independência do brasil

Foto: Renan Martelli da Rosa/Shutterstock

Revista online | 1789 e 1822: duas datas emblemáticas

Ivan Alves Filho*, especial para a revista Política Democrática online (47ª edição: setembro/2022)

O que verdadeiramente importa para a análise da Conjuração Mineira, em sua estreita ligação com os acontecimentos que culminaram na Independência do Brasil, é a compreensão do seu sentido histórico. Qual o traço de união existente entre o revolucionário Joaquim José da Silva Xavier, os poetas Tomás António Gonzaga e Cláudio Manoel da Costa e destes ao Padre Toledo e ao alfaiate Vitoriano Veloso? Todos sonharam com um país mais próspero e soberano. E o fizeram, basicamente, no espaço que vai do chamado Campo das Vertentes à região de Outro Preto, em Minas Gerais. 

Na ordem do dia estava a luta pela construção da Nação brasileira. Essa é a característica fundamental do movimento de 1789, em Minas Gerais. E por que Minas? Porque em suas terras se formou, pela primeira vez entre nós, um mercado interno, colocando o brasileiro de Goiás em contato com o brasileiro do Rio de Janeiro e este com o brasileiro da Bahia. Para a região das minas, entrava o gado de outras áreas e o sal do Rio de Janeiro. Pela outra porta, saía o ouro. E por aí vamos. Ou seja, estava sendo plantada a semente da união entre os brasileiros e as prisões que ocorreriam em vários pontos da Colônia revelavam isso: conjurados foram detidos tanto na Capitania do Rio de Janeiro quanto naquela de Minas Gerais e mesmo na Bahia e no Mato Grosso. Nunca é demais recordar que Minas Gerais era o centro geográfico do futuro país, e que suas terras faziam divisa com várias outras capitanias. Surgia assim um sentimento de brasilidade, que a cultura tão bem expressava, o mesmo se dando com a nova organização econômica e até a conformação geográfica como ficou dito. É de se observar que, por aqui, a cultura saía na frente, como que se antecipando ao Estado Nacional. Todo o poder à sociedade civil, tal poderia ser a palavra de ordem da Conjuração Mineira.

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O ouro de Minas Gerais (cerca de 75% de todo o ouro extraído na Colônia) contribuía para integrar o Brasil à nova fase da ordem econômica mundial, pautada pela acumulação primitiva de capital. Isso fazia com que os revolucionários de 1789 se movessem em um contexto marcado pela irrupção do ideário burguês no Ocidente. Eram os tempos da Revolução Americana e das transformações revolucionárias na França. Com a seguinte diferença, que dificultava um pouco mais as coisas: a Revolução Burguesa nos trópicos se processava em um ambiente colonial-escravista. As barreiras a serem transpostas eram portanto muito grandes e bem diferentes daquelas das Metrópoles em transição para o modo de produção capitalista.

A ousadia desse movimento político pode ser medida pelo fato de que, entre nós, o Estado nascera de fora para dentro, quase que por decreto. O que possibilitou isso foi o Regimento Tomé de Sousa, datado de 1548, o qual organizara as bases da ocupação do país, forjando toda uma administração. A primeira capital da Colônia, Salvador, surge desse processo. Havia algo de artificial nisso? Certamente. Sob essa ótica, o sonho dos revolucionários de 1789 ganha ainda maior relevo, uma vez que  combinava com uma realidade concreta, ou seja, a nacionalidade em formação - a qual, por seu turno, apresentava problemas reais e até novos. Urgia, assim, tentar uma solução. Dessa vez, o Estado fazia mais sentido.

Confira, abaixo, galeria de imagens:

Estátua de Tiradentes, em Minas Gerais | Foto: Luis War/Shutterstock
Igreja Matriz de Santo Antônio na cidade de Tiradentes, patrimônio cultural de Minas Gerais | Foto: Fred S. Pinheiro/Shutterstock
Rua de pedras e casas com estilo predominante da região de Minas Gerais | Foto: Márcia Heliane Gomes
Duzentos  anos da Independência do Brasil | Foto: Gerson Fortes/Shutterstock
Revolução Americana | Foto: Joseph Sohm/Shutterstock
A Revolução Burguesa nas regiões se processava em um ambiente colonial - escravista | Foto: woff/Shutterstock
A abolição da escravatura no Brasil foi decretada em 13 de maio de 1888, por meio da Lei Aurea | Foto: Valery Sidelnykov/Shutterstock
A Proclamação da República aconteceu em 15 de novembro de 1889 e resultou na derrubada da monarquia e na instauração da república no Brasil | Foto: Leonidas Santana/Shutterstock
Estátua de Tiradentes, em Minas Gerais
Igreja Matriz de Santo Antônio na cidade de Tiradentes, patrimônio cultural de Minas Gerais
Rua de pedras e casas com estilo predominante da região de Minas Gerais
Duzentos anos da Independência do Brasil
Revolução Americana
A Revolução Burguesa nas regiões se processava em um ambiente colonial - escravista
A abolição da escravatura no Brasil foi decretada em 13 de maio de 1888, por meio da Lei Aurea
A Proclamação da República aconteceu em 15 de novembro de 1889 e resultou na derrubada da monarquia e na instauração da república no Brasil
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Estátua de Tiradentes, em Minas Gerais
Igreja Matriz de Santo Antônio na cidade de Tiradentes, patrimônio cultural de Minas Gerais
Rua de pedras e casas com estilo predominante da região de Minas Gerais
Duzentos  anos da Independência do Brasil
Revolução Americana
A Revolução Burguesa nas regiões se processava em um ambiente colonial - escravista
A abolição da escravatura no Brasil foi decretada em 13 de maio de 1888, por meio da Lei Aurea
A Proclamação da República aconteceu em 15 de novembro de 1889 e resultou na derrubada da monarquia e na instauração da república no Brasil
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Mesmo assim, a Conjuração de 1789 colocou questões que só se resolveriam de fato mais de trinta anos depois (e este é o caso da Independência, em 1822). Ou, ainda, abordou lutas que teriam seu ápice na Abolição e na Proclamação da República, um século mais tarde!

Pode-se conjecturar que a Independência deixou intactas tanto as relações escravistas de produção quanto o sistema fundiário que lhe daria suporte. Isso só revela o quanto a Conjuração Mineira se antecipou historicamente, o quanto ela possuía inegáveis traços inovadores. É necessário ressaltar isso. 

Como toda e qualquer prática que se pretenda revolucionária, a Conjuração Mineira foi atravessada de contradições. Nela, havia setores mais avançados e outros menos avançados. As revoluções são assim; nunca são quimicamente puras. Quem quiser que pense o contrário. Mais: por vezes, a situação histórica concreta, os limites impostos pelo movimento real da vida, impede a solução de certos problemas. 

Seja como for, firmamos a convicção de que a Conjuração Mineira foi o máximo de consciência possível de sua época. Vale dizer, a Conjuração Mineira foi o Brasil antes do Brasil.

Sobre o autor

*Ivan Alves Filho é historiador licenciado pela Universidade Paris-VIII (Sorbonne) e pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris. Os mais recentes de suas dezenas de livros publicados são Os nove de 22: o PCB na vida brasileira e Presença negra no Brasil: do século XVI ao início do século XXI.

** O artigo foi produzido para publicação na revista Política Democrática online de maio de 2022 (47ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não reflete, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Jorge Caldeira e os 199 anos da Independência do Brasil

Escritor analisa as conquistas históricas da Declaração de Independência e defende a economia sustentável para o futuro do país

João Rodrugues, da equipe da FAP

O Brasil completa hoje 199 anos da Independência, marcada pelo grito Dom Pedro I, às margens do Rio Ipiranga, em 7 de setembro de 1822. Neste episódio extra, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) conversa com o escritor Jorge Caldeira. Ele analisa as conquistas desses 199 anos da Declaração de Independência, os fatos históricos do período e o que esperar para os próximos anos do nosso país. Além de escritor, Jorge Caldeira é historiador, jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP).

Ouça o podcast!



As lições da colônia, império, ditadura militar e o negacionismo do atual governo brasileiro também estão entre os temas do podcast. O episódio conta com áudios da telenovela Novo Mundo, da TV Globo, programa Roda, UOL (entrevista de Natalia Pasternak) e do site História em Meia Hora.

Além de eventuais edições extras, o Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Google Podcasts, Youtube, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues. A edição-executiva é de Renato Ferraz.

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