelhos. A indicação completa três meses. E nada de sabatina. As vagas preenchidas pelos ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso ficaram seis meses em aberto. A do ministro Luiz Edson Fachin, oito. Mas nesses casos o que demorou foi a indicação. Desta vez, a escolha foi oficializada quatro dias depois da saída do ex-ministro Marco Aurélio Mello. A demora é do Senado. O Congresso terá sessão dedicada ao Orçamento depois do feriado. O oxigênio de André Mendonça volta junto com a perspectiva de empenho das emendas.

Fonte: Valor Econômico
https://valor.globo.com/politica/coluna/aos-eleitores-o-inferno.ghtml


Brasileiro quer mais mulheres na política, aponta pesquisa Ipsos

Apesar da baixa representatividade, País é o que mais defende participação feminina

Davi Medeiros, O Estado de S.Paulo

Números do Congresso confirmam o que um olhar já revela: embora sejam maioria entre a população, as mulheres têm cerca de 15% de representação política nas duas Casas legislativas, ocupando 12 das 81 cadeiras do Senado e 77 das 513 na Câmara. Para sete em cada dez brasileiros, no entanto, isso não deveria ser assim. O Brasil é o país que mais defende a participação feminina na política, segundo levantamento global feito pelo Instituto Ipsos.

Para chegar a esta conclusão, os pesquisadores fizeram a mesma pergunta em 28 países: O mundo seria um lugar melhor, mais pacífico e bem-sucedido se mais mulheres estivessem no poder? A média global dos que responderam que sim é de 54%. Depois do Brasil, primeiro lugar no ranking com taxa de 70%, Peru e Colômbia empatam na segunda colocação. Ambos os países, porém, têm maior participação feminina na política que o Brasil. No Peru as mulheres são 40% do Parlamento, e na Colômbia, 19,7%. 

Homens e mulheres responderam de forma parecida ao levantamento. Em todos os países, as entrevistadas apresentaram maiores taxas de concordância à questão que os homens. A diferença foi de 12 pontos porcentuais na média global, e 10 no Brasil. 

Na pesquisa, online, foram ouvidos 19 mil entrevistados entre 16 e 74 anos, em todos os continentes. Os dados foram colhidos entre 23 de julho e 6 de agosto deste ano. A margem de erro para o Brasil é de 3,5 pontos porcentuais, para mais e para menos.

Embora o ímpeto seja culpar o eleitor, a disparidade começa antes do dia da eleição. Dados da plataforma 72 horas, que analisa a distribuição de recursos financeiros para campanhas, mostram que candidaturas de mulheres receberam 30% dos valores repassados pelos partidos em 2020. O valor foi apenas o suficiente para cumprir a lei que naquela eleição definia o repasse mínimo de 30% do fundo especial de financiamento de campanha para mulheres. https://datawrapper.dwcdn.net/3yzjT/6/

Segundo a especialista em financiamento de campanhas Fefa Costa, co-idealizadora da plataforma 72 horas, no ano passado observou-se um número muito baixo de representatividade feminina em todos os partidos. Muitas legendas nem chegaram a respeitar a cota, como é o caso do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), que destinou 17% dos recursos a candidaturas femininas. “O ideal seria que houvesse paridade. Precisamos falar de 50 a 50”, afirmou. “30% já é muito pouco perto da nossa real condição, e, mesmo assim, boa parte dos partidos não cumpre.”

Bônus. Proposta aprovada pelo Congresso em setembro deve contribuir para transformar esse cenário. A norma, promulgada no último dia 28, prevê um “bônus” financeiro para os partidos que mais conseguirem votos em candidatos negros e mulheres, o que já provocou uma “corrida” dos partidos para aumentar o número de candidaturas desses grupos. 

“Claro que todo avanço para a igualdade de gênero e racial é visto com bons olhos, mas é preciso entender o que acontece na prática”, avaliou Fefa. O mérito da proposta, segundo ela, é incentivar os partidos a impulsionarem candidaturas destes segmentos, conferindo mais visibilidade a lideranças que querem fazer parte do processo político, mas que carecem de apoio das legendas para ganhar relevância. “O ponto mais importante é se haverá transparência para que a sociedade e os próprios candidatos tenham meios para fiscalizar os recursos, saber se (a regra) é aplicada da maneira correta”.

A pesquisa do Instituto Ipsos chancela o interesse da população nesse tema, disse Helio Gastaldi, porta-voz da empresa no País. Ele afirmou que o “ambiente beligerante” da política brasileira não passa despercebido pela população, que valoriza a lógica parlamentar de busca pelo consenso. “O levantamento permite inferir que a maioria das pessoas não concorda com a hostilidade reservada às mulheres nos espaços de poder”, diz.  

“Vemos mulheres sendo tratadas de maneira agressiva. Pessoas que, em vez de debater a pauta que se apresenta, tentam desqualificar o interlocutor, no caso a mulher, e enfraquecer seus argumentos”, acrescentou Gastaldi. Exemplo disso aconteceu durante sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no mês passado, quando a senadora Simone Tebet (MDB-MS) foi chamada de “totalmente descontrolada” pelo depoente Wagner Rosário, ministro da Controladoria-Geral da União (CGU). 

Quando acontecem longe das câmeras, casos como o da senadora Simone podem ser denunciados aos canais do Ministério Público Eleitoral de cada Estado. No âmbito da Câmara, as queixas também podem ser apresentadas à Procuradoria da Mulher da Câmara dos Deputados. O órgão não recebe apenas denúncias de violência política, mas de não cumprimento das leis perante casos de violência doméstica e familiar.

NOTÍCIAS RELACIONADAS

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,brasileiro-quer-mais-mulher-na-politica-aponta-pesquisa-ipsos,70003860977


Senado aprova novo marco legal das ferrovias

Projeto visa expansão do setor ferroviário e segue para Câmara

Marcelo Brandão / Agência Brasil

O Senado aprovou hoje (5) um projeto de lei (PL) que cria um novo marco legal das ferrovias brasileiras. O texto trata de novos instrumentos de concessão ou autorização, além de exploração de ferrovias em regime privado, tanto em nível federal, quanto estadual e municipal. Na prática, são diretrizes para expansão do setor ferroviário no país. Agora, o PL segue para a Câmara.

O projeto sofreu alterações pelo relator, Jean Paul Prates (PT-RN), gerando um substitutivo. Ele prevê que o transporte ferroviário em regime de direito público pode ser executado diretamente por União, estados e municípios; ou, indiretamente, por meio de concessão ou permissão. Mas a execução direta do transporte ferroviário pela União ocorrerá apenas quando for necessário garantir a segurança e a soberania nacionais ou em casos de relevante interesse coletivo.

O uso da modalidade da autorização para a construção de novas ferrovias é a principal novidade do projeto. Nesse modelo, o Poder Público possibilita que o particular assuma o risco da operação ferroviária investindo em projetos de seu interesse. A proposta é diversa da concessão, na qual o investimento é bancado pelo Estado, buscando o atendimento dos seus interesses estratégicos.

“Nós estamos votando uma lei geral das ferrovias”, disse Prates. “Então, estamos regulando a inclusão das autorizações no mundo jurídico das ferrovias. E também a autorregulação. Ela não se sobreporá em momento algum à regulação setorial ferroviária. Ela se cinde aos aspectos técnicos e operacionais de um sistema ferroviário, nada mais. E ela, ainda assim, se sujeita à mediação final, caso haja conflitos, do órgão regulador. Mas é importante para dar agilidade a sistemas”, acrescentou ele durante a sessão.

O marco legal aprovado nesta terça-feira oferece a possibilidade de um operador ferroviário de passageiros contar com outros imóveis próximos à linha para ajudar na tarifa e diminuir a necessidade de subsídio estatal. Segundo Prates, trens de passageiros no mundo não se pagam apenas pela tarifa de uso dos passageiros. A ideia é que os serviços de transporte por trens dependam o mínimo possível de subsídio estatal.

* Com informações da Agência Senado

Fonte: Agência Brasil
https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2021-10/senado-aprova-novo-marco-legal-das-ferrovias


Benito Salomão: Auxílio Brasil e risco democrático

Proposta do novo benefício pode comprometer estabilidade macroeconômica

Benito Salomão / Folha de S. Paulo

Quando a lógica eleitoral pauta a política econômica, as consequências são indesejáveis. O Brasil viveu isso em 2013-14 diante da reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT), causando nítidos retrocessos na política fiscal, tais como as contabilidades criativas e pedaladas fiscais. Naquela época, a presidente optou pelo negacionismo fiscal até novembro de 2014, quando venceu as eleições e a realidade se impôs. O desfecho daquele episódio segue fresco na memória.

A história se repete, primeiro como tragédia, depois como farsa, sentença atribuída a Karl Marx ideal para explicar a realidade contemporânea. Após o descalabro de 2014, o Brasil voltou a discutir retrocessos fiscais parecidos com os daquele momento. Em 2020, o país teve que elevar seu endividamento público em face dos danos humanitários causados pela Covid-19.

A dívida pública absorveu o choque, crescendo fortemente. Já em 2021, com várias economias superando a pandemia e retirando os incentivos fiscais, o Brasil segue na direção oposta e acumula inúmeros episódios que têm minado a credibilidade fiscal. Vale ressaltar que o prolongamento da pandemia no tempo é o primeiro fator de insustentabilidade fiscal, criando pressão permanente sobre benefícios sociais que deveriam ser apenas temporários. Isso tudo piorado pelas incertezas acerca da manutenção do teto de gastos, ou por heterodoxias como o orçamento paralelo e o escalonamento dos precatórios.

Nesse contexto de dificuldades fiscais, o governo envia para a Câmara a medida provisória 1.061/21 do novo Bolsa Família, agora nominado Auxílio Brasil. Sobre isso, ressalvas devem ser feitas: 1 - uma política dessa natureza é muito importante para ser normatizada via medida provisória; 2 - não se tem notícia de nenhum estudo que embase o novo desenho da política; e, 3° essa nova política de renda mínima será financiada por elevações de impostos ou cortes de gastos e em quais áreas? Ademais esse programa será acrescido a outras despesas como os precatórios escalonados, além de novos gastos que devem surgir na folga criada pela inflação deste ano no teto de gastos. Esse conjunto de despesas pode tornar inevitável aumentos tributários em um futuro próximo, impondo um elevado custo à sociedade.

O mais grave, no entanto, é o seu objetivo claramente eleitoral, visando reverter a desvantagem do presidente nas próximas eleições. Buchanan e Wagner (1977) sustentam que déficits fiscais causam distorções nas democracias, já que seus benefícios são sentidos no curto prazo, enquanto seus custos, associados a desequilíbrios macroeconômicos como inflação, desemprego, juros altos e elevações tributárias, demoram a se manifestar. Já Tabellini e Alesina (1990) salientam que políticos têm o incentivo de elevar déficits no presente, visando bônus eleitoral e deixando os custos futuros do ajuste para seus sucessores. Nesse contexto, a proposta do Auxílio Brasil tem todas as características de um programa cujo objetivo seja auferir prestígio eleitoral ao seu idealizador. Jair Bolsonaro está, aparentemente, disposto a comprometer a estabilidade macroeconômica do país para se reeleger.

Para 2023, dois cenários são possíveis: 1 - a reeleição do atual presidente irá impor a necessidade que ele próprio conduza o ajuste fiscal. Se isso ocorrer, Bolsonaro herdará de si um país infinitamente mais desorganizado que recebeu em 2019, tendo que lidar com desemprego, dívida pública, câmbio, juros e inflação muito elevados; ou 2 - a eleição de Lula, que também terá de implementar ajustes fiscais, que via de regra são hostilizados por ele e seu partido.

Igualmente importante, é preciso atentar à configuração do Congresso que emergirá em 2023, isso porque boa parte das medidas fiscais dependem de esforços legislativos. No Brasil, a política fiscal é predominantemente formalizada na Constituição, o que torna o poder legislativo fundamental em qualquer estratégia de equilíbrio fiscal.

Independentemente do resultado das urnas, a próxima legislatura dependerá de credibilidade para que o ajuste tenha sucesso. Caso contrário, em um contexto de polarização exacerbada, o ano de 2023 pode reeditar as turbulências de 2015, afetando a governabilidade. Medidas como aumentos de impostos e cortes de gastos são impopulares por si próprias. Em períodos pós-eleitorais, mais ainda, porque o eleitor vota escolhendo cestas de bens públicos prometidos na eleição e, ao receber benefícios a menos, ou impostos a mais, sente-se enganado e tende a radicalizar.

É preciso evitar esse cenário. Melhor seria que o respeito à responsabilidade fiscal fosse cultivado já.

*Benito Salomão é economista do Programa de Pós-Graduação em Economia da UFU (Universidade Federal de Uberlândia)

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2021/10/auxilio-brasil-e-risco-democratico.shtml


Luiz Carlos Azedo: Diga ao povo que saio

Há um rosário de decisões de Guedes que o beneficiaram financeiramente, sem que tivesse que fazer uma nova aplicação em sua conta no exterior

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

Tem coisas no Brasil difíceis de entender. Por exemplo: Dom Pedro I, que proclamou a Independência, é homenageado com uma das menores ruas do Centro Histórico do Rio de Janeiro, nossa capital de 1763 até 1960, quando a sede do governo foi transferida para Brasília. Começa na Praça Tiradentes, ao lado do Teatro Carlos Gomes, e termina na Rua do Senado, com 141 endereços, 112 residências, 24 estabelecimentos comerciais, três prédios inacabados e 227 moradores, com uma renda média de R$ 1,143. Dependendo do prédio, o preço de um apartamento varia de R$ 3 mil a R$ 8 mil o metro quadrado.

Como já começamos a contagem regressiva para o Bicentenário da Independência, vale o desagravo. Essa lembrança veio em razão do trocadilho do título da coluna com a decisão de Pedro I de não regressar a Lisboa, contrariando as ordens das Cortes Portuguesas, em 9 de janeiro de 1822: “Se é para o bem de todos e felicidade geral da Nação, estou pronto. Digam ao povo que fico”. O Dia do Fico, referência à frase célebre, foi uma preparação para a proclamação da Independência, em 7 de setembro de 1822.

Havia muita ambição e esperteza embarcadas naquela rebeldia. Liderar a Independência era a única maneira de manter o Brasil sob controle da Casa de Bragança — com ela, a monarquia, o regime escravocrata, o tráfico de negros escravizados e o projeto de reunificação da Coroa, que levaria Dom Pedro I a abdicar do trono em 7 de abril de 1831 e voltar para Portugal para lutar pelo trono para a filha primogênita Maria da Glória. Em contrapartida, herdamos a integridade territorial e o Estado brasileiro, com suas principais instituições. Não foi pouca coisa.

Ambição e esperteza é o que não faltam nas altas esferas do poder. Por exemplo, não conseguia entender a longa permanência do ministro da Economia, Paulo Guedes, no comando da pasta. A vida toda foi um economista ultraliberal. Na campanha eleitoral, fez a cabeça do presidente Jair Bolsonaro e virou o Posto Ipiranga da economia, com apoio do mercado financeiro, para fazer as reformas liberais, entre elas a tributária e a administrativa. Com o passar do tempo, não fez as reformas e fracassou. Nossa economia registra uma brutal desvalorização do real, inflação alta, desemprego em massa e estagnação
econômica. Outros liberais, diante da guinada populista iminente do governo Bolsonaro, já teriam entregado o cargo, como alguns fizeram em sua equipe.

Agora já sabemos a explicação para o “Fico” do ministro da Economia: enquanto o povo come osso, Guedes ganha muito dinheiro com a crise, porque a desvalorização do real engorda suas economias em dólar, que ontem fechou a R$ 5,48. A conta de Guedes num paraíso fiscal no exterior foi revelada, no último fim de semana, pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ). O Ministério da Economia informou que toda a atuação privada de Paulo Guedes foi “devidamente declarada à Receita Federal, Comissão de Ética Pública e aos demais órgãos competentes”, mas há controvérsias. Eticamente, ganhar dinheiro com a desvalorização do real é incompatível com o cargo de ministro da Economia. No popular, é muita cara de pau.

Imposto de Renda
Por essa razão, Guedes foi convocado a dar esclarecimentos à Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara, e convidado também pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado a explicar a existência de sua empresa offshore, que não paga imposto no Brasil. Guedes abriu a empresa em 2014, ou seja, no ano da reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff. O horizonte econômico era de recessão e aumento da inflação. Até aí, tudo bem — toda vida ganhou dinheiro no mercado financeiro. Em 2016, porém, o governo criou facilidades para que todos repatriassem os recursos enviados para o exterior, mas Guedes não encerrou suas operações com a offshore. Deixou o dinheiro lá fora, no paraíso fiscal, mesmo depois de virar ministro da Economia.

Há um rosário de decisões de Guedes que o beneficiaram financeiramente, sem que tivesse que fazer uma nova aplicação em sua conta no exterior. O artigo 5o do Código de Conduta do setor público veda “investimento em bens cujo valor e cotação pode ser afetado por sua decisão”. Quando nada, o câmbio sempre será atingido por declarações ou atos do ministro da Economia, bem como do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que também tem conta numa offshore no exterior. É uma “não conformidade”.

Tudo isso acontece num momento crucial para o governo, que está em dificuldades para financiar o chamado Auxílio Brasil, programa de transferência de renda que Bolsonaro quer aprovar, para substituir o Bolsa Família. O problema é que o governo não tem dinheiro, tenta viabilizar o projeto com recursos do Imposto de Renda, que pretende modificar com esse objetivo, deixando de fora as contas offshore, é claro. O jabuti no IR, porém, subiu no telhado. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já mandou recado de que não vai misturar alhos com bugalhos.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-diga-ao-povo-que-saio/

Luiz Carlos Azedo: A desagregação do centro para uma terceira via

É cada vez mais difícil o surgimento da chamada terceira via, uma candidatura que unifique o centro político

Todas as pesquisas confirmam o cenário de polarização para as eleições presidenciais de 2022, entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), favorito na disputa, em torno de 40% de intenções de votos, e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), cuja reeleição está cada vez mais difícil, com teto nos 30% dos votos. O governador de São Paulo, João Doria, não sai da faixa dos 3% de intenções de votos, como candidato do PSDB. Se o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, fosse o candidato do PSDB, também não haveria grande modificação.

O candidato de oposição que aparece com melhor pontuação é o ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT), que se mantém em terceiro lugar, variando de 5% a 11%, dependendo da pesquisa. Entretanto, o pedetista não consegue ampliar suas alianças ao centro. A estagnação nas pesquisas eleitorais dificulta a vida de Doria, na medida em que o gaúcho Eduardo Leite corre na mesma faixa, o que aumenta o isolamento interno do governador paulista nas prévias do PSDB.

É cada vez mais difícil o surgimento da chamada terceira via, uma candidatura que unifique o centro político. A fragmentação é muito grande. No primeiro cenário, com Doria, pontuam, nas pesquisas, José Luiz Datena (PSL), com 4%; Henrique Mandetta (DEM), 3%; Rodrigo Pacheco (DEM), 2%; Aldo Rebelo (sem partido) e Alessandro Vieira (Cidadania), com 1% cada. No segundo cenário, com Leite como candidato do PSDB, Mandetta tem 3%;
Datena, 2%; Pacheco, Aldo e Alessandro, 1%. Esses cenários não podem ser engessados — estamos a um ano das eleições. Entretanto, mostram grande descolamento dos partidos de centro de suas bases eleitorais tradicionais.

A novidade no quadro partidário é a anunciada fusão do DEM com o PSL, partido pelo qual Bolsonaro se elegeu, mas, depois, rompeu. Com a fusão, passarão a se chamar União Brasil, com o número 44, escolhas feitas com base em pesquisas qualitativas. Será o maior partido da Câmara, com 81 deputados, o que garante para a nova legenda R$ 320 milhões de fundo eleitoral e R$ 138 milhões de fundo partidário. A nova legenda tem, ainda, sete senadores, quatro governadores e 554 prefeitos. Entretanto, não consegue alavancar seus pré-candidatos: Mandetta tem apenas 3% de intenção de votos, e Pacheco varia entre 1% e 2%, dependendo da sondagem.

Expectativas
O PSDB vive um momento de grande divisão interna. De certa forma, a disputa entre os tucanos paralisa os demais atores políticos de centro, que aguardam a escolha do candidato da legenda. Quem quer que seja o escolhido, terá dificuldade para unificar o partido. Além disso, os aliados tradicionais também estão se colocando como alternativa, com seus próprios candidatos. O PSDB deixou de ser uma força agregadora do centro. Quem vencer as prévias precisará fazer um grande esforço para reconstruir suas alianças tradicionais.

Outro ator importante na construção de uma alternativa de centro é o PSD, de Gilberto Kassab, que assedia o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Kassab atraiu para a legenda o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, que ensaia disputar o governo fluminense, e o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, que pretende voltar ao Palácio dos Bandeirantes. Com habilidade, Kassab trabalhou nos últimos anos para reunir 35 deputados, 11 senadores, dois governadores e 654 prefeitos.

Entretanto, o PSD corre o risco de ficar na mesma situação do MDB, que não tem, até agora, um projeto de candidatura própria, embora a senadora Simone Tebet (MS) pleiteie a vaga e o ex-presidente Michel Temer tenha voltado à ribalta. O MDB tem 16 senadores, 34 deputados, três governadores e 784 prefeitos. Tanto o PSD quanto o MDB podem derivar para a candidatura de Lula, o que aumentaria as suas chances de vencer no primeiro turno. O petista anda trabalhando nos bastidores para montar seus palanques regionais e não desistiu de suas velhas alianças, inclusive com o Centrão.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-a-desagregacao-do-centro

Everardo Maciel: O Senado deve aprovar a reforma do IR como está? Não

Projeto promove descapitalização e aumento do endividamento das empresas

Everardo Maciel / Folha de S. Paulo

A legislação do Imposto de Renda no Brasil tem, sem lugar a dúvidas, imperfeições, da mesma forma que a legislação de todos os países. A despeito disso, é reconhecidamente uma das mais simples e eficientes do mundo, inclusive em termos arrecadatórios, como bem demonstra hoje o excepcional desempenho das receitas federais.

Contra esse exitoso modelo propôs-se uma reforma do IR, que não foi demandada por nenhum contribuinte e atropelou o processo legislativo na Câmara, sendo votada sem debates públicos e sem a apresentação de estimativas confiáveis quanto às suas repercussões sobre contribuintes e entes federativos.

Vou concentrar-me nos seguintes pontos do projeto: elevação do limite de isenção da pessoa física, tributação dos dividendos e extinção dos juros do capital próprio.

Reajustar o limite mensal de isenção do IR das pessoas físicas de R$ 1.903,98 para R$ 2.500 é uma boa iniciativa, mas é preciso sublinhar que, ao menos entre os contribuintes que se encontram entre essas duas faixas de renda, o ganho máximo será de R$ 7,20 mensais, insuficiente portanto para comprar um quilo de pão.

O Brasil tributou lucros e dividendos por mais de 70 anos. A ineficácia dessa sistemática é que inspirou a não incidência do IR, a partir de 1996, na distribuição de dividendos, no contexto de uma ampla reforma na tributação da renda, bem recebida pelos contribuintes e que propiciou, entre 1996 e 2020, um crescimento real de 117% na arrecadação do IR corporativo, cuja participação no PIB aumentou em 50%.

Investimentos em empresas almejam, obviamente, retorno do capital investido, que se efetiva pela distribuição de dividendos. Esse retorno é impactado pela tributação dos lucros e dos dividendos, isolada ou conjuntamente.

Quando temos tributação de lucros e dividendos há sempre algum tipo de integração, porque as duas incidências se interconectam. Ao estabelecer a tributação exclusiva nos lucros, o Brasil, assim como mais de 20 países, optou pela integração completa. O projeto perfilha a desintegração total, comprovadamente malsucedida.

Em favor da incidência exclusiva nos lucros militam as seguintes razões: maior simplicidade, prevenção da sonegação associada à distribuição disfarçada de lucros, mitigação do planejamento tributário abusivo, menor vulnerabilidade arrecadatória em decorrência de virtuais restrições à distribuição de dividendos e maior liberdade nas opções de investimento.

A instituição dos juros do capital próprio representou uma alternativa, mais elaborada, à prevenção da tributação sobre lucros ilusórios, como pretendia a dedutibilidade da correção monetária do patrimônio líquido, que, além de premiar as grandes empresas, preservava a correção monetária em desfavor do Plano Real. Afora isso, aquele instituto promovia um relativo equilíbrio entre a capitalização mediante empréstimos ou investimentos diretos.

Com os juros do capital próprio, o Brasil conquistou uma liderança em termos de inovação de política tributária. Estranhamente, pretende-se sua extinção justamente quando a União Europeia, em maio passado, aconselhou sua adoção nos países que a integram.

Enfim, essa contrarreforma tributária promoveria a maior desorganização empresarial dos tempos recentes, com descapitalização e aumento do endividamento das empresas, em contexto de desemprego, risco fiscal, baixo crescimento do PIB e inflação.

*Everardo Maciel é Consultor tributário e ex-secretário da Receita Federal (governo FHC, 1995-2002)

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2021/10/o-senado-deve-aprovar-a-reforma-do-ir-como-esta-nao.shtml


Com Lula como favorito para derrotar Bolsonaro, o PT de fato quer o impeachment?

Partidos e movimentos predominantemente de esquerda convocaram novos protestos pelo impeachment neste sábado (02/10)

Mariana Schreiber / BBC News Brasil

Desconfianças de ambos os lados têm dificultado unificar as mobilizações em uma frente ampla contra o presidente, o que, na leitura de alguns analistas políticos, acaba reduzindo a capacidade desses atos de pressionar o Congresso Nacional — a decisão de iniciar um processo depende do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que hoje lidera uma ampla base de deputados da centro-direita avessa ao impeachment de Bolsonaro, já que tem sido beneficiada por cargos e verbas federais para seus redutos eleitorais.

Assim como o PT e movimentos historicamente ligados ao partido, a exemplo da Central Única de Trabalhadores (CUT), não aderiram aos atos de setembro, os grupos de direita que lideraram aquela mobilização, como Movimento Brasil Livre (MBL) e Livres, decidiram não ir às ruas nesse sábado.

Ato contra Bolsonaro em Brasília em maio
Críticos do PT dizem que partido prefere enfrentar Bolsonaro nas urnas em 2022

Um dos motivos é a desconfiança de parte destes grupos sobre o real compromisso do PT com a luta pelo impeachment. Como as pesquisas de intenção de voto indicam hoje Lula como favorito para vencer a eleição de 2022 em uma disputa direta contra Bolsonaro, críticos do partido dizem de que a preferência dos petistas pode ser por manter o presidente na corrida eleitoral para evitar que outro candidato potencialmente mais agregador se cacife para chegar ao segundo turno contra Lula. Petistas refutam essas acusações.

Outra justificativa dos grupos de direita para não participar dos protestos é um suposto risco de agressão a seus apoiadores por parte de manifestantes da esquerda — a mesma preocupação foi levantada pela esquerda em relação aos grupos de direita nos atos de setembro.

"Eu não coloco o impeachment à frente da segurança de quem nos segue. E tb não acho que atos orquestrados pelo PT sejam favoráveis ao impeachment", escreveu no Twitter o líder do MBL Renan dos Santos, ao justificar a ausência do grupo nos atos desse sábado.

Pesquisa Ipespe divulgada na quinta-feira (30/09) indica que, se a eleição fosse hoje, Lula e Bolsonaro disputariam o segundo turno, sendo que o petista venceria com 50% dos votos contra 31% do atual presidente. A pesquisa ouviu mil pessoas por telefone e tem margem de erro de 3,2 pontos percentuais.

O resultado vai na mesma linha da última pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada duas semanas antes, que entrevistou 3.667 presencialmente e tem margem de erro de 2 pontos percentuais. Esse levantamento indica que, mantidas as condições atuais, o petista derrotaria Bolsonaro no segundo turno com 56% contra 31% dos votos.

Por outro lado, essas pesquisas também indicam que Lula venceria com larga vantagem outros possíveis candidatos, como João Dória (PSDB) e Ciro Gomes (PDT).

Lideranças do PT ouvidas pela BBC News Brasil refutam as acusações de que o partido não esteja empenhado pelo impeachment, embora nos bastidores há quem reconheça que a disputa contra Bolsonaro seria hoje o cenário mais confortável para Lula voltar ao Palácio do Planalto.

Parlamentares ou lideranças petistas já assinaram ao menos dez pedidos de impeachment ou aditamentos (acréscimos a pedidos anteriores), o primeiro deles apresentado em maio de 2020 pelo ex-prefeito de São Paulo e candidato presidencial derrotado em 2018 Fernando Haddad.

Ao lado do deputado Rui Falcão (PT-SP), Haddad também apresentou um mandado de segurança em julho deste ano ao Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando que a Corte obrigue Arthur Lira a apreciar os mais de cem pedidos de impeachment que aguardam sua análise. A ação ainda será julgada.


Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
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Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
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Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
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"O PT nunca tergiversou com esse assunto. Nós sempre achamos que para o Brasil é melhor o Bolsonaro sair. E nós não escolhemos adversário (para a eleição presidencial de 2022), não nos preocupamos com isso. Nosso foco é com o programa e o projeto de país que nós temos a oferecer para o Brasil", disse a presidente do partido, deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), em maio de 2020.

Ela ressalta que o PT, ao lado de PCdoB e PSOL, já participou da convocação de outros quatro atos pelo impeachment, desde março. Esses protestos têm sido liderados pela Frente Povo Sem Medo, a Frente Brasil Popular e a Coalizão Negra por Direitos — as três reúnem centenas de sindicatos, movimentos sociais e coletivos negros e de periferia, como Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a UNEAfro.

Gradualmente, outros partidos aderiram, como PDT, PSB, Rede e Cidadania. Todos eles estão apoiando os protestos deste sábado também, assim como Solidariedade e PV. São aguardadas ainda lideranças de PSL, MDB, PSDB, DEM e Novo, embora essas siglas não estejam institucionalmente convocando para a mobilização.

Considerando os pré-candidatos presidenciais, Ciro Gomes (PDT) confirmou que participará das manifestações no Rio de Janeiro, pela manhã, e em São Paulo, na parte da tarde.

Já Lula não deve comparecer para evitar dar uma conotação eleitoral aos atos, disse Hoffmann. Segundo ela, há também preocupação com a saúde do ex-presidente e dos manifestantes devido à pandemia de covid-19, já que sua presença poderia causar focos aglomerações.

'Bolsonaro combalido até a eleição'

Apesar da movimentação do PT pelo impeachment, dentro do partido existe uma leitura de que enfrentar Bolsonaro nas urnas tende a ser o cenário mais confortável para Lula, contou à BBC News Brasil o assessor parlamentar de um senador petista.

A compreensão interna, diz, é que o presidente terá dificuldades de se recuperar até a eleição porque as perspectivas para a economia têm piorado muito.

"Com a atual política econômica, os preços dos combustíveis não vão parar de subir, os empregos não vão voltar. A ideia é que ele chegue combalido na eleição", afirma.

Segundo esse assessor parlamentar, o partido reconhece que Bolsonaro segue tendo uma base fiel relevante, capaz de colocá-lo no segundo turno, mas "não tem apoio suficiente para vencer". Ele ressalta ainda que ninguém no PT espera que seja uma eleição fácil.

"Todo mundo sabe que Lula vai ser confrontado com muita coisa de corrupção, de cadeia (período em que ficou preso condenado em processos da Lava Jato posteriormente anulados), de governo Dilma, vão dizer que ela destruiu o Brasil. Aquele velho discurso do antipetismo vai voltar forte", afirma.

"Mas projetam que um cenário de Bolsonaro acabado, e sem se viabilizar uma terceira via, seja menos difícil para Lula articular uma grande aliança e chegar lá", acrescenta.

Por outro lado, parlamentares petistas ouvidos pela BBC News Brasil acreditam que a campanha pelo impeachment não é contraditória com os interesses eleitorais.

"Vamos admitir que se consiga fazer o impeachment do Bolsonaro. Você acha que o PT entraria mais fraco ou mais forte o ano que vem? A liderança que mais mobiliza gente nesse país é o Lula. Então, amanhã, acontecendo o impeachment, é o Ciro que vai ser o porta voz do impeachment? Claro que não", argumenta o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).

"Então, mesmo para quem tem o raciocínio pequeno da conveniência (eleitoral), se a gente derruba o Bolsonaro, a oposição entra muito mais forte ano que vem", disse ainda.

A deputada Maria do Rosário (PT-RS) tem visão semelhante: "É uma avaliação equivocada e simplória (dizer que o PT não quer o impeachment). O PT sabe que quanto mais força existir na luta pelo impeachment, mais claro vai estar para a população que Bolsonaro não pode continuar", afirma.

Para ela, Bolsonaro continua sendo um adversário perigoso em 2022 e deve ser derrubado antes porque representa "uma ameaça à democracia".

"O PT não vai para a eleição achando que já ganhou de ninguém. Vamos ter que trabalhar muito, mesmo o Lula nesse momento sendo o favorito. Não avaliamos que Bolsonaro é o candidato mais fraco, nem que é invencível. É um candidato que, se não for totalmente desmascarado até a eleição, continua sendo o candidato mais perigoso, porque mobiliza uma turba de fanáticos, porque a direita internacional estará mobilizada pelo Brasil, porque o fascismo tem métodos que podem sempre atacar um processo democrático", disse ainda.

Bolsonaro em ato na Paulista neste 7 de setembro
Bolsonaro em ato na Avenida Paulista, em 7 de setembro, quando ameaçou não cumprir decisões do STF. Foto: Secom/PR

Críticos de Bolsonaro consideram que ele seria uma ameaça para a democracia devido a suas declarações contestando a legitimidade das eleições de 2022 sem adoção de um registro físico do voto. O presidente alega que sem esse mecanismo as eleições podem ser fraudadas, o que é contestado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na visão de adversários de Bolsonaro, o presidente pretende usar essa argumentação para não aceitar o resultado das urnas em 2022, caso não consiga se reeleger.

No feriado de 7 de setembro, ele mobilizou dezenas de milhares de apoiadores em Brasília e São Paulo para pressionar o Poder Judiciário, no que foi visto como um escalada autoritária por parte do presidente. Depois, porém, Bolsonaro divulgou uma carta recuando de seus ataques e ameaças ao STF.

Em entrevista recente à revista Veja, ele disse que não vai "melar" as eleições e elogiou o convite do TSE para que as Forças Armadas participem da uma comissão externa para fiscalizar o processo eleitoral. Bolsonaro afirmou ainda que "a chance de um golpe (de sua parte) é zero". Para ele, a oposição que quer lhe dar um golpe com o processo de impeachment. Seu argumento é que não há denúncias de corrupção que permitam cassá-lo.

Nos mais de cem pedidos de impeachment já apresentados, os denunciantes acusam o presidente de cometer crimes de responsabilidade na condução da pandemia de coronavírus (ao promover aglomerações e demorar a comprar vacinas, por exemplo), assim como por ter participado em 2020 de atos que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), ou ao supostamente interferir em instituições de investigação, como a Polícia Federal (PF).

Pedidos recentes também defendem a cassação do presidente devido à denúncias de possível superfaturamento e corrupção envolvendo compra de vacinas no Ministério da Saúde.

Muito perto de 2022

Para o cientista político Sérgio Praça, professor da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas, não é uma boa estratégia política para o PT apostar em um impeachment que "já é uma possibilidade tirada da mesa" por estarmos muito próximos das eleições de 2022".

"O impeachment não vai acontecer independentemente do que o PT faça. É um processo que demora, não faz sentido articular por isso hoje. Teria feito sentido antes, mas não aconteceu e agora ninguém vai lutar sério por isso. A campanha presidencial já começou", afirma Praça.

Segundo ele, os protestos contra Bolsonaro devem ir perdendo força pelo mesmo motivo.

"Na medida em que as eleições se aproximam, eles têm total irrelevância. Para que eu vou sair pra rua se daqui a pouco eu já vou votar?", afirma.

Sem frente ampla

Se esforçar por um impeachment não é a única ideia que vai ficando para trás conforme as eleições se aproximam, segundo analistas políticos.

Manifestantes contra Bolsonaro na Avenida Paulista
Com oposição dividida, atos contra Bolsonaro reuniram poucas milhares de pessoas no 12 de setembro. Foto: EPA

A ideia, levantada por parte da oposição, de que seria necessário esquerda e direita se unirem em uma frente ampla contra Bolsonaro também é algo "que não tem a menor chance de acontecer", diz Praça.

Praça diz que as ameaças de Bolsonaro contra a democracia não se concretizaram até agora de forma a fazer a esquerda e direita acreditarem que há necessidade de se unir.

"A única chance de haver essa união é se o presidente tentar dar um golpe de fato, caso perca a eleição. Porque ninguém quer uma ditadura de Bolsonaro. Mas no momento está claro que ele não tem apoio estratégico para isso", afirma o professor da FGV.

Para o cientista político Claudio Couto, a vantagem de Lula nas pesquisas faz com que não faça sentido para o PT tentar uma chapa única de oposição com a direita, que também não tem interesse nisso.

"Nunca acreditei em uma frente ampla no sentido de uma chapa única com objetivo de derrubar Bolsonaro nas eleições. Para o Lula não tem sentido, estando na frente, abrir mão da sua candidatura ou do seu programa. E para os outros partidos, mesmo que uma chamada "terceira via" não se viabilize, vale mais a pena lançar sua própria candidatura do que se unir ao Lula", diz Couto.

A exceção, diz ele, são os partidos como o MBD e os partidos do centrão que não costumam mesmo ter candidatura própria para a presidência e acabam se alinhando ao governo do momento.

Couto também diz que o fato de que uma chapa única não deva acontecer não impede que nomes como Lula, Eduardo Leite ou João Dória façam uma aliança em prol da democracia caso haja um movimento de natureza autoritária, mesma hipótese apontada por Praça.

Isso seria possível, segundo ele, porque até o momento os candidatos de oposição têm jogado limpo já pré-campanha, apesar das críticas eventuais que fazem uns aos outros.

"As críticas dentro da lógica da competição democrática. Tem havido um fair play entre esses vários candidatos. Quem está com atitude muito agressiva ao PT é o Ciro Gomes, mas isso é particular dele, que tenta pegar um público de direita ao ver que perdeu espaço na esquerda", diz Couto.

*Colaborou Letícia Mori, da BBC News Brasil em São Paulo

Fonte: BBC Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58769735


Cristovam Buarque: Quem tem medo de Tabata Amaral

Causa preocupação imaginar que militantes de esquerda se comportam desta forma por discordarem de votos progressistas

Blog Matheus Leitão / Veja

Causa repulsa a grosseria de um machista dizendo que se encontrar a Deputada Tabata Amaral na rua vai bater nela; causa indignação perceber militantes que se dizem feministas e democratas não discordarem desta posição, pelo fato de o autor ser do seu partido; é triste constatar a semelhança como funciona o gabinete do ódio da direita e o gabinete do ódio da esquerda: ameaçam e xingam manipulando informações com mentiras, para criar um clima de medo e ódio.

Mas a repulsa, a indignação e a tristeza são sentimentos individuais, sem consequências políticas. Causa preocupação social e política imaginar que os militantes de esquerda se comportam desta forma por discordarem de votos progressistas, democráticos e responsáveis da Deputada Tabata. As agressões à Deputada mostram comportamento antidemocrático e nostalgia de militantes que em vez de arautos do futuro passam a defender o status quo.

Criticam votos por reformas necessárias para desfazer prática populista, que as forças conservadoras de direita ou de esquerda sempre usaram no Brasil, impedindo o país de avançar e fazendo o povo pagar, com inflação e dívida pública, os privilégios de minorias e os investimentos em projetos quase sempre socialmente excludentes. Dizer que os votos da deputada Tabata são contra educação, repete o combate à  abolição da escravidão dizendo que a economia seria prejudicada, ou a luta contra a obrigatoriedade de vacina dizendo que é um instrumento comunista. Nada pior para a educação do que financiar com inflação os gastos públicos que beneficiarão sobretudo às classes privilegiadas, jogando desempregados na miséria e remunerando o empregado, inclusive professor, com o cheque sem fundo da moeda desvalorizada. Obrigando o professor a fazer greves para recuperar perdas de seus salários.

A reação agressiva de “exquerdistas” deve ter razão psicanalítica:

sabem que assumiram o negacionismo diante das mudanças no mundo, ficaram sem rumo e sem vigor transformador, caíram na nostalgia e reagem ao ver as posições progressistas e corajosas da Deputada Tabata, votando por reformas que o futuro exige, que a eficiência precisa e a justiça carece.

O ódio à Tabata vem do medo à Tabata.

Ao apontar para o futuro progressista, responsável e democrático ela desmascara o reacionarismo, a irresponsabilidade, o populismo, o corporativismo, o machismo e o antidemocratismo dos que a xingam. Sem espírito democrático, sem propostas transformadoras nem vigor reformista, prisioneiros do corporativismo e do passado e sem argumentos convincentes optam pela ameaça para esconder o próprio reacionarismo. A decadência que se percebe no Brasil, devido décadas de políticas populistas irresponsáveis e insustentáveis, agravada por um presidente desequilibrado, indica que Tabata Amaral está mais comprometida com o progresso, do que seus acusadores reacionários, tanto os de direita quanto os de “exquerda”.

A política continua dividida entre os que querem construir um mundo melhor e mais belo, com justiça, eficiência e sustentabilidade, e aqueles que nostalgicamente querem a volta ao passado: a manutenção do mundo injusto, ineficiente e insustentável. A direita assume sua nostalgia perversa

Sem dor na consciência, a “exquerda”, envergonhada pelo obsoletismo de suas ideias e por defender privilégios, alia-se à direita em sonhos e promessas nostálgicas. Tabata Amaral faz parte de um grupo de jovens políticos responsáveis, progressistas e democráticos em busca de futuro melhor e mais belo para o Brasil e o povo; representa o novo e isto irrita e desperta ódio aos que trocaram a luta pelo futuro, pela defesa do passado. Assusta aos que fazem política com slogans, no lugar de ideias, e reagem ameaçando bater nela até a polícia chegar.

Discordo da Deputada Tabata quando ela manifesta dúvida sobre a conveniência de voto no Lula ainda no primeiro turno, mas entendo sua preocupação diante de um governo Lula rodeado por esta “exquerda”. Assusta o risco de trocar um ministro da cultura que usava símbolos nazistas por outro que ameaça bater em uma deputada, porque discorda dos votos progressistas que ela tem a lucidez e a coragem de afirmar.

*Cristovam Buarque é ex-senador, ex-governador e ex-ministro. É também uma das vozes mais lúcidas da política brasileira

Fonte: Veja
https://veja.abril.com.br/blog/matheus-leitao/quem-tem-medo-de-tabata-amaral-por-cristovam-buarque/