uber

Pedro Doria: O trabalho de hoje, a política de ontem

Na última sexta-feira, a Suprema Corte do Reino Unido decidiu que o Uber deve tratar seus motoristas como funcionários. Ou seja: direitos trabalhistas. A decisão abrange Inglaterra, Escócia, Gales e Irlanda do Norte. E é final, não cabe recurso. A Suprema Corte francesa já havia tomado decisão semelhante, assim como a da Espanha. Um processo do tipo está em curso no Canadá e em diversos estados americanos. Evidentemente que nova legislação pode reverter esse curso — mas esta é uma das mais relevantes discussões em curso no mundo atualmente. Uma discussão ausente no Brasil.

Este é um dos grandes custos que o bolsonarismo impõe ao Brasil. O país se perde em discussões irrelevantes a cada crise vazia — e crise nova há, muitas vezes parece, dia sim, dia não. O Brasil se perde, também, em debates que nem sequer deveriam existir — como o da defesa do meio ambiente, o do armamentismo desenfreado ou, pasme, até o da manutenção da democracia. Enquanto isso, lá fora, o século 21 corre solto impondo suas transformações.

A questão no centro da decisão da Justiça britânica não tem a ver com o Uber. Tem a ver com a reinvenção do trabalho. Não é um debate simples.

O Uber argumenta aquilo que a maioria dos aplicativos do tipo dizem. Ele oferece uma tecnologia que permite a pequenos empreendedores que encontrem com mais facilidade seus clientes. Une duas pontas. Isso é verdade. Assim como é verdade que, diferentemente de uma relação normal de trabalho, os motoristas trabalham quando querem.

Os motoristas que foram à Justiça, porém, chamam atenção para outros pontos. É o Uber que dita o preço da corrida, é ele que coleta o dinheiro, pune motoristas que recusam chamadas e impõe um sistema de notas, que pode custar a quem dirige a expulsão da plataforma. Um empreendedor, por meio de seu engenho, tem oportunidades de crescer. O motorista ganhará sempre o mesmo que os outros, e seu maior esforço tem, na vida real, uma única premiação. Poder continuar trabalhando. E não é pouco: em geral, esses apps escravizam quem precisa manter uma renda digna.

A Justiça britânica então decidiu que o Uber terá de garantir um salário mínimo por hora trabalhada — e a hora trabalhada vale quando o motorista liga o app. Dá direito também a não trabalhar quando se está doente, a férias e plano de previdência. O Uber responde que, em momentos de ociosidade, quando há mais motoristas do que passageiros, se verá obrigado a impedir muitos de acessar a plataforma. Se não, o negócio se tornará inviável.

A discussão é de uma complexidade imensa por muitos motivos. O principal é o seguinte: os carros autônomos já existem. Ainda antes de 2030, não haverá mais motoristas. O mesmo vale para os apps de entrega e tantos outros. O processo de automação de muitos desses serviços apenas começou e está para ser acelerado.

A lógica dos direitos trabalhistas que temos hoje depende de uma sociedade industrial em que grandes empresas contratam massas de pessoas para produzir. Na economia digital, grandes empresas contratam uma fração de pessoas. A força dos grandes sindicatos só vai diminuir, pois cada vez mais o trabalho será mais fragmentado e distribuído. Aquele Estado de bem-estar social não é mais sustentável. Tem de ser pensado outro.

laissez-faire não é a solução. O que aconteceu nas décadas de 1920 e 30 no mundo, com a ascensão de governos autoritários e totalitários foi justamente fruto de uma crise de emprego que levou gente em desespero a virar as costas para a democracia liberal. Não é à toa que estamos vivendo uma versão daquilo.

O Estado tem de ser reinventado, assim como empresas e sociedade. No Brasil, claro, estamos ainda discutindo o papel social de uma petroleira estatal.


Para entender em meia hora a polêmica dos taxistas contra o Uber

Em mais uma de suas matérias especiais, o #ProgramaDiferente, da TVFAP.net, mostra os dois lados da polêmica entre taxistas e o aplicativo de transporte Uber. Assista aqui uma série de depoimentos e entrevistas com argumentos contra e a favor, para entender o que está em jogo e quais são os interesses explícitos e implícitos nesta disputa travada no mundo inteiro.

Nesta quarta-feira, 9 de setembro, a Câmara Municipal de São Paulo deve aprovar em segunda e definitiva votação o projeto de lei que proíbe o aplicativo na cidade. São esperados milhares de taxistas mobilizados para pressionar os 55 vereadores paulistanos. Se aprovado, como tudo indica, seguirá para sanção ou veto do prefeito Fernando Haddad (PT).

O assunto polêmico vem causando um debate acirrado e por vezes violento, que expõe a dificuldade do poder público em lidar com avanços tecnológicos e a incapacidade de resolver o problema da mobilidade urbana e do transporte de passageiros.

Parte 1 - Entrevista com os vereadores paulistanos Ricardo Young (PPS), Adilson Amadeu (PTB) e Salomão Pereira (PSDB); além do porta-voz da Uber no Brasil, Fabio Sabba; do presidente da Easy Taxi, Dennis Wang; do presidente do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores nas Empresas de Táxi de São Paulo, Antonio Raimundo Matias dos Santos, conhecido como Ceará; e do presidente do Sindicato dos Taxistas Autônomos, o ex-vereadorNatalício Bezerra.

Parte 2 - Audiência pública realizada na Câmara Municipal de São Paulo, com diversos pronunciamentos, entre eles o do vereador de Guarulhos e presidente da Associação Brasileira das Associações e Cooperativas de Motoristas de Táxi, Edmilson Americano; do presidente da Uber no Brasil, Daniel Mangabeira; e do vereador paulistano Police Neto (PSD).

Parte 3 - O desentendimento entre os vereadores Ricardo Young (PPS) e Adilson Amadeu (PTB), com o pronunciamento de ambos em plenário, a reação exaltada da plateia de taxistas e uma palavra final do vereadorClaudio Fonseca (PPS) e dos representantes da Uber.