Poder Judiciário

Míriam Leitão: Bolsonaro entre artigos e incisos

O presidente infringiu artigos da Constituição Federal e da lei do impeachment. Se ele não responder por isso, a democracia se enfraquece

O presidente Jair Bolsonaro cometeu crimes de responsabilidade. Vários. Ele tem ameaçado a federação, tem infringido o direito social à saúde, ameaça o livre exercício do Poder Legislativo e do Poder Judiciário. Tanto a lei que regulamenta o afastamento do presidente, a 1079/1950, quanto a Constituição Federal estabelecem o que são os crimes de responsabilidade. Impeachment é um julgamento político, e quem estiver na presidência precisa apenas de 172 votos para barrá-lo. O inquérito na PGR investiga se ele cometeu outros crimes. Até agora os depoimentos e contradições enfraqueceram a defesa do presidente. O procurador-geral da República, Augusto Aras, pode querer muito arquivar o inquérito, mas os indícios aumentam a cada dia.

Bolsonaro pode enfrentar um processo de impeachment no Congresso, se o deputado Rodrigo Maia der início. Há elementos para embasar um pedido de interrupção de mandato por crime de responsabilidade. O Congresso pode fazer isso ou não. É processo longo e penoso. Mas se não ocorrer, a explicação não estará em falta de crime, mas sim em algum insondável motivo que pertence aos desvãos da política.

O artigo 9º da lei 1079 estabelece em seu inciso 7 que é crime contra a probidade da administração “proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”. Decoro que ele quebrou inumeráveis vezes. No inciso 5, “infringir no provimento de cargos públicos, as normas legais”. O que está sendo revelado no inquérito da suspeita de interferência na Polícia Federal dá várias razões para se concluir que ele tentou ferir esse dispositivo da lei. O artigo 6º caracteriza os crimes contra o livre exercício dos poderes constitucionais. O primeiro inciso fala em “tentar dissolver o Congresso Nacional” ou “tentar impedir o funcionamento de qualquer das Câmaras”. O presidente Bolsonaro já participou de atos que explicitamente pedem o fechamento do Congresso, em faixas e palavras de ordem e nos motivos da convocação. Discursou dizendo que acreditava nos manifestantes e afirmou que as Forças Armadas estavam com eles, em clara ameaça ao país. No artigo 7º, a lei de 1950 define o crime contra o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais. Nele, o inciso 9 indica: “violar patentemente qualquer direito e garantia individual.” Nesse ponto se enquadra a violação do direito à saúde, quando ele prega diariamente contra as medidas recomendadas por todas as autoridades sanitárias do mundo e todos os especialistas brasileiros em saúde pública.

No artigo 85 da Constituição Federal são considerados crimes de responsabilidade os atos do presidente que atentem contra: “a existência da União.” Bolsonaro foi do “aqueles governadores paraíba” até a conclamação dos empresários para jogar pesado contra os governadores porque “é guerra”. Isso atenta contra a União. “O livre exercício do Poder Legislativo e do Poder Judiciário”. Com as manifestações pedindo fechamento do Congresso e do Supremo, o que fez Bolsonaro? “O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais”. Ele os fere insistentemente.

Mesmo se for arquivado, o inquérito na PGR pode fornecer elementos para sustentar um processo de impeachment. Interferir na polícia judiciária afeta o próprio livre exercício do Poder Judiciário.

A lei 1079/50 foi muitas vezes analisada durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma. Ela foi acusada pelo artigo 10, que define “os crimes contra a lei orçamentária”. A Constituição também, no artigo 85, fala dos crimes orçamentários. Depois que passa, fica na memória pouca coisa, o registro é de que ela errou no Plano Safra, baixou decretos de criação de despesa sem a prévia autorização do Congresso. Mas foi mais. As pedaladas são apenas a palavra que a crônica política criou. Dilma caiu porque arruinou a economia, criou uma recessão que perdurou por dois anos, fez uma escalada de desemprego, abriu um rombo nas contas públicas e usou os bancos públicos para pagar despesas orçamentárias. Ela fez gestão temerária na economia. Eu achava naquela época, acho agora.

Desconhecer os crimes muito mais graves cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro é aceitar um perigo infinitamente maior. Não se trata de ameaça à economia. Agora é a democracia que corre riscos.


Eugênio Bucci: O Supremo entre a imagem e a palavra

A superexposição banaliza a reputação dos ministros e fragiliza a casa da Justiça

No domingo passado, num seminário fechado em Ilhabela – sobre democracia e Judiciário –, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), José Antonio Dias Toffoli, anunciou que, a partir de agora, a instituição que ele comanda deverá pautar-se pelo recolhimento. Sua palestra foi cadenciada e serena: “É hora de o Judiciário se recolher. É preciso que a política volte a liderar o desenvolvimento do País.” Toffoli tem absoluta razão no que preconiza. Cumpra-se.

Todo mundo já percebeu que o excesso de exposição trouxe danos sérios para o prestígio (e para a autoridade) do STF. Danos para o STF, todo mundo também sabe, são danos para a normalidade do Estado de Direito e para a expectativa de justiça que cada brasileiro nutre (ou não nutre mais) no seu coração. Quando os ministros da Suprema Corte figuram como celebridades em programas de auditório, talk shows e revistas de gente famosa, algo está fora de ordem. A Justiça parece estar fora de lugar.

Todo mundo percebeu igualmente que essa visibilidade de pop star em torno de cada um (uma) dos (das) 11 integrantes do Supremo só vem servindo para amplificar, muito mais do que os egos de cada um (e de cada uma), a vulnerabilidade da instituição diante da fúria popular (e da falsa fúria dos incendiários oportunistas). Se os ministros e as ministras se prestam – inadvertidamente – ao papel de protagonistas de um teatro de gosto suspeito (como a troca de ofensas escabrosas, no horário nobre da televisão, durante sessões do plenário), oferecem-se – involuntariamente – para ouvir impropérios de qualquer um em qualquer lugar público.

Por vezes, os membros da cúpula do Judiciário – certamente sem se dar conta – estampam cenas de um realtity show macabro. Ato contínuo, o povo, que hoje se diverte nas redes sociais dirigindo insultos contra políticos, jogadores de futebol e atrizes de telenovela, acha que pode tratar com os mesmos maus modos os magistrados da Suprema Corte. O clima vai pesando. Há campanhas irracionais pelo “impeachment” do STF nas redes sociais. Está mais do que evidente que o ciclo de superexposição se voltou contra os superexpostos, banalizando a reputação dos ministros e fragilizando a casa da Justiça.

O que nem todo mundo percebeu, ao menos no Brasil, é que há uma incompatibilidade intransponível entre a natureza da função de julgar e a natureza dos holofotes da indústria do entretenimento e da imprensa sensacionalista. A cultura política brasileira não se deu conta desse fato elementar. Não é por acaso que os ritos e os protocolos da magistratura, em qualquer sociedade, primam pelo recolhimento. No Brasil, entretanto, até mesmo as sessões do pleno do Supremo passaram a ser transmitidas pela televisão – e ao vivo. É como se as excelências acreditassem que as câmeras são neutras e inertes. É como se acreditassem que um juiz pode ser habitué de colunas sociais e, ao mesmo tempo, imprimir aos seus julgamentos a marca inquestionável da isenção e da impessoalidade. Essa crença mora na raiz do problema – e o problema, infelizmente, não foi compreendido.

Os caminhos pelos quais a letra de lei se derrama sobre o mundo cotidiano (ou, em termos menos abstratos, os caminhos da aplicação da lei) pertencem ao domínio da palavra (pensamento, razão), não ao domínio da imagem (emoções imaginárias). A Justiça, para ser perceptível, identificável, reconhecida e acessível, depende de juízes que sejam discretos e recolhidos – juízes que não atuem para roubar a cena. Quando o juiz aparece em demasia, a entidade da Justiça some da vista. A única forma de que a Justiça dispõe para se fazer presente é o trabalho de juízes sem carisma – juízes recolhidos e competentes (em pelo menos dois sentidos).

A toga, a propósito, simboliza exatamente isso: ela barra o corpo físico daquele que julga e sobre ele faz descer o manto da vontade da lei. A toga indica – ou deveria indicar – que ali não está em cena uma subjetividade eivada de paixões, idiossincrasias e vaidades, mas apenas os desígnios impessoais da lei. Hoje se nota, contudo, que a toga em voga no Supremo mais parece uma capa de Batman ou de Darth Vader. Aí, a veste talar, cujo papel simbólico seria ocultar a pessoa como forma de interditar o personalismo, serve antes para emoldurar, para enfeitar a silhueta do meritíssimo.

O que dizer, então, da TV Justiça? Muita gente de boa vontade sustenta que ela trouxe mais transparência aos atos do Judiciário. Eu mesmo já me alistei nessas fileiras. Em 2002, quando a TV Justiça estreou, eu afirmava que ela representaria para a Justiça no Brasil do século 21 o que o Concílio Vaticano II representou para a Igreja Católica no século 20: obrigaria a autoridade a parar de falar latim. Para serem compreendidos os julgadores teriam de tentar falar a língua do povo, o que seria positivo. Bem, era nisso que eu apostava e, digamos, parece que eu estava parcialmente errado (o que, de vez em quando, muito de vez em quando, acontece). Há coisas boas na TV Justiça, claro, mas, se a palavra de ordem é mesmo recolhimento, valeria repensar tudo isso.

O que o Brasil vai cobrar do seu Judiciário não passa nem perto de qualquer modalidade de estrelato. A nossa democracia espera de seus juízes que eles assegurem a vigência dos direitos fundamentais e saibam fazer valer os freios constitucionais contra o arbítrio. Para tanto eles terão de firmar padrões jurisprudenciais menos erráticos e prestigiar as decisões colegiadas sem tanto apego (egoico) às monocráticas. Só assim, pela letra da lei e pela impessoalidade, a Justiça vai aparecer como precisa. É nesse sentido que a Justiça depende do recolhimento dos seus agentes. No universo da Justiça (que é o universo do simbólico), uma palavra vale mais que mil imagens.

* Eugênio Bucci é jornalista e professor da ECA-USP

 


José Aníbal: O inviável e inaceitável custo público do Brasil

A cada pesquisa de opinião pública, mais se consolida a percepção de que o brasileiro está insatisfeito com os políticos e as instituições mais diretamente relacionadas a eles: o governo, o parlamento e os partidos.

Mas não só com eles, como se pode inferir pelos índices registrados por outras organizações e personalidades ligadas ao Judiciário e ao Ministério Público.

O estado, tal qual o Brasil tem hoje, está em questão: ele custa à sociedade muito mais do que deveria e entrega muito menos do que dele se espera.

Precisamos todos encarar com maturidade e compromisso público questões centrais que fazem com que sejamos um país muito caro.

Não se trata apenas de falar do “custo Brasil” do qual tanto se queixam as empresas – muitas com razão, outras nem tanto. Significa esmiuçar as causas que tornam o Executivo pouco eficiente e licencioso sobre suas responsabilidades, o Legislativo dissociado do povo no seu dia a dia, o Judiciário, moroso e. todos, muito dispendiosos.

Nos três poderes da República, sobram motivos de reprovação para os serviços que o estado oferece aos cidadãos e situações que, no fim das contas, resultam em um país ainda muito desigual e injusto.

De cada 3 reais que o Brasil produz, cerca de 1 real vai para os cofres da União, dos governos estaduais e das prefeituras. O problema é menos essa proporção e mais como esses recursos são gastos.

Tomemos o governo federal como exemplo, sabendo que se repete, em maior ou menor proporção, nos demais entes federados.

Dentre todas as despesas feitas pelo governo central de janeiro a junho deste ano, 42,6% foram usadas para aposentadorias e pensões e 22,6% com o funcionalismo na ativa.

Enquanto isso, a margem de despesas discricionárias, que podem estimular o desempenho da economia e desenvolver melhor infraestrutura para o país, têm ficado restritas à faixa dos 15%, a despeito do déficit nominal de 56 bilhões de reais já registrados, segundo os dados do Tesouro Nacional compilados pela Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado.

Essa situação fiscal pode ser resumida da seguinte forma: a leniência dos últimos anos com o avanço das despesas de custeio da máquina e a falta de coragem e responsabilidade para adequar as regras de aposentadoria à nova realidade demográfica e ter exclusivamente o INSS como sistema público de aposentadoria para todos os brasileiros, transformou o governo num mero repassador de salários e benefícios previdenciários.

Sem criar critérios mais adequados de avaliação das políticas públicas, do desempenho do funcionalismo e sem combater desperdícios e privilégios, consolidamos a imagem de um estado pesado, inchado e ineficiente. Isso precisa mudar o quanto antes!

Mas não é só o Executivo que peca pela ineficácia de suas responsabilidades. Legislativo, Judiciário, Ministério Público Federal e Defensoria Pública já custaram aos cofres públicos, no primeiro semestre, mais de 5,2 bilhões de reais. Toda essa dinheirama foi quase toda usada para pagamento de salários, aposentadorias e pensões, já que são instituições com baixa necessidade de investimentos.

Fossem órgãos mais eficientes, não seria uma aplicação de dinheiro do contribuinte tão custosa à sociedade.

A Justiça brasileira é das mais caras, morosas e desiguais entre as democracias ocidentais. Tanto o cidadão comum quanto as empresas amargam prejuízos pela demora na análise e definição de processos judiciais, sem falar da sensação de impunidade nas questões relativas à violência urbana e à sensação de insegurança da população.

Enquanto isso, mais de uma dezena de cortes estaduais registram milhares de casos de funcionários públicos que desrespeitam o teto constitucional de 33,8 mil reais, sob frágeis argumentos legais que não passam de subterfúgios para elevar os rendimentos de parcela ínfima e já privilegiada da sociedade.

Sem enfrentar com firmeza os ranços de patrimonialismo, corporativismo e clientelismo que insistem em adentrar as estranhas do estado, seguiremos deixando de aproveitar as potencialidades de um país continental, rico em recursos naturais e ainda com parcela significativa de população em idade economicamente ativa.

É preciso desatar o nó que nos remete ao atraso e construir efetivamente um projeto que proporcione mais oportunidades, prosperidade e bem-estar aos brasileiros.

 

 

 

 


O Estado de S.Paulo: Onda de rejeição alcança até ministros do Supremo

Repúdio ao Executivo e Legislativo chega ao Judiciário, revela pesquisa Ipsos; apenas Moro e Joaquim Barbosa mantêm índice elevado, apesar de queda de aprovação

Daniel Bramatti e Gilberto Amendola, O Estado de S.Paulo

A onda de rejeição a políticos e autoridades públicas já não se limita ao governo e ao Congresso e chegou com força ao Poder Judiciário e ao Ministério Público. Pesquisa Ipsos mostra que, entre julho e agosto, houve aumento significativo da desaprovação a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Até o juiz Sérgio Moro enfrenta desgaste: apesar de seu desempenho ainda ser majoritariamente aprovado pela população, sua taxa de rejeição está no nível mais alto em dois anos.

A pesquisa avaliou a opinião dos brasileiros sobre 26 autoridades de distintas esferas de poder, além de uma celebridade televisiva, o apresentador de TV Luciano Huck. Quase todos estão no vermelho, ou seja, são mais desaprovados do que aprovados. As exceções são Huck, Moro e o ex-presidente do Supremo Joaquim Barbosa. Os dois últimos são responsáveis pelos julgamentos dos dois maiores escândalos de corrupção do País: mensalão e Operação Lava Jato.


Para Danilo Cersosimo, um dos responsáveis pela pesquisa, o aumento do descontentamento com o Judiciário pode estar relacionado “à percepção de que a Lava Jato não trará os resultados esperados pelos brasileiros”. Outros levantamentos do Ipsos mostram que o apoio à operação continua alto, mas vem caindo a expectativa de que a força-tarefa responsável por apurar desvios e corrupção na Petrobrás provoque efeitos concretos e mude o País. “Há uma percepção de que a sangria foi estancada, de que a Lava Jato foi enfraquecida”, disse Cersosimo.

Na lista de avaliados pelo Ipsos estão três dos 11 atuais integrantes do Supremo: Cármen Lúcia, a presidente; Edson Fachin, relator dos casos relacionados à Lava Jato; e Gilmar Mendes, principal interlocutor do presidente Michel Temer no Tribunal. Os três enfrentam deterioração da imagem.

Além de Moro e Fachin, há na lista outros dois nomes relacionados à Lava Jato: o do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e o do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da operação em Curitiba. Eles também sofrem desgastes.

O descontentamento com Gilmar cresceu ao mesmo tempo em que ele ficou mais conhecido: até maio, mais da metade da população (53%) não sabia dele o suficiente para opinar. Agora, esse índice caiu para 30%. Já a taxa de aprovação se manteve praticamente estável, oscilando em torno de 3%. A avaliação crítica é maior nas faixas mais escolarizadas: chega a 80% entre os brasileiros com curso superior, e é de 50% entre os sem instrução.

Nos últimos meses, Gilmar, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), se notabilizou por constantes e duras críticas ao que classifica como abusos na atuação do Ministério Público Federal em grandes investigações no País, incluindo a Lava Jato. O ministro protagonizou embates com o procurador-geral da República e chegou a chamar Janot de “desqualificado”.

Na pesquisa Ipsos, o chefe do Ministério Público Federal – que vai deixar o cargo em breve – teve seu desempenho reprovado por 52% dos entrevistados. A avaliação favorável ficou em 22%.

Evolução. Cármen Lúcia teve aumento de 11 pontos porcentuais em sua taxa de desaprovação entre julho e agosto, de 36% para 47%. Já sua aprovação está em 31% – queda de cinco pontos porcentuais em um mês e de 20 pontos desde janeiro. A avaliação favorável de Fachin caiu, em um mês, de 45% para 38%, enquanto a desfavorável subiu de 41% para 51%.

Conhecido por sua atuação no julgamento de acusados no escândalo da Lava Jato, Moro, titular da 13.ª Vara Federal de Curitiba, tem seu desempenho aprovado por mais da metade da população (55%). Sua taxa de desaprovação, porém, subiu nove pontos porcentuais no último mês, de 28% para 37% – o ponto mais alto na série histórica do Ipsos, que teve início em agosto de 2015.

 

 


Rubens Bueno: E os bandidos de toga?

Muito se fala hoje em punição para políticos corruptos, no entanto a corrupção dentro do sistema Judiciário continua sendo um tabu, uma verdadeira caixa preta.

Não há dúvidas que magistrados brasileiros têm contribuído de forma efetiva, nos últimos anos, para diminuir a impunidade no Brasil e colocar na cadeia poderosos que ninguém jamais imaginava que seriam alcançados pela espada da Justiça. No entanto, são pouquíssimos os casos de juízes que, flagrados recebendo propina, vendendo sentenças ou praticando outro tipo crime, tenham recebido uma punição exemplar.

Atualmente, os juízes são vitalícios e só perdem os cargos e, consequentemente, as respectivas aposentadorias, por decisão judicial transitada em julgado, desde que seja por ação penal por crime comum ou de responsabilidade. Não creio que hoje eles devam continuar a ter direito a esse privilégio.

Para mudar essa situação apresentei, ainda em 2012, a Proposta de Emenda à Constituição (163/2012) que extingue a aposentadoria compulsória como punição disciplinar para magistrados envolvidos em corrupção e estabelece a pena de perda do cargo.

A proposta aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

A análise do assunto exige pressa pois é uma verdadeira aberração que, em pleno Estado Democrático de Direito, um magistrado, cuja conduta é incompatível com a dignidade, a honra e o decoro, continue a ter aposentadoria como pena disciplinar máxima.

Aposentar juiz que vendeu sentença, aposentar juiz que roubou do povo, que manchou a Justiça brasileira, e dar a ele uma aposentadoria com todos os direitos é um escárnio. Temos que acabar com os privilégios, seja onde for.

Se a proposta já tivesse sido aprovada, casos como o do ex-presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), desembargador Clayton Camargo, acusado de ter dissimulado negociações comerciais e amealhado patrimônio incompatível com a remuneração, poderiam ter destino diferente.

O relator do caso no Conselho Nacional de Justiça sugeriu a punição máxima. E o que é a punição máxima?

A aposentadoria compulsória. Isso é um absurdo completo e por isso temos que mudar urgentemente essa legislação para poder punir com mais rigor os juízes corruptos. Hoje, flagrados, eles acabam sendo agraciados com o direito de ir para casa e continuar recebendo o salário integral.

Na história do Brasil, poucos juízes perderam o cargo. Entre eles estão o ex-juiz trabalhista Nicolau dos Santos Neto, que foi condenado pelo envolvimento, junto com o senador cassado Luiz Estevão, em desvio de recursos da construção do Tribunal Regional do Trabalho em São Paulo. Outro foi João Carlos da Rocha Mattos. O ex-magistrado foi condenado a seis anos de prisão pelo crime de lavagem de dinheiro.

A PEC que apresentei em conjunto com o deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA) tem o objetivo de mudar essa situação. Precisamos enfrentar esse problema com a seriedade devida.
* Rubens Bueno é deputado federal pelo PPS do Paraná

- Blog do Noblat

 


O Estado de São Paulo: A soberba de Lula

Ao se descortinar os fatos graves contra o ex-presidente, ficou demonstrado que o mito do herói petista serve melhor à literatura do que à política

O Estado de S.Paulo

O oportunismo que marcou a trajetória política do ex-presidente Lula da Silva, desde sua ascensão como líder sindical, foi tomado durante muito tempo como uma das virtudes capazes de levar um ex-metalúrgico a ocupar a Presidência da República. A realidade dos fatos, sobejamente documentada nos autos de um número constrangedor de processos judiciais a que responde, encarregou-se de demonstrar que o mito do herói serve melhor à literatura do que à política. Ao descortinar aos olhos dos cidadãos minimamente informados fatos graves que só a fé cega em um demiurgo é capaz de obliterar, as investigações sobre a conduta do ex-presidente revelaram que de virtuoso o oportunismo não tem nada.

Em evento de posse da nova direção do Partido dos Trabalhadores (PT) no sábado passado, na Assembleia Legislativa de São Paulo, Lula se apresentou como o único cidadão capaz de tirar o País da crise. Trata-se da imodéstia de quem se vê acima de qualquer responsabilidade que possa recair sobre seus atos, alguém ungido por um especial desígnio que justificaria qualquer desvario político. “Se o PT deixar, serei candidato para voltar a ver uma sociedade mais igual”, disse o ex-presidente. Poucas vezes uma afirmação de Lula soou tão embusteira. O PT é Lula, o rumo do partido é a expressão máxima de sua vontade. Portanto, o PT não tem qualquer ingerência sobre sua eventual candidatura à Presidência em 2018. Aliás, ainda que tivesse, esta prerrogativa, hoje, é exclusiva do Poder Judiciário, que pode torná-lo inelegível pela Lei da Ficha Limpa.

Durante o discurso, Lula mostrou que além de soberbo é incapaz de compreender a grandeza do cargo que ocupou e que sonha em voltar a ocupar. Afirmando que para voltar à Presidência “não precisa convencer os não convencíveis”, pois lhe bastariam “50% mais um” dos eleitores, Lula deixou clara a visão mesquinha que tem da Presidência da República, como se uma vez eleito estivesse comprometido apenas com o destino daqueles que o apoiam, e não com o de todos os brasileiros.

Ao arvorar-se em único capitão habilidoso o bastante para conduzir um navio à deriva, Lula esconde o papel determinante que teve na construção da pior crise política, econômica e moral da história recente, o mais eloquente atestado do desastre que o lulopetismo representou para o País. Em um misto de vaidade e desfaçatez, o ex-presidente afirmou em seu discurso na Assembleia Legislativa que “a melhor experiência de governança neste país foi do PT”. Para ele, a profunda recessão econômica e os 14 milhões de brasileiros desempregados são “fatos alternativos”.

Citado na delação superpremiada do empresário Joesley Batista como beneficiário de uma conta milionária abastecida com dinheiro de propina, Lula não se deu por constrangido e lançou mão de seu conhecido senso de humor rasteiro. “Estou quase fazendo delação para pegar os meus US$ 82 milhões”, ironizou. O problema seria encontrar um possível delatado, já que as investigações realizadas até agora colocam Lula no topo do esquema de corrupção engendrado para pilhar os recursos do Estado.

Mas não foi só a soberba, a imodéstia e a desfaçatez que marcaram o discurso de Lula na posse da nova direção de seu partido. O cinismo também deu as caras quando o ex-presidente afirmou que “o País nunca precisou tanto do PT como agora”. Prometendo resgatar o “Lulinha Paz e Amor”, o ex-presidente disse que “o PT é o único capaz de devolver a alegria ao povo brasileiro”. Lula é o grande artífice da grave crise por que passa o Brasil e por meio de seu discurso agressivo e excludente disseminou a cizânia e implodiu todas as pontes para uma reconciliação nacional em torno de um projeto de retomada do crescimento econômico, do desenvolvimento social e do debate de ideias próprio da democracia em um ambiente menos anuviado.

Se em meio à crise paira a incerteza sobre qual caminho o País deverá seguir em 2018, o lulopetismo já apresentou razões mais do que suficientes para a Nação saber qual deve ser evitado.

Editorial - O Estado de São Paulo