Independência

Crédito: Caio Gomez

A pobreza da independência

Cristovam Buarque*, Correio Braziliense

Amanhã, o Brasil comemora 200 anos de nação independente, sendo campeão de desigualdade, com 33 milhões de pessoas famintas e mais de 100 milhões com alimentação deficiente, cerca de 13 milhões de analfabetos — 25% da população pobre. A maioria é de raça negra e vive na região Nordeste. Esse é o maior fracasso de nossos 200 anos: a persistência da pobreza, apesar do êxito na economia que nos colocou entre as 10 nações mais ricas e o maior exportador de alimentos no mundo.

Desde 1822, tivemos dois imperadores, 38 presidentes, cerca de 10 mil parlamentares, milhares de intelectuais, mas a pobreza continua porque não desperta sentimento político de solidariedade, nem entendimento conceitual correto. A insensibilidade dos dirigentes em relação ao sofrimento dos pobres e a lógica equivocada sobre como nossos intelectuais explicam e propõem como superar a pobreza, explicam a pobreza da independência. O problema está no coração dos políticos e na mente de seus assessores: os primeiros não sofrem por causa da pobreza, os outros não entendem a real dimensão da pobreza, as causas e os meios para superá-la. A pobreza foi sequestrada pela elite no poder e pelo pensamento econômico. Não é vista como problema fundamental a ser enfrentado, e acredita-se que o crescimento da economia elimina a pobreza ao distribuir a renda ampliada.

Da mesma forma que, por 350 anos, a minoria branca e livre não se importou com os escravos, nem entendeu a importância da abolição para o país, há 135 anos, as classes privilegiadas aceitam com naturalidade o abandono de brasileiros na exclusão social da pobreza. Se os abolicionistas pensassem como economistas, a escravidão existiria até hoje, esperando o crescimento econômico. A escravidão foi abolida ao ser tratada como questão ética. É assim que a pobreza deve ser tratada. A superação da pobreza vai exigir que também seja tratada como imoral, uma vergonha a ser abolida.

Ao mesmo tempo, será preciso mudar o enfoque técnico de como é enfrentada. A principal causa da pobreza é a pobreza no entendimento de sua causa. A pobreza não decorre da falta de crescimento e renda na economia, mas por falta de comida, moradia, água, esgoto, atendimento médico, transporte urbano, escola, segurança. Desses itens, apenas comida e transporte dependem da renda pessoal, o resto exige políticas sociais e serviços públicos do Estado. Para solucionar a questão da pobreza, é preciso perceber que, como a escravidão, ela afeta não apenas os pobres, mas amarra toda a sociedade.

Depois de 200 anos, a independência precisa criar o que Joaquim Nabuco chamou, no século 19, de "instinto nacional" pela erradicação da escravidão. Agora, pela superação da pobreza com vontade e missão nacionais, e com o entendimento correto das políticas sociais e dos serviços públicos a serem ofertados a todos, com uma estratégia que assegure a cada um o que precisa para sair da pobreza. Entre eles, o mais importante é a educação de qualidade para todos. A sua qualidade aumenta a produtividade e o tamanho da renda nacional; a equidade para todas as crianças permite distribuir a renda, conforme o talento e o poder de pressão das massas pobres para obterem novos benefícios. Educação de qualidade para todos quebra o círculo vicioso que caracteriza os 200 anos de independência omissa diante da pobreza, tanto quanto foi diante da escravidão.

A pobreza de um pobre decorre da falta do essencial para sua sobrevivência plena. A pobreza da própria pobreza está na falta de sentimento político solidário e de um conceito técnico correto para explicá-la e superá-la. Até hoje, não tivemos governo com propósito de assegurar a cada família o necessário para não ser pobre. A pobreza foi sequestrada pela economia, no lugar de a economia ser instrumento da estratégia de sua erradicação. E em consequência a economia seria dinamizada, porque a pobreza é uma das causas do estancamento do progresso econômico, social e civilizatório, tanto quanto foi a escravidão ao longo de 66 dos 200 anos de independência.

Os Estados Unidos colocaram a missão de chegar à Lua antes das comemorações dos 200 anos de sua independência, o Brasil precisa definir sua missão a "segunda abolição" para as primeiras décadas de nosso terceiro século que se inicia amanhã. Para tanto, precisa querer politicamente superar a pobreza e entender corretamente as causas e as estratégias para a superação. Ao tolerar a permanência da pobreza, nossa independência é pobre: faz pobre milhões de brasileiros e esbarra no progresso.

*Cristovam Buarque - professor emérito da Universidade de Brasília (UnB) e membro da Comissão Internacional da Unesco para o Futuro da Educação.

Artigo publicado originalmente no Correio Braziliense


George Gurgel: O 7/9 - A afirmação da República e da democracia

Quais são a bandeiras a serem defendidas que nos levem à afirmação e à comemoração da democracia duramente conquistada no próximo 7 de setembro?

George Gurgel / Democracia Política e novo Reformismo

O que acontecerá no Brasil, no próximo dia 7 de setembro, quando estaremos comemorando os 199 anos de independência do Brasil. O que temos a comemorar? Quais são os nossos desafios históricos e atuais no caminho de uma sociedade democrática e sustentável?

O que está acontecendo no Brasil e com o Brasil a partir da vitória de Bolsonaro, sua chegada à Presidência da República e como tem sido o exercício do mandato bolsonarista e quais são as forças políticas que viabilizaram sua chegada ao poder e ainda o apóiam hoje neste cenário preocupante da vida política, econômica e social brasileira, às vésperas do 7 de setembro?

No Brasil, a polarização da cena política, acentuada de uma maneira contundente nas últimas eleições presidenciais, levou Jair Bolsonaro à Presidência em 2018. As forças conservadoras chegaram ao poder pelo voto, com apoio dos militares, através de uma liderança que foi menosprezada até às eleições pelos partidos hegemônicos da política brasileira que venceram a maioria das eleições, desde a Constituição democrática e cidadã de 1988.

Assim, a vitória de Bolsonaro foi uma consagradora vitória das forças conservadoras, do discurso econômico neoliberal, de uma participação efetiva dos militares que voltam à cena política e a derrota daquelas forças políticas fiadoras da transição democrática e que estiveram de maneira alternada no centro do poder no Brasil, nos últimos 30 anos. Foi principalmente a derrota do PSDB e do PT, de como agiram e exerceram o poder durante os mandatos na Presidência da República, antes da eleição de Bolsonaro.

O que ainda está por vir neste cenário de discursos extremados que dominam o cenário político brasileiro em plena pandemia?

Quais são as alternativas e as bandeiras a serem defendidas que nos levem à afirmação e à comemoração da democracia tão duramente conquistada pela sociedade brasileira no próximo 7 de setembro?

O Governo Bolsonaro

Desde os primeiros dias do mandato de Jair Messias inaugura-se uma maneira de governar pautada em uma agenda presidencial espetacularizada e centrada na pessoa do próprio presidente.

A maneira de ser dele, desde o exercício do seu primeiro mandato de deputado federal, durante a campanha de 2018 e no exercício da Presidência, era, de certa forma, conhecida. Portanto, a sociedade brasileira sabia quem era Bolsonaro, que vem causando sérios problemas à governabilidade do País nas suas relações com os outros poderes republicanos, de uma maneira mais beligerante com o Judiciário. Amplia-se, em plena pandemia, as crises política, sanitária, social e econômica que se acumulam, com conflitos e transtornos cotidianos que impactam a sociedade, levando à perplexidade e ao incômodo as relações do atual governo brasileiro com a própria sociedade brasileira e a comunidade internacional.


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A defesa da democracia e da República

O imperativo de defesa e ampliação da democracia, assim como o caminho para a construção de novas relações políticas, econômicas e sociais centradas na preservação da vida, da própria natureza e de uma cultura de paz, continuam sendo os principais desafios da sociedade brasileira e mundial durante e pós pandemia.

A pactuação desta perspectiva sustentável é o desafio colocado às dificuldades que estamos vivendo no Brasil, ampliadas com a maneira de ser e governar do presidente Bolsonaro. A pandemia desafia a sociedade brasileira e mundial na construção de novas relações centradas no que nos faz humanidade e dá sentido às nossas vidas: a cooperação, a solidariedade, a luta pela igualdade, liberdade e fraternidade. Coloca nas ruas e nas redes sociais do Brasil e do mundo a tragédia de milhões de pessoas, excluídas das conquistas elementares: trabalho, alimentação, moradia, saúde e saneamento básico.

Portanto, em relação ao Governo Bolsonaro, a sociedade brasileira continua desafiada ao enfrentamento da beligerância e da imprevisibilidade do próprio presidente que desgovernando afronta o funcionamento do Estado de Direito, da Constituição e dos valores republicanos. 

Jair Messias, na sua anterior atividade parlamentar e agora no exercício do mandato presidencial, traz para a cena política um ativismo beligerante do conservadorismo, parte integrante da história brasileira, ao longo da vida republicana. Ameaça e despreza as conquistas do Estado de Direito e da Constituição de 1988. Está recolhido ao seu labirinto familiar, com apoio de lideranças civis e militares conservadoras e ainda de uma parcela significativa da sociedade brasileira.

A política para o presidente Jair Bolsonaro é o confronto. Confronto cotidiano – mesmo quando tenha que recuar no dia seguinte.  É o modo dele de ser e de agir.

Antes, durante o próximo 7 de setembro e depois, a sociedade brasileira e as suas representações devem de maneira contundente manifestar-se defendendo o Estado de Direito e a Democracia, apontando alternativas democráticas ao Bolsonarismo no caminho de superação da nossa difícil realidade econômica, social e ambiental que exclui a maioria da cidadania brasileira dos seus direitos constitucionais, impactados pelo aumento da inflação, da gasolina e dos alimentos de primeira necessidade.

Como enfrentar essa realidade?

O Governo Bolsonaro movimenta-se para o confronto no dia 7 de setembro.  A crise e a perda de apoio que vem sofrendo nas próprias forças armadas, na área política e empresarial, tornam-no mais inconsequente e agressivo. As sucessivas hospitalizações a partir do episódio da facada, o estado de instabilidade da saúde, as denúncias de envolvimento da família com as milícias e as rachadinhas agravam ainda mais o seu comportamento beligerante, traço da personalidade do capitão Bolsonaro, desde quando servia ao Exército. Governa olhando para o retrovisor, com um saudosismo anacrônico da última ditadura militar, desafiando a sociedade, os poderes da República, insinuando-se como comandante supremo das Forças Armadas. Blefa o tempo todo. Apela para a população, para as Forças Armadas e para as polícias militares querendo demonstrar uma liderança que já não exerce entre os seus eleitores que o levaram ao Palácio do Planalto.


Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
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Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
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Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
Protestos contra Bolsonaro em Brasília (24/07/2021). Foto: Ricardo Stuckert
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Neste contexto, o próximo 7 de setembro é o nosso rubicão. Vai ser um momento importante de avaliação de quem ainda apoia o presidente Bolsonaro entre os militares e a sociedade em geral.

A independência conquistada em 7 de setembro de 1822 está, mais uma vez, na berlinda. O futuro da Sociedade e da Democracia deve ser, e vai ser, mais generoso para todos os brasileiros e brasileiras. O momento nos coloca a necessidade de refletir e de agir.

A sociedade brasileira está demandada à construção de uma alternativa democrática ao bolsonarismo. A tecelagem de uma alternativa democrática às crises política, econômica, social e sanitária é o desafio de trabalhar a unidade das forças democráticas, dialogando com a cidadania, com o mundo do trabalho e da cultura para a mobilização de uma frente ampla que garanta o Estado de Direito, a defesa da Constituição e a as reformas, garantindo a melhoria de vida da população brasileira.            

As opções entre a democracia e a barbárie continuam postas. A democracia venceu os grandes embates no século XX. É um processo em construção.  A questão democrática se impõe como um valor para a sociedade nas suas relações entre si e com a própria natureza.

Portanto, a mobilização e as bandeiras a serem desfraldadas no próximo 7 de Setembro devem ser a de defesa da Constituição, do Estado de Direito e da Democracia.

Estamos desafiados.    

Salve o 7 de Setembro!

Salve a República e a Democracia! 

*Professor da UFBA e do Instituto Politécnico da Bahia

Fonte: Democracia Política e novo Reformismo
https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/09/george-gurgel-de-oliveira-o-7-de.html


Elimar Pinheiro: Duas ou três ideias antes do 7 de Setembro

Elimar Pinheiro do Nascimento / Democracia Política e novo Reformismo

Especialistas, amigos ou conhecidos, têm-me dito que não há qualquer possibilidade de golpe militar no Brasil nos dias de hoje. Como já vivi um bom tempo, desconfio. Nas vésperas do golpe de 1964, ainda garoto, escutava a conversa dos mais velhos de que não havia possibilidade de golpe porque Jango tinha um esquema militar. Alguns anos depois, já estudante universitário, pensei ir viver no Chile e consultando amigos que conheciam o país, todos me disseram, em 1972, que não havia possibilidade de golpe, Chile não tinha esta tradição e os seus generais eram constitucionalistas. Se os especialistas de ontem falharam porque os de hoje não falharão?

Os argumentos em favor da impossibilidade de golpe hoje são outros. O que é normal, afinal, a sociedade brasileira é mais complexa e mais moderna, e o contexto internacional, com o fim da guerra fria, é melhor acolhedora de um processo de ruptura com a democracia. Não haveria, hoje, motivos de golpe, nem apoio social ou internacional. Será?

No plano internacional os apoios, imediatamente, não virão da América do Norte ou da Europa, mas da Rússia, por interesse geopolítico, e da China, sobretudo por interesse econômico. Um e outro país não tem qualquer apreço pela democracia ocidental, e suas relações internacionais, como é de hábito, são absolutamente pragmáticas. A resistência das democracias ocidentais duraria quanto tempo? E como se expressaria?

Internamente há um apoio social relevante, embora não mensurável. Parte do empresariado, das classes médias e dos setores populares é autoritária, racista e homofóbica. Ou seja, um golpe não estará de todo despido de apoio social.

O argumento de que o líder do movimento golpista é alguém despreparado e imprevisível não corresponde ao que a história nos tem ensinado. Tanto Hitler quanto Mussolini eram figuras medíocres.

Há condições outras que contam a favor de um golpe. O desgaste de instituições democráticas, como o STF e o Congresso Nacional, alimenta os sentimentos golpistas. São duas instituições com imagens absolutamente desgastadas entre os brasileiros.

Um outro fator favorável é o fato de que o regime democrático no Brasil tem se mostrado incapaz em assegurar a prosperidade e a segurança da população.

No âmbito das FFAA não há consenso sobre o gesto, mas há dois fatores favoráveis. O primeiro é a recusa ao PT, que já havia antes de 2002, mas foi incrementado com a corrupção constatada no Mensalão e na Lava Jato, desde o governo Lula e a instalação da Comissão da Verdade, no governo Dilma. Persiste, portanto, um sentimento de recusa ao retorno do PT ao poder, e particularmente a Lula. O segundo está relacionado às políticas identitárias do PT e das esquerdas, que vão contra o conservadorismo dos costumes de grande parte dos dirigentes militares.

A questão é saber o quanto os ganhos compensam as perdas, pois um golpe militar, pelo menos a curto prazo, irá impactar negativamente nossas relações comerciais, os investimentos e as iniciativas locais, sem nenhuma garantia de que a nova condução conseguirá responder às demandas da população por emprego, renda e segurança, com acesso à educação e, sobretudo, à saúde.

Um golpe militar tem algo em comum com uma CPI: sabemos como começa, mas não como termina, ou melhor, como prossegue. Em 1964, os militares pensavam deixar o poder dois ou três anos depois. E vários políticos que os acompanharam acabaram sendo perseguidos, podendo o mesmo ocorrer com algumas personalidades ligadas, hoje, ao Centrão. Não se sabe de antemão quais os vencedores e quais os perdedores em um movimento dessa natureza a médio prazo.

Em circunstâncias similares nem sempre prevalece a racionalidade. Por vezes, o que vence é a emoção da recusa do outro. Portanto, o golpe é possível, não sei o quanto de provável.

Há dois caminhos para evitá-lo. Um é o impeachment, que a maioria do Congresso não quer, o PT inclusive. O outro é ter uma alternativa política que possa chegar ao segundo turno e vencer quem lá estiver, Bolsonaro ou Lula. Claro, se o golpe não ocorrer antes.

A conclamação para que os candidatos, fora da polarização, se unam em torno de uma só candidatura, é inútil. É pregar no deserto. Possibilidade perto de zero de ocorrer. Quem convencerá Lula, Ciro ou Doria, se ganhar a escolha interna no PSDB, de não serem candidatos?

A única possibilidade é que um dos candidatos fora da polarização, que começam a se apresentar, como Rodrigo Pacheco, Eduardo Leite, Alessandro Vieira, Simone Tebet ou outro, consiga ganhar visibilidade e apoio ao ponto de inibir outros, cacifando-se para o segundo turno. E se um desses chegar terá todas as chances de vencer.

*Sociólogo político e socioambiental, Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília e do Programa de Pós-Graduação Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas

Fonte: Democracia Política e novo Reformismo
https://gilvanmelo.blogspot.com/2021/09/elimar-pinheiro-do-nascimento-duas-ou.html


CNBB pede respeito à democracia e às instituições

Dom Walmor afirmou na mensagem que o país "está sendo contaminado por sentimento de raiva e de intolerância"

Correio Braziliense

Em vídeo sobre o 7 de Setembro, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) orientou os brasileiros a não se deixarem convencer por “quem agride os poderes Legislativo e Judiciário”, num recado ao presidente Jair Bolsonaro. “A existência de três Poderes impede totalitarismos, fortalecendo a liberdade de cada pessoa”, afirmou o presidente da CNBB, dom Walmor Oliveira de Azevedo. “Independentemente de suas convicções político-partidárias, não aceite agressões às instituições que sustentam a democracia.”

Dom Walmor afirmou na mensagem que o país “está sendo contaminado por sentimento de raiva e de intolerância” e se opôs a uma série de bandeiras e políticas de Bolsonaro, entre as quais o incentivo e a facilitação da compra de armas de fogo por civis.

“Muitos, em nome de ideologias, dedicam-se a agressões e ofensas, chegando ao absurdo de defender o armamento da população. Quem se diz cristã ou cristão deve ser agente da paz, e a paz não se constrói com armas”, disse.

Bolsonaro e apoiadores apelaram ao discurso de viés religioso para conclamar cristãos a aderirem às manifestações a favor do Planalto. Isoladamente, padres haviam incentivado católicos a participarem dos protestos em defesa de Bolsonaro.

Além do apoio ao presidente, a pauta tem dois assuntos já superados no Congresso: voto impresso e impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal. Parte dos bolsonaristas também clama por uma intervenção militar. Pastores de igrejas evangélicas engrossaram as convocações do movimento bolsonarista, alegando a defesa da liberdade de expressão e de culto, e prometeram uma mobilização sem precedentes.

Por meio de seu presidente, a cúpula da principal entidade da Igreja Católica no país demonstrou preocupação com atos violentos e pediu respeito à vida durante as manifestações de rua no Dia da Independência, diante do agendamento de protestos contra e a favor do governo federal. O mote da campanha da CNBB é “somos todos irmãos”.
“Respeite a vida e a liberdade de seu semelhante. Aquele com quem você não concorda é também amado e tem uma família que aguarda o seu retorno com segurança”, apelou dom Walmor. “As desavenças não podem justificar a violência, a intolerância nos distancia da Justiça e da paz, afasta-nos de Deus.”

Excluídos

O presidente da CNBB também defendeu uma série de posições contrárias à gestão Bolsonaro. Ele lembrou da alta da inflação e do desemprego, da fome e da miséria, pautas que o governo evita comentar. “Não podemos ficar indiferentes a essa realidade, que mistura o desemprego e a alta inflação, acentuando gravemente exclusões sociais. São urgentes políticas públicas para a retomada da economia, e a inclusão dos mais pobres no mercado de trabalho”, disse.

O líder dos bispos católicos afirmou que a pandemia da covid-19 “é mal que ainda nos ameaça”, sugeriu respeito às medidas de distanciamento social e definiu a vacinação como uma “tarefa cristã”.

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/09/4947685-cnbb-pede-respeito-a-democracia-e-as-instituicoes.html


Ricardo Noblat: À medida que se enfraquece, mais perigoso Bolsonaro se torna

Até que melhore, a situação ainda vai piorar muito

Blog do Noblat / Metrópoles

Quanto mais isolado fica, mais perigoso se torna Jair Bolsonaro. Quanto mais votos ele perde como candidato à reeleição, mais dobra sua aposta no golpe que o manteria no poder.

Se não há consenso político para derrubá-lo, também não haverá para fazê-lo ditador caso seja derrotado na eleição do ano que vem – mas isso não o impedirá de continuar tentando até lá.

“A situação ainda vai piorar muito antes que possa começar a melhorar”, disse, ontem, a este blog um ministro do Supremo Tribunal Federal. Com ele concordam políticos de todas as cores.

Como atravessar os 16 meses que restam ao governo se Bolsonaro seguir esticando a corda na esperança de rompê-la a seu favor? Por ora, ninguém em Brasília ou fora daqui tem a resposta.

Ninguém acredita também numa súbita conversão de Bolsonaro à democracia. Presidente não pode tudo, mas pode muito. E o muito que pode basta para causar severos estragos ao país, como se vê.

Fernando Collor montou um ministério de notáveis imaginando com isso driblar o risco de impeachment – não adiantou. Eleito presidente com forte apoio militar, nem por isso apelou à farda.

Dilma se elegeu e se reelegeu contra a vontade dos militares. Acabou derrubada com o discreto apoio deles. Michel Temer salvou-se do impeachment apelando aos políticos, não às armas.

A única boa notícia do momento é a resistência cada vez maior da Justiça, do Congresso e de setores amplos da sociedade à ideia de trocar a democracia pela ditadura.

Para alguma coisa, afinal, serviria um presidente insano.

Fonte: Metrópoles
https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/ricardo-noblat/a-medida-que-se-enfraquece-mais-perigoso-bolsonaro-se-torna


El País: Independentistas da Catalunha derrotam Governo espanhol em eleição com participação recorde

Bloco de partidos que querem a separação da Espanha consegue a maioria das cadeiras e poderá eleger novo presidente catalão

Em uma eleição parlamentar apertada nesta quinta-feira, que retratou uma população dividida, os independentistas da Catalunha saíram como os grandes vitoriosos da batalha com o Governo espanhol que se arrasta há meses. Apesar de um partido anti-separatista (Ciudadanos) ter conseguido obter a maior quantidade de cadeiras de deputados, o bloco formado pelos três partidos que defendem o descolamento da Espanha conseguiu a maioria das vagas e terá a quantidade de votos necessária para indicar o próximo presidente catalão. Impuseram, assim, uma derrota ao Governo do primeiro-ministro Mariano Rajoy, que no final de outubro dissolveu toda a cúpula de poder da Catalunha e convocou novas eleições como resposta à realização de um referendo separatista ilegal. A expectativa governista de que a crise poderia ser amenizada após o pleito se esvai e uma nova etapa de incertezas se abre em um país já fraturado.

A eleição desta quinta teve dados de participação históricos: com 90% das urnas apuradas, já se apontada que mais de 80% dos 5,5 milhões de catalães aptos a votar compareceram às urnas, comprovando a importância que este pleito adquiriu na Catalunha. A decisão era maior do que uma simples eleição de deputados. Ela apontaria se o processo separatista ganharia um novo ímpeto ou se seria rechaçado. Durante o dia, os candidatos e líderes dos movimentos convocaram a população para a votação e filas de até 40 minutos foram registradas em alguns colégios eleitorais. Tudo transcorreu sem incidentes, ao contrário do que foi registrado na votação do referendo independentista de 1º de outubro, marcado por forte repressão policial por parte do Governo de Rajoy e o confisco de urnas. Na ocasião, 90% dos votantes disseram sim à independência em uma votação de pouca segurança eleitoral, mas apenas 42% dos aptos a votar participaram —muitos deixaram de ir às urnas porque não queriam legitimar o processo considerado ilegal.

No bloco independentista, o partido que logrou a maior quantidade de cadeiras foi o Junts per Catalunya, cuja lista de deputados é encabeçada justamente por Carles Puigdemont, o ex-presidente destituído por Rajoy após o referendo e que fugiu para Bruxelas para evitar a prisão. Foi seguido pela ERC (Esquerda Republicana da Catalunha), cuja cabeça da lista é ocupada por Oriol Junqueras, o ex-vice-presidente da comunidade autônoma, que se encontra preso preventivamente em Madri. A CUP (Candidatura de Unidade Popular), terceiro partido do bloco independentista, assegurou as vagas restantes para que o bloco obtivesse ao menos 68 das 135 cadeiras do parlamento.

"As forças independentistas voltaram a ganhar as eleições na Catalunha apesar da ofensiva policial e da ofensiva midiática do Governo espanhol", comemorou Marta Rovira, a número dois da ERC. "O resumo desta noite é muito simples: o independentismo voltou a ganhar as eleições e Mariano Rajoy perdeu", destacou. Puigdemont também se pronunciou, de Bruxelas: "Os catalães temos que decidir a solução e nosso futuro, e nenhuma receita que queira prescindir das maiorias parlamentares na Catalunha funcionará."

Os três partidos, que na última eleição, em 2015, lançaram uma candidatura única (a coligação Junts per Sí ou Juntos pelo Sim) não conseguiram chegar, desta vez, a um acordo para formar uma lista de deputados única, mas garantem que se unem em determinados pontos, como a "recuperação das instituições após a aplicação do artigo 155 da Constituição", que permitiu que o Governo central espanhol destituísse o Governo catalão. Uma das discordâncias, especialmente entre o Junts per Catalunya e a ERC era, justamente, sobre o nome que o bloco apontaria para a presidência da comunidade autônoma, caso obtivesse a maioria das cadeiras. Junts per Catalunya é a favor de devolver o Governo a Puigdemont. Enquanto a ERC prefere indicar Junqueras. A incógnita agora é saber a qual nome comum eles devem chegar e se qualquer um dos dois, ausentes fisicamente do Parlamento, poderá assumir a tarefa.

Os partidos anti-independentistas, que formam o bloco denominado constitucionalista (pois apoiam a aplicação do artigo 155 da Constituição e a decisão do Tribunal Constitucional de que o referendo separatista é inconstitucional), também chegaram à eleição divididos em três partidos: Ciudadanos, Partit dels Socialistes e o PP de Rajoy, que tem pouca força na Catalunha. Apesar de suas diferenças políticas, eles prometeram se unir em um Governo de coalizão caso somassem a quantidade de cadeiras suficientes para formar a maioria e eleger um presidente e, com isso, colocar um ponto final no processo independentista. Ciudadanos foi o partido com o melhor desempenho e conseguiu assegurar a maioria das vagas do Parlamento, mas o desempenho dos demais partidos do bloco fez com que eles não alcançassem a maioria.

Após os resultados, o líder do PP na Catalunha, Xavier García Albiol, reconheceu que os constitucionalistas "não foram capazes de gerar uma alternativa diferente ao separatismo no Parlamento". " "Vemos com muita preocupação um futuro social e econômico para a Catalunha com uma possível maioria independentista", ressaltou.

 


Arnaldo Jordy: A Pátria em crise

A passagem do dia 7 de setembro este ano foi marcada pelo grave momento de crise econômica e política vivida pelo Brasil. O país precisa urgentemente resgatar o sentimento de soberania duramente conquistada com o sangue derramado de milhões de brasileiros que lutaram pela Independência. No Pará, os cabanos se levantaram contra o opressor na defesa de um Brasil para os brasileiros. Hoje, a luta pela dignidade continua no urgente combate à corrupção, essa chaga que envergonha a maioria dos brasileiros, e pela construção de um projeto de país mais justo, desenvolvido, soberano e sustentável.

Felizmente, os fatos conspiraram para que um bandido que já deveria estar preso, Joesley Batista, entregasse inadvertidamente à Justiça as provas de sua própria corrupção para tentar manipular o Judiciário a seu favor, cooptando também um procurador federal, Marcelo Miller, e oferecendo provas importantes e válidas, sim, mas em troca de implodir o Supremo Tribunal Federal e a própria Lava Jato, tudo para escapar incólume de graves acusações e ainda, como ele mesmo disse, “fechar o caixão” da política brasileira, jogando a todos na vala comum da corrupção, enquanto ele se radicaria em outro país com suas empresas abastecidas com dinheiro público, certamente rindo da cara de todos nós.

Seu intento de botar os três poderes da República no chão, entretanto, não vingou, ainda que estejam sob graves suspeitas, como disse a presidente da Suprema Corte, Cármen Lúcia. Felizmente, ficou claro que o que houve foram insinuações e tentativas de chegar ao procurador-geral via Marcelo Miller, e aos ministros do Supremo via o advogado e ex-ministro José Eduardo Cardozo. Mas nenhuma acusação grave pesa contra o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nem contra qualquer ministro do Supremo. Joesley Batista, ao contrário do que pretendia, deverá perder os benefícios da delação premiada que fez e provavelmente pagará na cadeia pelos seus crimes, que começaram pelo uso do dinheiro público, via BNDES, nos governos petistas. Rodrigo Janot, aliás, com equilíbrio e firmeza mandou investigar a participação do ex-procurador federal Marcelo Miller no acordo fechado com Joesley Batista, medida indispensável para preservar o bom andamento da Lava Jato.

Na semana passada, a Procuradoria Geral da República fez a denúncia de todos os envolvidos do PP no Petrolão. Esta semana, foi a vez do chamado “quadrilhão” do PT, também envolvidos em desvios bilionários das Petrobras. Os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff estão entre os denunciados pela PGR. Ambos são suspeitos de participar de organização criminosa que recebeu R$ 1,485 bilhão em propina para políticos do PT. Lula é apontado por Janot como líder e “grande idealizador” da organização criminosa. Somente Lula teria recebido R$ 230,8 milhões de propina entre 2004 e 2012 da Odebrecht, OAS e Schahin, com recursos desviados de contratos firmados com a Petrobras.

A situação de Lula e Dilma se agrava ainda mais com as denúncias feitas pelo ex-ministro Antônio Palocci, que deu depoimento contundente, detalhado e preciso à Lava Jato. Palocci foi um dos cinco quadros de maior peso nas estruturas de poder dos governos petistas, juntamente com Lula, Dilma, o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro João Vaccari. Não se trata, portanto, de um depoimento qualquer.

Assim como o PT não deve escapar ileso dos graves atos que cometeu durante seus 13 anos de governo, outros grandes partidos, PMDB, PP e figuras do PSDB, também devem responder pelos crimes que escandalizam a nação, como a cobrança direta de propina em dinheiro vivo entregue em malas. Os mais de R$ 51 milhões encontrados em um apartamento utilizado pelo ex-ministro Geddel Vieira Lima e os pagamentos feitos por Joesley Batista ao ex-deputado Rocha Loures e ao primo do senador Aécio Neves são provas de que de que ainda há muito para ser investigado. Geddel, segundo o áudio gravado por Joesley Batista com Temer, era seu homem de confiança, assim como da confiança do ex-deputado Eduardo Cunha. É difícil de acreditar que os R$ 51 milhões encontrados no apartamento eram apenas dele.

O que cabe agora é cobrar para que os criminosos e denunciados não tirem partido das tentativas de desmoralizar a Lava Jato para escapar incólumes. Afinal, é o que está ajudando a passar o Brasil a limpo. Essa deve ser a cobrança da sociedade brasileira em defesa da Pátria, que precisa da continuidade da operação.

* Arnaldo Jordy é deputado federal pelo PPS-PA e líder do partido na Câmara dos Deputados

 


José Aníbal: A flechada contra a agenda de recuperação do Brasil

O Brasil é ainda jovem quando se pensa na comunidade internacional: neste 7 de setembro, completamos 195 anos como nação independente, sendo 128 como República, e o atual período democrático soma pouco mais de três décadas.

O regime constitucional em vigor chegará aos 30 anos no ano que vem, quando elegeremos o presidente que levará o país ao bicentenário de 2022.

Nesse curso da história, o quanto aprendemos a viver como nação? Quais as experiências e práticas institucionais que já estão consolidadas, e quais são as que ainda precisamos aprimorar?

São perguntas que naturalmente exigem reflexão e ganham mais densidade no mundo contemporâneo, quando estão em debate questões como as funções, a eficiência e musculatura do estado e o papel de suas instituições, a crise da representatividade política, os avanços e as limitações que a própria democracia propicia às sociedades.

No caso brasileiro, a complexidade torna-se maior, exigindo ainda mais discernimento, compromisso e responsabilidade dos agentes públicos.

Nesse sentido, causa assombro e indignação ver a repetição de distorções dos papéis a serem cumpridos pelos que abraçam a causa pública. Como bem disse nesta semana o governador Geraldo Alckmin, as novidades de que o Brasil precisa são a verdade e a defesa do interesse coletivo, para que este se sobreponha aos objetivos das corporações que tomaram conta tanto de setores estatais como privados.

A política no dia a dia do governo e do Congresso obviamente precisa ser exercida com mais responsabilidade, mais conectada com os anseios e exigências da sociedade. Mas também é preciso avançar – e muito – nos outros pilares fundamentais do estado: o Poder Judiciário e o Ministério Público.

Quando regras são desrespeitadas, interesses pessoais e corporativistas são colocados à frente dos deveres institucionais, joga-se o país em aventuras e incertezas. Coloca-se em xeque a credibilidade não só deste ou daquele agente público, mas da própria ideia de república e de nação civilizada e democrática.

O ímpeto com que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, se lançou nos últimos meses a disparar denúncias e acusações aos cântaros com base numa delação premiada bastante questionável, promovendo uma tempestade institucional sem precedentes, revelou-se agora açodado, inconsistente e movido por motivações ainda a serem explicadas.

Sob o pretexto de combater a corrupção e defender os interesses coletivos, deixou livres a dupla de empresários enriquecida pelo mais nocivo “capitalismo de compadrio” do lulopetismo e provocou um abalo que trouxe prejuízos intangíveis e incalculáveis. Foi uma verdadeira flechada na agenda para a retomada do crescimento econômico e da reorganização do estado brasileiro.

Quando Janot apresentou pedido para investigar o presidente da República durante o exercício do mandato, uma situação inédita e grave na história republicana, o Congresso estava prestes a aprovar a mais fundamental das medidas de ajuste das contas públicas.

A reforma da Previdência vai colocar um ponto final definitivo nas benesses previdenciárias da elite da burocracia – da qual fazem parte políticos e assessores legislativos, mas principalmente juízes, desembargadores, promotores e procuradores – e garantiria a sustentabilidade das aposentadorias e pensões da imensa maioria dos brasileiros. Por isso despertam tão forte reação das corporações, auxiliadas pela turma do “quanto pior melhor” de sempre.

Coincidentemente, no mesmo dia em que o procurador-geral admitiu falhas na delação dos irmãos Batista, o Conselho Nacional de Justiça atualizou as estatísticas de um problema bastante conhecido: o Judiciário brasileiro resolve menos de 1 em cada 4 processos em tramitação e custa mais caro do que os equivalentes de países europeus ou dos Estados Unidos. Em média, um magistrado brasileiro custa quase R$ 48 mil mensais. O salário mínimo é R$ 937,00. O salário médio dos trabalhadores brasileiros gira em torno de R$ 2.000,00.

A eficiência da Justiça é tão importante quanto a do Congresso e do governo. Todos os poderes devem prestar um bom serviço ao cidadão, cumprir com suas tarefas e ter o interesse coletivo como prioritário. É assim que se tornarão fortes, e não com arroubos de justiçamento ou voluntarismo. É assim que, perto de seus 200 anos de independência, o Brasil poderá ser um país com instituições sólidas e um povo orgulhoso de sua República.