TCU

Vera Magalhães: Improviso institucional trava o Brasil

TCU e STF mostram que podem aceitar gambiarras, o Congresso e o Executivo vão exagerando na dose

Vera Magalhães / O Globo

O Brasil está travado institucionalmente por doses cavalares de improviso e casuísmo que foram sendo tolerados nos últimos três anos e culminaram num cenário em que não há previsibilidade alguma nos campos jurídico, político, fiscal e econômico.

O responsável pelo império da incerteza é Jair Bolsonaro, claro, mas os demais Poderes, o Ministério Público, o mercado e o Tribunal de Contas da União (TCU) são alguns dos cúmplices.

Bolsonaro não tinha maioria. Achava que obteria apoio parlamentar colocando sua turba das redes sociais para acossar o Congresso. Obviamente, não funcionou.

Mudou de método e decidiu comprar uma base parlamentar à custa de orçamento secreto. Vinha funcionando, até o Supremo Tribunal Federal (STF) mandar acabar com a brincadeira.

Agora, diante do impasse institucional, os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira, resolvem se unir para salvaguardar o caráter sorrateiro das emendas do relator e preservar seus comandados da luz do dia. Resultado: anunciam que descumprirão decisão judicial! E marcam sessão do Congresso numa sexta-feira para tornar a desobediência oficial!

Quais os caminhos possíveis a partir daí? Pacheco pode usar sua voz aveludada para tentar convencer Rosa Weber de que não está afrontando a decisão tomada pelo plenário da mais alta Corte do país. Mas ela não acreditará. Quanto mais se pode esticar uma corda dessas sem profundas consequências para o ordenamento democrático?

Da mesma forma, com o fim desastroso do Bolsa Família, criou-se um vácuo jurídico e fiscal em que o Auxílio Brasil existe de forma anômala: no papel, mas sem uma receita permanente que o assegure.


Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: SCO/STF
Plenário do STF. Foto: SCO/STF
Ministro Alexandre de Moraes. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: SCO/STF
Ministra Rosa Weber. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Alexandre de Moraes. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
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Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: SCO/STF
Plenário do STF. Foto: SCO/STF
Ministro Alexandre de Moraes. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Plenário do STF. Foto: SCO/STF
Ministra Rosa Weber. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF
Ministro Alexandre de Moraes. Foto: Nelson Jr/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
Supremo Tribunal Federal. Foto: Felippe Sampaio/SCO/STF
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A partir daí, vale tentar uma sucessão de cavalos de pau legislativos, fiscais e até na lógica mais primária. Mas é o tal “se colar, colou”. Como o TCU e o STF já deram mostras de que podem aceitar gambiarras, o Congresso e o Executivo vão exagerando na dose das que propõem.

Além da revogação do teto de gastos e do calote nos precatórios, a atual versão da PEC acaba por rasgar também a Lei de Responsabilidade Fiscal.

A dificuldade em passar esse trambolho pelo Senado, apesar de tantos absurdos, acaba sendo mais resultado de questões políticas que de uma genuína preocupação dos senadores com o futuro das contas públicas, o ambiente de investimentos no Brasil transformado em Casa da Mãe Joana ou o que ficará de papagaio para o próximo governo.

O que está pegando, no fundo, são as artimanhas de Davi Alcolumbre para deixar de aprovar André Mendonça para o STF, a disputa interna por uma vaga no TCU, a pretensão eleitoral de Pacheco e outras tantas questões típicas de Câmara de Vereadores, e não do Senado Federal.

De forma silenciosa, e nem sempre linear, acaba acontecendo a bolsonarização de todas as instituições. Com um presidente que avacalha todos os ritos, que gasta os dias em papo furado com apoiadores, solenidades da importância da chegada do Papai Noel e viagens desprovidas de estratégia comercial ou diplomática, tudo vai sendo rebaixado.

As relações entre os Poderes hoje se assemelham a novelas de baixo orçamento de emissoras com traço de audiência. Quando seria tolerável que, depois de anunciar que não cumprirá uma decisão judicial, o presidente do Senado pedisse uma audiência com uma ministra do Supremo para tentar levá-la no papo?

O Brasil está, com tanto improviso coordenado, contratando um ano eleitoral em que não se tem a mínima ideia de qual será a cara do Orçamento. Como e onde se vai gastar?

O que será feito de concreto, e não mero chute grotesco, para conter a inflação galopante, para tentar gerar empregos e para fazer com que o país volte a ser, se não atraente, ao menos minimamente confiável aos olhos de governos parceiros e investidores privados?

A julgar pelos passos claudicantes das nossas instituições, absolutamente nada. Vamos assim, na base de patéticas tentativas e sucessivos erros.

Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/vera-magalhaes/post/improviso-institucional-trava-o-brasil.html


TCU decidirá se abrirá processo sobre orçamento secreto

No Tribunal de Contas da União (TCU), há, pelo menos, seis a sete processos tratando do tema

Rosana Hessel / Correio Braziliense

Não é apenas o Supremo Tribunal Federal (STF) que está de olho nas polêmicas emendas do relator-geral, as chamadas RP9, que estão no centro das denúncias do "orçamento secreto" e são moeda de troca para a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, prevista para hoje (9/11).

No Tribunal de Contas da União (TCU), há, pelo menos, seis a sete processos tratando dessas emendas do Orçamento de 2021, de acordo com o procurador do Ministério Público no TCU Júlio Marcelo de Oliveira. Ele investigou a ação que trata sobre a compra de tratores superfaturados pelo Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) e contou que está tudo fragmentado.

No relatório que o procurador preparou sobre as compras do MDR, ele constatou sobrepreço de 13,8% a 63,1% sobre os valores de referência no pregão de compra de motoniveladoras e escavadeiras hidráulicas para os estados do Amapá, Goiás, Bahia e Alagoas.

Oliveira recomendou uma medida cautelar para interromper o edital e suspender os pagamentos. Contudo, o ministro relator Jorge de Oliveira, ex-ministro da Controladoria-Geral da União (CGU) e indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o cargo, negou a cautelar.


Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Foto: Pedro França/Agência Senado
Rodrigo Pacheco, Bolsonaro e Arthur Lira no dia da posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Foto: PR
Arthur Lira durante anúncio sobre o voto impresso ir ao plenário. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados
Arthur Lira, presidente da Câmara e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, no início do ano legislativo. Foto: Agência Senado
Arthur Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Pablo Valadares/Agência Câmara
Arthur Lira durante a sessão sobre o voto impresso. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
 Jair Bolsonaro acompanhando de Ministros, entregam a MP do Auxílio Brasil ao Presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Marcos Corrêa/PR
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O procurador do MP lembrou que, em outro processo, relatado pelo ministro-substituto Weder de Oliveira, identificou sobrepreço superior a 10% em itens de pelo menos oito dos 39 nove certames licitatórios conduzidos pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Cofevasf) relacionados à aquisição de máquinas e equipamentos pesados.

Na ocasião, o então ministro-relator determinou medida cautelar para que a companhia suspendesse a aquisição de máquinas e compra de tratores pela Codefasf. Foi concedida a cautelar porque há indícios de superfaturamento.

"Nesse processo da Codevasf, os tratores são mais modernos do que os que foram comprados pelo MDR, e os preços são menores", contou Oliveira. Ele fez uma nova petição discorrendo sobre as irregularidades no leilão conduzido pelo MDR e solicitando a suspensão do edital e dos pagamentos pendentes. O pedido está aguardando análise.

Amanhã, o TCU deverá analisar um outro processo, também tratando de irregularidades no uso das emendas, chamado "orçamento secreto", em troca de apoio parlamentar. Segundo a assessoria do órgão, o ministro Raimundo Carreiro é quem vai decidir sobre o encaminhamento de dois pedidos do sobre o mesmo tema, sendo um do líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), e outro do procurador Lucas Furtado.

Esse processo é de setembro, mas vale lembrar que, no caso das pedaladas da ex-presidente Dilma Rousseff, o então relator, José Múcio Monteiro, levou apenas cinco dias para levar o tema à votação no plenário. Outra denúncia sobre a existência desse orçamento paralelo de R$ 3 bilhões está sendo relatada pelo ministro Aroldo Cedraz e segue na fase das oitivas. 

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/11/4961676-tcu-decidira-se-abrira-processo-sobre-orcamento-secreto.html


Pedro Fernando Nery: Salário dos militares do governo pode chegar a R$ 80 mil com teto duplex

Militares não se aposentam. Foi assim que sempre argumentaram as Forças Armadas para se livrar da equiparação das regras previdenciárias com civis.

Militares se aposentam: e os ministros militares do governo são aposentados. É o que buscou a Defesa para se livrar do limite remuneratório (conhecido como teto). Argumenta-se que esses generais devem poder receber acima do limite/teto acumulando “aposentadoria” e o salário de ministro.

Estariam, assim, incluídos nas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União (TCU) que permitem – excepcionalmente nesses casos – que o teto remuneratório seja dobrado, aplicado separadamente a cada um dos pagamentos, e não à soma deles (aposentadoria+salário).

Deixa de valer, assim, o limite de R$ 39,2 mil, o salário de ministros do Supremo que é a remuneração máxima no serviço público. Com a dobra do limite feita, o chamado “teto duplex” iria para quase R$ 80 mil. É 70 vezes o soldo dos recrutas. A mudança decorre de uma portaria do Ministério da Economia (que, aliás, não diz como vai pagar, violando a Lei de Responsabilidade Fiscal).

Militares da reserva com cargos no governo serão beneficiados, porque até então o acúmulo de salário e aposentadoria esbarrava no teto. Agora, o limite será o teto dobrado. Haverá aumentos para o presidente, mas principalmente para os generais. Segundo jornais, o vice Mourão receberia mais de R$ 63 mil mensais a partir de agora, os ministros Braga Netto, da Defesa, R$ 62 mil; Heleno, da Segurança Institucional, R$ 63 mil; e Ramos, da Casa Civil, R$ 66 mil.

A alegação para a portaria seria o cumprimento de uma decisão do STF, que permitiu que o limite remuneratório de R$ 39,2 mil seja observado separadamente para aposentadoria e para salário. Seria, assim, um limite para cada vínculo. Mas militar na reserva perde o vínculo?

A Constituição prevê que a aposentadoria afasta o vínculo com o empregador, seja na iniciativa privada ou no governo. Só que militares sempre justificaram que não se aposentam, que há apenas uma “transferência para a reserva remunerada”, que seguem à disposição do Estado e que podem ser convocados.

O TCU também havia decidido em anos recentes que, “na hipótese de acumulação de aposentadoria com a remuneração decorrente de cargo em comissão, considera-se, para fins de incidência do teto constitucional, cada rendimento isoladamente”. A expressão usada é aposentadoria, o que não se aplicaria aos generais.

Mesmo no STF, a discussão no julgamento da questão não parece ter levado em conta os militares. Por exemplo, o ministro Lewandowski, para quem o teto de R$ 39,2 mil sobre aposentadoria+salário violaria a dignidade da pessoa humana, observou que a aposentadoria é contraprestação por décadas de contribuição.

Mas militares não contribuem para a transferência para a reserva (ou “aposentadoria”), porque esta não seria um benefício (já que ainda estão à disposição etc.). Não é exagero do colunista: nenhum dos generais na reserva contribuiu sequer com um centavo em qualquer mês da carreira militar para o que agora querem considerar uma aposentadoria.

O argumento de que militar não se aposenta foi usado historicamente para evitar a imposição de idades mínimas para aposentadoria (90% sai da ativa com menos de 55 anos, 50% antes de 49), de contribuições de aposentados (como no serviço público civil) e de cálculo de aposentadoria com base na média salarial (como no INSS). Militares ainda têm a integralidade: vão para a reserva com 100% do maior salário. “Os militares nunca tiveram e não têm um regime previdenciário” escreveu Mourão em 2017 no texto “Por que os militares não devem estar na reforma da Previdência?”. O vice prometeu doar o dinheiro.

Agora, para pegar carona nas decisões do TCU e do STF autorizando o limite duplo para aposentados que recebem salário, o governo editou portaria estendendo o limite duplo para “militares na reserva”. As decisões não trataram desses casos, que exigiriam uma emenda à Constituição – já que é controverso o status dos militares da reserva. Qual o limite dos generais?

*Doutor em economia

Fonte:

O Estado de S. Paulo

https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,salario-dos-militares-do-governo-pode-chegar-a-r-80-mil-com-teto-duplex,70003718273

 


Míriam Leitão: Orçamento é nó também político

O Orçamento criou um nó cego para o governo. O ministro Paulo Guedes disse que não há briga. Há sim. Briga entre os poderes e dentro do governo. Entre os técnicos e a ala política. O Ministério Público de Contas quer que o TCU alerte o governo preventivamente de que a sanção pode representar crime de responsabilidade fiscal. O parecer do TCU deve sair amanhã. Paulo Guedes na live para um banco disse que se o Orçamento for deixado como está as contas podem ser reprovadas no ano que vem e “alguém” terá a “capacidade de atingir a candidatura presidencial”. O assunto é técnico mas aperta todos os botões políticos, do relacionamento com o Congresso e da sustentação do governo.

Quem olhar o Brasil de fora deve achar que esse é o menor dos problemas. Vários jornais do mundo têm publicado nos últimos dias matérias mostrando o desempenho desastroso do governo brasileiro na gestão da crise. Os dados são eloquentes em provar que o Brasil se tornou em termos de média móvel o pior caso do mundo.

Quem ouvisse o ministro da Economia ontem, falando a banqueiros, poderia considerar que o Brasil está em outro mundo. O Brasil, segundo ele, criou “680 mil empregos formais” e pode ter criado muito mais “do cara que vende churrasquinho e água na praia”. Onde exatamente andam os ministros do governo Bolsonaro? Em que planeta? O ministro Marcelo Queiroga, da Saúde, disse que “a ordem é evitar o lockdown”. Essa solução só deve ser usada quando? O que é mais grave do que ser o país onde mais se morre por Covid-19, não haver mais vagas de UTI, emergências não atenderem em hospitais privados, faltar oxigênio e estar perto do esgotamento dos remédios necessários para intubação?

No meio dessa trágica situação do Brasil na área da saúde, foi dado um nó orçamentário que reflete a incompetência do governo em negociar um acordo político, em unificar a linguagem entre os vários ministérios, em cumprir os acordos que faz.

A solução técnica recomendada é vetar todo o RP9, as emendas do relator. Integralmente. E depois, num PLN, recompor as despesas obrigatórias que foram cortadas da previdência e outros benefícios sociais. E teria que cortar também nos investimentos que foram elevados no Ministério do Desenvolvimento Regional e no de Infraestrutura. São os gastos que o próprio presidente quer manter porque acha que assim terá palanque de inaugurações.

Na visão de Paulo Guedes, explicada na live da XP, um dos problemas é que “os parâmetros estavam superados”. Bom, estavam mesmo defasados e por isso o governo deveria ter enviado uma emenda modificativa. “Era mais rápido mandar o relatório bimestral”, explicou o ministro. Isso é um detalhe técnico, mas que fez toda a diferença e mostra o erro do ministro. O relatório bimestral tem que ser enviado ao fim de março. De fato, ele veio mostrando um rombo de R$ 17,6 bi. O problema é que a emenda modificativa tinha condições de ter sido enviada muito antes. Afinal, desde o começo de janeiro já se sabia que a inflação havia sido de 5,2%, e não de 2,09%, e que o salário mínimo era R$ 1.100. Portanto, todas as despesas afetadas pelo salário mínimo tinham aumentado. Esses parâmetros errados explicam uma parte da confusão. Mas depois disso o relator fez outras negociações com o governo que acabaram ampliando ainda mais as despesas.

Vetar todas as emendas do relator seria uma declaração de guerra. Culpar o Congresso está deixando muita gente irritada no parlamento e ontem o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que o texto foi “feito a quatro, seis ou oito mãos” e que o ministro Paulo Guedes acompanhou pari passu.

O mundo nos olha com espanto. O influente jornal “Financial Times” — e ele não foi o único — fez uma matéria extensa no último fim de semana sobre a piora da pandemia no Brasil. O país é visto como um risco à saúde mundial, por ter deixado o vírus fugir ao controle. No título, o “FT” afirma que Bolsonaro está “mais isolado do que nunca” e é descrito como “um dos maiores céticos da pandemia no mundo”. Conta todos aqueles episódios bizarros e diz que ele luta para manter viva sua chance de reeleição. Esse é o quadro dramático vivido pelo Brasil. No meio de tudo isso, o Orçamento é uma confusão a mais. E nada trivial.


Agência Senado: Brasil, recordista em desigualdade

Cintia Sasse, Agência Senado

A pandemia escancarou, mais uma vez, o péssimo quadro da desigualdade social e econômica no Brasil. Durante a primeira onda do coronavírus, no ano passado, mais de 30% dos 211,8 milhões de residentes no país tiveram de ser socorridos na etapa inicial do auxílio de R$ 600 aprovado pelo Congresso, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados em julho de 2020.

O contingente dos que precisaram de ajuda espantou até mesmo algumas áreas de governo, mesmo tomando em consideração os desvios e irregularidades cadastrais. O Tribunal de Contas da União (TCU) estimou, em relatório divulgado ao final de fevereiro, que 7,3 milhões de brasileiros podem ter recebido o auxílio emergencial indevidamente. Mesmo quem não agiu de forma intencional terá que se acertar com o fisco agora em 2021.

Os cálculos quanto ao número total de beneficiários variam entre 67 e 68 milhões de brasileiros na primeira fase e cerca de 57 milhões na segunda rodada, a partir de setembro, quando o auxílio foi reduzido para R$ 300. Essa variação depende da fonte de informação consultada.

Além do espantoso número de beneficiários, o custo do chamado coronavoucher evidenciou o peso financeiro da desigualdade no país. Foram gastos praticamente R$ 293 bilhões no ano passado, cerca de 56% dos recursos federais desembolsados para enfrentar a primeira onda da pandemia, de acordo com o Siga Brasil, sistema do Senado que facilita a busca de dados do Tesouro Nacional. Ou R$ 321,8 bilhões, conforme os cálculos divulgados pelo Ministério da Economia sobre o gasto com o auxílio emergencial.

O importante é que qualquer uma das duas cifras reflete o custo elevado do perfil de distribuição de renda no país. Os recursos socorreram não só os que ficaram desempregados ou perderam seus pequenos negócios no meio da maior crise sanitária deste século. Entre os elegíveis ao benefício estavam brasileiros situados na base da pirâmide social. Ou seja, os pobres que vivem com menos de US$ 5,50 por dia ou os muito pobres que conseguem apenas US$ 1,90, conforme classificação do Banco Mundial.

Desigualdade
 

— O Brasil está entre os dez países mais desiguais do mundo — afirma o sociólogo Luis Henrique Paiva, coordenador de estudos em seguridade social do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
 

De fato. A publicação Síntese de Indicadores Sociais, divulgada pelo IBGE em 2020, trouxe estimativas do Banco Mundial com base no índice de Gini, instrumento criado pelo matemático italiano Conrado Gini para medir o grau de concentração de renda no grupo a ser avaliado. A variação numérica é de zero a um, sendo zero quando todos têm a mesma renda e um representando o extremo oposto.
 

Nesse ranking da desigualdade, o Brasil apresenta 0,539 pelo índice de Gini, com base em dados de 2018. Está enquadrado entre os dez países mais desiguais do mundo, sendo o único latino-americano na lista onde figuram os africanos. O Brasil é mais desigual que Botsuana, com 0,533 pelo índice de Gini, pequeno país vizinho à África do Sul com pouco mais que 2 milhões de habitantes.


Marcus Pestana: Controles, corrupção e eficiência

Para cumprir seus objetivos, os governos erguem uma estrutura burocrática, leis e normas, processos, instrumentos de gestão. Projetos e programas são implantados combinando recursos humanos, orçamentários, físicos, tecnológicos e parcerias.

É um grave equívoco comparar linearmente a gestão privada e a pública. Na esfera de mercado, os recursos envolvidos são privados, e o empresário pode escolher livremente a aplicação de seus fundos financeiros, e, em caso de ineficiência, ser punido pela falta de competitividade, podendo ser excluído do mercado através de concordata e falência. No setor público é diferente. Os recursos orçamentários são de toda a sociedade que os prove através do pagamento de tributos. O gestor público enfrenta uma série de restrições e limites para que os recursos sejam bem aplicados. Daí a necessidade de concursos públicos, licitações, transparência e controles internos e externos.

A corrupção existe desde que o primeiro balcão público foi montado na Grécia Antiga ou no Império Romano. No Brasil, chegou a limite insuportável como demonstraram recentes acontecimentos. Isso impõe a necessidade de boas práticas administrativas, de transparência total e acompanhamento dos órgãos de controle internos e externos. Devemos ter tolerância zero com a corrupção. Mas hoje, estou convicto, a administração pública brasileira está sufocada na sua criatividade, capacidade inovadora e eficiência pelo excesso de controles exercido pelos tribunais de contas, controladorias e ministério público. Os servidores públicos tendem a ficar inertes, não ousar, não produzir, com receio de no futuro responder a processos com repercussões financeiras e pessoais muito além de sua capacidade de resposta. O conceito de improbidade ficou elástico. Há estudos que indicam que 95% dos processos nos tribunais de contas não envolvem dolo, prejuízo ao erário ou enriquecimento ilícito.

Vamos à vida como ela é. Fui por 16 anos gestor público. Em 05/01/2020 paguei uma multa de quase três mil reais aplicada pelo TCE/MG por emissão do ato de nomeação das comissões de inventário fora do prazo, falhas na gestão do patrimônio da secretaria de saúde e ausência de formalização dos procedimentos no gerenciamento de almoxarifados. Não fui ouvido e recebi o boleto para pagamento da multa. Paguei, já que contratar um advogado ficaria mais caro. Imagina um secretário de saúde que lidera milhares de servidores em centenas de estruturas setoriais, conseguir “abraçar o mundo com as pernas” e cuidar do detalhe do detalhe. Só se for um super-homem.

Recentemente, recebi outro comunicado do TCE/MG sobre um novo processo relativo a convênio com um consórcio intermunicipal do norte de Minas dentro do reconhecido e premiado programa de Transporte Sanitário, cuja prestação de contas não foi feita, embora a secretaria tenha cobrado e aberto tomada de contas especial. Valor histórico, R$ 250 mil, isto 13 anos atrás. Eram milhares de convênios e parcerias, ao secretário estadual de saúde caberia conferir recibos e notas fiscais de cada parceria empreendida para melhorar a saúde da população?

A auditoria do Ministério da Saúde também nos notificou para devolvermos 8 milhões de reais de um convênio de 2005 para fornecimento de equipamentos a vários hospitais de Minas Gerais, por, principalmente, não localizarem os equipamentos. Isto, dez ou doze anos depois dos fatos. Ao verificarmos o item de maior valor (R$ 1.298.000,00), um tomógrafo para o Hospital São João de Deus, de Divinópolis, obtivemos toda a documentação de que o aparelho foi entregue em 28/04/2010 e prestou excelentes serviços ao SUS no centro-oeste mineiro.

São apenas três em dezenas de casos. Orgulho-me da equipe que liderei e que construiu uma das mais admiradas experiências de gestão regional do SUS. Hoje ninguém mais, honesto e movido pelo interesse público, quer aceitar cargos. Os salários são baixos e os riscos enormes. Se não acharmos um novo ponto de equilíbrio vamos matar a administração pública. Tenho ex-assessores honestos, dedicados, excelentes servidores, modestos, que tiveram suas vidas arrasadas, sua imagem comprometida, problemas financeiros inacreditáveis e também de saúde, pelos múltiplos processos que enfrentaram. A eles dedico este artigo como pequena forma de homenagem. 

*Marcus Pestana, ex-deputado federal (PSDB-MG)


Mariana Ceratti: Brasil analisa como fortalecer o controle interno para evitar desperdício de recursos públicos

Novo estudo alerta: discrepâncias nos sistemas de controles internos dos estados e municípios podem facilitar irregularidades e piorar a qualidade dos serviços públicos

Nepotismo; evolução de patrimônio incompatível com o salário de um servidor público; fraudes e desvios de recursos dos contribuintes: em tese, tais problemas, bem conhecidos entre os que vivem no Brasil e no resto da América Latina, podem ser evitados, rastreados e/ou punidos com sistemas fortes e eficientes de controles internos.

Na realidade, mesmo compatíveis com as melhores práticas internacionais, esses sistemas estão sujeitos a deficiências e desigualdades na implementação, o que abre portas para irregularidades, fraudes e desperdício de verbas públicas. Em uma palavra: corrupção. Todos os anos, US$ 1 trilhão é pago em subornos, enquanto mais US$ 2,6 trilhões são roubados; tudo devido à corrupção, de acordo com as Nações Unidas. E em tempos de pandemia, é mais importante do que nunca conter esse flagelo.

No Brasil, por exemplo, um novo relatório do Banco Mundial e do Conselho Nacional de Controle Interno (Conaci) encontrou grandes diferenças no nível de implementação dos controles internos nos estados e municípios brasileiros. “Isso implica em desperdício de recursos públicos e, na maioria das vezes, em baixa qualidade dos serviços prestados à população”, explica Susana Amaral, especialista sênior em gerenciamento financeiro do Banco Mundial. O desempenho tende a ser melhor nos estados com maiores receitas e Índices de Desenvolvimento Humano (IDH).

“O estudo demonstra a necessidade de reestruturar o sistema de controle interno não apenas para cumprir o arcabouço legal, que no caso do Brasil é desenvolvido e em grande parte aderente aos padrões internacionais. Mas, sobretudo, para que ele seja fortalecido em todas as áreas e funções desempenhadas, e cumpra seu real objetivo de ajudar os gestores, corrigir e orientar a implementação dos programas de governo de modo a entregar serviços de qualidade aos cidadãos”, comenta Susana.

Para entender melhor os resultados do estudo, é importante saber o que são os sistemas e instituições de controle interno e de que forma elas ajudam os governos a entregar serviços públicos de qualidade à população.

  • O controle interno é o conjunto de práticas de supervisão que visam a garantir que os gestores e servidores observem as normas da administração pública e que as políticas públicas sejam cumpridas, sempre prevenindo erros, irregularidades, fraudes e desperdício na aplicação dos recursos dos contribuintes.
  • Existem três tipos de controle interno: o preventivo, que busca evitar desvios; o concomitante, que ocorre durante a execução de uma atividade (uma obra de escola ou hospital, por exemplo); e o corretivo, que visa a ressarcir os cofres públicos pelos recursos que foram mal utilizados e punir os agentes públicos.
  • As Unidades Centrais de Controle Interno (UCCI) orientam os gestores e os servidores públicos a acompanhar a execução dos programas de governo. Elas identificam falhas e sugerem melhorias, seja nos aspectos de registro financeiro, contábil, etc., ou na preparação de contratos e outros documentos. É muito importante que essas unidades tenham equipe própria, independência financeira e manuais de ética para desempenhar suas atribuições de controle. Além disso, todos os órgãos de governo precisam ter unidades de controle interno para executar as recomendações da UCCI.
  • As instituições de controle interno ajudam na prevenção e no combate à corrupção e na melhoria da qualidade do gasto público. Elas também dão apoio ao controle externo, como os tribunais de contas, da União, dos estados ou dos municípios. Esses órgãos fiscalizam e orientam todos os demais órgãos da administração pública nos processos de compra, de contratação de serviços e de terceiros, além de propor soluções para questões técnicas.

Vinte e dois estados e o Distrito Federal enviaram seus dados (faltaram Acre, Maranhão, São Paulo e Sergipe). De acordo com o estudo, apenas oito têm instrumentos para regulamentar conflitos de interesse, o que pode prejudicar o atendimento do interesse coletivo. Esse é o mesmo número de estados que ainda não contam com instrumentos para acompanhar a evolução do patrimônio de seus agentes públicos.

Outra descoberta é a de que nem todas as macrofunções de controle interno — corregedoria, ouvidoria, integridade e auditoria interna — estão estruturadas ou implantadas nos estados participantes da pesquisa. Quase um terço dos órgãos não exercem as funções de transparência e corregedoria, enquanto aproximadamente um quarto dos órgãos não executam a função de promoção da integridade.

O documento também analisa dados de 22 das 26 capitais. A avaliação identificou que 19 têm regulações para vedar a prática de nepotismo. Por outro lado, apenas quatro delas apresentam normas sobre conflitos de interesse e acompanham a evolução patrimonial dos agentes públicos. Além disso, quase metade das capitais não regulamentaram satisfatoriamente a Lei Anticorrupção.

Apesar de mais de 95% das UCCIs das capitais estarem inseridas no primeiro escalão da administração, aproximadamente 20% delas não têm acesso irrestrito às informações e aos documentos necessários para a realização das atividades.

Finalmente, em apenas um quinto das capitais a UCCI participa do planejamento de todas as auditorias executadas. E quase um terço das UCCIs não instauram investigações para apurar responsabilidades em caso de fraudes ou desvios.

O diagnóstico foi apresentado para os representantes dos órgãos em 16 de dezembro. Os dados por estado e capital serão enviados separadamente a cada órgão para orientar a implementação de melhorias. Em um país que chegou ao 106º lugar (de 180 países) no Índice de Percepção da Corrupção 2019 (IPC-2019), divulgado no começo de 2020 pela Transparência Internacional, essas e outras mudanças serão fundamentais para melhorar a qualidade dos serviços públicos e ajudar a aumentar a confiança dos brasileiros em suas instituições.

*Mariana Kaipper Ceratti é comunicadora online do Banco Mundial no Brasil


Maílson da Nóbrega: Recuperação da economia e obras paradas

Iniciativa privada deve ter papel mais relevante na crucial expansão da infraestrutura

A pandemia de covid-19 evidenciou e agravou deficiências manifestas, quais sejam, a desigualdade social, a pobreza, a fragilidade da atividade econômica, o alto desemprego e o elevado endividamento público. Além desses desafios, é preciso também refletir sobre as bases de uma recuperação duradoura da economia brasileira.

Tudo isso dependerá de reformas estruturais para aumentar a produtividade e o potencial de crescimento econômico, até mesmo mediante destravamento dos obstáculos impostos pelo setor público à atividade das empresas, de que são exemplos as obras paradas. A expansão da infraestrutura será crucial. Esse conjunto permitiria a restauração de confiança dos empresários, tornando viáveis os investimentos. Agora, diferentemente de outras crises, a iniciativa privada deverá ter o papel mais relevante.

No campo da produtividade, sobressai a proposta em exame de modernizar a caótica tributação do consumo – Propostas de Emenda Constitucional (PECs) 45, da Câmara, e 110, do Senado –, pois aí está a maior fonte de ineficiências. Haveria a substituição de cinco tributos por um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), cobrado no valor agregado (IVA) e arrecadado no destino, permitindo a desoneração integral nas exportações e nos investimentos. Além disso, para a participação do setor privado será fundamental avançar nas concessões de serviços públicos. O marco do saneamento e, brevemente, a nova lei de gás natural poderão atrair vultosas inversões.

Felizmente, dispomos de certo tempo. A queda do produto interno bruto (PIB) em 2020, entre 5% e 6%, a maior da nossa História, legará grande ociosidade na economia, assegurando a recuperação cíclica em 2021, da ordem de 3,5% ou mais. A produção de petróleo, que poderá expandir-se em mais de 7% no próximo ano, contribuirá para a reativação da atividade econômica em Estados como o do Rio de Janeiro.

O Brasil já venceu desafios semelhantes. Para tanto ajudarão conquistas como a da solidez das instituições e da democracia. Cite-se o êxito recente do mercado de capitais, que se tornou fonte de crédito para investimento em infraestrutura. Casos de sucesso no setor privado são muitos, como os da Embraer, das empresas que dominam avançada tecnologia de construção civil, particularmente na infraestrutura, e da crescente multinacionalização de firmas bem administradas.

Nesse contexto, é preciso não perder oportunidades. Levantamento realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em agosto de 2019 indica 14 mil obras paralisadas, somando R$ 144 bilhões. Numa análise superficial, uma obra de R$ 1 bilhão com prazo de execução de 36 meses pode empregar cerca de 1.500 colaboradores e criar 216 mil outros empregos diretos em três anos. Boa parte desses empreendimentos dispõe de fonte definida de financiamento, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e de outras instituições financeiras.

Vale destacar, no relatório do TCU, a informação de que cerca de 10% dos óbices à continuidade dessas obras não derivam da falta de recursos, mas de objeções de tribunais de contas dos Estados e do próprio TCU, ou de problemas jurídicos. Não fosse pela conhecida lentidão decisória de órgãos públicos, que costumam procrastinar a adoção de saídas jurídicas razoáveis, cerca de 21.600 empregos diretos poderiam ser criados.

Um case de oportunidade perdida é o do Metrô do Rio de Janeiro. Em seis anos foram construídos 15 km de linha metroviária e cinco estações, mas uma delas está pendente de conclusão por causa de processos em andamento no Tribunal de Contas estadual. A continuidade da obra geraria cerca de 1.600 empregos diretos, atenderia 22 mil passageiros por dia e proporcionaria arrecadação de quase R$ 100 milhões em impostos, com impacto positivo na economia do Estado.

Não bastassem casos de falta de competência técnica para opinar sobre assuntos complexos, os processos se eternizam pelo receio de dirigentes de órgãos públicos de serem responsabilizados por suas decisões. Assim, julgamentos de ações que destravariam obras importantes são realizados sem considerar relatórios de auditoria independente, firmados por profissionais internacionalmente reconhecidos, que evidenciam equívocos de decisões tomadas sob esse ambiente.

Neste grave momento, não se pode perder tempo ou errar, nem usar a crise para oportunismo ou para ferir a autonomia das instituições de controle. Cumpre buscar soluções criativas e amparadas na lei, com vista a retomar obras paradas que não impliquem aumento de gastos públicos e contribuam para recuperar a economia.

Mesmo que se materialize o pior cenário macroeconômico e político, as conquistas institucionais e a relativas aos fundamentos da economia têm tudo para ser preservadas. A plataforma de lançamento econômico, digamos assim, permaneceria firme. Investimentos públicos que não exigem aporte de recursos orçamentários deveriam ser retomados.

SÓCIO DA TENDÊNCIAS CONSULTORIA, FOI MINISTRO DA FAZENDA


Afonso Benites: TCU aperta cerco sobre gastos com publicidade do Governo Bolsonaro

Decisão veta verba em sites e perfis no YouTube de atividade ilegais, como jogo do bicho, ou em canais infantis. Escrutínio é novo revés para máquina de propaganda do Planalto

Uma decisão em caráter cautelar, de efeito imediato e preventivo, do ministro Vital do Rêgo, do Tribunal de Contas da União, impedindo que o Governo Jair Bolsonaro anuncie em diversos sites e canais do YouTube se soma a uma série de reveses para o Planalto em sua estrutura de propaganda oficial e extraoficial. Na sexta-feira, o ministro proibiu que o Ministério das Comunicações veiculasse publicidade em meios que promovam atividades ilegais, como jogo do bicho, por exemplo, ou em que o conteúdo não tenha relação com o público-alvo de suas campanhas, como o infantil. Os valores gastos com esses anúncios ou o tamanho das páginas atingidas não foram divulgados. Por conta dessa ação, o Governo terá de divulgar todas as inserções publicitárias programadas pela Secretaria de Comunicação, a Secom.

A decisão de Rêgo cita casos em que foi veiculada publicidade em páginas que disseminavam fake news, conteúdo infantil, a favor do jogo do bicho ou no idioma russo. A ação foi baseada em uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo que revelou os gastos da então Secretaria de Comunicação da Presidência da República nesses meios específicos no ano de 2019, quando o Planalto produziu peças publicitárias em alusão à reforma da Previdência, que acabou sendo aprovada naquele ano. Atualmente, a Secom é vinculada ao recriado Ministério das Comunicações.

Para o ministro Rêgo há sinais de “flagrante desperdício de recursos públicos”. Diz trecho da decisão: “O caso em relevo —divulgar matérias afetas a regime jurídico-administrativo a crianças, sejam elas brasileiras ou de qualquer outra nacionalidade— equivale a vender areia no deserto, gelo nos polos ou água nos oceanos”.

Os anúncios veiculados nessas páginas eram feitos via Google Adsense, que é uma ferramenta na qual o anunciante pode filtrar seu público. Por exemplo, escolhe qual é a faixa etária de seu alvo, a temática tratada pelo veículo ou se trata de temas ilegais. Algo que, aparentemente, não foi feito pelo Palácio do Planalto. Em nota à Folha, a Secom afirmou que o Governo “não interfere na seleção do Google Ads, realizada por algoritmos, e nunca investiu recursos públicos com base em preferências pessoais ou políticas”.

Em sua decisão, Vital do Rêgo ainda cobrou explicações do Governo nos próximos 15 dias e exigiu que o ministério apresente “informações detalhadas sobre todas as veiculações/inserções do Governo Federal em plataformas/mídias/canais realizadas por meio da compra de espaços publicitários”.

A divulgação detalhada dos dados da Secom pode ser mais combustível para o escrutínio às ações de propaganda do presidente e do Governo. Mas não é o único movimento que mira a maquinária de propaganda do bolsonarismo, especialmente na Internet. A escalada judicial e empresarial contra os militantes iniciou em maio, quando o Supremo Tribunal Federal deu andamento ao inquérito das fake news e apreendeu uma vasta quantidade de documentos, celulares e computadores de 29 blogueiros e youtubers bolsonaristas. Na mesma ocasião, foram autorizadas as quebras de sigilo contra quatro empresários suspeitos de financiar a disseminação de desinformação.

No mês seguinte, os alvos foram quem apoiou atos antidemocráticos, entre eles dez deputados e um senador da base do Governo que também tiveram seus sigilos levantados. Nesse ínterim, desembarcou no Brasil a iniciativa Sleeping Giants, que estimula empresas a deixarem de financiar veículos que divulgam boatos, a maioria delas ideologicamente vinculadas à gestão Bolsonaro – ao menos dois e sites e cinco apoiadores foram descapitalizadas até o momento, com perdas aproximadas de 448.000 reais.

Por fim, o Governo ainda viu o Facebook e o Instagram encerrarem 88 perfis, grupos e contas vinculadas a apoiadores do presidente, entre eles o assessor presidencial Tércio Arnaud Tomaz, número dois da estratégia digital do mandatário. Neste caso, o conglomerado comandado por Mark Zuckerberg reagiu à pressão internacional de patrocinadores, que ameaçaram deixar de anunciar em suas redes caso não houvesse uma filtragem de perfis que disseminassem discursos de ódio ou espalhassem desinformação. Em outros quatro países – EUA, Canadá, Equador e Ucrânia – foram fechadas outras 402 contas por “comportamento inautêntico coordenado”.O caso em relevo —divulgar matérias afetas a regime jurídico-administrativo a crianças, sejam elas brasileiras ou de qualquer outra nacionalidade— equivale a vender areia no deserto, gelo nos polos ou água nos oceanos.

Os movimentos têm desagradado o presidente, que reagiu, mesmo em isolamento por estar com coronavírus. Em live na última quinta-feira, o presidente disse que quem o apoia tem sido censurado. “Vemos que o Facebook derrubou páginas em todo o mundo. No Brasil, sobrou pra quem está do meu lado, pra quem é simpático à minha pessoa. A esquerda fica posando de moralista, mas olha aqui, blog me associando ao nazismo. Bolsonaro decapitado. Ninguém fala em derrubar essas páginas”, disse o mandatário.

Em tese, essa rede de desinformação que vem sendo desbaratada em diversas frentes pode afetar o julgamento de ações que tramitam no Tribunal Superior Eleitoral que pedem a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão. Na eleição de 2018, havia claro uso de divulgação de fake news em favor da candidatura que venceria o pleito.


Ribamar Oliveira: Governo depende do TCU para sair do sufoco

O risco é leilão da cessão onerosa ser adiado novamente

Todo o sufoco vivido atualmente pelos ministérios - alguns deles não têm dinheiro para chegar a dezembro - poderia ser evitado se o Tribunal de Contas da União (TCU) concluísse a sua análise sobre o megaleilão dos excedentes de petróleo da cessão onerosa e sobre a revisão do contrato feito entre a União e a Petrobras.

Uma montanha de dinheiro está prevista para ingressar nos cofres do Tesouro até o fim deste ano, mas o governo não pode incluir os recursos em sua previsão de receita orçamentária por não saber quais serão as decisões do TCU. Já há dúvidas no alto escalão do governo se, efetivamente, o leilão será realizado em novembro, como programou a Agência Nacional do Petróleo (ANP), ou se será novamente adiado.

A área técnica do Ministério da Economia se queixa das perguntas intermináveis do TCU e algumas delas sobre questões que se achava já terem sido resolvidas em 2018. Para ter uma ideia, ontem, em consulta feita nos processos que tratam do assunto, o Valor verificou que houve novos pedidos de informações registrados no dia anterior.

A instrução normativa 81 do tribunal estabelece um prazo de 75 dias para a área técnica encaminhar sua proposta de mérito sobre o assunto analisado ao ministro relator do processo.

O problema é que o prazo só começa a contar depois que todos os documentos solicitados são recebidos. A questão é que os pedidos de informação feitos pela área técnica do TCU ao governo sobre a cessão onerosa e o leilão do excedente do petróleo não param.

Ontem, por exemplo, em decisão do plenário dos ministros, o tribunal passou a exigir que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) apresente justificativa técnica detalhada sobre as áreas que entrarem ou ficarem de fora dos leilões de partilha de produção. A nova regra já valerá para o megaleilão do excedente da cessão onerosa.

Para os técnicos do TCU, há "obscuridade" na forma de classificação das áreas que entram nos leilões de partilha, segundo reportagem do jornalista Rafael Bitencourt, publicada ontem à noite no Valor PRO. O problema maior, segundo os técnicos, ocorre quando uma área com forte potencial econômico é leiloada no regime de concessão, o que reduziria consideravelmente os ganhos da União.

Se pudesse incluir os recursos do megaleilão em sua programação orçamentária e financeira deste ano, o governo reverteria o contingenciamento de R$ 30 bilhões realizado nas dotações orçamentárias e cumpriria com folga a meta fiscal deste ano. O maior gasto da União neste resto de ano iria ajudar a estimular a atividade econômica, junto com as outras medidas que o ministro da Economia, Paulo Guedes, promete anunciar nos próximos dias.

O megaleilão do excedente de petróleo dos campos que foram cedidos de forma onerosa à Petrobras está marcado para o dia 6 de novembro. Pelo cronograma, as empresas vencedoras devem fazer o pagamento do bônus de assinatura no dia 27 de dezembro, segundo informou a ANP. Não há dúvidas no mercado sobre o sucesso deste leilão, pois as grandes companhias internacionais que atuam no setor já manifestaram interesse.

A exploração do petróleo excedente da cessão onerosa será feita sob regime de partilha de produção. As empresas vencedoras pagarão um bônus por ocasião da assinatura de cada contrato. Serão vencedoras do leilão aquelas que oferecerem uma maior participação à União no óleo extraído. O valor total do bônus de assinatura foi fixado em R$ 106,5 bilhões. Mas nem todo esse dinheiro entrará nos cofres do Tesouro.

A União aceitou pagar uma compensação à Petrobras no valor de US$ 9,058 bilhões, na revisão do contrato da cessão onerosa para exploração de 5 mil barris de petróleo no pré-sal, firmado em 2010. Ao câmbio de ontem, a compensação correspondia a R$ 34,06 bilhões. Isto significa que, depois de pagar a Petrobras, o Tesouro ficaria com R$ 72,4 bilhões.

Em abril deste ano, o deputado Paulo Pereira da Silva (Solidariedade-SP) ingressou com uma representação junto ao TCU solicitando que a União seja impedida de pagar a compensação à Petrobras, no âmbito da revisão do contrato da cessão onerosa, com o argumento de que não há prévia autorização orçamentária para a realização da despesa e que o pagamento fere o teto de gastos, instituído pela emenda constitucional 95/2016.

O pedido do deputado ainda não foi apreciado, pois, segundo explicações do TCU ao Valor, o governo federal se comprometeu a esperar uma solução legislativa para a questão, que veio por meio da proposta de emenda constitucional (PEC) 98/2019, já aprovada pela Câmara. Por esta PEC, a compensação paga à Petrobras pela União, no âmbito da revisão do acordo da cessão onerosa, fica excluída do teto de gastos. A proposta será agora votada pelo Senado.

A PEC 98/2019 determina também que 15% do valor arrecadado com o leilão do excedente, depois de deduzida a compensação à Petrobras, seja transferido aos Estados, e outros 15%, aos municípios. Assim, em termos líquidos, o Tesouro ficaria com R$ 50,7 bilhões, dinheiro mais do que suficiente para tirar os ministérios do atual sufoco.

A ANP abriu consulta pública sobre o leilão e a previsão é de que até o dia 6 de setembro o edital definitivo seja publicado. Se o TCU concluir a sua análise até essa data, uma autoridade do governo disse ao Valor que os recursos do megaleilão poderão ser incluídos na previsão de receita orçamentária. No dia 22 de setembro, o governo terá que enviar ao Congresso o relatório de avaliação de receitas e despesas relativo ao quarto bimestre do ano. A inclusão dos recursos do megaleilão seria feita no relatório.

O temor do governo é incluir os recursos do megaleilão na sua previsão de receita, reverter o contingenciamento, e, caso o leilão seja adiado por alguma questão levantada pelo TCU, correr o risco de não cumprir a meta de resultado primário deste ano, o que é considerado crime de responsabilidade.


Angela Bittencourt: Bolsonaro ganha um "presentão" do TCU

38 órgãos com 'alta' exposição a fraude gerem R$ 216 bilhões

Recessão, desemprego, desequilíbrio fiscal, serviços públicos deficientes, percepção de alto grau de corrupção e falta de confiança no Estado tornaram-se características de um Brasil que não traz orgulho para ninguém e têm consequências: favorecem desperdício, mau uso do dinheiro público, ineficiência do Estado, distorção na alocação de recursos, entraves econômicos, políticos e sociais, corroem a credibilidade das instituições e ainda estimulam o desprezo do cidadão pela lei.

Foi com esse retrato do Brasil que o presidente eleito Jair Bolsonaro saiu da visita ao Tribunal de Contas da União (TCU), na terça-feira passada. Com o retrato, Bolsonaro recebeu do presidente da Corte Raimundo Carreiro e ministros um "presentão" para quem dá início a uma nova gestão: o mapeamento do grau de exposição à fraude e corrupção a que o governo está exposto.

O mapeamento é resultado de uma auditoria operacional coordenada pela Secretaria de Relações Institucionais de Controle no Combate à Fraude e Corrupção (Seccor), órgão do TCU, em 287 instituições do Poder Executivo Federal com o objetivo de avaliar se os controles internos de prevenção e detecção a esses problemas estão compatíveis com o Poder Econômico e o Poder de Regulação desses órgãos e propor melhorias.

A relatora do processo dessa auditoria é a ministra Ana Arraes, futura vice-presidente do TCU, que passará ao comando do ministro José Múcio Monteiro. Ambos serão empossados em 1º de janeiro de 2019, quando Jair Bolsonaro receberá a faixa presidencial.

Além dos 287 órgãos federais, foram auditadas pelo TCU seis instituições selecionadas pela "variedade de situações a serem estudadas": Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Agência Nacional de Mineração (ANM), Banco do Brasil (BB), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Ministério da Saúde (MS) e Ministério do Trabalho (MTb) e também Casa Civil e Comissão de Ética Pública da Presidência da República (CEP). Ana Arraes lembra que alguns dos controles de prevenção e detecção de fraudes e corrupção estão sob a responsabilidade da Casa Civil.

O mapa composto pelos órgãos do Executivo avaliados pelo TCU mostra que, de modo geral, as estatais possuem controles mais proporcionais ao valor gerido por elas que as demais instituições analisadas. "Essa maturidade na avaliação pode ser explicada, em primeira hipótese, pela maior aproximação dessas instituições do mercado privado, que acabam por impulsionar a adoção de melhores controles de forma a aumentar a sua lucratividade. Adicionalmente, alguns dos controles implantados são oriundos de exigências legais específicas para essas instituições", diz o relatório.

O mapa mostra também que 38 instituições com alto Poder Econômico possuem fragilidades nos controles "alta e muito alta". Portanto, elas têm elevada exposição ao risco de fraude e corrupção. Juntas, essas 38 instituições gerem um orçamento anual de mais de R$ 216 bilhões.

O mapa referenciado pelo Poder de Regulação mostra que sete das instituições com maior poder regulatório apresentaram fragilidades de controle "alta e muito alta", o que também as coloca em uma situação de elevada exposição a riscos de fraude e corrupção. Dentre as sete, três registraram "alta" exposição devido ao seu Poder Econômico.

Segundo Ana Arraes, a "indicação de dirigentes" é um dos critérios de controle que podem contrapor os riscos de fraude e corrupção advindos tanto do Poder Econômico quanto do Poder de Regulação. "A escolha de dirigentes comprometidos com padrões de ética e integridade é medida indispensável para o sucesso de medidas de combate à fraude e corrupção", diz a ministra.

A Lei das Estatais avançou em controles na escolha de seus administradores quando especificou critérios mínimos a serem observados na designação, como reputação ilibada e ausência de conflito de interesses. Entretanto, critérios mínimos não foram estabelecidos para as demais instituições do Executivo, diz a ministra. Ela lembra que a Casa Civil estabeleceu sistema específico para controlar a indicação de pessoas para cargos e funções comissionadas sujeitas ao seu crivo, o que "inegavelmente" melhorou a tramitação desses pedidos. "Contudo, sem critérios objetivos para serem aferidos, a decisão tende a não guardar uniformidade e coerência", diz.

Cruzamento de dados realizado pela auditoria revelou que entre agosto de 2017 e julho de 2018 foram verificadas mais de 554 restrições em ocupantes de cargos ou funções comissionadas. Os cadastros podem conter falsos positivos, mas chamou a atenção do TCU de que muitas vezes os servidores ocupam cargos nas mesmas instituições que aplicaram as penas cadastradas. "Mostra-se necessário e urgente que o Poder Executivo regulamente o art. 5º da Lei 13.346/2016, o qual determina que o Poder Executivo Federal defina os critérios, perfil profissional, bem como procedimentos gerais para a ocupação de cargos e funções comissionadas", alerta o TCU.

A Designação de Dirigentes é um dos cinco temas considerados pelo TCU ao estabelecer controles capazes de inibir as práticas de fraude e corrupção. Os demais temas são: Gestão de Riscos e Controles Internos; Gestão da Ética e Programa de Integridade; Auditoria Interna; e Transparência e Accountability.

Outra falha apontada pela auditoria é a gestão da ética e do programa de integridade que ainda se encontram em fases iniciais. Dos 102 órgãos com maior Poder Econômico e Poder de Regulação, 70% declararam que não estão implementadas medidas de monitoramento da gestão da ética. Já o programa de integridade apresentou novamente situação polarizada ente as estatais e as demais instituições do Executivo com alto Poder Econômico. Dentre as estatais, cerca de 61% delas apresentaram informações de que se encontram em estágio aprimorado na implantação do programa. Para as demais instituições pertencentes ao Orçamento Geral da União (OGU), 69% indicaram que se encontram em estágio inexpressivo de implantação.


Bernardo Mello Franco: A maldição do impeachment pegou mais um

Eduardo Cunha foi preso. Aécio Neves caiu em desgraça. Michel Temer continua no palácio, mas não pode pisar na rua. A maldição do impeachment tem sido implacável com os algozes de Dilma Rousseff. Agora chegou a vez de Augusto Nardes, o relator das pedaladas fiscais.

"No fim de maio, a Polícia Federal vasculhou a casa do ministro do Tribunal de Contas da União. Os agentes apreenderam documentos e celulares. A operação foi realizada em sigilo, por ordem do Supremo Tribunal Federal. Veio à tona na quarta-feira, no site da revista Época.

"Nardes apareceu na delação de Luiz Carlos Velloso, um dos réus confessos da quadrilha de Sérgio Cabral. Ele disse à Justiça que pagou despesas pessoais do ministro. No pacote, incluiu até mensalidades escolares. Segundo o delator, o ministro do TCU também recebeu propina de Fernando Cavendish, o empreiteiro que bancava as farras do ex-governador do Rio.

"Não é a primeira vez que o investigador vira investigado. Nardes já havia sido citado na Operação Zelotes, que apura fraudes fiscais. Também foi delatado ao menos duas vezes na Lava-Jato. Renato Duque, o ex-diretor da Petrobras, disse que ele recebeu propina de R$ 1 milhão."

Até agora, o ministro esteve a salvo de conduções coercitivas ou prisões temporárias. As buscas em sua casa são uma novidade porque indicam que essa blindagem pode ter começado a ruir. Procurado na quarta, ele não quis se manifestar sobre a operação.

"Antes de se enrolar, Nardes foi peça-chave na derrubada de Dilma. Seu relatório sobre as pedaladas deu pretexto formal para o processo de impeachment. Às vésperas do julgamento, ele posava de vestal. Numa entrevista, disse que o país não podia mais “passar a mão na cabeça das autoridades em detrimento do povo” brasileiro. “Temos que dar um basta a isso”, bradou. Houve quem sugerisse lançá-lo ao Planalto."

Ex-deputado do PP, Nardes foi indicado ao TCU por Severino Cavalcanti, aquele que exigiu a diretoria da Petrobras “que fura poço e acha petróleo”. Antes de virar ministro, fez acordo para escapar de uma acusação por crime eleitoral e peculato. Quando ele pontificava contra a corrupção, sua ficha já era bem conhecida em Brasília.