Day: dezembro 21, 2019

How will i record a unique call

Subscriptions may be managed by the person and automobile-renewal may possibly be turned off by going to the user's Account Options following buy. How to Report a Phone Get in touch with on Your Iphone. Apple is rather rigid when it comes to what applications are authorized to do on its system, and it draws a tricky line on connect with recording.

But with a small hackery, you can record a telephone simply call from your Apple iphone. Here is how. First, Know the Nearby Laws. Before we go into how to do this, it's significant to recognize regardless of whether recording a mobile phone contact is legal. The super-brief version is if you happen to be an active participant in the contact, you've got got a fantastic likelihood that it's lawful. If you're not, it's virtually definitely unlawful.

  • How do you record a telephone job interview?
  • Could you legally record a telephone call with out the other individual determining?
  • What's the greatest software to record message or calls?
  • Exactly how do you record a Skype call on apple iphone?

The marginally for a longer period variation is that several state and federal legislation cover the topic. To further more muddy the waters, these laws also fluctuate by nation.

You will find a quite in depth checklist on Wikipedia, but as with http://callrecorder.biz all the things on Wikipedia, obtain a 2nd supply for your neighborhood legislation. Rev, a firm we will communicate about under, also has an outstanding blog site put up on the subject. It boils down to the two styles of consent: just one-social gathering and two-bash (which is a little bit of a misnomer). One particular-celebration consent implies you can history a get in touch with as long as you are on that get in touch with.

Most U. S. states, the federal statute, and most other nations need 1-bash consent. Two-bash consent signifies everyone on a phone should approve of the recording, whether or not it can be two men and women, three men and women, or a lot more. There are numerous U. S.

states and some nations around the world that call for two-get together consent. Once more-investigation your area laws. The penalty for not complying with the regulation may differ, ranging from civil to prison litigation. When in question, obviously state at the starting of a connect with that it is currently being recorded and talk to every person to affirm that this is alright. So, now that we're legal let us get to it.

There are two procedures you can use to report a cellular phone simply call on an Apple iphone: hardware or software. We are going to outline the choices for just about every underneath from the easiest to the most elaborate. The Most basic Possibility: Speakerphone and a Voice Recorder. Hardware get in touch with recording can be as simple as placing a call on speakerphone and setting a electronic recorder down upcoming to your mobile phone. The Sony Voice Recorder ICD-PX Collection is a extremely rated selection on Amazon for $sixty. It has a constructed-in bbUSB plug, MicroSD expansion, and features a lavaliere mic in situation you at any time want to record an individual experience-to-deal with. But this technique operates with any voice recorder. Just arm it to report, set your cellular phone on speakerphone, and report away.

If you by no means system to broadcast the recording and it truly is just for individual notes, this possibility is probably for you. If you need larger good quality, nevertheless, factors get a bit extra complex. The Program Alternative: Recording a Get in touch with with Rev Call Recorder. Apple will not allow apps to file a cellular phone contact on your gadget. However, there are some apps you can get that will enable you to report by using a 3-way conversation. The connect with is routed by the company's servers, where it truly is recorded. It is a crafty minimal workaround if you need something a lot more refined than a speakerphone connect with recorded on a voice recorder but really don't want to commit in specialized recording components. Rev Phone Recorder is a extremely rated connect with recording services (four. 4 stars and virtually two,000 opinions at the time of this producing).

It really is also free, but you can pay back for the optional service of owning a recording transcribed. Before we get into the course of action, however, let us discuss about the business-we reached out to Rev to converse about privateness and stability. Contact recordings are retained indefinitely until you delete them. They are saved encrypted on Rev's servers, and they have never experienced a knowledge breach (#KnockOnWood).

Digging into their privacy plan a little bit, we see that most of the company's use of your recordings revolves close to their transcription company. There are other provisions in there about compliance with legislation, small business transfers, and the like.


Roberto Simon: A América Latina em 2020

Quatro perguntas sobre os (des)caminhos da região no próximo ano

Em janeiro de 2019, a América Latina parecia outro planeta.

Mauricio Macri prometia zerar o déficit primário e retomar o crescimento argentino, com donos do dinheiro a apostar na sua reeleição. Veio Alberto Fernández.

Juan Guaidó virou “presidente interino” da Venezuela e proclamou que “o tempo de Maduro (estava) se esgotando”. Hoje, nem a oposição venezuelana acredita que a queda do ditador é iminente.

O FMI projetava um crescimento de 2,5% do Brasil, e Paulo Guedes falava em “3,5% no curto prazo”. Com reforma da Previdência e tudo, deu menos da metade da projeção do fundo.

A lista continua: Equador em convulsão, Evo Morales em fuga, Chile nas ruas rumo a uma nova Constituição, protestos na Colômbia. As bolas de cristal dos analistas —as quais, diga-se, nunca funcionaram muito bem— trincaram de vez.

Melhor, então, olhar adiante de outra forma. Em vez de projeções ambiciosas (e provavelmente erradas), podemos pensar em quatro perguntas para guiar interessados na nossa região.

1) Como a “segunda década perdida” continuará a se traduzir em instabilidade política?

À raiz da turbulência regional, está o fracasso econômico. Segundo a Cepal, o período 2014-2020 será o de menor crescimento da América Latina em 70 anos. O PIB per capita latino-americano caiu 4% em seis anos. Do México à Patagônia, a ideia de que inevitavelmente nos tornaríamos sociedades de classe média perdeu força.

Hoje, prevalece a percepção oposta —um nada-realmente-mudou-e-nunca-mudará—, com consequências políticas extremas: ondas de protesto, colapso do establishment político, ascensão de outsiders.

Esse ciclo não terminou e continuará a definir a evolução política na região em 2020.

2) O que virá nas eleições de 2020?

Não faltarão oportunidades para o mal-estar político se manifestar por meio do voto. Em janeiro, o Peru elegerá um Congresso para substituir a legislatura que o presidente Martín Vizcarra destituíra. Em março ou abril, a Bolívia refará suas eleições presidenciais, com um risco real de o resultado ser novamente contestado.

Chilenos terão um plebiscito constitucional e, a depender do resultado, escolherão uma assembleia constituinte em outubro. No mesmo mês, brasileiros terão eleições municipais —descobriremos se o bolsonarismo, com sua Aliança pelo Brasil, criará raízes no nível local. Se Maduro inviabilizar as eleições legislativas venezuelanas, marcadas para dezembro, Guaidó cairá num limbo político-jurídico (seu mandato termina no mês seguinte).

Mas a mais importante eleição para o futuro da região é a dos EUA, onde estão em jogo visões radicalmente distintas sobre o papel dos EUA no mundo.

3) O Brasil seguirá na trilha do isolamento internacional?

Imagine o seguinte cenário: a crise na Amazônia se intensifica, com investidores afugentados, uma campanha internacional de boicote e europeus discutindo sanções ao Brasil. Cresce a hostilidade entre Bolsonaro e Fernández, com graves consequências ao Mercosul. Derrotado, Trump dá lugar a um democrata progressista.

Existe um caminho claro que levará o Brasil ao isolamento. Trilhá-lo será uma escolha do governo, a depender, sobretudo, do poder que terá a ala “antiglobalista” daqui para frente.

4) Como o jogo geopolítico global afetará a região?

O ano terminou com o pré-acordo comercial entre Pequim e Washington, cujas quotas podem custar caro a economias latino-americanas (algo como US$ 10 bilhões ao Brasil, segundo o Insper).

Mas o confronto EUA-China se ampliou a duas outras frentes, além do comércio. A primeira é a tecnológica, sobretudo no campo do 5G. O Brasil considera postergar seu leilão, mas eventualmente terá de se decidir sobre a participação da China. A segunda é a financeira. Sanções contra chineses, ou restrições à plataforma Swift de comunicação interbancária, arriscarão balcanizar o sistema financeiro.

As três disputas definirão o desenvolvimento latino-americano na nova economia global.

Essa lista está longe de ser exaustiva —é apenas um começo. O mais importante: com menos certezas preconcebidas, será mais fácil entender uma América Latina em rápida transformação.

*Roberto Simon, é diretor sênior de política do Council of the Americas e mestre em políticas públicas pela Universidade Harvard e em relações internacionais pela Unesp.


Ricardo Noblat: Bolsonaro detona Bebbiano com medo de que ele conte o que sabe

Teoria da conspiração

Sem apresentar prova, sem citar diretamente o nome dele, mas dando todas as indicações que a ele se referia, Jair Bolsonaro disse em entrevista à VEJA que Gustavo Bebbiano, seu ex-ministro da Secretaria-Geral da presidência da República, é suspeito de ter participado do atentado à faca que por pouco não o matou.

“O meu sentimento é que esse atentado teve a mão de 70% da esquerda, 20% de quem estava do meu lado e 10% de outros interesses”, afirmou Bolsonaro refastelado numa poltrona do Palácio da Alvorada, de bermuda, chinelos, e com a camisa de um desconhecido time de futebol de Minas Gerais.

“Tinha uma pessoa do meu lado que queria ser vice”, prosseguiu. “O cara detonava todas as pessoas com quem eu conversava. Liguei para convidar o Mourão às 5 da manhã do dia em que terminava o prazo de inscrição da chapa. Se ele não tivesse atendido, o vice seria essa pessoa. Eu passei a valer alguns milhões deitado.”

Antes de falar com Mourão, Bolsonaro falara várias vezes com Bebbiano na noite do dia anterior. E quando Bebbiano soube que o vice seria Mourão, tentou convencer Bolsonaro a procurar outro vice. Uma chapa pura de militares não seria uma boa. Foi o próprio Bebbiano que o disse em mais de uma entrevista.

Bebbiano até poderia pretender ser vice de Bolsonaro. Á época, presidia o PSL. Era uma estrela em ascensão entre os bolsonaristas. Mas daí a sugerir que ele, mais tarde, desejasse ver Bolsonaro morto e tenha sido cúmplice da facada, vai uma distância que só a irresponsabilidade de Bolsonaro pode percorrer.

Quando nada porque a Polícia Federal e, em seguida, a Justiça, investigaram o atentado à exaustão e concluíram em três ocasiões que o pedreiro Adélio Bispo, autor da facada, agiu sozinho. Bolsonaro não se conforma com isso. E tenta enlamear o nome de Bebbiano por medo de que no futuro ele lhe crie embaraços.

O ex-ministro filiou-se ao PSDB sob o patrocínio do governador João Doria, de São Paulo, e admite ser candidato a prefeito do Rio em 2020. É um pote de mágoa de Bolsonaro até a borda. Perdeu o emprego no governo porque Carlos Bolsonaro, o Zero Dois, o detestava. Se contar o que sabe, os Bolsonaro estarão em apuros.

Sempre que se vê acuado, Bolsonaro inventa histórias, desata ataques aos seus desafetos e arranja novas brigas para desviar a atenção do que não lhe interessa. O inquérito sobre os rolos da dupla Flávio-Queiroz está cada vez mais perto dele e de sua família. É uma bomba que pode explodir a qualquer momento.


Míriam Leitão: Os fios soltos da reforma não feita

Ano chega ao fim com melhor expectativa de crescimento, mas sem que o governo tenha apresentado seu projeto de reforma tributária

A reforma tributária está cheia de fio solto, na opinião da economista Zeina Latif. Como apresentar um projeto é muito complexo técnica e politicamente, o governo vai soltando ideias esparsas, como a de que “vamos fazer a CPMF ou algo que o valha”. O economista Bráulio Borges concorda que o novo imposto falado pelo ministro Paulo Guedes é uma CPMF que não quer dizer seu nome. Ele acha que é preciso “trazer todos os elementos da reforma ao mesmo tempo”.

Entrevistei Zeina, da XP, e Braulio, da LCA e da FGV, para um balanço de fim deste 2019. Ela acha que este foi um ano curioso pelas mudanças de humor, ao longo dos meses:

— Começou, de uma forma geral, com uma expectativa muito grande em relação ao crescimento do PIB, consenso de mercado era de 2,5% de alta, muitas casas falavam em 3% e 3,5%, e que haveria uma agenda ambiciosa de reformas e muitas privatizações. Ainda no primeiro semestre as expectativas foram se adequando à dura realidade. Isso gerou um certo pessimismo, mas no segundo semestre a gente viu a economia ganhando tração.

De balanço bom do ano, segundo Zeina Latif, tem as surpresas positivas com a inflação, o efeito no mercado de crédito do longo ciclo de redução dos juros iniciado por Ilan Goldfajn:

— O que a gente percebeu foi que aos poucos esse ciclo foi avançando, as empresas foram melhorando seus indicadores e o crédito está fluindo. Está havendo uma recuperação da demanda e do consumo das famílias, e o investimento está voltando aos poucos.

Bráulio destaca que a sensação de bem-estar da sociedade é muito fraca ainda. Ele chama de “pífia” a recuperação:

— Este foi o terceiro ano de frustração grande em relação ao que se esperava. No começo de cada ano, as projeções eram de 2% a 2,5%, até 3%, mas não foi o que aconteceu. No final, ficou no 1,2%. Como em 2019. É uma sequência de frustrações. Mas estou mais otimista para 2020 porque a construção civil, que foi o grande patinho feio, caiu quase 30% nesta crise, finalmente está em recuperação. A liberação do FGTS vai explicar parte do crescimento do ano.

Braulio acha que 2020 será diferente pela soma de vários fatores. A ociosidade está muito alta, o desemprego, também, e o país pode se recuperar sem pressão inflacionária. A utilização de capacidade da indústria está em 75%. Esse será o ponto de partida, com uma taxa de inflação baixa e os estímulos da política econômica como a liberação do FGTS:

— Dá para ter certeza maior agora de um crescimento de 2% a 2,5% no ano que vem. Mas não dá para sustentar esse ritmo por cinco ou dez anos sem fazer reformas estruturais.

Os dois economistas acham que mesmo com o PIB crescendo o desemprego permanecerá alto. Bráulio fala em desemprego estrutural de 9%. Zeina Latif fala em 10,5%. Do ponto de vista social, taxas tão altas por tanto tempo são um grave problema. Zeina alerta que é preciso acelerar o crescimento:

— Não podemos crescer tão pouco. Vale lembrar que 60% da população vivem com até um salário mínimo. Precisamos acelerar o crescimento. A indústria crescendo tão pouco já é uma dica. Há capacidade ociosa, mas tem muita máquina defasada, velha. São empresas médias, com máquinas desatualizadas, segurando nas costas o custo Brasil. E isso está se refletindo na piora da balança comercial. Então não tem jeito, ou a gente acelera e é ambicioso no avanço das reformas estruturais ou vamos ter uma decepção virando a esquina.

Bráulio chama a reforma tributária de “a mãe de todas as reformas”, e o governo esta semana diz que fará apenas sugestões para uma comissão mista do Congresso.

— Falta uma proposta mais objetiva, mais clara de mostrar impactos e não simplesmente lançar ideias no ar, como disse a Zeina. Este tema nos acompanha há 20 anos. Há muitos assuntos complexos nos vários impostos. Mas é importante trazer todos esses elementos. Não pode haver uma redução de carga tributária, mas se o sistema for menos complicado já trará um enorme ganho. E é preciso discutir uma realocação de carga tributária, que gera resistência dos setores.

Como disse Zeina, as pontas soltas são porque o governo fala sobre uma parte de cada vez, quando deveria falar de como quer reformar toda a complexa estrutura de impostos do país. “Colocar num Power Point é fácil”, diz ela. O difícil é enfrentar a complexidade técnica e política de uma reforma tributária. E essa o governo ficou devendo em 2019.


Merval Pereira: Sem compostura

Presidente está acuado, pela queda da popularidade, pelas limitações que instituições democráticas lhe impõem

O presidente Jair Bolsonaro vem numa escalada de falta de compostura que beira a insanidade. O episódio de ontem, em que destratou jornalistas, demonstrando falta de educação e preconceitos, é próprio de quem se sente acuado, e de fato o presi- dente está acuado, pela queda de sua popularidade, pelas limitações que as instituições democráticas lhe impõem, pelas denúncias contra seu filho Flávio, que envolvem toda uma família ampliada que, pelas acusações do Ministério Público do Rio, vivia às custas do Erário público.

Bolsonaro anda também cercado de fantasmas, desde as alucinações de que querem vê-lo morto para tomarem-lhe a presidência, até o impeachment político. O delírio persecutório que revela assiduamente pode fazer parte de uma personalidade paranoica, agravado pelo atentado contra sua vida, bastante real.

Mas o impeachment já está colocado e, como é um instrumento sobretudo político, será acionado, ou não, quando as forças políticas no Congresso desejarem. Motivos Bolsonaro já deu de sobra, e a falta de decoro de ontem é apenas mais uma, e não será a última.

A investigação contra o senador Flávio Bolsonaro certamente está abalando a já desequilibrada personalidade do presidente, embora a punição dificilmente acontecerá em razão direta das denúncias do Ministério Público. Mas podem atingir o presi- dente no correr das investigações.

O próprio Bolsonaro, demonstrando o quanto o assunto o incomoda, já disse que surgirão diálogos que sugerirão que ele tem ligações com milicianos do Rio de Janeiro. O ex-ministro Bebianno, acusado indiretamente por Bolsonaro de desejar ser seu vice para substituí-lo em caso de morte, disse claramente que as ligações de Bolsonaro com milicianos serão demonstradas nas investigações.

A punição ao senador Flávio Bolsonaro, se houver, não virá através do Congresso. O presidente do Senado, David Alcolumbre, já disse que nenhuma denúncia poderá ser analisada no Conselho de Ética porque, se algo aconteceu, foi quando Flávio era deputado estadual.

Uma possível condenação vai depender de denúncia do Ministério Público, com argumentos muito fortes, para convencer o Senado a permitir a punição, mas acho que essa autorização não será dada. No entanto, politicamente a situação é muito ruim para a família Bolsonaro, e essa investigação ainda vai bater em situações delicadas, apesar de, concretamente, ser difícil condenar o senador Flávio Bolsonaro — a não ser que a coisa evolua de tal maneira que se chegue a uma situação de impeachment.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse que Bolsonaro não tem motivos para se preocupar com um processo de impeachment, mas sobre outro assunto. O presidente passou dias sugerindo que vetará a proposta de fundo eleitoral de R$ 2 bilhões aprovado pelo Congresso para a campanha municipal do próximo ano.

Fez até uma enquete populista com apoiadores na porta do Alvorada, perguntando, como se fosse um animador de auditório, quem achava que devia vetar o projeto. Foi aplaudido quando disse que não aprovaria dinheiro para fazerem campanha eleitoral. Jogou o Congresso contra a opinião pública quando disse, numa comparação absurda, que com uma verba dessas, o ministro da Infraestrutura faria várias obras necessárias para o país. Em uma live nas redes sociais, Bolsonaro depois disse que aguardava parecer jurídico para saber se poderia vetar o Fundão Eleitoral, com receio de sofrer um impeachment como retaliação política.

Mais uma tentativa de jogar seus seguidores contra o Congresso. A relação com os parlamentares, que havia entrado em módulo de pacificação, voltou a ficar conturbada. A simples ameaça de vetar o Fundo Eleitoral acirrou os ânimos no Congresso, que promete derrubar o veto — inclusive porque a proposta de R$ 2 bilhões veio no Orçamento enviado pelo Palácio do Planalto.

Os problemas da família Bolsonaro com a Justiça, porém, servirão certamente de instrumento para tentativas de constranger o Palácio do Planalto. E isso não é paranoia do presidente, é apenas a baixa política, que sempre foi o terreno das manobras de Bolsonaro.


Lilia Lustosa analisa obra de um dos maiores cineastas do país na revista Política Democrática de dezembro

Crítica de cinema aborda longametragem Terra em Trase, do diretor baiano Glauber Rocha

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

“Terra em Transe é o terceiro longa metragem de Glauber Rocha (1939-1981), um dos maiores cineastas que o Brasil já teve, considerado louco por muitos, gênio ou visionário por outros, e até ‘profeta alado’ pelo grande historiador e crítico de cinema Paulo Emilio Sales Gomes”. A análise é da doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL) Lilia Lustosa, em artigo que ela produziu para a revista Política Democrática online de dezembro.

» Acesse aqui a 14ª edição da revista Política Democrática online

Realizado em 1967, o filme gerou enorme polêmica à época de seu lançamento, desagradando em cheio a gregos e troianos, conforme escreve Lilia. “Em um contexto de guerra fria, a direita acusava-o de fazer ‘propaganda subliminar marxista’, incitando a luta de classes; a esquerda o considerava ‘fascista’, já que se via representada na tela como populista e demagoga”, afirma ela.

De acordo com a especialista em crítica de cinema, a única unanimidade em torno do filme era a de que se tratava de uma obra confusa, hermética, praticamente impossível de se entender, um “texto chinês de cabeça para baixo”, como escreveu o direitista Nelson Rodrigues no Correio da Manhã. “Mas o que não se sabia na época é que toda essa confusão havia sido planejada - ou, ao menos almejada - por Glauber, que queria, de fato, que seu filme tivesse o efeito de uma bomba, atirando faíscas para todos os lados”, diz Lilia.

Não por acaso, segundo a análise publicada na revista Política Democrática online, o formato escolhido por ele foi o da alegoria, figura de linguagem/retórica que permite múltiplas interpretações. “Em Terra em Transe, ele já não falava mais de Brasil, não precisando, portanto, temer nem a censura nem os militares. O Golpe acontece em Eldorado, ‘país interno atlântico’, que poderia ser qualquer país da América Latina, até o Brasil!

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Demétrio Magnoli: A esquerda que elege a direita

Não por acaso, Trump acalenta o mesmo sonho dos ativistas americanos de esquerda

Boris Johnson obteve maioria absoluta no Parlamento britânico, mas a votação dos conservadores aumentou em apenas 1,2 ponto percentual. Na raiz do triunfo, encontra-se o colapso da oposição trabalhista, que perdeu 7,8 pontos percentuais. A abstenção saltou de 22%, em 2017, para 33%, agora. Os eleitores descontentes ficaram em casa, para não votar em Jeremy Corbyn. A esquerda elegeu a direita.

Há pouco, participei de uma conferência internacional no Marrocos. Num dos painéis, dedicado à crise das democracias, uma jovem expositora, líder de uma ONG indiana, foi indagada sobre as iniciativas do governo de Narendra Modi. Ela circundou a pergunta, optando por um discurso ensaiado. Mencionou estatísticas acerca das carências da população jovem do mundo e, quase aos gritos, proferiu sucessivas exigências iniciadas sempre pela frase “Nós temos o direito” —a isso, aquilo e aquilo outro.

O “nós” da expositora significava “nós, jovens do mundo todo”. Ninguém a elegeu como representante, mas ela pratica o discurso identitário, esporte da moda. A reivindicação de direitos pertence à tradição democrática moderna, responsável pela progressiva ampliação dos direitos políticos e sociais.

Contudo, sua autoproclamada representatividade pertence a uma gramática autoritária pós-moderna. Justamente por exibir-se como porta-voz de uma vasta e heterogênea parcela da humanidade, a jovem não aceita inscrever suas reivindicações no campo das complexas transações políticas da democracia. Os berros da esquerda elegem a direita.

A revista Time nomeou Greta Thunberg personalidade do ano. A adolescente sueca acredita na ciência, ao contrário dos negacionistas que governam os EUA e o Brasil. Porém, como a jovem indiana, despreza a política, classificando tudo que fique aquém das exigências máximas do movimento ambientalista como “palavras vazias”.

Nos EUA, Trump aposta sua reeleição no “país profundo” do carvão e do petróleo. Na França, Macron tentou estabelecer uma taxa verde sobre os combustíveis fósseis, mas teve que recuar diante da pressão dos coletes amarelos. Na COP-25, não se obteve nem um acordo sobre o mercado de carbono. Greta fala só para convertidos.

Corbyn anunciou a “Revolução Industrial Verde” do Partido Trabalhista num encontro com Greta. O líder britânico joga em diversas posições. Anos atrás, enaltecia Hugo Chávez e flertava com a versão esquerdista do antissemitismo. Seu manifesto eleitoral radical, junto com suas ambiguidades sobre o brexit, provocou a maior derrota trabalhista desde 1935.

Os trabalhistas ganharam a adesão entusiasta da juventude urbana de classe média, mas romperam o diálogo com a massa de eleitores que rejeitam a velha fórmula econômica estatizante. A esquerda dura e pura elegeu um governo nacionalista, xenófobo e antieuropeu.

A esquerda americana inspira-se nos conceitos de Corbyn e no método discursivo de Greta. Os pretendentes democratas Bernie Sanders e Elizabeth Warren recusam a ideia de reforma imigratória, em nome da descriminalização da imigração ilegal e da abolição da agência nacional imigratória.

Também querem educação superior gratuita para todos e a anulação universal das dívidas de créditos estudantis. A deputada Ocasio-Cortez, ícone da ala esquerdista, rotulou a proposta de expansão dos subsídios educacionais apenas para os menos ricos, formulada pelos pré-candidatos moderados, como “conversa fiada republicana”.

A catástrofe trabalhista britânica não abalou os ativistas americanos. Presos às bolhas das suas redes sociais, eles engajaram-se na missão de torpedear os candidatos democratas capazes de conversar com os eleitores do Cinturão da Ferrugem que derrotaram Hillary Clinton em 2016. Sua chapa dos sonhos é Sanders/Warren, os heróis tribais dos campi universitários. Trump, não por acaso, acalenta o mesmo sonho.

*Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.


Guilherme Amado: O ano de Rodrigo Maia

“O Brasil havia eleito um presidente que abdicara de ao menos tentar ter relação com o Congresso. Foi aí que nasceu o Maia parlamentarista”

Boa parte das investidas com tintas autoritárias de Jair Bolsonaro em seu primeiro ano foi esvaziada pelo sistema de freios e contrapesos que o Brasil construiu em seus 34 anos de democracia. Ora com mais, ora com menos sucesso, o Judiciário, a imprensa, a sociedade civil, o Ministério Público e até o Tribunal de Contas atuaram como saudáveis amortecedores para quem, em muitos momentos, atuou “no limite” — palavras do próprio Bolsonaro ao publicar a primeira leva de decretos pró-armas. Mas este foi um ano em que o Congresso, sobretudo, teve papel medular para amenizar o desmonte institucional que Bolsonaro tentou levar a cabo. Embora o presidente do Senado seja constitucionalmente o chefe do Legislativo, na prática esse papel foi desempenhado por Rodrigo Maia. O presidente da Câmara voou em 2019.

Foi quase sempre o primeiro a se pronunciar — quando não o único — diante de despautérios da base bolsonarista, como os flertes golpistas de um filho e um par de ministros. Conduziu a aprovação da necessária reforma da Previdência. Articulou a derrubada de atropelos legais de Bolsonaro e teve de fazer até a vez de chanceler. Com a roupa de primeiro-ministro, porém, também vieram as responsabilidades. E não houve só acertos no ano Maia.

Desde janeiro, foi ganhando forma o que seria o governo do capitão, com sua notável inabilidade para a articulação com o parlamento, o que gerou um vácuo sem precedentes na história recente da República.

Ele tomou para si a articulação das reformas e boa parte da agenda econômica de Paulo Guedes, lidando com o temperamento difícil do ministro da Economia e muitas vezes se dirigindo diretamente a outros integrantes da equipe econômica. Garantiu a aprovação do pacote anticrime, ainda que no fim do ano, e buscou preencher buracos deixados pelo Executivo, como a falta de uma agenda de políticas públicas num país assolado também por uma crise social.

Enquanto Jair Bolsonaro dispara contra outros países e mira até a ONU, Maia tem tentado limpar a barra. Em tom oposto ao beligerante capitão, visitou da Suíça ao Azerbaijão, passando por Estados Unidos, Líbano e Inglaterra, entre outros. Uma ação desastrosa do presidente levava a uma reação diplomática de Maia. Bolsonaro criticou o presidente argentino e ameaçou ignorar sua posse? Maia foi até Fernández para sentar e conversar. Bolsonaro fez pouco caso das queimadas na Amazônia e acusou os países europeus de interesses escusos? Maia foi à Europa para remendar o estrago. Bolsonaro atacou a ONU? Maia voou à Suíça para tratar com os organismos da entidade, inclusive de direitos humanos.

A última viagem mostrou sua importância nesse papel. Na sexta-feira 13, reuniu-se em Genebra com Michelle Bachelet, a alta comissária de Direitos Humanos da ONU, atacada pelo sempre diplomático Bolsonaro em diferentes situações. Nascido no Chile durante o exílio de seu pai, Cesar Maia, o presidente da Câmara tem muito em comum com Bachelet, cujo pai foi torturado e morto pela ditadura de Augusto Pinochet. Mais uma vez ocupando o vácuo deixado pelo governo, ele propôs à alta comissária a criação de um observatório parlamentar junto à ONU para acompanhar violações no Brasil.

Na mesma viagem, ouviu do presidente irlandês, Michael Daniel Higgins, um desabafo: ele, aos 78 anos, depois de inúmeras assembleias-gerais da ONU, surpreendera-se com o discurso de Bolsonaro nos Debates Gerais, em setembro. “Nunca pensei que fosse a uma assembleia da ONU para ser ofendido daquela maneira”, disse a Maia.

Essas posturas fazem parecer que Maia cumpre uma agenda de oposição a Bolsonaro. Afinal, por que o interesse em se contrapor ao presidente em tantos temas? Maia, ainda por cima, topou instalar duas CPIs que podem trazer problemas para o governo: a das Fake News, mista com o Senado, e a do Óleo, para investigar o vazamento no Nordeste e a lenta ação do governo para reagir à crise. Mas acreditar que ele é um opositor é um erro.

Maia tem um agenda própria e tem usado a cadeira para tocá-la. Deixa andar aquilo com que concorda — a agenda ultraliberal de Paulo Guedes, por exemplo — e freia os temas de que discorda, a exemplo das mudanças irresponsáveis na legislação sobre armas e os excessos do pacote anticrime.

O comportamento faz seus críticos o acusarem de estar confundindo o papel de presidente da Câmara com o de líder político. “Ele tem um discurso de que a direita e a esquerda são extremos e que o centro é o melhor, por ser capaz de aproveitar o melhor de cada lado. Mas o parlamento tem de dar espaço a todas as formas de pensar, e o presidente da Câmara não deve deixar andar apenas as matérias com que concorda. A pauta que ele está colocando para o parlamento é a pauta que ele acha boa. Isso não é democrático”, reclamou uma das principais lideranças da Casa.

Maia também é criticado por, em quatro anos na presidência da Câmara, ainda não ter conseguido fazer reformas administrativas na Casa. O inchaço contrasta com o discurso de austeridade pregado. Até dezembro, a Câmara já tinha custado mais de R$ 5 bilhões aos cofres públicos — em grande parte por causa de salários incompatíveis com a realidade do país.

Maia conseguiu um raro consenso entre esquerda e direita. O comunista Orlando Silva, seu amigo há anos, se derrete de maneira superlativa: “É um dos maiores políticos da história, o estabilizador da República”. Começa a trocar mensagens com os deputados em geral às 6 horas e vai quase todos os dias até depois das 23 horas. Mas é o centrão que está sempre na residência oficial, nos cafés da manhã de fim de semana ou nos jantares em dias úteis. A proximidade excessiva também gera críticas. “O centrão tem de ser como um judô. Você não pode ficar muito colado. Você tem de usá-lo”, ensinou um aliado.

Falar com os dois lados foi uma capacidade que Maia afiou já na primeira campanha pela presidência da Câmara, quando foi eleito a um mandato-tampão para suceder a Eduardo Cunha. No discurso de posse, fez uma menção elogiosa a José Genoíno. “Rodrigo tem caráter e cumpre palavra, o que, não querendo desmerecer meus pares, é algo raro”, disse um dos deputados mais próximos a Maia.

Além de cumprir sua palavra, Maia carrega também o traço da passionalidade. Chora com facilidade. Num levantamento recente, ÉPOCA contou pelo menos 11 vezes em que foi às lágrimas publicamente nos últimos três anos. Chorou até elogiando Eduardo Cunha na votação do impeachment de Dilma Rousseff. Reações mais quentes também são comuns, embora raramente públicas. Em 2019, boa parte dessa irritação foi causada por Carlos Bolsonaro e pelos ataques de sua tropa digital, que, se houver um terremoto no Japão, encontrará uma maneira de culpar Maia. Do gordofóbico Nhonho, como fazem com Joice Hasselmann, a Botafogo, alusão a seu suposto apelido na planilha da Odebrecht, Maia é achincalhado todo dia. Boa parte desses ataques foi iniciada e incentivada por Carlos.

O momento mais difícil na relação com Bolsonaro em 2019 foi em março, no dia em que o ex-ministro Moreira Franco, casado com a sogra de Maia, foi preso. O incendiário Carlos Bolsonaro correu para o Twitter e insinuou que o presidente da Câmara freava, com segundas intenções, a tramitação do pacote anticrime de Sergio Moro. Maia ameaçou abandonar as articulações da reforma da Previdência, que naquele momento já era deixada de lado pelo governo, e conseguiu um cessar-fogo temporário dos bolsonaristas. “Não uso as redes sociais para atacar ninguém”, disse. Todo mundo entendeu. Naquela semana, ficou irado e chegou a pensar em romper com a gestão Bolsonaro.

Maia tem uma visão mais negativa do governo do que a maioria do DEM e do centrão. Não gosta da família Bolsonaro, com exceção de Flávio, e, quando assume o Planalto no lugar do presidente e de Hamilton Mourão, não despacha do palácio, como sempre fez no período Temer. Diz que a energia atual do Planalto, com Bolsonaro, é “muito negativa”.

Por falar em energia, a coluna deseja um 2020 só de boas notícias. Assunto não vai faltar e, por isso, embora na versão impressa só estejamos de volta em janeiro, o site continuará a todo vapor, sem parar nenhum dia.
Postado por Gilvan Cavalcanti de Melo às 08:18:00


Monica de Bolle: Freiheit!

Já neste fim de década, “liberdade” é palavra perigosa, tempos de intolerância, de conservadorismo extremado, de nacionalismo escancarado, de injustiça

No dia 25 de dezembro de 1989, há quase 30 anos, Berlim recebeu Schiller, Beethoven e Leonard Bernstein. O “Concerto pela Liberdade” marcou não apenas a queda do Muro de Berlim, mas a inauguração de uma nova era. Para a Alemanha, tinha início a união, com a demolição do muro que dividira o país após a Segunda Guerra Mundial. Para o mundo, a sinfonia sublime de Beethoven seria o hino da União Europeia. O novo tempo tinha início, assim, com Beethoven, o compositor que soube como ninguém revelar a beleza que a humanidade é capaz de produzir, e a contribuição do magnífico Bernstein ao introduzir no poema de Schiller uma singela e brilhante mudança: a substituição da palavra “alegria” pela palavra “liberdade”. Já neste fim de década, “liberdade” é palavra perigosa, tempos de intolerância, de conservadorismo extremado, de nacionalismo escancarado, de injustiça.

Em 1989 Bernstein ofereceu a liberdade ao mundo no poema de Schiller, unindo todos os povos com a celebração de sua inescapável humanidade. Quem não quer liberdade? Liberdade para criar, para se expressar, mas, sobretudo, para garantir a justiça. Não há liberdade onde uma parte da população é oprimida ou impedida de ter as mesmas oportunidades, os mesmos direitos e o mesmo respeito que têm os demais. Não há liberdade onde há injustiça.

Sociedades muito desiguais não são justas, portanto, não são livres. O Brasil é profundamente desigual e inequivocamente iliberal — e isso só é novidade para quem nunca pôs o país diante do espelho, olhou e fez as perguntas difíceis. Como defender um fiscalismo qualquer em nome do “liberalismo” sem tratar das consequências que essas medidas podem ter no aprofundamento da desigualdade? Como ter a ousadia de falar em “volta da confiança com as reformas para retomar o crescimento” quando há dezenas de milhões de desempregados e subempregados no país? Sem contar, é claro, que só fizemos uma reforma nestes quase 12 meses de governo.

Como dar tanta atenção ao mercado quando estamos perdendo mais uma geração para o analfabetismo funcional em matemática, ciências e, claro, leitura? Como deixar escorrer pelas costas de uma sociedade multiétnica as persistentes discriminações de gênero, de raça, de classe social? Se há algo que o Brasil deveria ter aprendido com seus fracassos é que dogmas não respondem a essas perguntas. O modelo formal e rigoroso — modelinho bacana — aprendido na faculdade de economia não responde a essas perguntas. Os arroubos em mídias sociais tampouco. As respostas prontas não respondem a essas perguntas.

O mundo está de pernas para o ar. Perdemos referências que pareciam bem estabelecidas e que foram celebradas no Portão de Brandemburgo naquele Natal de 1989. É certo que àquela altura o entusiasmo com o liberalismo também era cego, mas tal perda de referências não é licença para fazer o que bem se entende — isso a liberdade não permite, já que está entrelaçada com a justiça, a igualdade de todos na aspiração a uma vida livre e o dever de respeitar espaços e modos de vida alheios.

A perda de referências também não é razão para o desespero ou para o niilismo. Não é a primeira vez que a humanidade vê ruir suas referências. A perda de referências é, antes, uma oportunidade. Oportunidade para pensar e debater como entendemos a desigualdade, em que medida os governos são capazes de atenuá-la e se basta pensarmos apenas nessa dimensão daquilo que é um imenso problema nacional e global.

Desigualdade é a disparidade de acesso às oportunidades no ponto de partida. Reduzindo-a a alguns itens do Índice de Desenvolvimento Humano, a desigualdade passa pelo acesso à educação de qualidade, à saúde, ao saneamento, a um emprego que garanta um salário digno. Mas, ainda que resolvidos os problemas do ponto de partida, há muros. Há muros que impedem a mobilidade social por preconceitos, por exemplo. Entre os maiores problemas que o mundo e o Brasil enfrentam nesta virada de década não figura apenas a simples existência desses muros, mas a vontade política, a vontade popular, de torná-los mais sólidos e resistentes. Ou de erguê-los onde haviam deixado de existir — no Canal da Mancha, por exemplo.

Neste mundo em que sobem as barreiras, neste Brasil em que as cabeças se fecham e o campo visual se estreita, há muita necessidade de resgatar a liberdade concebida por Schiller, Beethoven e Bernstein naquele dezembro simplesmente formidável e inesquecível.

*Monica de Bolle é Pesquisadora Sênior do Peterson Institute for International Economics e professora da Universidade Johns Hopkins