Day: outubro 23, 2020

Eliane Cantanhêde: O rei sou eu

Depois de Coaf, Receita e PF, Bolsonaro vai meter a mão na Anvisa por capricho?

Luiz Henrique Mandetta foi demitido por propor o isolamento social, Nelson Teich se demitiu por não engolir a cloroquina, Eduardo Pazuello é humilhado por tentar viabilizar uma vacina em massa para o País. Estão todos errados e só o presidente Jair Bolsonaro está certo? Ou, entre a vida dos brasileiros e suas conveniências políticas, ele fica com a reeleição?

Já que os dois médicos se recusaram a fazer o jogo sujo, ele convocou o general da ativa para bater continência a tudo o que lhe vier na cachola e avisa: “Quem manda sou eu, não vou abrir mão da minha autoridade”. Pazuello concorda, pateticamente: “É simples. Um manda, o outro obedece”.

O general diz, o capitão desdiz. E o que o general faz? Abaixa a cabeça e diz que foi “mal interpretado” ao anunciar a compra de 46 milhões de doses da vacina Coronavac assim que obtivesse o registro da Anvisa. Como alguém desmente o que escreveu em ofício e disse em vídeo para mais de 20 governadores? Vergonha alheia. Forças Armadas, Exército e oficiais, o que acham dessa vassalagem inominável?

Ao desautorizar a aquisição de vacinas anunciada pelo ministro – que passou meses interino, em plena pandemia –, Bolsonaro falou em “traição” e digitou no Twitter: “NÃO SERÁ COMPRADA”. No dia seguinte, recorreu ao morde-e-assopra que usava com Sérgio Moro, Mandetta e Paulo Guedes: incorporou o personagem simpaticão e foi visitar o general, que está com covid e fez papel e cara de bobo ao ser paparicado pelo chefe.

É nessas horas que a gente vê quem é quem. Bastam uma visitinha e um sorriso programado para apagar a humilhação? Se o presidente mandar matar, torturar, se jogar do 20.º andar, arriscar a saúde de 210 milhões de brasileiros, a quem o general deve lealdade e obediência?

Mas vamos à vacina, que une Judiciário, Legislativo, governadores, prefeitos, entidades científicas, médicas, jurídicas. Com mais de 155 mil mortos e 5 milhões de contaminados, ninguém está interessado em briguinhas políticas, o que se espera do presidente é que tome a decisão certa. E se espera em vão.

As quatro vacinas em teste no Brasil precisam de duas doses, logo, serão necessárias de 300 milhões a 400 milhões doses e será preciso somar as vacinas, porque uma só não dará conta. E dane-se se uma é “do Doria”, outra “do Bolsonaro”, uma é “da China”, outra “de Oxford”. Aliás, corre nas redes: se contarem a Bolsonaro que os chineses inventaram a pólvora, será que ele proíbe as armas no País?

O presidente indicou e o Senado aprovou nesta semana o novo presidente, contra-almirante Antonio Barra Torres, e três dos quatro diretores da Anvisa. E se eles forem como o general Pazuello, que faz qualquer coisa para agradar ao presidente? Amigo de Bolsonaro e fotografado com ele numa “manifestação golpista” no início da pandemia, Barra Torres disse para o governador João Doria e repetiu depois, em entrevista, que a agência não cederá a pressões políticas e vai ser fiel à medicina e à ciência.

Que assim seja, porque se trata de milhares de vidas, da economia e dos empregos e, se a Anvisa ficar ao sabor da ignorância, dos ciúmes e dos interesses reeleitorais de Bolsonaro, aí mesmo é que a imagem do Brasil vai para o beleléu, já atingida por desmatamento, queimadas, boiadas e desmanche do Ibama e do ICMBio, sem falar no endeusamento de Donald Trump.

Como Bolsonaro não se constrangeu em meter a mão no Coaf e na Receita e está sendo até investigado pelo Supremo por ingerência política na Polícia Federal, é preciso confiar na consciência e na responsabilidade dos indicados para a Anvisa, que têm conhecimento e nomes a zelar. Na dúvida, Bolsonaro se antecipou e avisou que não comprará a vacina “da China” mesmo que a Anvisa aprovar. Aí, gente, só internando…


Míriam Leitão: Congresso subserviente

Assunto constitucional não é interna corporis, é assunto constitucional. Pode-se alterar a Constituição, mas não descumpri-la. Esse é o ponto que está em questão no esforço dos presidentes do Senado e da Câmara de permanecer no cargo. Eles torcem para que o ministro Gilmar Mendes decida que a reeleição seja uma questão interna. O problema é que se a liminar do ministro disser apenas isso há o risco de se criar o seguinte e perigoso precedente: mudar o regimento interno para alterar-se a Constituição.

O STF será usado para a realização de ambições pessoais, mais explícitas no caso do senador Davi Alcolumbre, de permanecer onde está. Alcolumbre tem feito tudo, até calar-se diante do abjeto escândalo das cuecas e preparar o forno de pizza para assim ficar bem com todo mundo.

A análise de parlamentares e de um ministro do Supremo ouvidos pela coluna é a de que o relator pode dizer que é interna corporis e isso será interpretado como licença para apenas alterar o regimento interno das Casas.

— Questão constitucional nunca será um problema interna corporis — alerta um ministro do STF.

— A Constituição é claríssima, não cabe interpretação, não é possível a reeleição. Vão pegar o termo em latim que provavelmente estará na liminar para de forma apressada fazer o rito de alteração do regimento interno. Mas se o ato interno é regido pela Constituição esse não pode ser o caminho. Se o constituinte achou por bem normatizar, só por emenda pode ser alterada — explicou um parlamentar.

O Congresso tem dado nos últimos tempos um show de subserviência, pelas mais variadas razões e interesses. Ao fazer isso, deixa de cumprir seu papel com a independência prevista na Constituição. Na sabatina do agora ministro Kassio Nunes, quase todos fugiram ao seu papel. A sabatina não é um ato de louvação, mas sim uma forma de permitir que o país conheça quem tomará decisões que influenciarão nossas vidas nos próximos anos e décadas. O advogado Kassio Nunes abriu a fala usando um termo caro aos evangélicos. Falou que sentiu essa nomeação como um “chamado”. Disse que é católico e citou a bíblia e o rezar de mãos postas. Há ministros no Supremo extremamente religiosos que não usaram o nome de Deus para dissolver resistências. Isso não é argumento num estado laico. Ensaboado, escorregou de várias questões, mas, a não ser raras e valiosas exceções, não foi sabatinado. Foi bajulado.

Esta semana passaram sem contestação no Senado os nomes de três militares para a Autoridade Nacional de Proteção dos Dados. Isso não faz sentido. Teriam que ser nomes técnicos com conhecimento suficiente e vida profissional dedicada à questão em si. Os militares não podem ser vetados por serem militares, mas não devem ter maioria nessa agência.

O Congresso aceitou todas as pressões do Planalto para adiar a análise dos vetos presidenciais para que o governo consiga arregimentar mais apoios. Um desses vetos é aguardado por inúmeras empresas para fazerem seu planejamento de 2021.

Recentemente, o relator do Orçamento, ao sair do Ministério da Economia, disse que só terminaria seu trabalho quando o ministro Paulo Guedes concordasse com tudo. Ele estava tentando criar um programa social que o governo não consegue, mas agia como se fosse do Executivo. O Orçamento passa pelo Congresso para que seja analisado, alterado, confirmado ou acrescido dentro das regras fiscais, mas a relatoria não é o ato de buscar carimbos no Ministério da Economia. O senador bolsonarista Marcio Bittar foi escolhido a dedo para seguir ordens. Ele inaugurou seu mandato no Senado assinando junto com o senador Flávio Bolsonaro uma proposta do fim do mundo: queria acabar com toda a reserva legal da Amazônia. Ou seja, pôr a floresta abaixo. Essa delirante proposta acabou arquivada mas só a assinaria quem estivesse disposto a tudo para agradar o governo.

Os poderes são harmônicos, mas independentes. Quando um se submete ao outro está traindo seu papel institucional. As negociações, os acordos, a harmonia devem existir, mas não para encobrir malfeitos de parlamentares, blindar a família do presidente, atender aos interesses continuístas. O Congresso está escolhendo ser a casa do “sim, senhor” para um presidente que tem demonstrado não entender quais são os limites do poder da presidência numa democracia. Isso torna tudo mais perigoso.


Bernardo Mello Franco: Sabujismo orgulhoso

No governo Bolsonaro, não basta ser servil. É preciso ostentar a subserviência como prova de lealdade. Ontem dois ministros se humilharam em público para agradar ao chefe. Encolheram as próprias biografias e avacalharam as pastas que deveriam comandar.

Eduardo Pazuello, dublê de paraquedista e ministro da Saúde, recebeu Bolsonaro após ser desautorizado sobre a compra de vacinas. Sem corar, ele reconheceu a falta de autonomia no cargo. “Senhores, é simples assim: um manda e o outro obedece”, explicou.

Seguiu-se um diálogo constrangedor entre o general da ativa e o capitão reformado. “A gente tem um carinho”, disse Pazuello. “Opa, tá pintando um clima”, animou-se Bolsonaro. O ministro está com Covid, mas rompeu o isolamento para gravar com o presidente. Sem máscaras, os dois voltaram a fazer propaganda da cloroquina.

Mais cedo, Bolsonaro foi ao Itamaraty. Em discurso para formandos do Instituto Rio Branco, Ernesto Araújo deu uma aula de antidiplomacia. A turma foi batizada de João Cabral de Melo Neto. “Modestamente, me considero também as duas coisas, diplomata e poeta”, arriscou o chanceler, sem modéstia alguma.

Ao microfone, o ministro se atreveu a atacar o homenageado. Disse que ele “dirigiu-se para o lado errado: para o lado do marxismo e da esquerda”. Perseguido por outros Ernestos, o autor de “Morte e vida severina” chegou a ser afastado do Itamaraty, em 1953.

“A diplomacia pode ser lírica, pode ser dramática, mas também pode ser épica”, prosseguiu o ministro, repetindo palavras do discurso nazista de Roberto Alvim. Na sequência, ele passou a elogiar Bolsonaro. “Nosso presidente conhece e ama esse povo e nos ensina a conhecer e a amar esse povo”, derramou-se.

Sem disfarçar o ressentimento, o chanceler reclamou da atenção dada a cientistas e intelectuais “prudentes e sofisticados”. Ele disse liderar uma “política externa do povo brasileiro”, inspirada nas ideias do capitão e inimiga de um imaginário “complexo marxista-isentista”.

Num breve surto de lucidez, Ernesto admitiu que o Brasil de Bolsonaro se tornou um pária na comunidade internacional. Mas não deu o braço a torcer. “Talvez seja melhor ser esse pária, deixado ao relento, do lado de fora, do que ser um conviva no banquete do cinismo interesseiro dos globalistas”, disse, orgulhoso do próprio sabujismo.


Merval Pereira: Ser pária

O resultado da eleição presidencial dos Estados Unidos pode ser fundamental para o resto do mundo, mas especialmente para países como o nosso, governado por extremistas de direita que sentem-se protegidos pela “relação carnal” com a administração Trump.

O presidente Bolsonaro ainda tem em mente a ideia de uma China comunista que quer dominar o mundo. Realmente, ela quer, como todo potência, mas com armas capitalistas, investimentos e produção, o que faz parte do jogo do capitalismo internacional. O Brasil tem que se aproveitar da sua importância geopolítica para tirar vantagens dos EUA, da China e da Europa, e não ficar entregue aos EUA, fazendo a política de Trump, que até agora não nos deu nada em vantagem.

Se Joe Biden vencer a eleição americana, vai ficar difícil dar continuidade à política externa brasileira, porque o governo democrata vai exigir contrapartidas importantes do Brasil, especialmente na política ambiental. Com essa briga com a China, corremos o risco de virarmos párias mundiais, sem aliados, se EUA e Europa se unirem e voltarem a nos pressionar na questão do meio ambiente, o que é provável com a vitória de Joe Biden.

O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, um dos pilares da visão extemporânea de mundo que rege esse governo, anunciou ontem aos formandos do Instituto Rio Branco que o Brasil está disposto a ser um ‘pária internacional’ se for pela defesa da ‘liberdade’.

Segundo ele, na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas deste ano, os presidentes Bolsonaro e Trump “foram praticamente os únicos a falar em liberdade”. Para Ernesto Araújo, a ONU “foi fundada no princípio da liberdade, mas a esqueceu”. Ele acredita que o Brasil é o porta-voz da liberdade pelo mundo, e “se isso faz de nós um pária internacional, então que sejamos esse pária”.

Para Araújo, “talvez seja melhor ser esse pária deixado ao relento, do lado de fora, do que ser um conviva no banquete do cinismo interesseiro dos globalistas, dos corruptos e semicorruptos”. Globalismo é como os direitistas mais radicais chamam a globalização, e o “banquete” seriam os organismos internacionais como a ONU ou a Organização Mundial da Saúde (OMS) que representam a ideia de um mundo multipolarizado, mas que a direita internacional critica por, nessa visão, serem controlados por uma orientação esquerdizante do mundo, que quereriam impor a todos os países.

Os organismos internacionais, comandados por pessoas que não foram eleitas, querem impor ao mundo uma visão unificada, impedindo que as nações exerçam sua soberania. Como já disse o chanceler Ernesto Araújo, o globalismo seria “a configuração atual do marxismo”.

Mesmo com essa visão estereotipada das relações internacionais, o Brasil não tem se esquivado de se aliar a ditaduras, mesmo a chinesa, para defender seus pontos de vista sobre direitos humanos no Conselho da ONU, alterando fundamentalmente a posição tradicional brasileira a respeito do tema.

Em junho, apoiou uma resolução proposta por China, Cuba, Venezuela, Irã e Síria, que acabou aprovada, reduzindo o âmbito de atuação do Conselho dos Direitos Humanos, transformando-o em um lugar de debate de cooperação, e não de monitoramento de violações dos direitos humanos no mundo.

Juntamente com essas ditaduras, o Brasil tem recebido muitas críticas com respeito à violação dos direitos humanos, sobretudo de indígenas e minorias. O Brasil também se aliou a governos autoritários como Arábia Saudita , Paquistão, Egito e Iraque sobre direitos sexuais das mulheres, propondo, entre outras coisas, retirar o tema “educação sexual” das prioridades da ONU.

Nos documentos brasileiros, não há mais referências a temas como tortura, gênero, LGBT, desigualdade, e, juntamente com a Arábia Saudita, defende o fortalecimento da família com “pai e mãe”. Os crimes do ditador Duterte, das Filipinas, cometidos na guerra às drogas, não tiveram o voto do Brasil para uma investigação. Já somos, portanto, párias em diversos setores da sociedade internacional, e não acompanhamos mais os países progressistas da Europa ou mesmo da América Latina.


Pedro Doria: Hora de voltar às garagens

A atuação das gigantes do Vale é global e engole todas as democracias

O primeiro processo de antitruste do governo americano contra o Vale do Silício foi aberto. É esperado há uns três anos. Nasceu. A empresa escolhida foi o Google — mas não todo o Google. Não entrou o sistema operacional Android. Não entrou o YouTube. Não entraram os mapas. Tampouco a ampla publicidade digital. Apenas busca. E não toda busca. Só busca de texto e suas partes — a busca propriamente dita, a propaganda que a acompanha e os serviços que vêm junto. Buscas de imagem ou vídeo ficaram de fora.

Foi conservador o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.

Ainda assim não é pouco — só começou, há muito preparado, mais virá. O último processo contra um monopólio deste vulto ocorreu há vinte anos. Foi aberto em maio de 1998 e encerrado, com um acordo entre companhia e governo, em novembro de 2001. Quando começou, a internet comercial havia acabado de nascer e a Microsoft usara todo seu poder sobre o Windows para coibir os espaços do browser Netscape. Queria dominar a web e fez uso das armas que tinha para eliminar o concorrente. Ninguém tinha aquele tipo de força. Aí a batalha legal sugou tanto a energia dos executivos da empresa que, ao final daqueles três anos e meio o bonde havia passado, uma explosão criativa ocorrera no Vale e novidades como o Google surgiram. A Microsoft não foi dividida em duas. Seu poder de dominar a internet, porém, desapareceu. Ao fim, era outra empresa.

Foi assim nos anos 1980, quando a batalha contra o monopólio da AT&T nas telecomunicações levou realmente à divisão da empresa. Da fragmentação daquele mercado nasceram possibilidades várias — entre elas, a internet comercial. Ainda antes, nos anos 1970, foi com a IBM e seu monopólio sobre a computação. Como no caso da Microsoft, a atenção dos executivos foi drenada no combate legal ao governo. E enquanto estavam distraídos brotaram empresas como Apple e, ora, a própria Microsoft com a indústria dos computadores pessoais.

A história recente da tecnologia diz que estes monopólios tendem a se formar, que se tornam anticompetitivos, e que faz bem não só ao consumidor, mas à própria diversidade do mercado, a boa aplicação da lei antitruste. Monopólios sufocam novas ideias. E, neste momento, as conversas do mundo estão concentradas. Nos sistemas que operam nossos celulares, por duas companhias. Nas redes, quase que por uma só. No comércio, também por uma. E nas buscas também.

A atuação destas gigantes do Vale é global, engole todas as democracias. Ameaça as democracias. O Google não quer ameaçar. O Facebook não quer ameaçar. Nenhuma delas o deseja. Seus melhores cérebros estão concentrados no problema. Mas não conseguem resolvê-lo. Porque o problema está no modelo de negócios que depende de sugar a total atenção, pela maior quantidade possível de tempo, e explorar os dados produzidos por cada um de nós para vender publicidade.

Nunca foi tão urgente a aplicação deste conceito tão essencialmente liberal, tão essencialmente pró-mercado, tão fundamentalmente democrático que é o antitruste. E embora estas empresas atuem globalmente, só o governo americano pode agir. Porque num mundo que em verdade já se globalizou, o limite de nossas leis ainda é nacional e aquelas são empresas americanas. O populismo nacionalista e extremista, que manipula justamente as fraquezas criadas no rastro das criações maravilhosas destes gênios do Vale, gostaria que fosse diferente.

Mas não é. Saudades de Steve Jobs. Saudades do Vale do Silício criativo. Ficou pesado, burocratizado. Este sistema de liberdade é capaz de fazer frente ao autoritarismo chinês em criatividade. Precisa só permitir às garagens que voltem a brotar férteis.


Gil Castello Branco critica esvaziamento da Lava Jato no combate à corrupção

Em entrevista exclusiva à Política Democrática Online de outubro, diretor da Contas Aberta compara caso brasileiro ao desmonte de operação italiana

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Com mais de 150 mil brasileiros mortos na pandemia do coronavírus, o Brasil está menos transparente no combate à corrupção, diz o economista Gil Castello Branco, fundador e atual diretor executivo da Associação Contas Abertas, entidade que fomenta a transparência, o acesso à informação e o controle social no país. Em entrevista exclusiva à revista Política Democrática Online de outubro, ele também afirma que o desmonte da Lava Jato no país não é muito diferente do que ocorreu com a Operação Mãos Limpas na Itália.

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A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e que disponibiliza todos os conteúdos, gratuitamente, em seu site. Entrevistado especial desta 24ª edição da Revista Política Democrática Online, Castello Branco acredita que, em meio à pandemia, a redução da transparência é ainda mais preocupante. "Já foram autorizados para o enfrentamento ao Covid-19, só na área federal, cerca de R$ 600 bilhões; na hipótese [otimista] de que 3% desses recursos venham a ser desviados, R$ 18 bilhões serão abocanhados por criminosos", avalia.

Na avaliação de Castello Branco, "é preocupante constatar que, desta vez, as acusações [de desvios] não pairam sobre um, dois, ou três partidos políticos. Não dizem respeito a um governador ou a um secretário". “A corrupção está acontecendo de uma forma horizontal, e merece ampla reflexão. A única arma de que dispomos é a transparência", completa.

Em relação ao possível esvaziamento da Lava Jato, ele a compara com a operação italiana, que, ao atingir poderosos, inclusive políticos, começou a ser fragilizada por diversos meios. “E, hoje, dizem, na Itália, que combater a corrupção depois da Mãos Limpas é mais difícil do que era anteriormente. Por quê? Porque justamente a Legislação foi sendo afrouxada de tal maneira que inviabilizou o combate mais acirrado à corrupção. E receio que isso possa acontecer aqui no Brasil, ou, pior, que já esteja acontecendo”, lamenta.

Segundo o entrevistado especial da revista Política Democrática Online de outubro, o trabalho da força tarefa foi extremamente importante para que a sociedade brasileira tivesse a impressão de que a corrupção iria diminuir no país. Pouco depois, surgiram as “10 Medidas Contra a Corrupção”, ampliadas, posteriormente, para as “70 Medidas Contra a Corrupção”, um trabalho coordenado pela Fundação Getúlio Vargas e a Transparência Internacional, que contou com a participação de quase 300 entidades, inclusive a Contas Abertas. 

Gil Castello Branco realiza, frequentemente, palestras em workshops para empresários e cursos em instituições acadêmicas e nos principais veículos brasileiros de comunicação (O Estado de S. Paulo, TV Globo, Folha de S. Paulo, Fundação Getúlio Vargas, USP, UnB, O Globo, entre outros). Foi professor visitante da Unicamp (Universidade de Campinas) e colunista mensal dos jornais O Globo, Correio Braziliense e O Estado de S. Paulo.

Atualmente Castello Branco é o professor de curso EaD "No rastro digital do dinheiro público: como fiscalizar os gastos da União, Estados e Municípios", organizado pela Knight Center for Journalism in the Americas, da Universidade do Texas, em parceria com a Contas Abertas.

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