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Julianna Sofia: O laranjal floresce

Por que Bolsonaro não defende o ministro do Turismo? Não o demite? Não classifica acusações de fake news?

Não há hoje na Esplanada dos Ministérios quem defenda a permanência do ministro Marcelo Álvaro Antônio (Turismo) no governo. Nem o próprio presidente Jair Bolsonaro se arrisca a escudar o subordinado e joga-o na arena com os leões. "Deixa as investigações continuarem", declarou nesta sexta (8).

Atitude timorata diante do viçoso laranjal que floresce dia após dia.

São pelo menos três as candidatas que denunciaram publicamente a existência de concorrências fajutas no PSL de Minas Gerais, sob domínio de Álvaro Antônio nas eleições do ano passado. Uma delas acusa diretamente o ministro. Outra relata que o esquema solicitou-lhe cheques em branco para a triangulação imprópria de recursos públicos.

Há ainda quatro inexpressivas e suspeitas peesselistas que postularam cargos eletivos no estado em 2018. Elas levaram R$ 279 mil em dinheiro do fundo eleitoral, obtiveram apenas 2.000 votos e parte da verba entrou no caixa de empresas de pessoas ligadas ao gabinete de Álvaro Antônio na Câmara.

A Polícia Federal abriu inquérito no final de fevereiro para investigar o laranjal, e o Ministério Público colhe documentos e depoimentos de várias pessoas —desconfia de caixa dois na campanha mineira.

Há duas semanas, o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) chegou a dizer que, se houvesse algo de responsabilidade direta do ministro, o presidente analisaria e tomaria uma decisão.

Assessores palacianos consideram insustentável a manutenção de Álvaro Antônio no posto e reprovam a insistência do mineiro em não largar o osso. "Não é imexível", afirmou reservadamente um deles à Folha.

Se não o é, por que o presidente não o afasta até a conclusão das investigações? Tampouco o protege? Por que o mandatário não recorreu à sua dileta estratégia de ataque à imprensa e classificou as acusações contra o ministro de fake news?

Como na modorra da demissão de Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral), Bolsonaro continua a comporta-se com inexplicável apatia.


Julianna Sofia: Cara de palhaço

Deputados se esbaldam em Carnaval prolongado às custas da Viúva

Embora a mais autêntica pândega brasileira, o Carnaval nem feriado nacional é. À exceção de estados e municípios onde lei local assim o designa, o período equivale a dias regulares de trabalho, em que órgãos públicos e empresas privadas podem exigir atividade normal de seus funcionários, e faltas podem ser descontadas dos salários. Dispensa é questão de liberalidade.

Isso vale para um cidadão ordinário —aquele com cara de palhaço.

Na quarta-feira (27), a Folha flagrou o início da patuscada na Câmara dos Deputados. Eram seis da manhã, quando o painel de presença da Casa foi aberto para que os congressistas pudessem marcar seus nomes para a sessão que só começaria três horas mais tarde.

Antes das 8h, 11 deputados já tinham se registrado. O interesse nas votações que se seguiriam (acordos internacionais) era próximo de zero. O motivo real para a madrugada no plenário era garantir presença, embarcar para o estado de origem e deleitar-se num feriado prolongado.

O salário de um deputado é de R$ 33.763, fora outras benesses, e o comparecimento a sessões de votação é condição para não haver desconto. Há muito trabalho pendente nos escaninhos da Câmara, que tem adiante toda a tramitação de uma reforma da Previdência urgente.

Os congressistas fazem parte da infinitesimal parcela da população no topo da pirâmide de renda no Brasil. Nesta quinta (28), o Ministério da Economia alertou sobre a necessidade de aprovação da reforma para evitar que o PIB per capita do país entre em trajetória de queda.

“Para que o PIB per capita volte a crescer de maneira sustentável, é necessário que as reformas estruturais ocorram”, diz o documento. No ano passado, a economia do país avançou decepcionante 1,1%, e a renda por brasileiro ainda ficou 8% abaixo do patamar de 2013.

Na galhofa parlamentar brasileira, houve a tal renovação, mas tudo continua como dantes. E você, cidadão ordinário, já está com o feitio apropriado até a Quarta-Feira de Cinzas.


Julianna Sofia: Fora das catacumbas

Hesitação de Bolsonaro em defenestrar Bebianno fragiliza Planalto do embate pela nova Previdência

A cada vez que um deputado se aboletar na tribuna da Câmara para esmagar uma laranja podre, a exemplo do “pornopeesselista” Alexandre Frota (SP), ficará mais custoso para Jair Bolsonaro persuadir sua base de sustentação, ainda em estado gelatinoide, a votar pela reforma da Previdência.

A hesitação de Bolsonaro em defenestrar Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral) do Palácio do Planalto fragilizou o governo e expôs falta de firmeza para lidar com o escândalo dos candidatos laranjas de seu partido. Situação ridícula e insustentável depois de o ministro ter sido chamado de mentiroso não só por Carluxo, o filho 02 do capitão reformado, como pelo próprio presidente da República. Qualquer caminho de volta à normalidade nos corredores palacianos passaria pela demissão voluntária, ou não, do subalterno.

Não se fez isso às claras nesta sexta (15), e o cheiro de fritura empesteou a Praça dos Três Poderes. A atmosfera infectada contamina o ambiente para tramitação da reforma das aposentadorias, que chegará na próxima semana ao Congresso.

Apesar do discurso buscando pacificação e uma tentativa de mostrar que Bebianno poderia ficar no governo, pairaram ao longo do dia conversas sorrateiras sobre como garantir uma saída honrosa ao ministro ou como isolá-lo e drenar paulatinamente seu poder.

O ex-presidente do PSL chegou a insinuar manter confidências da campanha presidencial do partido; depois retrocedeu (em nota diz que o presidente “não tem qualquer relação com outras candidaturas”); por fim vazou conversas privadas mantidas com o capitão reformado.

Bebianno no cargo não seria o primeiro zumbi a viver fora das catacumbas na Esplanada dos Ministérios.

O mais recente enfrentou do terceiro andar do Planalto a maldição da JBS e viu seus planos de aprovar uma nova Previdência serem sepultados em cova rasa. Assim como Michel Temer não tinha os votos para mudar as regras das aposentadorias, Bolsonaro também ainda não os tem.


Julianna Sofia: Ecos na caserna

Militares estreiam o toma lá dá cá com governo Bolsonaro

Jair Bolsonaro elegeu-se com 58 milhões de votos lançando ataques à velha política e ao fisiologismo. Até onde a vista alcança, ao nomear seu ministério, manteve-se aderente ao discurso de não se curvar a negociações embaladas pelo casuísmo de agremiações partidárias. Nesta sexta-feira (1°), um Congresso Nacional seminovo tomou posse, o que vai pôr à prova o modelo bolsonarista de agora em diante.

Vêm de onde menos se esperava e de forma precoce ecos do toma lá dá cá. A caserna está sendo justamente pressionada a entrar na reforma da Previdência e já aceita elevar de 30 para 35 anos o tempo mínimo de serviço. Para dar sua cota de sacrifício, porém, os militares querem levar uns tostões da União em troca.

Em discussão está a revisão do plano de carreira das Forças Armadas, por consequência, um aumento salarial. “Temos uma defasagem salarial. Coloquei isso na mesa. O presidente Bolsonaro é um profundo conhecedor disso”, diz o ministro Fernando Azevedo (Defesa).

O regime dos militares inativos e pensionistas registrará um rombo de R$ 43 bilhões neste ano, quase o mesmo impacto negativo do sistema previdenciário do funcionalismo federal, que atende ao dobro de beneficiários e é tido como um dos focos da reforma de Jair Bolsonaropara acabar com privilégios.

Mesmo com a expectativa de engordar os holerites, os generais desejam ficar de fora do primeiro pacote de mudanças que o governo encaminhará ao Congresso nas próximas semanas. Alegam que o projeto da categoria tramitaria em menos tempo que a reforma-mãe e, portanto, poderia ser mais debatido antes do envio. O timing será dado por Bolsonaro, que já defendeu jogar os militares para uma segunda etapa.

O Palácio do Planalto quer liquidar neste primeiro semestre a fatura da Previdência. Ao excesso de otimismo governista, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), retruca: “Quem vai conduzir o tempo da votação da reforma da Previdência é a Câmara dos Deputados”.


Julianna Sofia: UTI federal

Descalabro nas contas estaduais se agrava, e governadores aumentam pressão sobre Bolsonaro

Não teve o mérito de durar um triênio a renegociação das dívidas dos estados promovida em 2016 pelo governo Michel Temer diante do descalabro orçamentário das administrações regionais. Quando o emedebista foi ao socorro dos governadores, os cofres estaduais padeciam com a queda de receitas resultante da crise econômica e o desenfreado aumento das despesas —principalmente pela pressão dos gastos com pessoal e Previdência.

O alívio garantiu o prolongamento das dívidas por 20 anos e concedeu descontos nas parcelas mensais até 2018, a um custo de R$ 50 bilhões para a União. Mas a pusilanimidade de Temer levou à fixação de contrapartidas insuficientes aos governos locais. Não houve compromisso de melhorias estruturais para compensar mais uma tunga na viúva.

Além do refinanciamento, o emedebista criou um regime diferenciado para gestões em situação falimentar. O RRF mirava o Rio de Janeiro e permitiu a suspensão dos pagamentos ao Tesouro Nacional por até seis anos a partir de um miraculoso e severo programa de ajuste fiscal.

Desde então, mais seis estados decretaram calamidade financeira (RS, MG, RN, RR, MT e GO) e buscam uma vaga na UTI federal ao lado do Rio —que até hoje se mantém respirando por meio de aparelhos.

Governadores vêm batendo à porta da equipe econômica de Jair Bolsonaro desde a transição de governo e viram espaço para vantajosa negociação após o gesto —equivocado— do ministro Paulo Guedes (Economia) de partilhar dinheiro do megaleilão do pré-sal com os entes regionais. Com a volta de Guedes de Davos, pretendem voltar à carga.

A deterioração das contas estaduais não se deu num estalar de dedos e hoje se tornou mais grave que o próprio déficit crônico da União. Governadores, congressistas e o presidente de plantão precisam mostrar empenho para atacar a origem do desequilíbrio, encarando de frente lobbies corporativos e empresariais, que perpetuam o gigantismo e a ineficiência da máquina estatal.