cidadania
Nova Política Democrática analisa crise do governo Bolsonaro e legião de invisíveis
Em editorial, revista da FAP diz que pandemia vem sendo tratada com ‘descaso esperado’ no Brasil
Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP
Mais de 46 milhões de brasileiros na invisibilidade revelada pelo coronavírus, a crise de liderança política de Jair Bolsonaro, o limbo entre as defesas da vida e da economia e a nova disputa no governo com a ala militar são as análises de destaque da nova edição da Revista Política Democrática Online. Produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), a publicação pode ser acessada, integralmente e de forma gratuita, no site da entidade.
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Em sua nova edição, a revista destaca que a pandemia vem sendo tratada com “descaso esperado”. “Uma vez que o problema, para o governo, não é a doença, mas as medidas que o consenso da ciência indica para sua contenção, caminhamos celeremente para a quebra de todos os recordes negativos”, afirma um trecho do editorial. “Provavelmente chegaremos aos números mais elevados do mundo, tanto no que diz respeito a óbitos como a empregos destruídos”, continua.
O Brasil passou a Rússia e é o segundo país com mais casos de Covid-19 no mundo, segundo o balanço divulgado pelo Ministério da Saúde. Fica atrás apenas dos Estados Unidos. Além disso, conforme mostra a reportagem especial desta edição, mais de 46 milhões de brasileiros não estão em nenhuma lista do governo brasileiro e correm para conseguirem benefício durante pandemia do coronavírus.
A reportagem da Revista Política Democrática Online também mostra que, na ausência do poder público, a solidariedade tem-se tornado o melhor remédio de força para comunidades inteiras se ajudarem e passarem o período da pandemia do coronavírus. Em diversos Estados, grupos de vários segmentos da sociedade se unem para amenizar a fome ou auxiliar pessoas sem acesso à internet a fazerem o registro no Cadastro Único.
Em entrevista especial à revista, a professora aposentada e pesquisadora sênior do Departamento de Ciência Política e do Núcleo de Políticas Públicas da USP (Universidade de São Paulo), Lourdes Sola, Bolsonaro atua para destruir maiorias no Congresso. “Se uma maioria se insinua no Congresso, ele se dedica a sabotá-la”, critica. “Bolsonaro nunca esteve sozinho. Logo que ele começou a contestar a forma de os governadores reagirem à Covid, evidenciou-se para mim que não era só a família que o apoiava. Havia outros atores – nem sempre forças ocultas, mas semiocultas”.
No plano econômico, o Brasil terá que recorrer ao investimento público, para se recuperar dos efeitos da crise atual, conforme análise do professor do Departamento de Economia da UnB (Universidade de Brasília). “O ritmo anêmico de crescimento da economia brasileira anterior à pandemia já era prova cabal de que, sem aumento significativo do investimento público em infraestrutura, não é possível obter aceleração consistente do crescimento”, afirma ele.
Além de análises sobre as defesas da vida e da economia, que chegam a polarizar discussões no Brasil, a Revista Política Democrática Online também leva ao público outros assuntos relevantes, de interesse público e atuais sobre filosofia, cinema e cultura.
Todos os conteúdos da publicação são divulgados no site e tem chamadas nas redes sociais da FAP. O conselho editorial da revista é composto por Alberto Aggio, Caetano Araújo, Francisco Almeida, Luiz Sérgio Henriques e Maria Alice Resende de Carvalho.
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RPD || Reportagem especial: Busca por auxílio emergencial revela legião de brasileiros na invisibilidade
No total, mais de 46 milhões de brasileiros não estão em nenhuma lista do governo e correm para conseguir benefício durante pandemia do coronavírus
Cleomar Almeida
Na geladeira da faxineira Marizete Coelho (37 anos), duas garrafas de água. É só o que tem. Mãe solteira, ela e os dois filhos (8 e 9 anos) sobreviviam com 800 reais mensais que conseguiam com bicos de limpeza em espaços de festas e eventos, que foram suspensos por causa da pandemia do coronavírus. Metade do dinheiro era para o aluguel do barracão de três cômodos onde moram, em Santa Maria, a 26 quilômetros de Brasília. Até hoje, ela não conseguiu se cadastrar para receber o auxílio emergencial de 600 reais.
Assim como milhares de brasileiros, Marizete já passou vários dias em grandes filas da Caixa Econômica Federal para tentar regularizar sua situação, mas sem êxito. Ela não está em lista alguma do governo. Não recebe nem Bolsa Família porque os filhos não estudam. Não tem CPF ativo nem conta bancária, que são exigidos para conseguir a ajuda de emergência. “Minha renda sempre foi da faxina pra colocar a comida em casa. Também nunca tive patrão para pedir documento, porque sempre trabalhei para fazer bico com ajuda de pessoas que já me conheciam”, diz ela.
A situação de Marizete não é isolada. No total, segundo dados oficiais, mais de 46 milhões de brasileiros não se enquadram nas regras e não estão em qualquer lista do governo. São trabalhadores informais que ficaram sem renda por causa da pandemia e dependem dessa ajuda para sobreviver. São os invisíveis do Cadastro Único do Governo Federal. Muitos não têm nem acesso à internet para se regularizar.
O efeito da pandemia sobre a vida das pessoas é ainda mais trágico se considerados os 12,9 milhões de desempregados em março, conforme dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Apenas nos três primeiros meses deste ano, 2,3 milhões perderam o emprego, sendo 1,9 milhão de informais, o que reforça o peso catastrófico da pandemia sobre esse grupo. As principais pesquisas sobre ocupação da população foram interrompidas ou enfrentam problemas.
O primeiro desafio do governo era inscrever 11 milhões que não estavam no Cadastro Único, mas têm direito ao benefício, segundo cálculo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). O segundo era fazer o pagamento. Para quem não tem conta em banco, a Caixa Econômica Federal prometeu criar 30 milhões de poupanças digitais, movimentadas via aplicativo.
De acordo com pesquisa do Instituto Locomotiva, mais de 5,5 milhões de brasileiros com renda de até meio salário mínimo, elegíveis para receber o benefício, não têm nem conta em banco ou acesso regular à internet. São eles que correm o maior risco de não receber o auxílio. “A crise do coronavírus tirou renda e jogou para a pobreza muita gente que tinha pouco, mas não era alvo de programas sociais. O vírus joga luz a problemas que já existiam, como a baixa renda dos informais, e acentua uma desigualdade histórica”, diz o presidente do instituto, Renato Meirelles.
Pesquisadores do IPEA defendem ações urgentes e integradas entre União, Estados e municípios para socorrer os invisíveis. “O fundamental é partir da estrutura que já construímos, para atender de imediato às famílias mais pobres. Do contrário, o risco é de só conseguirmos operacionalizar o benefício tarde demais”, alerta o representante do IPEA, Pedro Ferreira de Souza. “Nossas simulações mostram que é possível garantir renda mínima para famílias vulneráveis com custos relativamente baixos, considerando a gravidade da situação”, diz.
O furacão de invisíveis, que aumenta cada vez mais, tem engolido até as expectativas do próprio governo. “Temos um volume muito grande de pessoas que literalmente trabalham durante o dia para comer à noite. Para atender a esse problema, saímos em busca dos que eram considerados invisíveis, os informais, que não têm uma atividade formalizada, organizada. Tínhamos a expectativa, a FGV [Fundação Getúlio Vargas] e outros institutos, de encontrar sete ou oito milhões desses invisíveis. Já encontramos 20 milhões", disse o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, no início de abril.
No dia 20 de abril, o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, reconheceu a dimensão ainda maior da população até então inexistente para o governo, em entrevista à imprensa. “Esses invisíveis hoje são 42,2 milhões de brasileiros e nós estávamos conversando, pensamos que chegaremos a 50 milhões de brasileiros. É um número maior do que imaginávamos”, afirmou.
O desespero dessas pessoas faz diminuir ainda mais o isolamento social, medida preventiva ao coronavírus, já que, na ânsia de conseguirem os 600 reais, têm de correr para as filas das agências da Caixa, para tentarem regularizar sua situação e serem vistas oficialmente pelo governo. A realidade socioeconômica torna essas pessoas ainda mais vulneráveis.
A professora Ana Carolina de Aguiar Rodrigues, do Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), da Universidade de São Paulo (USP), diz que, no Brasil, diferentemente de outros países, medidas de isolamento também devem passar por questões socioeconômicas. Ela ressalta que esse aspecto deveria moldar as diretrizes e ações a serem tomadas pelos governos no país.
“Definitivamente, esse valor não é suficiente”, diz ela, referindo-se aos 600 reais do auxílio emergencial. “Mas é importante dizer que, na hora que esse dinheiro cair na conta, as pessoas vão reduzir suas saídas de casa”, avalia a professora da USP. O técnico do IPEA Pedro Herculano de Souza, que estuda desigualdade de renda, concorda: "O auxílio é bem desenhado. O desafio é chegar a todos".
É exatamente isso que Marizete almeja. A faxineira conta que não vai sossegar em casa enquanto não conseguir regularizar sua situação junto ao governo. “Tenho dois meninos para criar, a geladeira está vazia. Não temos o que comer”, diz. Durante a pandemia, ela sobrevive com ajuda de vizinhos e de grupos de doação. “A gente sabe que o melhor é não sair de casa, mas hoje existir nos registros do governo é questão de sobrevivência. Só assim eu vou conseguir ter alguma ajuda nessa crise do coronavírus”, afirma.
Solidariedade socorre desassistidos pelo governo
Na ausência do Poder Público, a solidariedade tem-se tornado o melhor remédio de força para comunidades inteiras se ajudarem e passarem o período da pandemia do coronavírus. Em diversos Estados, grupos de vários segmentos da sociedade se unem para amenizar a fome ou auxiliar pessoas sem acesso à internet a fazerem o registro no Cadastro Único.
Em Goiânia, após a confirmação da progressão geométrica de casos de pessoas contaminadas pelo coronavírus, um grupo de amigos passou a se mobilizar pelas redes sociais para juntar alimentos e doá-los a quem necessita. Os beneficiados são, principalmente, pessoas consideradas invisíveis, de acordo com um dos organizadores.
“Muita gente não tem nada em casa nem perspectiva de quando vai receber algum dinheiro do governo. Já encontramos situação de trabalhadores do lixão que sequer tinham RG ou CPF. Parece inacreditável, mas é preciso visitar os lugares mais esquecidos para enxergar a realidade”, afirma o dentista Rogério Leal, voluntário do projeto. “Toda semana, entregamos cestas básicas a mais de 100 famílias desamparadas. Essa ajuda só é possível graças à sensibilidade de donos de supermercados”, diz ele.
Em Belo Horizonte, outro grupo tem-se reunido durante a semana, para ir até a casa de moradores da periferia e leva-los de carro até agências da Caixa Econômica Federal, para que consigam cadastrar a solicitação do auxílio emergencial. “Muita gente não tem pão para o café da manhã, muito menos vale-transporte para pegar ônibus e ir até uma agência”, afirma o advogado Lucas Mendonça, que se mobiliza com um grupo de evangélicos para auxiliar famílias carentes. “Nosso intuito é amparar da melhor forma possível. Se temos carro, usamos o veículo para ter função nas comunidades”, pondera.
No Rio de Janeiro, uma associação de camelôs cadastra e faz o acompanhamento do pedido do auxílio emergencial de 600 reais para colegas sem internet ou conta em banco. "Fazemos o pedido e monitoramos o andamento", conta a ativista Maria de Lourdes do Carmo. "Se a gente não se unir, todo mundo vai sofrer", acentua. Segundo ela, mais de 100 pedidos do benefício realizados por meio da associação já foram aprovados.
Além de grupos de amigos, a ajuda vem de Organizações Não-governamentais (ONGs) e associações que nunca tiveram a simpatia deste governo, na avaliação do diretor da FGV Social, o economista Marcelo Neri. "É preciso agir: a crise chegou após cinco anos de aumento da pobreza. No fim de 2019, a desigualdade de renda do trabalho, enfim, parou de subir, mas deve voltar a crescer”, alerta.
Número de auxílios liberados é três vezes maior que o projetado
O número total de auxílios emergenciais liberados a trabalhadores informais até a primeira quinzena deste mês já é o triplo do previsto pelo governo em março e deve aumentar ainda mais ao longo deste ano. A Caixa Econômica Federal informou que, até este mês, 58,7 milhões de trabalhadores informais tiveram o benefício autorizado.
A projeção inicial do Ministério da Economia era de que até 20 milhões de pessoas seriam beneficiadas pelo auxílio emergencial, o que, segundo o órgão, geraria custo de R$ 15 bilhões aos cofres públicos. Com o passar dos dias, as autoridades foram surpreendidas pelo crescente número de brasileiros que se enquadravam nos critérios do benefício.
Depois, o próprio governo teve de fazer novos cálculos e liberar novo crédito, que passou para próximo de R$ 124 bilhões. O prazo para os interessados se cadastrarem no programa vai até o mês de julho, o que ainda deixa o governo em alerta sobre possíveis aumento nos dados.
Diante do cenário de incerteza, a equipe econômica quer incluir no debate a possibilidade de revisão do que chama de gastos ineficientes. Os técnicos querem reavaliar gastos como abono salarial, seguro-defeso (pago a pescadores artesanais no período de reprodução dos peixes, quando a pesca é proibida) e farmácia popular.
Na avaliação da equipe econômica, a revisão nesses benefícios poderia abrir espaço no Orçamento para acomodar renda básica à população ou outra proposta de fortalecimento das políticas sociais no Brasil. No formato atual, o auxílio emergencial custa cerca de R$ 45 bilhões ao mês, uma despesa que, na avaliação dos técnicos, não cabe no Orçamento nem no teto de gastos, mecanismo que limita o avanço das despesas à inflação.
A manutenção do auxílio emergencial de R$ 600, além dos três meses definidos inicialmente pelo governo, já é defendida por parlamentares e entrou na conta das projeções de mercado para o resultado fiscal do Brasil em 2020. No entanto, economistas alertam para o risco de o país repetir os erros da crise de 2008, quando políticas temporárias para resgatar empresas e famílias se tornaram permanentes e contribuíram para o processo de deterioração das contas públicas.
No Congresso, o argumento de parlamentares é evitar que as famílias fiquem sem renda alguma em um momento em que a circulação do coronavírus no país ainda poderá inviabilizar a retomada plena das atividades e do emprego.
RPD || Pedro Scuro Neto: Admirável vírus novo
Em tempos de crise, até mesmo inimigos podem ajudar-se uns aos outros para superar os desafios impostos pela pandemia do novo coronavírus Covid-19 em todo o mundo. Papéis da Ciência, da mídia e da administração pública passam por reavaliação, avalia Pedro Scuro Neto
Que maravilha!
Quantas boas criaturas temos aqui!
Como a humanidade é bela!Oh admirável mundo novo
Que tem gente assim.
William Shakespeare, A Tempestade.
A sociedade trata os intelectuais com desconfiança, mas, em tempos de crise, fecha os olhos e daqueles menos escrupulosos encomenda profecias. Narrativas que a grande imprensa, na função de sentinela do sistema, agenda para fazer a opinião pública confiar que “quando tudo isto tiver passado, o mundo não será mais o mesmo”. [1] E o que esse mundo será, um dos literatos, dentre os profetas o favorito, se encarrega de dizer. Um mundo diferente, em que aprenderemos a lidar com “políticos irresponsáveis”, os mesmos que nos fizeram perder a confiança na ciência, nas autoridades e na mídia, que doravante serão os grandes mediadores das mudanças. Para fazer a diferença a palavra-chave será “solidariedade”, pois se “escolhermos desunião apenas prolongaremos a crise, trazendo catástrofes ainda piores”. Mas, se, ao contrário, “optarmos pela solidariedade global, venceremos não somente o coronavírus, mas toda e qualquer epidemia ou crise que sobrevier neste século”. [2] E como fazer isso? Em tempos normais, não se pode resgatar a confiança perdida, mas, como estes são “tempos de crise”, os espíritos podem mudar e até mesmo inimigos encontrarão “reservas secretas de confiança e amizade, dispondo-se a ajudar um ao outro”.
Na base de soluções proféticas estão sempre estratagemas. Neste caso, o truque é “naturalizar” o surto como se fosse algo íntimo, uma crise pessoal, que pede mudança de lentes para se enxergar melhor. Exige, sobretudo, confiar em intermediários, a mídia, a ciência e as autoridades, que, sob a influência da “maior crise da nossa geração”, vão ficar mais sintonizadas e sensíveis aos dramas de cada um. Em vez de monitorar, como sempre fizeram, vão propiciar “escolhas pessoais mais informadas”. A decisão final, porém, seguirá sendo dos indivíduos. Razão pela qual “a crise do coronavírus pode ser a batalha decisiva, pois entre privacidade e saúde as pessoas escolherão a segunda”. Mas, o que fazer com os incorrigíveis “egomaníacos”, os políticos, os “irresponsáveis” a quem deve ser imputada toda a culpa da crise de confiança nos “mediadores”? Neste preciso momento, desmorona toda a argumentação do profeta favorito, que desconhece os fatos e os atores.
Para começar, a ciência, o “mediador” mais neutro, fonte de probidade e veracidade, porém há décadas imerso em uma crise que nada tem a ver com políticos, mas com práticas ruins. A saber, em primeiro lugar, reprodutibilidade insatisfatória – recentemente, um projeto replicou 100 experimentos descritos em revistas indexadas de uma determinada ciência, cujos “efeitos alcançaram apenas a metade da magnitude original”.[3] Em segundo lugar, abusiva dependência de métricas, metas e indicadores, que, em lugar de sustentar avaliação qualificada, oprimem consciências, distorcem comportamentos e corrompem carreiras. Por último, problemas de revisão por pares, a menos ruim de todas as formas de governança acadêmica, mas assim mesmo assombrada por escândalos e denúncias. Tudo isso foi tema do livro de um sociólogo norte-americano, o primeiro a entender que os problemas da ciência não estão em seus fundamentos epistemológicos, mas nas imperfeições de suas práticas. Meio século depois, ele ainda denuncia as “pressões corruptoras” de uma “ciência industrializada”, cujos “incentivos perversos” obrigam os cientistas a se submeter a uma gig economy de contratos de curto prazo, sem direitos, sob o domínio de supervisores caprichosos.[4]
Por conta disso, a qualidade tornou-se instrumentalizada e a excelência perdeu espaço para o “impacto”, a nova regra do jogo. Situação agravada por tecnologias de guerra cientificamente informadas, pela manipulação financeira e pela predação ambiental, que, mesmo “aumentando as possibilidades de uma catástrofe civilizacional”, mostram que “o rei está nu”. Não se depender de literatos agenciados pela mídia para desviar nossa atenção de práticas ruins e de seus verdadeiros agentes.
Na administração, o segundo “mediador”, a prática mais nociva é a corrupção, “inerente às indústrias de mineração, petróleo e gás, construção e engenharia, todas de alto risco e objeto de investigação no mundo inteiro”.[5] A questão não é tanto o governo ou os políticos, mas o setor, num contexto em que a influência de organizações multilaterais se tornou preponderante. Caso do Banco Mundial, que, em 2011, orgulhosamente anunciou que seu braço no setor privado, a International Finance Corporation, tinha aberto linha de crédito de 50 milhões de dólares para a construtora Norberto Odebrecht. Fundos imediatamente transformados em ações de 250 milhões, como garantia de contratos de projetos de obras públicas.
Tudo documentado, mas, quando sobrevieram os escândalos, rapidamente deletado da base de dados do banco: “parcerias público-privadas” de 30 bilhões de dólares que a Odebrecht e outras quatro empreiteiras receberam de um banco estatal de desenvolvimento para operações na África e América Latina. Parcerias e suas indefectíveis “renegociações contratuais”, “terreno fértil para corrupção” – segundo Christopher Sabatini, professor da Universidade de Columbia, para quem “todo mundo sabia”, ou seja, que “a Odebrecht agenciava corrupção” com a chancela do Banco Mundial. Uma “tramoia evidente desde o começo”, na qual a IFC e o banco não corriam nenhum risco – “investigações de corrupção não chegam a outros países implicados e, nos países-clientes, os representantes do banco estão blindados contra processos judiciais”.[6]
O último ‘mediador’ do admirável mundo novo anunciado pelo profeta é a mídia, cujo “papel satânico” (Bauman) é “revolucionar os mecanismos de percepção do mundo” e instrumentalizá-los. Indústria conformadora de consciências que permeia todos os setores da sociedade, assumindo funções de controle e orientação. Não devido à informação que transmite, mas ao “conteúdo” – o que Marshall McLuhan chamava de “pedaço de carne”, que o ladrão traz para distrair o cachorro enquanto saqueia a casa. Indústria em crise, não por conta de políticos, mas de fatores estruturais relacionados com uma drástica queda na venda de mídia impressa e na saturação do mercado que obriga à competição com modalidades de mídia menos formais e profissionais. O que obriga a mover céus e terras para manter a clientela e fatias de mercado através da exploração do sensacionalismo, de uma incessante produção de notícias e de uma frenética busca por “inimigos”, para os quais se antecipa punição.
Crise não de agora, mas desde quando o primeiro grande centro produtor e difusor de notícias, a Igreja Católica, começou a perder o monopólio dos púlpitos e o status de “fonte” suprema, à qual todos, do mais rico e poderoso ao mais miserável, davam ouvidos com reverência.
Na antiguidade, os futurólogos eram “profetas da desgraça” que anunciavam cruéis castigos de Jeová para o povo – principalmente para dirigentes indignos (“os políticos”). Os atuais parecem mais atraídos por “renunciantes” budistas portadores de notícias acerca da “vida boa”. Laicizadas, mas sempre avessas à linguagem da democracia, suas derrapadas metafísicas desbordam o contexto estritamente religioso e invadem o âmbito da intimidade pessoal – cujas sutilezas só podem ser entendidas através dos inesgotáveis recursos da literatura. O que fez Aldous Huxley (Admirável Mundo Novo) há noventa anos, imerso na tempestade perfeita desencadeada depois da Primeira Guerra. Identificou estabilidade como a “necessidade original e derradeira” da civilização que luta para sobreviver a crises múltiplas. Como as de hoje, causadas por um modelo social, econômico e político falido, miseravelmente pego de surpresa por um minúsculo agente infeccioso. Crises agravadas por superpopulação e pelos meios de controle usados para submetê-la – dentre os quais Huxley destacaria as drogas e a sugestão subliminar, pedindo resistência para defender a democracia contra o autoritarismo, mais uma vez aos nossos portões.
No mundo real, enquanto os países se mobilizam para conter o coronavírus e suas nefastas consequências – a pior das quais é o colapso dos sistemas de saúde – não se pode perder de vista quadro bem mais assustador: uma nova pandemia é só uma questão de tempo. O surto global de Covid-19 não foi uma anomalia; doenças infecciosas emergem e reemergem em velocidade nunca vista ao longo da história. De 1980 a 2013, o número de epidemias anuais oscilou de 1.000 a mais de 3.000. Doenças infeciosas como Zika, MERS-CoV, SARS, cólera, tuberculose, HIV, influenza e ebola matam milhões todos os anos e, no seu rastro, destroem economias, causam pânico e, como no Brasil, crises institucionais. Situação que expõe a fragilidade das economias, a insuficiência das redes de segurança social e permanente subinvestimento em sistemas de saúde pública.
É preciso, primeiro – e antes de qualquer coisa – reforçar a capacidade do sistema de saúde na detecção e contenção de doenças com organismos centralizados de vigilância de dados que articulem informações de laboratório com dados populacionais e medidas clínicas. Em segundo lugar, desenvolver comunicação e coordenação, articulando centros de controle e prevenção com organismos da sociedade civil capazes de guiar respostas durante as crises e preparar protocolos baseados em evidências e boas práticas de saúde mesmo em tempos em paz. Finalmente, focar nas desigualdades que fazem as crises tão devastadoras, atentando para pequenas empresas, trabalhadores e pessoas mais vulneráveis.[7]
* Pedro Scuro Neto é sociólogo, diretor da Sociedade Internacional de Criminologia (Paris), autor de Sociologia Geral e Jurídica, cuja 8ª edição (A Era do Direito Cativo) é publicada pela Saraiva: S. Paulo.
Mais informações:
[1] Francesca Melandri (2020). https://www.theguardian.com/world/2020/mar/27/a-letter-to-the-uk-from-italy-this-is-what-we-know-about-your-future
[2] Yuval Harari (2020). https://www.ft.com/content/19d90308-6858-11ea-a3c9-1fe6fedcca75
[3] https://osf.io/ezcuj/wiki/home
[4] Jerome Ravetz (2016). https://www.theguardian.com/science/political-science/2016/jun/08/how-should-we-treat-sciences-growing-pains
[5] Andreas Pohlmann, Folha de S. Paulo, 22/9/2015.
[6] Roberto Bissio (2017). Leveraging corruption – How World Bank funds ended up destabilizing young democracies in Latin America, http://www.socialwatch.org.
[7] Jane J. Kim e Michelle A. Williams (2020), https://fortune.com/2020/03/29/coronavirus-pandemic-public-health-preparedness.
RPD || Maria Amélia Enríquez: Vida e economia nos tempos da Covid-19
Contradições da sociedade brasileira são expostas fortemente por conta dos efeitos da pandemia do coronavírus Covid-19. Debate sobre quem é mais importante, a defesa da vida ou da economia, ganha força
A pandemia do Covid-19 tem permitido escancarar as profundas contradições da sociedade brasileira, reveladas pelas péssimas condições sanitárias de 48% da população, sem esgoto e sem saneamento básico; precariedade do trabalho informal de 38,6 milhões de brasileiros, 41% da força de trabalho; míseros R$ 420,00 com que 52 milhões de brasileiros subsistem e, seu oposto, a extrema concentração da renda, a segunda maior do mundo, em que os 1% mais ricos detém 28,3% da renda total do País. Paralelamente, a pandemia e seus efeitos têm provocado um debate, até então pouco aprofundado, sobre o suposto antagonismo entre a defesa da vida e a defesa da economia.
Esse falso dilema pressupõe que a esfera econômica está apartada da vida das pessoas e tem existência própria, manifestando-se no mercado financeiro, na bolsa de valores, câmbio, transações bancárias, números do PIB etc. A vida real dos cidadãos e suas famílias, por seu turno, se passa em outra esfera, em seus domicílios e na rotina de seu cotidiano. O desastre econômico desencadeado pela pandemia mostra quão irreal é essa percepção.
Além de acesso aos recursos ambientais e materiais, a economia, enquanto reprodução material da vida, depende fundamentalmente da motivação humana, da energia, do engenho, da coragem, da criatividade, enfim, do trabalho e do talento das pessoas que precisam, antes de tudo, estarem vivas, confiantes e dispostas, para além de produzir e poder consumir.
Adam Smith (1776) demonstrou que o trabalho humano é a principal causa do desenvolvimento econômico. A tradição clássica subsequente reafirmou a produtividade do trabalho como chave para geração da riqueza e, não obstante todo o avanço da era digital e da indústria 4.0, com a retirada de cena de parte do trabalho por causa da pandemia assiste-se a um tombo na economia sem precedentes.
Mas, para além do trabalho, a dinâmica econômica requer confiança para consumir, gerar emprego e investir, enfim, assegurar a indispensável “demanda efetiva”. Para Keynes (1938), é o “estado de confiança” que molda as expectativas sobre essas decisões econômicas cruciais, mas, quando não há confiança do setor privado, surge uma onda de negatividade, com aumento do desemprego e queda da renda, o que gera e aprofunda a “armadilha recessiva”. Para combatê-la, a solução é aumentar as inversões públicas, que devem ser financiadas com déficit. A renda injetada provoca efeito de encadeamento que restabelece a confiança, essencial para impulsionar o crescimento.
Fukuyama (em Trust, 1995) demonstrou que o vínculo entre confiança e economia é a cooperação, fator explicativo dos diferentes padrões de crescimento entre países; além de substância do “capital social”, básico nos processos de desenvolvimento.
Assim, partindo-se do pressuposto de que a confiança é indispensável para a saúde econômica, nada mais lhe é tão nocivo quanto o medo, medo da morte por uma doença cruel, que exclui e isola do convívio familiar o paciente, cujo corpo nem poderá ser visto para consumar o rito. A argumentação de que doenças como H1N1 e dengue matam quantitativamente mais pessoas não tem sustentação, pois, além de as fatalidades ocorrerem em menor intensidade e escala, são conhecidas, evitáveis ou tratáveis. O que mais aterroriza na Covid-19 é a roleta russa que impõe, principalmente porque, no Brasil, um quarto das mortes é de jovens e sem comorbidade.
Como então readquirir motivação ao trabalho e confiança para consumir, investir e gerar emprego? Simples, se houvesse cura ou vacina, mas como ainda não existem, os cenários ajudam a ponderar. Em um cenário de ampla abertura das atividades, como lidar com a (falta de) confiança e cooperação no ambiente de trabalho e entre empresas? Como equacionar o mercado internacional se não houver demanda, já que outros países igualmente enfrentam depressões profundas?
O Brasil saiu na vantagem de entrar na pandemia “tardiamente”, mas não levou a sério a lição de que a única maneira de adiar a propagação do vírus para evitar uma crise humanitária seria o isolamento social e está presenciando a acumulação de cadáveres nos IMLs, em especial na Região Norte. Portanto, o cenário de ampla abertura da economia em meio à pandemia, além de cruel, apenas posterga os custos econômicos que inevitavelmente ocorrerão.
Monica de Bolle tem reiterado que a pandemia alterou por completo os rumos da economia e que o mundo não voltará automaticamente ao que era antes[1]. Ressalta, assim, a necessidade de uma renda básica permanente para pessoas em extrema vulnerabilidade e a reconversão industrial para a produção de insumos e equipamentos médicos. Este cenário impõe enorme desafio para países emergentes e com crônicos problemas de financiamento, como o Brasil.
Apresentar desde já um horizonte crível para a crise é um dos melhores meios para se resgatar a confiança. Todavia, parafraseando Galbraith (1995), o futuro será a resultante de ações realizadas no presente que, por seu turno, são fruto das decisões do passado. E, olhando para trás, constata-se que, em nome da economia, foram cometidas muitas atrocidades com as pessoas e a natureza. A pandemia está dissolvendo concepções e demonstrando que pode haver caminhos diferentes.
A ruptura das cadeias de valor, a dissolução dos preços do petróleo e das commodities em geral, o respiro ambiental nos grandes centros, as inúmeras demonstrações de compassividade e cooperação em prol do bem comum de empresas e da sociedade, em especial dos mais humildes, como é o caso de Paraisópolis (SP), abrem espaço para repensar a crônica insustentabilidade do modelo dominante de reprodução material da vida humana.
Talvez um dos efeitos secundários dessa crise seja ousar pensar na possibilidade da emergência de uma nova economia, que tenha como pilar estruturante a regeneração da natureza e da sociedade, uma “economia da reconversão”, que permita resgatar dívidas social e ambiental, tendo como valores o compromisso e a solidariedade com as gerações presentes e futuras. Isso é possível a partir de investimentos em atividades de alta efetividade que sejam economicamente sustentáveis. Para isso, a crise sanitária oferece excelente oportunidade de, finalmente, realizar investimentos maciços em saneamento básico, abastecimento de água, coleta e tratamento de resíduos; pois o déficit é brutal e o retorno é crescente, com vantagem de empregar muitas pessoas e resolver um dos problemas estruturais mais críticos do país[2].
A crise também permite revalorizar cadeias produtivas locais, mas, para isso, é imprescindível um amplo programa de qualificação e requalificação a esse novo mundo do trabalho, como a experiência, de baixo custo e de alto impacto, do “Pará Profissional” [3], vencedor do prêmio “Excelência em Competitividade”; além de estímulos ao aumento da competitividade com a intensificação da transferência de tecnologia para os processos produtivos locais, a partir de incentivos à pesquisa aplicada. Enfim, há muitas iniciativas e bons exemplos que precisam ser replicados e ganhar escala, mas para que ocorram é imperativo o engajamento com a causa!
* Maria Amélia Enríquez é economista, Professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), conselheira da Fundação Astrogildo Pereira (FAP).
Mais informações:
[1] https://www.fundacaoastrojildo.com.br/2015/2020/04/17/monica-de-bolle-a-economia-requer-mais-imaginacao/[2] Segundo o Instituto Trata Brasil, a falta de saneamento básico provoca mais de 300 mil internações por ano no país. Excluídas as doenças, há ineficiência da entrega de água. Em 2017, o Brasil teve prejuízo de R$ 11 bilhões, o que daria para ter abastecido 30% da população, além do que o país ganharia R$ 1,1 trilhão nos próximos 20 anos se universalizasse o saneamento básico, a um custo de R$ 470 bilhões.
RPD || Lilia Lustosa: A morte do cinema. De novo?
Novas tecnologias, como o som, cores, a televisão, o VHS e a tecnologia digital transformaram o cinema desde o seu nascimento, em 1895. Hoje, em tempos de pandemia e na era do streaming, a disputa entre a telona e a telinha ganhou novos contornos, tons e sonoplastias, analisa Lilia Lustosa em seu artigo
Desde o nascimento do cinema, em 1895, vários foram os momentos em que sua existência foi colocada em questionamento. A chegada do som, em 1927, foi um dos mais marcantes. Salas de cinema tiveram que ser adaptadas, e sets de filmagem, reconfigurados, já que a exigência da proximidade dos ainda não tão potentes microfones acabava por limitar o movimento dos atores. O resultado foi uma espécie de retrocesso na mise-en-scène dos filmes até que toda a indústria pudesse estar adaptada à novidade. E muitos foram os cineastas que se opuseram à mudança, defendendo que a fala acabaria com a aura da nova arte. Charles Chaplin fazia parte desse time, resistindo a não mais poder à incorporação do som, rendendo-se, finalmente, em 1940, ao lançar seu corajoso O Grande Ditador.
A chegada da televisão, do VHS e, mais recentemente, da tecnologia digital foram outros momentos de grandes medos e transformações, em que mais uma vez se questionou a sobrevivência do cinema. Técnicos tiveram que aprender a manejar novas câmeras e novos softwares de edição; cineastas tiveram que apurar o olhar à nova imagem, agora com menos textura e mais artificialidade; atores tiveram que aprender a contracenar com fundos verdes ou azuis, a usarem fios grudados em seus corpos; e as salas de projeção tiveram mais uma vez que ser adaptadas para receber as novas máquinas. Até hoje, ainda há diretores que se recusam a filmar em digital, apegando-se à pureza da imagem analógica, ao granulado e à nostalgia de sua composição. Tarantino é um deles! Além de filmar exclusivamente em película, comprou até o pequeno New Beverly Cinema, em Los Angeles, só para garantir a preservação do cinema à moda antiga.
Estamos agora na era do streaming, e a existência da sétima arte como concebida naquele longínquo 1895 parece mais ameaçada do que nunca. A disputa entre telona e telinha, que já andava acirrada nos últimos tempos, ganhou novos contornos, tons e sonoplastias... E não foi pela chegada de uma nova tecnologia, não! A ameaça agora vem de um vírus que pegou a todos de surpresa, atingindo de uma só vez o corpo e a alma do cinema, contaminando toda a cadeia cinematográfica. De repente, não mais que de repente, criadores e espectadores tiveram seus movimentos engessados. A pandemia da Covid-19 fechou salas, interrompeu filmagens, adiou lançamentos e fez com que milhões de profissionais perdessem seus empregos. As ações das grandes produtoras despencaram, e a maioria dos exibidores e das pequenas produtoras está decretando falência. E o pior, tudo isso ainda sem solução no curto prazo, já que teatros, cinemas e shows estão entre as últimas atividades a serem retomadas, em função de suas naturezas aglomerativas.
Em meio a esta crise sem precedentes na história do cinema, as empresas de plataformas de streaming saem como as grandes (e talvez únicas) beneficiadas, com suas ações atingindo índices altíssimos e com o número de clientes aumentando a uma velocidade “de contágio” maior que a do próprio coronavírus. Um a zero para a telinha nesta fase da era do streaming! E, sem querer tomar partido nessa disputa, a meu ver, incongruente, a sobrevivência da sétima arte parece estar assim ao menos assegurada, já que assistir a filmes se tornou um dos grandes antídotos para sobreviver à dura realidade do confinamento. Nunca se assistiu a tantos filmes e séries como agora!
Seria, então, o “algoz” da sétima arte – segundo alguns puristas – hoje seu salvador? Será esse o futuro do cinema? O da telinha? A chance é grande, até porque nada pode nos garantir que esta pandemia seja a última do século. A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood já até alterou seu regulamento a fim de permitir que filmes lançados e exibidos apenas na Internet possam concorrer ao Oscar em 2021, encerrando briga recorrente nos últimos anos. E, apesar de a maior parte dos grandes estúdios ainda se recusar a lançar seus blockbusters diretamente pelas plataformas digitais, lançamentos como o de Trolls 2, da Dreamworks/Universal Pictures, feito diretamente em VOD (video on demand), demonstraram ter seu valor. Cada visualização, a 19,99 dólares, rendeu cerca de 100 milhões em alguns dias “em cartaz”. Nada mal para um lançamento sem salas de cinema!
O fato é que, depois que as quarentenas forem levantadas, a experiência de ir ao cinema não será mais a mesma. Mudanças terão que ocorrer para que os espectadores possam se sentir seguros para voltar às telonas. Nos Estados Unidos, alguns Estados começam a dar os primeiros passos nessa direção. O Texas já autorizou a reabertura de salas, desde que com apenas 25% de ocupação. Massachusetts, que anda também ensaiando a reabertura, anunciou as mudanças que devem ocorrer: fileiras e cadeiras serão retiradas para que haja pelo menos 1,5m de distância entre os espectadores; as compras de ingressos serão feitas exclusivamente online, com impressão do bilhete feita em casa pelo espectador ou apresentação no formato digital (celular); álcool em gel estará disponível em vários pontos das salas, que, por sua vez, contarão com mais portas de saída.
Diante do novo cenário, é impossível não prever aumento no preço dos ingressos, o que fará com que a ida ao cinema seja cada vez mais um programa de elite. Mais pontos para a telinha?
Outro problema que se impõe quando da reabertura das salas é o dos conteúdos a serem exibidos. Quer dizer, com as produções todas em pausa por tantos meses, a que filmes iremos assistir? Em um primeiro momento, o mais provável é que entre em cartaz a leva represada de blockbusters – Viúva Negra, Mulan, Tenet, 007 etc. – que tiveram seus lançamentos adiados por medo de não conseguirem recuperar o montante estratosférico de dinheiro investido, caso tivessem optado pelo lançamento digital.
Em seguida, tendem a ganhar força as produções mais baratas, que exijam equipes pequenas, menos equipamentos e mais agilidade na conclusão dos projetos. Documentários também devem ter seu destaque, porque, em geral, cabem dentro de um orçamento mais modesto e podem ser montados com imagens de arquivos, entrevistas e, consequentemente, menos contatos humanos envolvidos. Quem sabe, agora, pequenas produtoras e coletivos de cinema ganhem mais espaço. Quem sabe consigam finalmente ter seus filmes devidamente distribuídos nas novas salas carentes de conteúdos. Estaríamos diante de um “neo Neo-realismo” ou de um “novo Cinema Novo” ?
Independentemente do que esteja por vir, neste cenário pós-pandemia, o Estado terá papel decisivo na retomada da atividade cinematográfica. No caso do Brasil, então, então, com uma indústria bem menos consolidada do que a americana, tendo tido também vários lançamentos adiados (A Menina que matou os pais, Três Verões, A Febre etc.) e produções interrompidas, a Ancine pode (e deve) ser a grande ferramenta de reconstrução do cinema nacional, ampliando as linhas de financiamento às pequenas e médias produções, criando linha de crédito para que os exibidores possam reabrir suas salas e incentivando as grandes empresas a investirem em cinema em troca de incentivos fiscais. Coisa que já acontecia, claro, mas que esteve ameaçada nos últimos tempos e que agora não pode falhar nem faltar. Obviamente, essas ações não vão impedir que a indústria cinematográfica entre em uma crise profunda, mas, além de aliviar o tamanho da queda, servem para dar-nos esperança e tempo para repensar o formato do cinema nestes novos tempos pandêmicos.
A pergunta que fica martelando é: quando tudo isso passar e o corona vírus já tiver virado História, voltaremos às salas de cinema como antes? Ou estaremos já tão acostumados à tela pequena que não nos daremos mais ao trabalho de sair de casa em prol da experiência coletiva da sala escura e da tela grande? Teremos aprendido a dar mais valor a produções mais artísticas, menos cheias de efeitos especiais? E os blockbusters, com seus budgets exorbitantes e suas equipes gigantescas, tornar-se-ão coisa do passado, símbolos de uma época sem riscos de contaminação?
Sobram perguntas e escasseiam respostas. Mas, nestes tempos de incertezas, angústias e questionamentos, uma única coisa parece certa: o cinema não vai morrer. Não vai ser desta vez…
*Lilia Lustosa é doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL).
RPD || José Luis Oreiro: Plano Pró-Brasil: Um New Deal para a economia brasileira?
Governo Bolsonaro criou mais uma disputa interna entre a equipe econômica do governo e a ala militar, encabeçada por Braga Neto, originada no fato de que a agenda de privatização, reformas estruturais e abertura comercial não tem apresentado os resultados prometidos
No final de abril, o ministro Chefe da Casa Civil, General Braga Neto, anunciou a intenção de realizar um grande pacote de investimentos em obras de infraestrutura até 2031, no valor de R$ 280 bilhões, dos quais R$ 30 bilhões sairiam dos cofres públicos e os restantes R$ 250 bilhões seriam obtidos por intermédio de concessões à iniciativa privada. Na coletiva de imprensa na qual o anúncio foi feito, notaram-se duas ausências. A primeira foi o detalhamento dos projetos que fariam parte do assim denominado “Plano Pró-Brasil”. Na verdade, a apresentação de Braga Neto se resumiu a sete lâminas de power point, em que absolutamente nada de substantivo foi apresentado. A segunda ausência foi a do ministro da Economia Paulo Guedes, quem, em tese, deveria encabeçar esse tipo de iniciativa.
Comentários de bastidores que circulam livremente em Brasília mostram a existência de disputa entre a equipe econômica do governo, liderada por Paulo Guedes, e a ala militar, encabeçada por Braga Neto. Essa disputa tem sua origem no fato de que a agenda de Paulo Guedes – Privatização, Reformas Estruturais e Abertura Comercial – não tem apresentado os resultados prometidos em termos de aceleração do crescimento econômico. Com efeito, apesar da aprovação de uma reforma da previdência muito mais profunda do que a pensada durante o governo Temer, o primeiro ano do governo Bolsonaro conseguiu a proeza de apresentar taxa de crescimento de apenas 1,1%, inferior à média obtida no governo Temer (1,2% entre 2017 e 2018) e muito abaixo da tendência de longo prazo de 2,81% a.a para o período 1980-2014.
Em segundo lugar, a equipe econômica do governo mostrou, nas primeiras semanas da crise do corona vírus, enorme dissonância cognitiva, recusando-se a tomar as medidas necessárias para atenuar os efeitos econômicos das medidas de distanciamento social; sendo assim atropelada por iniciativas que partiram do Congresso Nacional, como, por exemplo, o programa de renda emergencial. Esse comportamento contrastava com as medidas adotadas de forma célere pelos governos dos países desenvolvidos, os quais destinaram valores que somavam 20% do PIB (por exemplo, no caso da Espanha), para atenuar a queda abrupta do nível de atividade econômica.
Entre os economistas das mais diversas tendências de pensamento, formou-se um consenso de que a pandemia atualmente em curso deverá produzir a maior queda do nível de atividade econômica na história do capitalismo, superando em intensidade a Grande Depressão de 1929. Uma vez contida a pandemia e suspensas as medidas de distanciamento social, a recuperação econômica será extremamente lenta e dependerá, tal como na década de 1930, de forte atuação do Estado na forma de vultosos investimentos em infraestrutura. No caso dos países europeus, abre-se uma janela de oportunidade para realizar mudança estrutural importante, qual seja: a descarbonização da economia, com vistas à redução da emissão de CO² na atmosfera, de maneira a conter o fenômeno do aquecimento global, ameaça de longo prazo à sobrevivência da própria humanidade. O volume de investimentos necessários para essa mudança estrutural é gigantesco, constituindo-se, portanto, no vetor de demanda necessário para a recuperação das economias europeias no pós-pandemia.
O Brasil também terá de recorrer ao investimento público para se recuperar dos efeitos da crise atual. O ritmo anêmico de crescimento da economia brasileira anterior à pandemia já era prova cabal de que, sem aumento significativo do investimento público em infraestrutura, não é possível obter aceleração consistente do crescimento. A história brasileira mostra de forma muito clara que, no período de crescimento acelerado, entre as décadas de 1930 a 1980, o investimento público, direto ou por intermédio de empresas estatais, teve papel fundamental. No período pós-pandemia, os níveis elevados de desemprego e de ociosidade da capacidade produtiva vão inviabilizar qualquer retomada da atividade liderada pela demanda do setor privado.
Também é pouco provável que, dada a demanda por financiamento nos países europeus, os investidores internacionais se mostrem dispostos a financiar volume grande de projetos em infraestrutura no Brasil. A retomada do crescimento irá exigir um New Deal para a economia brasileira. O problema é que os militares não têm, ainda, a mais remota ideia de como fazer isso.
*José Luis Oreiro é professor Associado do Departamento de Economia da Universidade de Brasília e Pesquisador Nível IB do CNPq. E-mail: joreiro@unb.br. Página pessoal: www.joseluisoreiro.com.br.
RPD || Henrique Brandão: Aldir, nunca haverá outro igual
Nos versos de Aldir Blanc havia um sentimento vitalista de malícia, ironia, crítica social e de imagens brilhantes. Vítima da Covid-19, ele deixa mais de cem canções gravadas e uma música inédita
O que dizer de Aldir Blanc em um momento de profunda tristeza como esse? O bardo da Muda, na expressão de seu amigo Eduardo Goldemberg, merece todas as homenagens e elogios do mundo, pelo grande poeta, letrista e cronista que foi. Como compositor, é dos maiores que a MPB já teve. Um monstro, gênio da palavra.
Todos nós somos “reféns” de Aldir. Quem nunca sambou um samba seu? Quem nunca dançou, com a ponta torturante de um band-aid no calcanhar e embalado por uísque com guaraná, um bolero dele? O cara não era profeta, longe disso. No entanto, quem há de discordar que seus versos em “Querelas do Brasil”, música do distante ano de 1978, em parceria com Maurício Tapajós, haveriam de soar tão atuais quando dizem que “O Brazil não merece o Brasil / O Brazil,tá matando o Brasil”?
Aldir morreu de Covid-19, mas sua saúde, assim como a do país que ele tanto amava, foi sendo solapada pela tristeza galopante, com a velocidade de uma brigada de cavalaria, na descrença de que um horizonte mais generoso ainda fosse possível. O país preconizado por atual presidente psicopata, com sua perspectiva cada vez mais autoritária, está muito aquém do Brasil tão amado e cantado pelo poeta.
O Aldir mais conhecido de todos é o letrista de sucessos maravilhosos, tanto na parceria com João Bosco como com músicos do talento de Guinga, Moacyr Luz e Cristóvão Bastos, entre outros, responsável por sucessos que qualquer um assobia fácil pelas ruas, entoa nas mesas dos bares ou ouve com frequência nas rodas de samba. É aquela música que o cidadão comum conhece, canta inteira, mas, muitas vezes, nem sabe quem é o autor. Isso é privilégio de poucos, reservado somente aos maiores, escolhidos a dedo pelo que o destino lhe reservou. Coisa de Caymmi, Luiz Gonzaga, Noel, Vinícius...
Mas tem um outro Aldir, menos conhecido do público, que é tão talentoso quanto o letrista. É o cronista. Sua verve foi exercida, inicialmente, no Pasquim, semanário de humor de saudosa memória, onde jornalistas e colaboradores do quilate de Jaguar, Millôr, Ziraldo, Sergio Cabral, Ivan Lessa e Sergio Augusto esculachavam a ditadura. A colaboração profícua rendeu seu primeiro livro, Rua dos Artistas e Arredores, reunião das crônicas publicadas no tabloide. A primeira edição é de 1978.
A Rua dos Artistas, com este belo nome, fica em Vila Isabel. Aldir morou nela quando garoto, na casa dos avós. Fez daquele microcosmo do subúrbio carioca, a partir de suas lembranças e de sua perspicaz imaginação, crônicas que dialogam com o mundo, esteja você no Rio, Pequim ou Budapeste. Relendo-as, é impossível conter o riso. Os dramas, casos, personagens e apelidos de cada um, que vivem na fictícia, porém muito real, comunidade “vilaisabetana”, misturam grosseria, poesia e generosidade, na proporção exata que só Aldir sabia dosar. Como cronista, assim como letrista, também foi dos grandes, no nível de João do Rio, Lima Barreto, Sergio Porto.
Além do livro, as crônicas geraram um filhote. Foi do nome de um dos personagens de Aldir, o Esmeraldo “Simpatia é Quase Amor”, que, em 1994, leitor de seu livro, sugeri a um grupo de amigos o nome para um bloco de carnaval que pretendíamos fundar. Aldir acabou virando o patrono do bloco. Como era de seu feitio, sempre se esquivou das nossas inúmeras tentativas de homenageá-lo. Participou de alguns desfiles, sempre discretamente. Chegava sem avisar e ia para o meio da bateria tocar seu tamborim. Quando o descobríamos já era tarde, o bloco estava na rua.
Desde então, há 36 carnavais que, sob a benção de Aldir, o “Simpatia” desfila pela orla de Ipanema. Por ocasião do aniversário de 15 anos, gravamos um CD com todos os sambas cantados em nossos cortejos. Dessa vez, fruto de sua benevolência, quem prestou homenagem ao bloco foi o Aldir, ao gravar um depoimento que abre o CD. Diz ele: “O bloco da minha mocidade foi o ‘Bafo da Onça’, de saudosa memória, do Catumbi, Estácio e adjacências. Mas nem mesmo o ‘Bafo’, com suas rainhas e princesas de polução noturna, me deu emoção tão forte como o ‘Simpatia é Quase Amor’. Criei em livro o ‘Simpatia’ para proteger a identidade de um primo do subúrbio (...). É bonito ver um primo da Zona Norte virar bloco na Zona Sul. Com este gesto simpático, saiu ganhando São Sebastião do Rio de Janeiro. No ‘Simpatia’, onde minhas filhas saíram pequenas, hoje, 15 anos depois, desfilam meus netos”. Esse depoimento enche a todos nós, fundadores e foliões do bloco, de imenso orgulho.
Segue em paz, Aldir.
* Henrique Brandão é jornalista e fundador do bloco “Simpatia é Quase Amor”.
Aforismas do gênio Aldir (alguns do Rua dos Artista e Arredores, Mórula, 2016).
“Se você está pensando que o tijucano é um estado de espírito, aqui ó! O tijucano é um estado de sítio”“Alto funcionário da Polícia Federal lembra a seus subordinados em Brasília: o piso é a prova de fogo, o preso, não”
‘Na inauguração do novo Distrito Policial, coube ao delegado dar o pontapé inicial”
“No Hipódromo da Gávea, um garanhão traçou uma égua, depois de uma... informação de cocheira”
“No Jardim Zoológico, o avestruz concretista, depois de uma bimbada, suspira: Pô, Ema...”
“Eu nunca marco derrota do meu time na Loteria. Me sinto um traidor”
“O amor tanto se mete a edredon, que acaba velha colcha de retalhos”
“Querido diário, hoje foi um dia incrível. Nem te conto”
RPD || André Amado: O imortal
Leitura de alto nível, que fará esquecer as agruras da quarentena, recomenda André Amado, que nos brinda com uma análise da mais nova obra do embaixador brasileiro no México, Mauricio Lyrio
É longa e estreita a relação entre funcionários do serviço diplomático brasileiro e a Academia Brasileira de Letras (ABL). No curso da história, nada menos do que doze diplomatas ocuparam cadeiras na prestigiosa academia.[1] No momento, sempre em um universo de 40 acadêmicos, são cinco: Sergio Paulo Rouanet, Alberto da Costa e Silva, Geraldo Holanda Cavalcanti, Evaldo Cabral de Melo e João Almino.
Quando recebi O imortal de nosso embaixador no México, Mauricio Lyrio, confesso que temi tratar-se de uma obra dedicada a explorar a tradição acima mencionada, o que, convenhamos, não é tema exatamente palpitante, para dizer um mínimo.
Conhecendo, no entanto, o autor como conhecia – desde os tempos em que buscava ideias frescas sobre como dirigir o Instituto Rio Branco, honrosa função para a qual acabara de ser convidado –, não pude deixar de intuir que Mauricio teria coisas mais inteligentes a dizer, e de maneira tão brilhante quanto as que me passou lá trás, em 1995.
Não me enganei.
O imortal tem como personagem central Cassio Haddames, um embaixador lotado em Brasília sem maior brilho profissional, mas que é eleito pela Academia Sueca para receber o Prêmio Nobel de Literatura, tornando-se o primeiro brasileiro a ser contemplado com o cobiçado galardão. Sua candidatura fora proposta pelo ministro das Relações Exteriores, em exposição de motivos, dirigida ao presidente da República, iniciativa que incluía – na verdade, tinha como objetivo maior – vender uma segunda candidatura, a de Sua Excelência o mais alto mandatário do pais ao Prêmio Nobel da Paz. O texto desse expediente, cuja leitura já vale a do livro, reproduz na ficção um exemplo frequente na Esplanada dos Ministérios, de como altos membros da burocracia tentam chaleirar o ego de seus superiores, apostando em que ninguém vira o rosto para mimos faiscantes.
Esqueceram-se de combinar com os suecos, que aceitaram conceder o Nobel de Literatura ao embaixador, mas passaram solenemente ao largo do pleito presidencial.
De sua parte, Haddames estava até certo ponto constrangido pela concessão do Prêmio. Tal como não se cansava de repetir um despeitado jornalista da terrinha, o próprio Cassio Haddames também tinha dúvidas quanto à justiça da honraria recebida. Ele apenas escrevera três romances, que somavam, juntos, 954 páginas. Daria para justificar a homenagem maiúscula da Academia Sueca? Tanto mais na comparação com a produção literária de um Bandeira, Drummond, Guimarães Rosa, João Cabral, entre tantos outros, jamais considerados por Estocolmo.
Em meio a essa crise de consciência, duas surpresas aguardariam o agora ilustrérrimo embaixador em seu retorno ao Brasil. Primeira, ainda no aeroporto, um comitê de recepção desfraldava faixa monumental com dizeres em letras garrafais: O NOBEL É NOSSO! E a segunda foi de início uma sondagem, que rápido ganhou foros de irrecusável gestão, orquestrada por raposas da cena política brasileira, para que Cassio Haddames aceitasse disputar as próximas eleições a presidente da República.
Fácil de imaginar, a vida de Haddames passou por momentos de turbulência, estupefação e angústia. O autor não nomeia esses sentimentos. Cabe ao leitor identificar, em meio aos múltiplos incidentes descritos no livro, que se alternam com capítulos, de um lado, cobrindo a trajetória profissional do embaixador/presidente por Nova Iorque, Paris e Beijing e, de outro, os inevitáveis desafios das novas funções, explorando com humor os corredores do poder em Brasília (Não hesito em ressaltar a construção e o palavreado do telegrama que o embaixador do Brasil em Estocolmo envia ao Itamaraty sobre o discurso de posse de Haddames na cerimônia de concessão do prêmio, uma peça antológica do que nós, diplomatas, chamamos de “itamaratês”, código que nem por isso deixará de ser decifrado por todos que conhecem o mundo da política).
Destaque especial merece a correspondência de Haddames com seu filho André, por intermédio da qual o embaixador compartilha sua visão de mundo – não raro, suas culpas como pai ausente -, atualizando o leitor quanto ao perfil emocional e psicológico do personagem.
Há um momento no livro em que o leitor se pergunta: e daí? Há um romance entre Haddames e uma diplomata argentina, que parece transformar a mesmice da vida do personagem, que, somos informados, era divorciado. Mas, ainda assim, a relação não promete galvanizar a trama. À frente do Executivo, o inexperiente Chefe de Estado não se sai nada mal. Voltamos à pergunta: e daí?
E daí é quando o grande escritor tira o tapete do leitor e escolhe desfecho surpreendente, tecido de maneira magistral. O resumo da história é que vocês não podem deixar de ler O imortal. Garanto: é leitura de alto nível, que fará esquecer as agruras da quarentena.
[1] Lista por ordem cronológica de eleição: Joaquim Nabuco, Aluísio Azevedo, Domício da Gama, Oliveira Lima, Ribeiro Couto, Gilberto Amado, João Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto, Antônio Houaiss, José Guilherme Merchior, Sergio Corrêa da Costa e Affonso Arinos de Mello Franco.
*André Amado é diretor da Revista Política Democrática Online
RPD || Adriana Novaes: Filosofar com Hannah Arendt em tempos de Covid-19
Em tempos em que o novo coronavírus torna pior o que era ruim e faz com que os problemas fiquem ainda mais dramáticos, a filosofia atenua a aflição e nos socorre, avalia Adriana Novaes em seu artigo
O escritor argentino Ernesto Sabato escreveu que quase nunca acontecem coisas. No início deste ano de 2020, uma coisa aconteceu. Uma nova doença transformou nosso cotidiano e instalou a incerteza. São tempos graves. Uma situação-limite que desafia os cientistas, os profissionais de saúde, os economistas, os políticos, os educadores. Ninguém está livre de sua ameaça e do impacto das mudanças que provocou. Já vivíamos em um período tenso, crítico, instável e incerto. A Covid-19, o Sars-Covid-2, o novo corona vírus veio para tornar o que era ruim ainda mais exposto, fazer os problemas ficarem ainda mais dramáticos, como a imensa desigualdade de nosso país.
É nesses momentos de incerteza que a filosofia nos socorre. Não porque ela dê respostas definitivas, nem mesmo porque atenue a aflição. De modo algum. Ela é o despertar e a investigação acerca do que tem significado, a paralisação do espanto e a exigência da busca por possibilidades novas. É nas situações-limite que a filosofia vem em nosso auxílio, é nos momentos graves que somos chacoalhados e instados a nos perguntar sobre as coisas, a suspender certezas, a rever posições, a reconsiderar valores e referências. O filosofar é provocado pelas experiências que ativam de modo intenso nossa vida do espírito.
A vida do espírito foi examinada pela filósofa Hannah Arendt no final de sua vida, a última etapa de uma trajetória intelectual marcada pelo esforço de compreensão do fenômeno mais importante e traumático do século XX, o totalitarismo, e o novo tipo de mal que surgiu nele, a banalidade do mal. Dedicada ao estudo da política, dos elementos constitutivos históricos dos regimes totalitários, das revoluções, dos desdobramentos do colapso moral ocorrido na Segunda Guerra Mundial, Arendt se viu desafiada a examinar as atividades do espírito, suas concepções ao longo da história da filosofia, e resgatar seus significados. São os novos contextos emergenciais os que mais exigem de nossa vida espiritual.
Essas atividades são espirituais porque não correspondem apenas a estruturas de nossa mente, mas são capacidades em inter-relação dinâmica, habilidades que nos dão perspectivas de viver e dotar de sentido, criar e escolher, aquilo que há de mais complexo e extraordinário em nossa condição humana. Essas atividades – o pensar, o querer e o julgar – são faculdades que precisamos exercitar para agirmos de acordo com a potência de nossa humanidade.
Pensar é o exercício que fazemos ao nos retirarmos do mundo, no distanciamento, agora forçado e, às vezes, não tão só. Mas poder parar e pensar é fundamental para nos darmos conta do que estamos fazendo, nossas ações e caminhos na vida e, especialmente para Arendt, do modo pelo qual exercemos nossa vida política. Isso significa examinar como agimos em nossa vida conjunta, enquanto uma comunidade, uma nação. Pensar é examinar-se, é conversar consigo mesmo e perguntar-se sobre o sentido real das decisões que tomamos, das escolhas que fazemos. Essas escolhas são ações de nossa capacidade de julgar.
Julgar, para Arendt, é um grande desafio porque é encarar os problemas a partir dos pontos de vista das outras pessoas. É jamais colocar os próprios interesses em primeiro lugar, mas, ao contrário, dispor-se aos outros. Porque cada um de nós é único, vê a realidade de modo único. E a realidade é tão ampla que nunca conseguimos dar conta dela. Ela é irredutível ao pensamento. É complexa demais. Por isso, precisamos do esforço da abstração de que somos capazes pelo pensamento – o que significa lidar em nossa mente com os invisíveis, os significados das coisas – e sempre nos colocarmos no lugar dos outros. É pela consideração da realidade pelo maior número possível de pontos de vista – pela consideração de vários olhares únicos como o nosso – que podemos compreender melhor o que está acontecendo. Assim, fazemos melhores escolhas.
A tentativa de compreender é muito difícil, como escreveu Eric Hobsbawm sobre o papel do historiador no exame do violentíssimo século XX. Mas, para Arendt, compreender é a tarefa do pensamento, de nossa vida do espírito, o que temos de mais extraordinário.
Outra atividade do espírito é o querer, a vontade como ímpeto para criarmos coisas novas. E criar o novo é acolher a imprevisibilidade que sempre assusta. Nesses nossos tempos, algo que até foi previsto, mas para o que poucos deram atenção, fez o mundo parar. Um novo vírus, um desafio para médicos e cientistas, também escancarou o desastre de uma civilização estruturada pela alta tecnologia que ainda precisa conviver com toda sorte de absurdos como terraplanismo, crença em remédios milagrosos, variadas bobagens pseudocientíficas, mas também a perigosa negação da eficácia das vacinas. As falsas soluções e as mentirosas explicações são usadas por governos que encolheram e se embotaram como meras burocracias, como se nações pudessem ser equiparadas a empresas, uma deformação antipolítica que ameaça de modo ainda mais pernicioso a liberdade e a civilidade. Essa negação da política compromete a consciência e a plena atuação conjunta dos cidadãos, o envolvimento responsável com a própria comunidade, a nação da qual se faz parte.
Resgatar a dignidade da política como a esfera de exercício de nossas atividades do espírito, como âmbito do discurso que exige nossa responsabilidade, é um desafio que a obra de Hannah Arendt nos apresenta e ao qual a situação-limite em que vivemos nos lança. É preciso encarar a realidade, por mais difícil e terrível que seja. Para enfrentá-la, temos o cultivo e o exercício de nossa vida do espírito.
* Adriana Novaes é pós-doutoranda do Departamento de Filosofia da FFLCH-USP.
Marco Marrafon: Governança estratégica deve nortear reforma do Estado na era digital
“Um Estado leve, porém forte, necessário e dotado de lógica pública não necessariamente estatal. Afinal, na Era Digital se tornou urgente que as instituições funcionem e forneçam respostas às necessidades da população, de modo a possibilitar a efetividade dos direitos fundamentais individuais e sociais, resgatar a legitimidade da política e preservar importantes postulados da democracia liberal.”
Há algum tempo tenho defendido aqui neste espaço o conceito de reengenharia constitucional como a necessária e radical reconfiguração estrutural das instituições oitocentistas do liberalismo democrático que fomentaram a ideia de Estado de Direito.
Tendo em vista o diagnóstico cada dia mais consensual de que existe uma crise nos postulados da democracia liberal e que essa crise pode se tornar um retrocesso civilizatório com o aumento do autoritarismo em escala global, parte-se da ideia de que a superação desse quadro tornou imprescindível a implantação de medidas estruturantes para salvaguardar valores universais como os direitos humanos, o governo democrático, a liberdade, a separação dos poderes e os limites do poder estatal, bem como a redução de desigualdades e a concretização de direitos sociais.
Assim, para preservar esses objetivos da gestão pública e fazer cumprir o papel que se espera do Estado, as formas estruturais pensadas há aproximadamente três séculos não se mostram efetivas atualmente.
Pelo contrário, sua perda de legitimidade é evidente. Na Era Digital, o tempo do Estado burocrático não é o tempo da vida, o que tem gerado forte descrença e rejeição da política, aliado a arroubos autoritários.
Desta feita, é preciso transformar as estruturas e preservar as finalidades públicas, notadamente a concretização dos direitos fundamentais e a busca de vida plena aos cidadãos.
As mesmas reflexões se aplicam ao contexto brasileiro: a fim de assegurar o conteúdo funcional da Constituição de 1988 é preciso reconstruir sua arquitetura estrutural, ou seja, novos meios para realmente alcançar a efetividade dos fins constitucionais.
Nesta oportunidade, ouso enunciar algumas ideias que possam se tornar diretrizes para o futuro do Estado, em uma perspectiva ensaísta e provocativa para que o debate e o tempo amadureçam as reflexões.
A Constituição de 1988, inspirada nos ideais do Estado de Bem-Estar europeu (keynesiano, providencialista) que emergiu após a Segunda Grande Guerra, trouxe consigo fortes preocupações com os sistemas de controle, com a impessoalidade na gestão pública e um arquétipo estatalista que rapidamente se mostrou esgotado ante as demandas do fim do milênio. O grande avanço na salvaguarda dos direitos fundamentais individuais e sociais não veio acompanhado de estruturas sustentáveis fiscalmente e capazes de garantir sua efetividade.
O modelo pensado tinha uma tendência irrefreável para o avanço das corporações e o inchaço da máquina pública, de modo que o excesso de estruturas estatais se tornou obstáculo para a efetividade dos direitos fundamentais, e não meio para concretizá-los.
Sem demoras, vieram as pressões por reformas. Especialmente a partir de 1995, emergiu o Plano Diretor da Reforma do Estado proposto pelo Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), cujo objetivo era operar um câmbio entre o paradigma burocrático-controlador para o gerencial-fiscalista na Administração Pública.
Novos conceitos foram introduzidos. Pregava-se a redução do tamanho do Estado, a descentralização e desconcentração dos serviços públicos, a flexibilização de controles, maior autonomia dos gestores em prol de resultados, maior abertura à sociedade civil, maior relacionamento com o chamado terceiro setor, a necessidade de novos entes gestores sob a tutela técnica e não política (p. ex. agências reguladoras) e um rígido controle das contas públicas.
Veio uma série de concepções empresariais, como a ideia do cidadão-consumidor, o princípio da eficiência em uma perspectiva mercadológica, privatizações e a crença nos mecanismos de mercado como vetores de desenvolvimento. O conceito de eficiência estava atrelado a uma noção rudimentar de Estado-empresário.
Como pano de fundo teórico, o paradigma gerencial-fiscalista se apresentava conectado à concepção de Estado-Regulador.
Em palavras ligeiras, um Estado-Regulador é aquele que ao invés atuar diretamente nas políticas públicas, gastando ele mesmo os recursos auferidos via tributação, estabelece normas e regula as atividades privadas para que elas gerem desenvolvimento a partir de condições de funcionamento eficiente, conforme ensina La Spina e Majone1.
Passados alguns anos das reformas estruturantes, cujo marco legal se revela nas emendas constitucionais n. 19 e n. 20 de 1998, inúmeras são as razões que obstacularizaram a implantação desse modelo no Brasil.
Dentre elas, pode-se mencionar a cultura política avessa ao planejamento de longo prazo e ao tratamento técnico de questões públicas até a resistência burocrática a ações orientadas pelo desempenho, especialmente em um ambiente de rigor fiscal2.
Contudo, além do plano prático relativo ao contexto brasileiro, novos desafios se impõem ao novo Estado que não podem ser relativizados: i) o advento da era digital e o incrível desenvolvimento das novas tecnologias, ii) as mudanças no mindset dos cidadãos, cada vez mais ansiosos, impacientes e (des)informados, iii) os limites internos e externos à soberania nacional, os quais impõem constrangimentos e condicionantes aos poderes estatais, cerceando o potencial de atuação centralizada do Estado3, iv) a necessidade de maior integração com a sociedade civil e atuação em rede, bem como v) a maior participação dos cidadãos na produção normativa, ante o aumento de complexidade na base social e o incremento do pluralismo nas expectativas e modos de vida.
Daí é imprescindível a adoção de uma lógica pós-burocrática radicalmente inovadora, digital e conectada com as demandas contemporâneas, um Estado enquanto centro de inteligência e governança estratégica.
Pautado por uma racionalidade pública e no interesse coletivo, não necessariamente estatal e nem mesmo empresarial, esse modelo prioriza a inteligência de análise e tratamento de dados, as evidências e os mecanismos de governança para o fim maior de concretização dos direitos fundamentais individuais e sociais por meio de políticas públicas. Seu compromisso não é com a estrutura, mas com os resultados.
No olhar proposto, as inovações de governo digital ou govtech não são apenas instrumentos a facilitar as medidas executivas. Elas adquirem forte assento no nível estratégico de decisão.
A primeira característica desse modelo é a prioridade no nível estratégico: ao lado dos mandatários eleitos, um corpo de executivos públicos de alta qualificação e bem preparados formam um conselho de governança no Poder Executivo, cuja missão é analisar dados, avaliar diagnósticos, planejar, definir atribuições táticas e operacionais, estabelecer indicadores e monitorar o cumprimento das metas a serem executadas na própria gestão pública ou por meio de parceiras com a iniciativa privada.
Assegurada a atuação direta do Estado em atividades consideradas essenciais e que demandam garantias igualmente públicas, os demais serviços públicos não necessariamente teriam execução estatal. Tampouco se submeteriam à razão mercadológica.
Para que seja possível o monitoramento na execução das políticas públicas, o controle e fiscalização dos seus agentes, a adoção de políticas de integridade (compliance) e responsabilização de agentes públicos e privados (accountability) o modelo estratégico deve se aliar ao compromisso fortemente regulador.
Regulação e monitoramento são imprescindíveis para bons resultados. Por isso, a prestação de serviços públicos de índole meramente operacional ou direta deve prestigiar a parceria com a iniciativa privada, restando ao Estado maior foco na atividade regulatória em detrimento da prestação direta e ação operacional.
Neste quesito, não há grandes novidades. A inovação é aliar essa regulação com um modelo de governança estratégia e inteligência pública ditando os rumos do futuro e que não se restringe à regulação tradicional. Ele atua também como indutor do desenvolvimento.
Superando as dicotomias da modernidade entre Estado e sociedade civil, o modelo proposto atua dialeticamente com a esfera privada, de modo a promover novos vetores de desenvolvimento a partir da síntese dessas duas forças dialogantes.
Nessa dialética supera-se a leitura desenvolvimentista clássica, que credita ao Estado o papel de motor da história, sem atribuir exclusividade à sociedade civil e aos mecanismos de mercado a missão de fomentar os avanços sociais.
O novo Estado induz, provoca, gera incentivos e estabelece punições. Indica caminhos, constrói meios em conjunto e atua com a sociedade no progresso civilizatório e na promoção dos direitos fundamentais da pessoa humana.
Por fim, esse modelo há de ser interativo: ante a insuficiência contemporânea da produção normativa puramente estatal, a governança deve interagir com os diferentes atores sociais, de modo a permitir sua participação e adotar mecanismos de construção colaborativa e compartilhada tanto no âmbito da formulação das políticas, quanto de seu arcabouço legal regulatório.
Um exemplo prático e que revela uma tendência é o Comitê Gestor de Internet composto por membros do setor empresarial, acadêmico-científico, empresarial e entidades não governamentais. Sua atribuição principal é a formulação de orientações estratégicas sobre o uso e o desenvolvimento da internet no Brasil, além de promover estudos e pesquisas sobre a temática (conferir: www.cgi.br),
Estratégico, regulador, indutor do desenvolvimento e interativo: eis um conjunto de diretrizes para se pensar o novo Estado e assim orientar as reformas administrativas em prol de resultados, a reelaboração dos marcos regulatórios e a formulação de políticas públicas baseadas em evidências.
Um Estado leve, porém forte, necessário e dotado de lógica pública não necessariamente estatal. Afinal, na Era Digital se tornou urgente que as instituições funcionem e forneçam respostas às necessidades da população, de modo a possibilitar a efetividade dos direitos fundamentais individuais e sociais, resgatar a legitimidade da política e preservar importantes postulados da democracia liberal.
Marco Aurélio Marrafon é advogado, professor de Direito e Pensamento Político na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), doutor e mestre em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), com estudos doutorais na Università degli Studi Roma Tre (Itália). É membro da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst).
1 LA SPINA, Antonio. MAJONE, GIANDOMENICO. “Lo Stato Regolatore” Bologna: IlMulino, 2000. p. 24 e ss.
2Para aprofundamento, conferir: REZENDE, Flávio da Cunha. Razões da crise de implementação do estadogerencial: desempenho versus ajuste fiscal. In: Revista de Sociologia e Política n. 19: 111-121. Curitiba: Ufpr, 2002. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/rsp/article/viewFile/3622/2879 Acesso: 07maio2020.
3 Cf. CHEVALIER, Jacques. O Estado Pós-moderno. Trad, Marçal Justen Filho. Belo Horizonte: Fórum, 2009. (Coleção Forum Brasil-França de Direito Público, n. 1). p. 38 e ss.
‘Tudo está em profunda transformação’, diz Roberto Freire na última aula da Jornada da Cidadania
Curso de formação política chega à etapa final com discussão sobre a Era Digital; alunos têm até 15 de junho para concluírem curso e receberem certificado
“Estamos no limiar de novo mundo e, portanto, não podemos imaginar que as instituições, as relações sociais entre as pessoas, o mundo do trabalho e a sociedade permaneçam como estão”, afirma o presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire, em videoaula de encerramento da Jornada da Cidadania. Realizado pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), o curso multimídia de formação política disponibiliza, nesta quarta-feira (13), o último pacote de aula na plataforma de educação a distância totalmente online, interativa e com acesso gratuito.
Os conteúdos são disponibilizados, exclusivamente, para alunos cadastrados na Jornada da Cidadania, com login e senha. Em sua videoaula, Freire explica o futuro da política e dos partidos na Era Digital, a qual, segundo ele, é alcançada por meio da revolução da inteligência artificial e da comunicação em redes. “Tudo está em profunda transformação”, afirma o presidente nacional do Cidadania. Ele cita, por exemplo, que estão mudando as relações institucionais e a própria democracia representativa.
Em seguida, o historiador Alberto Aggio, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista), analisa o governo Bolsonaro no contexto da pandemia do coronavírus. Em seguida, o diretor de Treino da empresa Ideiais Radicais, Renato Diniz, explica gestão de voluntários e o especialista em educação Rafael Parente destaca pontos importantes da educação e formação continuada.
Na última aula multimidia, os alunos também deverão assistir a um vídeo do sociólogo Manuel Castelo, em que ele aborda escola e internet no mundo de constante aprendizagem dos jovens. Além disso, também terão de ler parte do livro A sociedade em rede e ouvir o podcast em que Roberto Freire complementa a sua aula ao analisar a pandemia da Covid-19 e o futuro do Brasil, antes de responderem ao questionário e à pesquisa de satisfação.
Etapa final
Todos os alunos terão até o dia 15 de junho para concluírem o curso na plataforma de ensino a distância e receberem certificado com camiseta e caneca personalizadas da Jornada da Cidadania, no endereço cadastrado no ato da inscrição. Possíveis alterações do endereço devem ser comunicadas pelos alunos à FAP, realizadora do curso.
A Jornada da Cidadania teve início no dia 12 de fevereiro, oferecendo 36 horas de conteúdo multimídia para os internautas, ao longo de 14 semanas. O objetivo é capacitar cidadãos acerca de conteúdos relevantes da política, além de fornecer bases fundamentais para possíveis candidatos que pretendem disputar as eleições municipais deste ano.
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