cloroquina

O Estado de S. Paulo: CNS recomenda suspensão do uso da cloroquina em casos leves

Entidade diz que ‘momento excepcional’ da pandemia do novo coronavírus ‘não pode significar que a população deva ser exposta a condições de maior vulnerabilidade’

Conselho Nacional de Saúde (CNS) publicou uma recomendação na sexta-feira, 22, em que pede a suspensão imediata das orientações do Ministério da Saúde para o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento de casos leves do novo coronavírus. “Até o momento, não existem evidências científicas robustas que possibilitem a indicação de terapia farmacológica específica”, justifica o documento.

Segundo a recomendação, o “momento excepcional” da pandemia da covid-19 “não pode significar que a racionalidade deva ser abandonada nem que a população deva ser exposta a condições de maior vulnerabilidade”. Ela é assinada pelo presidente do conselho, Fernando Zasso Pigatto.

documento também recomenda que não seja recomendada “qualquer medicamento” para prevenção da covid-19, “pela ausência de confirmações de uso seguro aos usuários”, e que o ministério “desempenhe seu papel na defesa da ciência e a redução da dependência de equipamentos e insumos, construindo uma ampla e robusta produção nacional”. 

Além disso, pede que o Ministério Público Federal (MPF) “tome as devidas providências” para que as orientações para manuseio medicamentoso precoce de pacientes com diagnóstico da covid-19 sejam suspensas.

Na quarta-feira, 20, o Ministério da Saúde publicou um novo protocolo, que libera os dois medicamentos no tratamentos de todos os pacientes com sinais da doença. Para o conselho, contudo, a mudança “não se baseia em evidências científicas” e faz referências a estudos “criticados pela comunidade científica”.

A recomendação do CNS ainda diz que o ministério descumpriu a legislação do Sistema Único de Saúde (SUS) por indicar os medicamento para um uso que não está registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, tampouco, teve análise e elaboração de diretrizes terapêuticas pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec).

O conselho ainda chama a mudança de protocolo de uma “decisão política tomada por não especialistas em saúde”. Ele também cita artigos publicados em revistas científicas internacionais que apontam efeitos dos medicamentos no tratamento de pacientes do coronavírus, especialmente em relação a problemas cardíacos, além de diretrizes médicas publicadas por entidades brasileiras, como a Associação de Medicina Intensiva e a Sociedade Brasileira de Infectologia, dentre outras.

“Considerando que a necessidade de avaliação dos pacientes através de anamnese, exame físico e exames complementares nos equipamentos de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS), trará um grande impacto à atenção primária e de média complexidade, ao qual o sistema não está adaptado para regular neste presente momento”, aponta ainda o texto.

O CNS é uma instância colegiada do Sistema Único de Saúde (SUS), que tem o objetivo de fiscalizar, acompanhar e monitorar as políticas públicas de saúde. Ele tem 48 conselheiros, que são representantes dos segmentos de usuários, trabalhadores, gestores do SUS e prestadores de serviços em saúde, além de representantes de movimentos sociais, instituições governamentais e não governamentais, entidades de profissionais de saúde, comunidade científica, entidades de prestadores de serviço e entidades empresariais da área da saúde. 


Hélio Schwartsman: A ciência da cloroquina

Insistir no uso do medicamento deixou de ser racional para se converter em opção ideológica

Idealmente, a ciência informa as decisões dos políticos e não é influenciada por eles. Gestores só adotariam medidas que já tivessem sido testadas em pesquisas e jamais interfeririam no trabalho de cientistas.

No mundo real as coisas são mais confusas. Não é que governantes nunca ouçam especialistas, mas frequentemente preferem fazer aquilo que acreditam que aumentará sua popularidade ou apenas seguem seus caprichos. A política também afeta a ciência por vários canais, dos mais concretos, como a disponibilidade de verbas, aos mais sutis, como a ideologia.

Como essas considerações se aplicam à cloroquina? Em março, quando o presidente Bolsonaro se tornou um entusiasta do medicamento no combate à Covid-19, sua posição não era absurda. Havia uma hipótese teórica para explicar sua possível ação e alguns poucos trabalhos (de má qualidade, é verdade) a sugerir eficácia.

A partir daí, a ciência fez o que tinha de fazer. Deu início a vários programas de teste, cujos resultados estão saindo. Sem surpresa, vai se constatando que a droga não funciona contra a nova moléstia. Um purista poderia argumentar que ainda falta uma boa metanálise para derrubar a última esperança na cloroquina, mas já há elementos de sobra para recomendar que ela não seja distribuída a grandes populações. Os riscos dos efeitos colaterais superam os cada vez mais improváveis benefícios.

Insistir no uso da cloroquina deixou de ser uma posição racional para converter-se numa opção ideológica. Que pessoas façam isso é da vida. Mas, quando governos tentam determinar o que a ciência diz, as consequências podem ser catastróficas. Há quem atribua o fracasso econômico da URSS em parte à figura de Trofim Lysenko, o manda-chuva da área biológica que, por razões ideológicas, militava contra a genética mendeliana. Ela seria antissocialista. Sem genética, a agricultura soviética ficou para trás.


Folha de S. Paulo: Entidades médicas vão à Justiça contra o uso da cloroquina

Médicos afirmam que orientação do Ministério da Saúde deixou profissionais em meio a fogo cruzado

Fernando Canzia, da Folha de S. Paulo

Entidades médicas preparam medidas judiciais para obrigar o Ministério da Saúde a retirar de seu site na internet as orientações para que profissionais de saúde administrem precocemente cloroquina, hidroxicloroquina e azitromicina em pacientes com coronavírus.

Os médicos afirmam que o fato de a orientação existir formalmente dará margem à população para exigir o uso dos medicamentos mesmo quando a avaliação clínica não recomendar a prescrição.

A maioria das unidades básicas de saúde no país não tem, por exemplo, eletrocardiógrafos para aferir se os pacientes podem usar a cloroquina, que apresenta a arritmia como um de seus principais efeitos colaterais.

Mais de 90% dessas unidades também não dispõem de profissionais de segurança, e o temor dos médicos é que, como a escalada da epidemia, muitos pacientes acabem exigindo de forma mais enfática o uso dessas drogas.

Segundo Daniel Knupp, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), que reúne 47,7 mil equipes de atenção básica no país, o governo federal está colocando os médicos em um “fogo cruzado” com a publicação das orientações pelo Ministério da Saúde.

Haverá pressão da população para o uso desses medicamentos, sendo que o próprio governo está sendo tecnicamente omisso em sua orientação”, diz Knupp.

“Esse foi o subterfúgio usado para que não haja uma disputa técnica sobre o uso da cloroquina”, diz Knupp.

Segundo ele, a cloroquina deve começar a ser largamente distribuída pelo governo nos próximos dias por conta da produção que o Exército vem realizando.

Com a orientação para o seu uso publicada no site do ministério, os médicos que não concordarem com ela podem acabar sendo pressionados a fazê-lo.

Na ação contra a manutenção do documento no site, a SBMFC usará o seu próprio texto como argumento contra o uso dos medicamentos.

Em sua primeira nota técnica, o documento afirma que "ainda não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o beneficio inequívoco dessas medicações para o tratamento da Covid-19”.

A Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib) estuda participar da mesma ação ou tomar medidas jurídicas individualmente.

“Há evidências suficientes para a não utilização da cloroquina e das demais medidas recomendas pelo ministério em pacientes infectados pela Covid-19”, afirma Suzana Margareth Lobo, presidente da Amib.

A Sociedade Brasileira de Infectologia também emitiu nota afirmando que vários estudos mostraram o "potencial malefício” dessas drogas. A entidade recomenda que o uso de cloroquina ou hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 seja feito "prioritariamente em pesquisa clínica".


Merval Pereira: Cloroquina nele!

Se não há estudos conclusivos, e se o remédio usado no combate à Covid-19 pode causar até morte, por que ampliar seu uso no serviço público de saúde?

Nos anos 1970 chegou ao Brasil uma figura polêmica internacional, o futurólogo Herman Kahn, físico, matemático, escritor e estrategista militar, que trabalhou no projeto da Bomba H e foi consultor de diversos governos dos Estados Unidos. Considerado um gênio, dirigiu o Hudson Institute e foi da RAND Corporation. Obeso, seu peso de 150 quilos só era menor do que seu QI 200.

Foi o criador da tese da “destruição mútua assegurada”, MAD, que garantia que um ataque da União Soviética geraria uma reação da mesma proporção, base da estratégia dos Estados Unidos durante a Guerra Fria.

Pois Herman Kahn chegou ao Brasil para expor um projeto chamado “Grandes Lagos”, percebido como um primeiro passo para a internacionalização da Amazônia tanto pela esquerda brasileira quanto pelos militares. Uma barragem no Baixo Amazonas transformaria a bacia amazônica em um lago gigante que desenvolveria o comércio com outros países, facilitando o transporte de minérios e outras comoditties.

A revolta foi tamanha que uma foto sua saindo da piscina do Copacabana Palace, com aquele corpanzil, foi usada para um grande outdoor com as palavras: “Ciclamato nele!”. Foi um outdoor criado pelo publicitário Marcus Pereira. O jornal O Pasquim, à época, fez muitas críticas ao futurólogo americano. Naquele momento, pesquisas indicavam que o adoçante com ciclamato fazia mal à saúde.

Hoje, Bolsonaro mereceria um meme com a frase: “Cloroquina nele!”. O protocolo para o uso da cloroquina desde os primeiros sinais da Covid-19, assinado pelo ministro interino da Saúde General Eduardo Pazuello sem a validação de médicos, pode ser considerado uma ameaça à saúde pública, e certamente será questionado nos tribunais, sobretudo no Supremo Tribunal Federal que, aliás, ontem começou a tomar posição sobre tema análogo, a Medida Provisória que busca isentar de culpa o agente público que cometer erros durante o período da pandemia.

Ao assinar o Termo de Ciência e Consentimento para uso da cloroquina no tratamento da Covid-19, o paciente confirma que sabe que o medicamento pode agravar sua condição clínica. Está lá escrito: “Compreendi, portanto, que não existe garantia de resultados positivos, e que o medicamento proposto pode inclusive agravar minha condição clínica, pois não há estudos demonstrando benefícios clínicos.”

Se não há estudos conclusivos, e se o remédio, usado no combate da Covid-19, pode causar até morte, por que ampliar seu uso no serviço publico de saúde?. E como exigir de um paciente, ou de seu parente ou responsável, que não assuma esse risco quando está à beira da morte?

Ontem, no inicio do julgamento da constitucionalidade da polêmica Medida Provisória que é vista como uma tentativa de livrar autoridades, sejam da área administrativa ou da saúde, em caso de fraudes em licitações como já ocorrem hoje, ou de erro médico na administração de remédios como a cloroquina, o relator do caso no STF, ministro Luís Roberto Barroso, deu o caminho que parece será seguido pela maioria.

Defendeu a punição para agentes públicos cujas decisões não sigam critérios científicos, ou não observem os princípios da precaução e da prevenção, tanto em relação à vida e à saúde da população quanto às decisões econômicas, como Barroso deixou claro ao ser questionado pelo ministro Ricardo Lewandowski.

O relator sugeriu, especialmente no que se refere à definição de “erros grosseiros”, os seguintes acréscimos à Medida Provisória, sem invalidá-la “1. Configura erro grosseiro o ato administrativo que ensejar violação ao direito à vida, à saúde ou ao meio ambiente equilibrado, por inobservância: (i) de normas e critérios científicos e técnicos; ou (ii) dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção. 2. A autoridade a quem compete decidir deve exigir que as opiniões técnicas em que baseará sua decisão tratem expressamente: (i) das normas e critérios científicos e técnicos aplicáveis à matéria, tal como estabelecidos por organizações e entidades médicas e sanitárias, internacional e nacionalmente reconhecidas; e (ii) da observância dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção, sob pena de se tornarem corresponsáveis por eventuais violações a direitos”.

A questão da cloroquina está bem encaminhada no Supremo Tribunal Federal, seguindo jurisprudência ditada por decisão da ministra Rosa Weber relativa ao uso do amianto.


Vera Magalhães: A revolta da cloroquina

Assim como a reação à vacina em 1904, a apologia a um remédio é irracional e perigosa

Cada epidemia que assola a humanidade tem seus surtos de irracionalidade, ignorância e aproveitamento político associados. Não é diferente com a covid-19, e o fenômeno não é uma exclusividade do Brasil, embora por aqui estejamos nos esforçando para passar à frente no campeonato desses efeitos incidentais.

Em 1904, o Rio de Janeiro viveu a Revolta da Vacina. O presidente Rodrigues Alves nomeou o médico sanitarista Oswaldo Cruz para tentar conter os surtos concomitantes de varíola, febre amarela e peste bubônica, que assolavam uma população crescente que vivia em condições sanitárias precárias. A obrigatoriedade de vacinação para a varíola, aprovada pelo Congresso, foi o estopim para uma revolta popular instrumentalizada por grupos políticos em novembro daquele ano.

Mais de um século depois, diante da pandemia do novo coronavírus, outra reação irracional e perigosa, insuflada por políticos e seus apoiadores, confunde a população e desarticula a estratégia nacional para o combate à propagação do vírus.

Trata-se da pregação do uso de cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento da covid-19. Na última semana, o debate, que já era intenso nas hostes bolsonaristas, ganhou emissoras de TV aberta, fez com que o ministro da Saúde, Luiz Mandetta, fosse forçado a se pronunciar e colocou na berlinda até médicos conceituados, instados por comunicadores a dizer se haviam ou não usado os medicamentos em seus próprios tratamentos.

O uso dos dois fármacos no tratamento da covid-19 é controvertido: resultados positivos na evolução de alguns pacientes são relatados pelo mundo, bem como complicações que não só não resultam na propalada cura como pode fazer com que os pacientes evoluam para óbito.

Seu uso mais efetivo, até aqui, foi observado em laboratório, em dosagens e condições que não podem ser replicadas em pacientes. Seu efeito tem sido mais efetivo quando em associação com outras drogas, como antirretrovirais e corticoides. Esse coquetel só pode ser prescrito por médicos, de acordo com o histórico e as condições de cada doente.

Mas não é isso que se vê nas insanas redes sociais e na movimentação deliberada de Jair Bolsonaro. O que se tem é uma propaganda irresponsável dos poderes da cloroquina e da hidroxicloroquina, sem comprovação científica que a ampare. Chegou-se ao ridículo de parlamentares sempre dispostos a pagar mico para bajular Bolsonaro subirem hashtags como #RemediodoBolsonaro e #JairNobeldaPaz.

A “revolta” da cloroquina e da hidroxicloroquina embute riscos graves. O primeiro e mais evidente é contrapor seu efeito “milagroso” à necessidade de isolamento social, como se o uso liberasse as pessoas a relaxarem a quarentena. O efeito da semana da histeria cloroquínica foi justamente esse: em todo o País os índices de isolamento regridem perigosamente.

Sem testes em quantidades mínimas, o incentivo de Bolsonaro para que as pessoas voltem às ruas tem potencial genocida. Seu novo tour por Brasília, um dos lugares do Brasil que primeiro adotaram regras duras de distanciamento social, é um desserviço presidencial à saúde pública. Displicente, limpou o nariz no antebraço antes de dar a mão a simpatizantes, entre os quais idosos. Uma cena capaz de chocar um mundo quarentenado e envergonhar o Brasil.

Caso prospere a narrativa de que basta pressionar médicos para que receitem medicamentos de eficácia ainda não comprovada e todos podem sair por aí livremente, vamos viver uma tragédia. Neste caso, o presidente não será candidato ao Nobel da Paz (risos), mas sim ao título de chefe de Estado que pior lidou com o mais grave problema enfrentado pela humanidade neste século.


Demétrio Magnoli: Fanáticos enxergam a cloroquina como pote de ouro

Todos os médicos podem prescrever a cloroquina para seus pacientes, com autorização deles. O Ministério da Saúde não veta o uso da substância --e também não a receita, pois, como em qualquer outro caso, não é sua função substituir o médico.

O ministério não estimula o uso indiscriminado da droga porque não se concluiu o protocolo científico de sua aprovação como medicamento para a Covid-19. Ao lado dela, pesquisas em fase inicial descortinam outras hipóteses medicamentosas prometedoras. Tudo isso parece óbvio, exceto para os fanáticos da cloroquina, que deflagraram uma "guerra cultural".

À primeira vista, a guerra decorre da sedução do pensamento mágico. Os fanáticos da cloroquina a enxergam como cura divina, o santo graal, elixir da vida, um pote de ouro no fim do arco-íris. Mas esses são os fanáticos tolos, inocentes úteis, soldados rasos de uma guerra cujas raízes não compreendem.

Os alquimistas da nova jihad transfiguram a substância química em metáfora de um arco narrativo ideológico que nada tem a ver com medicina.

O arco estende-se da China às "elites globalistas", com escala na OMS. Os três capítulos da narrativa são mais frequentemente difundidos como contos autônomos, mas pertencem a um romance único. Cada um apoia-se em fatos incontestáveis ou hipóteses razoáveis, que sofrem manipulações de natureza conspiratória.

1. China: o vírus emergiu em Wuhan, o regime ocultou a etapa inicial da epidemia e, para proteger o sistema de poder totalitário, provavelmente fabricou estatísticas fantasiosas que miniaturizaram as curvas de infecções e óbitos. Daí, os fanáticos da cloroquina extraem uma conspiração comunista destinada a disseminar globalmente o coronavírus, quebrando economias capitalistas para estabelecer hegemonia mundial da China.

2. OMS: a China impulsionou a escolha do etíope Tedros Adhanom para a chefia da OMS e hoje exerce influência sobre a organização similar à que os EUA e os europeus mantêm sobre o FMI e o Banco Mundial. Parceiro de um regime engajado em projetar "soft power" na África, Adhanom celebrou a "eficiência" chinesa no combate à epidemia, calando-se acerca de tudo que possa constranger Xi Jinping.

Dessa parceria os fanáticos da cloroquina extraem um complô veiculado pela OMS para amplificar a crise sanitária e desacreditar o remédio providencial.

3. "Elites globalistas": na linguagem sectária dos fanáticos da cloroquina, a expressão engloba todas as correntes compreendidas entre o liberalismo progressista e a social-democracia, genericamente rotuladas como "socialistas".

Tais elites, articuladas nas instituições internacionais, conduziriam um plano malévolo destinado a subjugar as nações e os capitalismos nacionais. A pandemia funcionaria como pretexto ideal para universalizar as quarentenas, solapar negócios, arrasar empresas privadas e perenizar a intervenção econômica estatal.

A guerra da cloroquina foi declarada pelos mesmos líderes políticos que, há pouco, qualificavam a Covid-19 como "gripezinha". Agora, desmascarados, eles se reagrupam numa trincheira de comprimidos de cloroquina e armam catapultas para assediar o castelo das democracias.

Há pesquisadores sérios convencidos da eficácia da substância no tratamento da doença. Suas reputações serão mais bem servidas se contribuírem com ensaios clínicos randomizados da droga, recusando o papel de porta-vozes científicos da "guerra cultural" alheia.

Chefes do tráfico não cheiram pó, curandeiros confiam sua própria saúde aos médicos, astrólogos profissionais não planejam suas vidas a partir de mapas astrais.

Os fabricantes da conspiração sem fronteiras --que abrange a China, a OMS, a União Europeia, o Partido Democrata, o STF, Maia, Doria, Mandetta e a maldita imprensa-- vendem deliberadamente um produto falsificado.

*Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.