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O Centrão no telhado. Aliança pode impactar desempenho de Bolsonaro

Não se deve subestimar a aliança de Bolsonaro com o Centrão. Além de dar mais estabilidade ao governo no Congresso, pode impactar seu desempenho eleitoral

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas (Correio Braziliense e Estado de Minas)

A reunião do presidente Jair Bolsonaro com o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, foi transferida de ontem para hoje, na versão oficial, porque o avião no qual retornou do México atrasou. Nos bastidores, porém, a ida do parlamentar para a Casa Civil do Palácio do Planalto está no telhado. O presidente da República cogitaria dar “meia-volta, volver” no deslocamento do general Luiz Eduardo Ramos (aquele que foi “atropelado por um trem”) para a Secretaria-Geral da Presidência, com o argumento de que a Casa Civil tomaria muito tempo de Nogueira, cuja principal tarefa seria a articulação política.

A ida de Ciro para a Secretaria-Geral da Presidência só fará sentido se for um desejo do próprio. Se for um recuo de Bolsonaro, porém, mesmo que o senador aceite a tarefa, será um sinal de que o empoderamento do Centrão no Palácio do Planalto foi apenas uma flor do recesso. A entrega da Casa Civil ao Centrão descontenta os seguidores de Bolsonaro nas redes sociais e os militares que controlavam a Esplanada, pois a Casa Civil tem um papel estratégico na coordenação da administração federal. Entretanto, na Secretaria-Geral, Ciro não terá a força política que seus aliados no Congresso esperam.

Não faltam motivos para a mexida no Palácio do Planalto na metade do terceiro ano de mandato. O tempo ruge para Bolsonaro, que lidou com o relógio como se esse não fosse o recurso mais escasso de seu mandato. O presidente da República perde o foco com atos de repercussão negativa e assuntos que não são prioritários, ainda que emulem seus seguidores. O tempo perdido já cobra seu preço nos indicadores do governo. Basta olhar para os problemas reais do país, a começar pela crise sanitária.

Ontem, sete capitais registraram falta de vacinas — Belém, Campo Grande, Florianópolis, João Pessoa, Rio de Janeiro, Salvador e Vitória —, o que é um atestado de incompetência do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. Ou seja, quatro ministros depois, as falhas do governo federal na coordenação do combate à pandemia continuam. Mesmo com o Congresso em recesso, portanto, sem as sessões da CPI da Covid, Bolsonaro continua acumulando notícias negativas na Saúde. A vacinação avança num ritmo lento, apesar dos esforços dos estados para controlar a pandemia. A redução do número de mortes diárias — foram 578 óbitos causados pela doença e 18.999 novos casos notificados nas últimas 24 horas —, não apaga o trauma de 550 mil mortos.

Aposta na galinha
O mau desempenho do governo é escandaloso na saúde, mas isso não significa que, em outras áreas, tudo esteja bem. Houve um desmonte de políticas públicas na educação, com universidades e outros estabelecimentos federais de ensino à míngua, crise de financiamento na rede privada e evasão escolar generalizada. A ausência de uma política de habitação adequada somada à pandemia, apesar do bom desempenho do mercado imobiliário, multiplicou a população em situação de rua nas grandes e médias cidades. Na segurança pública, a liberação da venda de armas e a truculência policial fizeram explodir o número de mortes por arma de fogo — ou seja, a violência e a insegurança aumentaram.

Na área econômica, o agronegócio e a mineração vão bem, obrigado, porém, a política oficial de agressão ao meio ambiente cobra seu preço. As mudanças climáticas estão em toda parte e, com isso, as pressões internacionais sobre o governo aumentarão. As enchentes na Alemanha, na Holanda e em outros países europeus farão recrudescer os protestos e retaliações contra o governo brasileiro e produtos brasileiros. Ao mesmo tempo, aqui no Brasil, os incêndios provocados pela seca já começaram e ainda teremos uma crise energética. Bate à porta uma inédita onda de frio, para a qual muitos não estão preparados, e o governo não tem sequer um plano de contingência, apesar dos alertas dos meteorologistas.

Alta da inflação, juros subindo, 17 milhões de desempregados, mesmo com uma expectativa de crescimento em torno de 5% neste ano, o ambiente econômico é muito ruim para a maioria da população. Como acontece nas crises, os mais pobres estão mais pobres. Entretanto, a retomada do crescimento é um fator positivo, que alimenta as esperanças do mercado, do ponto de vista da rentabilidade das empresas, e do próprio Bolsonaro. Um voo de galinha da economia, em ano eleitoral, pode embalar o projeto de reeleição. Por essa razão, não se deve subestimar a aliança de Bolsonaro com o Centrão. Além de dar mais estabilidade ao governo no Congresso, pode impactar seu desempenho eleitoral, turbinando candidaturas de seus aliados nos estados e o desempenho do governo na ponta do clientelismo.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-centrao-no-telhado/

Ricardo Noblat: Depoimento de Wajngarten à CPI irrita Ramos e assusta Pazuello

É tal a irritação do general Luiz Eduardo Ramos, chefe da Casa Civil, com o publicitário Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação do governo, que a ele só se refere como “idiota, imbecil”. Mesmo assim, quando de bom humor. De mal então…

Ramos não perdoa o ex-secretário por ter concedido uma barulhenta entrevista à VEJA onde criticou o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, e quis parecer mais importante do que foi no combate à pandemia da Covid-19.

O comando da CPI que investiga os erros do governo está convencido de que Wajngarten quis faturar alguns milhões de reais como lobista da vacina da Pfizer. É justamente por isso que o convocou para depor nesta quarta-feira.

Poderá pedir a quebra dos seus sigilos bancário e telefônico para comprovar as denúncias que recebeu. De sua parte, Pazuello está certo de que o depoimento do ex-secretário servirá para complicar ainda mais sua situação, deixando o governo de fora.

Lula volta a São Paulo preocupado com a fraqueza de Bolsonaro

O ex-presidente aproveitou a visita a Brasília para dizer aos companheiros que é preferível Bolsonaro na situação em que está a ele no chão

Lula aproveitou a visita de três dias que fez a Brasília para manifestar a interlocutores sua preocupação com o mau estado da saúde política do presidente Jair Bolsonaro. Voltou a São Paulo com a certeza de que ela inspira cuidados, inclusive da parte da oposição ao governo. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra.

A oposição, PT na cabeça, deve continuar batendo em Bolsonaro, mas não a ponto de inviabilizá-lo como adversário a ser batido nas eleições do ano que vem. O senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI da Covid-19, sabe disso e compartilha a opinião de Lula. Devagar com o andor para que o santo não caia.

Tem lembrado Lula que Bolsonaro radicaliza o discurso sempre que se vê ameaçado, e assim procede desde o início do governo. É para manter refém os bolsonaristas de raiz. Acontece que isso não o salvou de perder o apoio de devotos que lhe pareciam os mais confiáveis. E é aí que o bicho pode pegar a oposição.

A ela não deve interessar que Bolsonaro se enfraqueça e corra o risco de ficar de fora do segundo turno da eleição, dando passagem desde já a um nome, ou a mais de um, do que se convencionou chamar de terceira via, um candidato capaz de apresentar-se como alternativa a Bolsonaro e a Lula. Isso seria o pior dos mundos.

Lula está convencido de que tem lugar assegurado no segundo turno. Concordam com ele Bolsonaro, seus ministros, e líderes de partidos fechados com o governo até aqui. Mas Lula quer Bolsonaro no ringue para com ele trocar socos. Nada, pois, de apeá-lo do poder. Melhor mantê-lo de pé, sangrando

A opção pelo “deixa ele sangrar” foi escolha da oposição ao governo de Lula no segundo semestre de 2015 quando estourou o escândalo do mensalão do PT – a compra de votos de deputados para que aprovassem projetos despachados ao Congresso pelo Palácio do Planalto. O tiro saiu pela culatra, matando a oposição.

Era o PSDB quem a comandava. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o ex-ministro da Saúde José Serra e outras estrelas do partido concluíram que um Lula vulnerável, a ter que se explicar, seria melhor do que um Lula vítima de um processo de impeachment, ovelha golpeada pelas elites perversas.

Houve um momento em que Lula quase se rendeu. Num sábado de porre na Granja do Torto, uma das residências oficiais do presidente, Lula admitiu renunciar. Foi demovido da ideia pelos companheiros – um deles José Dirceu, chefe da Casa Civil, que estava em São Paulo e teve que voar às pressas a Brasília.

A economia ia bem, obrigado. Lula aproveitou a trégua que a oposição lhe deu para recuperar-se. No primeiro turno da eleição de 2016, derrotou Geraldo Alckmin (PSDB) por uma margem pequena de votos. No segundo turno, Alckmin cometeu o prodígio de ter menos votos do que no primeiro. Nunca se viu nada igual.

A economia, hoje, voa baixo como as galinhas. O desemprego está em alta. As reformas do Estado empacaram. A pandemia com quase meio milhão de mortos tão cedo sairá da memória dos brasileiros. Lula conta com tudo isso para vencer, mas também com Bolsonaro. Estará errado no seu cálculo? A ver.

Fonte:

Metrópoles

https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/ricardo-noblat/depoimento-de-wajngarten-a-cpi-irrita-ramos-e-assusta-pazuello


O Globo: Centrão pressiona governo para ocupar pastas hoje com militares

Grupo político defende que a Casa Civil e a Secretaria de Governo, por exemplo, passem a ser chefiadas por políticos

Natália Portinari e Gustavo Maia, O Globo

BRASÍLIA — Com a proximidade da reforma ministerial, programada para acontecer depois da eleição para as presidências de Câmara e Senado, vem crescendo a pressão do centrão para a mudança naquele que é um dos pilares do governo de Jair Bolsonaro: a presença maciça de militares em postos estratégicos do primeiro escalão. O grupo, cada vez mais próximo ao presidente, defende a nomeação de mais políticos em ministérios e mira, especialmente, duas pastas sediadas no próprio Palácio do Planalto: a Casa Civil, hoje a cargo de Braga Netto, e a Secretaria de Governo, responsável pela articulação política, ocupada por Luiz Eduardo Ramos.

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A impressão de aliados de Bolsonaro no Congresso é que a “militarização” do governo atrapalha na interlocução com os partidos, além de ser um entrave para a liberação de cargos e emendas, moeda de troca importante para os parlamentares. Até agora, o Planalto sondou nomes como o do ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM-BA), e de José Múcio Monteiro, ex-presidente do Tribunal de Contas União (TCU) e ex-ministro das Relações Institucionais do governo Lula. Ambos rejeitaram a hipótese de assumir a articulação política do Planalto.

À frente da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos é alvo frequente de críticas de líderes partidários próximos a Bolsonaro — os parlamentares o acusam de não cumprir promessas. Para alguns deputados, a falta de histórico de atuação no Congresso prejudica o ministro, classificado frequentemente como alguém que “não é do ramo” e que não teria habilidade em articular politicamente. O grupo pressiona pela substituição de Ramos, general da reserva, por um nome com trajetória política. Auxiliares de Bolsonaro ouvidos pelo GLOBO, porém, minimizam a hipótese de troca — Ramos é amigo do presidente. Uma alternativa seria deslocá-lo para outro posto no governo como a Secretaria-Geral, hoje comandada interinamente por Pedro Cesar Sousa — ex-chefe de gabinete do presidente.

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O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, de origem na Marinha, é outro militar do primeiro escalão que recebe críticas de parlamentares do centrão. O apagão no Amapá no fim do ano passado e a demora na apresentação de soluções tem sido usado como argumento para a troca.

Apesar da forte pressão sobre o presidente para que demita os ministros da Saúde, Eduardo Pazuello, e das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, aliados próximos a Bolsonaro afiançam que os dois não serão defenestrados do governo. A manutenção da dupla já teria virado uma espécie de “questão de honra” para o chefe do Executivo, que nos últimos dias fez questão de defendê-los publicamente.

Mesmo se houver a possibilidade de retirar Pazuello do cargo, integrantes do centrão avaliam que não é o momento de ocupar o Ministério da Saúde, já que, durante a pandemia, a pasta está no centro das atenções e pode gerar problemas. Imaginam também que Bolsonaro queira indicar um nome de sua “cota pessoal” para ministro.

Cotado para assumir a Saúde sempre que a especulação sobre a demissão de Pazuello surge, o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), nega que exista qualquer negociação em torno de ministérios.

— Isso não está sendo estudado. Está sendo cobiçado. Do lado de fora do Palácio do Planalto. O presidente Bolsonaro tem dois ministros do DEM, o DEM diz que é independente e ele não demite os ministros. A régua dele não é essa — disse Barros ao GLOBO.

Caso a candidatura do deputado Arthur Lira (PP-AL) seja vitoriosa na Câmara — na semana passada, ele reverteu o apoio do PSL, partido que abriga bolsonaristas e que, antes, estava ao lado de seu adversário, Baleia Rossi (MDB-SP) —, a correlação de forças no entorno de Bolsonaro será alterada, com o fortalecimento do centrão. Aliados acreditam que o resultado poderá dar tração à ampliação do espaço do grupo no primeiro escalão.

Congressistas defendem que o governo acomode partidos que apoiaram os candidatos do Planalto — além de Lira, Bolsonaro está ao lado de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) no Senado, em acordo costurado pelo atual presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP). As negociações devem ocorrer entre os partidos mais próximos ao governo, como PP, PL, PSD e Republicanos. Também está em análise a recriação de pastas, como Planejamento e Indústria e Comércio, que hoje são parte do Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes (leia mais abaixo).

Alcolumbre no senado

Uma mudança dada como certa por interlocutores de Bolsonaro, por outro lado, é a saída de Onyx Lorenzoni (DEM) do Ministério da Cidadania. A vaga é cobiçada pelo PP, de Ciro Nogueira e Arthur Lira. Deputado federal licenciado do Rio Grande do Sul, Onyx pode ganhar outro cargo no governo. Um dos únicos parlamentares que apoiaram a pretensão presidencial de Bolsonaro ainda muito antes da eleição, Onyx tem a gratidão do presidente, ainda que sua passagem pela Casa Civil no começo do governo seja avaliada como malsucedida.

Outra certeza consolidada nos últimos dias entre interlocutores de Bolsonaro é que o atual presidente do Senado, Davi Alcolumbre, não ganhará um ministério, e continuará no mandato de senador. O presidente alega que o parlamentar não poderia entrar no governo por estar muito “desgastado”.

Recentemente, Alcolumbre disse a aliados que fora convidado para o Ministério do Desenvolvimento Regional, onde assumiria a cadeira de Rogério Marinho. Mas governistas garantem, nos bastidores, que o ministro permanecerá no cargo.

Bolsonaro também é pressionado a ceder o comando do Ministério do Turismo, que passou por uma turbulenta troca de comando no mês passado, quando Gilson Machado assumiu o posto de Marcelo Álvaro Antônio. O ex-ministro deixou a pasta um dia depois de atacar Ramos. Em mensagem enviada pelo WhatsApp em um grupo de ministros, ele acusou o colega de pedir sua cabeça a Bolsonaro para entregar o ministério ao centrão “para obter êxito na eleição da Câmara dos Deputados”.

A avaliação interna entre alguns auxiliares do presidente é que Gilson Machado, apesar de ser muito próximo a Bolsonaro, não traz dividendos políticos para o governo.


Correio Braziliense: Bolsonaro estuda ter vice à reeleição que não o incomode tanto quanto Mourão

Incomodado com o vice, que atende jornalistas e não se furta em emitir críticas ao próprio governo, presidente estuda possibilidade de colocar como segundo na chapa à reeleição alguém que não cause tanto desconforto a ele e aos filhos

Ingrid Soares e Augusto Fernandes, Correio Braziliense

Com uma rotina de conflitos com integrantes do próprio governo, Jair Bolsonaro vem se desentendendo com o vice, Hamilton Mourão, e se distanciou do general nos últimos meses — em 2020, eles falaram apernas por oito horas. Incomodado com o comportamento do seu sucessor imediato no comando do Poder Executivo, que costuma se posicionar de maneira às vezes conflitante em diversos temas, o presidente da República tem dado cada vez menos ouvidos a ele, priorizado a relação com ministros sobre os quais tem ascendência. Com isso, crescem os rumores de que Mourão não deve compor a eventual chapa que concorrerá à reeleição, em 2022.

A avaliação de Bolsonaro, de acordo com assessores do Palácio do Planalto, é de que Mourão tem tentado se projetar politicamente. Desconfiado, já o vê como um adversário para o próximo pleito. Para o presidente, o fato de o vice constantemente atender os jornalistas e não se furtar em comentar o desempenho do governo, muitas vezes de forma crítica, é sinal de que ele tem pretensões maiores. Por conta disso, é preciso frear o ímpeto do general.

Bolsonaro evita repreender Mourão publicamente, mas, neste mês, já deu declarações que serviram como um recado claro ao vice. Há duas semanas, depois de o general apoiar a participação da empresa chinesa Huawei no leilão do 5G no Brasil, o presidente foi no sentido contrário. “Ninguém vem falar (sobre) 5G comigo, e não está aberta a agenda para quem quer que seja a pessoa, a não ser que ela venha acompanhada do ministro Fábio Faria, das Comunicações. Repito: 5G ninguém fala comigo sem antes conversar com Fábio Faria”, afirmou, durante solenidade no Planalto.

Ainda que tente desconversar sobre se candidatar à reeleição daqui a dois anos, Bolsonaro tem cogitado outros nomes para vice, como as ministras Tereza Cristina (da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e Damares Alves (da Mulher, Família e Direitos Humanos). Com isso, o general avalia as saídas para o seu futuro. Chegou a admitir que pode se candidatar para uma vaga ao Senado e que, a princípio, não pensa em tentar disputar o Governo do Rio Grande do Sul, seu estado natal, por causa da idade.

De qualquer maneira, o vice tenta evitar os ruídos com Bolsonaro. No começo do mês, afirmou que vê influência de “intrigas palacianas” no relacionamento com o presidente. De acordo com o general, há assessores palacianos que “distorcem os fatos”. Esses mesmos palacianos veem Mourão muito próximo do MDB, e não descartam uma candidatura futura do general, em 2022, rumo ao Planalto.

Na última quarta-feira, os dois tiveram uma reunião pessoal, depois de semanas sem conversarem a sós. Segundo Mourão, os dois ainda não trataram sobre a próxima eleição geral, mas o general garantiu que vai se manter leal ao presidente aconteça o que acontecer.

“Até o presente momento, o presidente Bolsonaro não tocou neste assunto comigo. Eu estou em condições, estou pronto para acompanhá-lo, caso ele deseje e ele vá ser candidato em 2022, porque tudo é possível daqui para lá. Então, se ele decidir que vai ser candidato e me convidar, ele sabe que tem o meu apoio e minha lealdade para continuar com ele”, disse.

Possibilidades
Na avaliação do cientista político da Universidade Presbiteriana Mackenzie Rodrigo Prando, caso Mourão queira um protagonismo maior, o lugar que ele tem mais chances de conseguir algum resultado é disputando o Senado. Afinal, se resolvesse entrar na corrida pelo Palácio do Planalto, brigaria por votos na mesma parcela do eleitorado que é fiel ao presidente.

“Não sei se Mourão quer partir para embate com Bolsonaro. Teria que dividir um grupo que já está muito próximo ao bolsonarismo e o apoia. O presidente tem dificuldade de conviver com qualquer pessoa que tenha elementos de liderança e que possa ofuscá-lo”, observa Prando. Ele lembra que a postura mais amena de Mourão, aberto ao diálogo com políticos, além do grau de conhecimento do vice, são fatores que intimidam Bolsonaro –– e também, por isso, o presidente tenta afastá-lo.

“No início do mandato, Mourão começou a dar entrevistas, a atender à imprensa, falar em outros idiomas e a conversar com governadores. Tudo isso incomodou demais Bolsonaro e seus filhos, que viam articulação do general como se um processo de impeachment estivesse em vias de prosperar. Qualquer movimento é entendido por eles, e pelo próprio presidente, como tentativa de golpe, de diminuir prestígio do presidente”, observa

Para a constitucionalista e mestre em direito público administrativo pela Fundação Getulio Vargas (FGV) Vera Chemim, “Mourão demonstrou não apenas prudência, como também o seu conhecimento. Tais virtudes acabam provocando animosidade por parte dos filhos de Bolsonaro, que não perdem a oportunidade de hostilizá-lo em manifestações públicas”.

Controle da Câmara assegura menos problemas

Pressionado pelo escândalo da Agência Brasileira de Informações (Abin) e por questionamentos sobre a atuação do governo na pandemia, o presidente Jair Bolsonaro tem, na eleição para a Presidência da Câmara, marcada para fevereiro, um teste decisivo para o seu futuro político. Fazer o sucessor do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) no cargo, mais do que favorecer projetos de interesse do governo, seria, para o presidente, uma forma de navegar em águas menos agitadas, ante uma avalanche de complicações que estão por vir.

A corrida pela sucessão na Câmara transformou-se em um campo de batalha, com o enfrentamento entre as forças políticas que já começaram a se organizar para as eleições de 2022. A recente troca de acusações entre Bolsonaro e Maia a respeito do não pagamento do 13º do Bolsa Família expôs o acirramento da disputa.

A revelação de que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) produziu relatórios para orientar advogados do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) é a mais nova dor de cabeça do presidente. Seu filho mais velho é investigado por suspeitas de desvio de salários de funcionários do gabinete à época em que era deputado estadual no Rio de Janeiro.

Ao mesmo tempo em que a oposição acusa o chefe do governo de ter cometido crime de responsabilidade, passível de um processo de impeachment, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) abra uma investigação para confirmar se a agência de inteligência do governo foi utilizada pelo presidente para fins pessoais. O caso, revelado pela revista Época.

Futuro partidário
A disputa pela Presidência da Casa tem importância também na decisão de Bolsonaro sobre o partido ao qual irá se filiar. Aliados têm orientado o presidente sobre a importância de ele contar com uma estrutura partidária para tentar a reeleição em 2022. Depois de não obter as assinaturas suficientes para criar o Aliança pelo Brasil, o presidente tem mantido conversas com lideranças de diferentes legendas, principalmente, do Centrão.

Na semana passada, ele voltou a dizer que anunciará o nome de sua nova sigla em março, ou seja, após o resultado da eleição da Câmara. Conforme afirmou, um dos partidos com os quais tem conversado é o PP, do deputado Arthur Lira (AL), líder do Centrão e candidato do Planalto para suceder Maia no comando da Casa –– Bolsonaro foi filiado ao PP até 2016. Entre outros partidos do bloco parlamentar, o presidente também tem na mira o PTB, do ex-deputado Roberto Jefferson (RJ), o PL e o Republicanos.

Um deputado filiado a um desses partidos, ouvido pelo Correio, afirmou que o presidente seria recebido de braços abertos, desde que não pretenda assumir o controle da legenda. Nessas discussões, Bolsonaro tem insistido que só formalizará uma filiação se puder assumir o comando de sua nova sigla, com autonomia, principalmente, para acessar os recursos dos fundos partidário e eleitoral.

O deputado Marcos Pereira (SP), presidente do Republicanos, já deixou claro, em diferentes ocasiões, que não abriria mão do comando da legenda para Bolsonaro. “Não abro mão do Republicanos, nem para o presidente”, tem repetido o parlamentar, que retirou a candidatura à Presidência da Câmara e passou a apoiar Lira.

Migração constante
Desde que ingressou na política, em 1988, o presidente Jair Bolsonaro passou por oito partidos:

1988 a 1993PDC
1993 a 1995PPR
1995 a 2003PPB
2003 a 2005PTB
2005PFL
2005 a 2016PP
2016PSC
2017firmou
compromisso
com o Patriotas
2018 a 2019PSL
2019 a 2020sem partido


Correio Braziliense: Bolsonaro deve reformular toda articulação política com o Congresso em 2022

General Ramos deve deixar Segov na reforma prevista para 2021. Marcos Pereira e Davi Alcolumbre cotados para substituí-lo

Wesley Oliveira, Correio Braziliense

Além de entrar de cabeça nas negociações para eleger o deputado Arthur Lira (PP-AL) para a presidência da Câmara, o governo de Jair Bolsonaro deve reformular toda sua articulação política com o Congresso Nacional no próximo ano. O objetivo do Executivo é ampliar sua governabilidade junto ao Legislativo para tentar avançar com suas pautas prioritárias. Nessa seara de negociações, o cargo do chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, entrou no balcão de negócios e deverá ser entregue para algum nome do Centrão. O posto, que tem status de ministro, é responsável pela interlocução do Planalto com a Câmara e o Senado.

Recentemente, Ramos viveu um entrave com um colega de governo. O ex-ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio acusou o chefe da secretaria de “conspirar para tirá-lo do cargo”. Em mensagens por um grupo de WhatsApp, Marcelo revelou que o governo estava “pagando” um preço muito alto pela aprovação de matérias mínimas dentro do Legislativo. A revelação acabou irritando Bolsonaro, que optou por demitir o ministro. Nos bastidores, o general Ramos comemorou a decisão, mas entendeu que Marcelo só acabou sendo rifado porque as mensagens vazaram.

Líder do Republicanos na Câmara, Marcos Pereira (SP) é, hoje, apontado nos bastidores como um dos favoritos para ocupar o posto de Luiz Eduardo Ramos. O atual vice-presidente da Câmara rompeu com Rodrigo Maia e acabou embarcando na candidatura de Arthur Lira. Com esse reforço, o bloco do líder do Centrão conta com nove partidos de apoio. Somando todas as bancadas, o parlamentar já tem cerca de 200 votos. Para se eleger, um candidato precisa de, ao menos, 257 deputados.

Além de Marcos Pereira, o atual presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), é cotado para o posto de articulador do Planalto. Impedido de tentar a reeleição para o comando da Casa depois da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o democrata busca, agora, se manter no jogo político pelos próximos dois anos. Alcolumbre é visto como um aliado pelo governo Bolsonaro, pois atuou para minimizar diversas crises entre o Executivo e o Legislativo neste ano.

Mesmo com esse possível remanejamento, Bolsonaro não pretende deixar Ramos fora de seu governo. Ao sair da articulação política, o general iria para a Secretaria-Geral, que funciona como uma espécie de prefeitura do Palácio do Planalto, além de abrigar a Subchefia para Assuntos Jurídicos (SAJ), por onde passam todas as leis e atos normativos firmados pelo presidente da República.

Outras lideranças
Além do chefe da Secretaria de Governo, o Palácio do Planalto estuda mudanças em suas lideranças do Legislativo. Hoje, os postos são ocupados por: Ricardo Barros (Câmara), Fernando Bezerra (Senado) e Eduardo Gomes (Congresso).

Na Câmara, Ricardo Barros (PP-RS) deve ser remanejado para o Ministério da Saúde, atualmente com Eduardo Pazuello à frente. O partido de Barros, que comanda o Centrão, acredita ter quadros para ocupar uma das maiores pastas da Esplanada dos Ministérios. Barros foi ministro da Saúde durante o governo do ex-presidente Michel Temer.

Já Fernando Bezerra e Eduardo Gomes, ambos senadores do MDB, cobiçam a cadeira ocupada atualmente por Davi Alcolumbre na Presidência do Senado. O partido já articula para assumir o comando da Casa pelos próximos dois anos.

Caso um dos dois consiga vencer a disputa interna dentro da sigla, que conta com quatro pré-candidatos, um posto na liderança do Senado ou do Congresso seria aberta para 2021, com isso, o governo estuda distribuir a vaga para outro senador aliado. Entre os cotados estão os senadores Ciro Nogueira (PP-PI) e Otto Alencar (PSD-BA).

Histórico de entreveros
O entrevero que provocou a demissão do ex-ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio não é o primeiro envolvendo o nome do chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. Em outubro, o chefe da pasta do Meio Ambiente, Ricardo Salles, atacou o general nas redes sociais e pediu para que ele parasse com a “postura de Maria Fofoca”. A publicação de Salles acompanhou reportagem do jornal O Globo, que dizia que Salles estaria “esticando a corda com a ala militar do governo” ao afirmar que brigadistas do Ibama cruzariam os braços por falta de orçamento da pasta. O ministro do Meio Ambiente teria informações de que Ramos trabalhava para minar a atuação dele no governo. A ala ideológica do governo também reclamou do general, pois viu nele um dos principais responsáveis pela aproximação de Bolsonaro com o Centrão. O histórico de Ramos inclui pressão sobre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e sobre o ex-líder do governo na Câmara Major Vitor Hugo (PSL-GO). Ele também teria incomodado a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, por causa de nomeações que ele fez na pasta.


Andrea Jubé: Hora de menos “selva”, mais política

José Múcio foi sondado para vaga de Ramos no palácio

Política é circunstância, e as circunstâncias favorecem o movimento lento e gradual de profissionalização da articulação política do governo. Salvo o imponderável, o presidente Jair Bolsonaro deverá coroar esse processo na reforma ministerial prevista para fevereiro, após se consumar a sucessão nas Mesas Diretoras da Câmara e do Senado.

Trata-se de um movimento iniciado há 14 meses, quando Bolsonaro substituiu a deputada Joice Hasselman (PSL-SP), parlamentar de primeiro mandato, uma neófita entre raposas, pelo senador Eduardo Gomes (MDB-TO), três vezes deputado federal, na liderança do governo no Congresso.

O segundo gesto nessa direção foi a substituição, há quatro meses, do então líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), parlamentar de primeiro mandato, um neófito entre raposas, pelo deputado Ricardo Barros (PP-PR), seis vezes deputado federal e ex-ministro da Saúde.

No Senado, nunca se cogitou a substituição do líder do governo, o experiente Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). Quando o emedebista se viu alvo de uma operação da Polícia Federal em setembro do ano passado, ele nem balançou no cargo. O que se ouvia nos corredores do palácio era que a prudência recomendava ao novo governo não fustigar a poderosa bancada do MDB do Senado.

Os caciques do Centrão, que agora orbitam em torno do gabinete presidencial, convenceram Bolsonaro de que chegou a hora de nomear um político para o cargo mais político do governo: a chefia da articulação política, atribuição do titular da Secretaria de Governo. Atualmente, o general da reserva Luiz Eduardo Ramos.

Um dos políticos cogitados para a vaga foi o ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) José Múcio Monteiro. Experiente na função, ele foi ministro da articulação política no segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em tom de brincadeira, Bolsonaro fez o convite público no último dia 3, na abertura, em sessão virtual, do 4º Fórum Nacional de Controle. Nos bastidores, a sondagem foi concretizada.

“Se a saudade lhe bater, venha pra cá, estará entre nós no nosso primeiro time”, convidou o presidente. “Sou apaixonado por você”, derramou-se.

A coluna apurou que, em privado, coube ao ministro das Comunicações, Fábio Faria, sondar Múcio sobre a efetiva possibilidade de aceitar o convite de Bolsonaro e assumir a articulação política do governo.

Múcio, que acabou de se aposentar, negou que a sondagem tenha ocorrido, e afirmou à coluna que não pretende voltar à vida pública, embora Bolsonaro tenha declarado que “seu gás é infinito”. A coluna mantém a informação, confirmada com uma fonte do Congresso e uma fonte do palácio.

Próximo a Bolsonaro, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), também foi sondado para a função. No momento, entretanto, ele está concentrado em eleger o irmão para a Prefeitura de Macapá, e em fazer o seu sucessor no Senado.

Outro nome lembrado para o posto é o do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros. Internamente, ele ganhou fama de “trabalhador”, e tem a confiança de Bolsonaro.

Desde o início, Bolsonaro havia decidido nomear generais para a chefia da articulação política. Nas primeiras semanas, a piada interna entre políticos que já haviam se reunido com o primeiro titular da pasta, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, era de que a etiqueta da “nova política” implicava bater continência para ministros, acompanhada da saudação “selva”.

Mas o agravamento da crise política, diante do avanço dos inquéritos envolvendo o presidente no Supremo Tribunal Federal (STF), da denúncia contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), e a prisão do ex-assessor Fabrício Queiroz (hoje em regime domiciliar), amarraram Bolsonaro ao Centrão com nó de marinheiro.

É nessa conjuntura que políticos experientes como o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), os líderes Ricardo Barros, Eduardo Gomes, Fernando Bezerra, além de contemporâneos de Bolsonaro na Câmara, cada vez mais ouvidos pelo presidente, o persuadiram de que ele deve nomear um político para a chefia da articulação do governo.

O argumento é de que Bolsonaro precisa profissionalizar a articulação para melhorar a relação com o Congresso, e garantir o avanço das pautas do governo, sobretudo a dois anos da eleição presidencial. Há uma avaliação de que o governo foi generoso na liberação de emendas e distribuição de cargos, mas os parlamentares não retribuíram na mesma proporção.

A mudança na articulação já foi aventada anteriormente. Desta vez, entretanto, dois fatores contribuem para sua concretização. Em primeiro lugar, um político da envergadura de José Múcio foi sondado para o cargo. Ou seja, começaram as sondagens por um substituto para o general.

Além disso, Bolsonaro pode precisar de Ramos em outro ministério, no mesmo quarto andar do Palácio do Planalto.

No começo de janeiro, o ministro Jorge Oliveira toma posse no Tribunal de Contas da União, abrindo a vaga de ministro da Secretaria-Geral da Presidência. É uma oportunidade para manter Ramos próximo ao gabinete presidencial, e em ministério palaciano.

Embora a reforma ministerial esteja prevista para fevereiro, os fatos obrigaram a antecipação de alguns movimentos. Como Oliveira sai em janeiro, o presidente terá de decidir se já nomeia Ramos para o seu lugar, ou aguarda o desfecho da eleição no Congresso, indicando um interino para a função.

Como o entrevero com Ramos precipitou a demissão do ministro Marcelo Álvaro Antônio do Ministério do Turismo, reservado ao Centrão, Bolsonaro teve de escalar o presidente da Embratur, Gilson Machado Neto, para um mandato-tampão.

Salvo o imponderável, Bolsonaro dará continuidade à profissionalização da articulação política. A ressalva se impõe porque ele muda de direção como o vento. Por sobrevivência, a biruta está mandando ele seguir o Centrão.


Merval Pereira: A caminho da reserva

Saúde passou a ser exemplar da ‘militarização’ do governo, tendo sido nomeados no último mês 30 assessores militares

A autocrítica do General Mark Milley, chefe do Estado Maior Conjunto, principal autoridade militar dos Estado Unidos, por ter participado de uma caminhada com o presidente Donald Trump de cunho político, vem a calhar diante da incorporação de militares, da ativa e da reserva, no governo do presidente Bolsonaro.

“Minha presença naquele momento, e naquele ambiente, criou uma percepção de envolvimento dos militares na política interna”, disse o general Milley. O mesmo desconforto sentiu o General de Exército da ativa Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo, ao participar de uma manifestação política em frente ao Palácio do Planalto no domingo dia 17.

Convocado pelo presidente Bolsonaro, assim como outros ministros, o General Ramos compareceu “disfarçado”, com um boné da Harley Davidson e óculos escuros, e ficou no alto da rampa, sem participar da manifestação. Mas naquele dia o presidente resolveu chamar todos os ministros para próximo dele, e apresentou um a um à multidão, levantando seus braços.

Sua presença na rampa do Planalto tinha um inescapável sentido político e foi muito criticada pelo fato de ser um General da ativa. Foi a última vez em que Ramos participou de uma manifestação, e começou a pensar em ir para a reserva.

Vem conversando com o presidente Bolsonaro desde então, e diz que sua decisão pessoal já foi tomada, mas está na “fase de possibilidade de ir para a reserva”, pois ainda não se acertou com o presidente. Ele prefere continuar ajudando no Governo, mas estar na reserva.

O General americano Mark Milley gravou um vídeo para ser exibido na abertura do ano letivo da Universidade Nacional de Defesa onde diz: “ Como oficial da ativa, foi um erro com o qual aprendi, e espero sinceramente que todos nós aprendamos com ele. Nós, que usamos as insígnias de nossa Nação, que viemos do povo, devemos sustentar o principio das Forças Armadas apolíticas, que tem raizes firmes na base da nossa República”.

O governo Bolsonaro tem cerca de 3 mil militares, da ativa e da reserva, em seus quadros, oito militares como ministros efetivos e um interino, o General Eduardo Pazuello, há quase um mês à frente do ministério da Saúde. General da ativa, Pazuello só não foi efetivado porque os ministros militares que têm gabinete no Palácio do Planalto aconselharam o presidente a não fazer isso, pois os problemas da pandemia de Covid-19 cairiam no colo dos militares.

Bolsonaro encontrou uma maneira indireta de fazer o que quer, transformando essa interinidade em atividade permanente. Os militares sempre defenderam a tese de que não existem ministros militares, mas ministros que têm origem militar, assim como outros são engenheiros, advogados, ou mesmo políticos.

Mas o fato é que, assim como o PT aparelhou o governo nos seus 15 anos com sindicalistas e políticos fisiológicos do centrão, Bolsonaro está aparelhando o seu com o mesmo tipo de políticos e militares. O ministério da Saúde passou a ser exemplar dessa “militarização” do governo, tendo sido nomeados nesse último mês cerca de 30 assessores militares, alguns em postos chaves do ministério, que perdeu muitos técnicos de qualidade nesse período.

O General Luiz Eduardo Ramos é o encarregado dos contatos políticos do Governo e tem um bom relacionamento com eles desde que, como Comandante Militar do Leste, com sede em São Paulo, mantinha encontros periódicos com parlamentares da região. Hoje, atua diretamente em negociações politicas, inclusive com governadores.

A última “missão” de peso de que participou foi organizar a reunião de Bolsonaro com os governadores que marcou um breve interregno no conflito entre Brasília e os Estados.

Na ocasião, ele comemorou o sucesso do encontro classificando-o de “histórico”. O General Ramos concorda em tese com o General americano Mark Milley, por isso está trabalhando junto ao presidente Bolsonaro para ir para a reserva sem deixar suas funções na Secretaria de Governo. Ele é amigo de Bolsonaro há décadas, diz que considera importante estar no governo neste momento, mas acredita que, indo para reserva, preserva o “meu Exército, que tanto amo e servi”.


Bernardo Mello Franco: O general quer elogios

O general Ramos está insatisfeito com o trabalho da imprensa na pandemia. Deveria se mudar para o Turcomenistão, onde o ditador proibiu os jornais de usar a palavra ‘coronavírus’

Nos idos de 1967, o marechal Costa e Silva fez uma reclamação à condessa Pereira Carneiro, então proprietária do “Jornal do Brasil”. “O seu jornal tem tratado muito mal a mim e ao meu governo”, queixou-se. Em tom diplomático, a senhora respondeu que o diário buscava publicar “críticas construtivas”. O ditador reagiu com franqueza: “Eu gosto mesmo é de elogio”.

O general Luiz Eduardo Ramos foi cadete no período autoritário, mas chegou aos postos de comando na democracia. Foi promovido a coronel em 2003, quando a Presidência era ocupada por um ex-operário que liderou greves contra a ditadura. Ontem ele teve uma recaída, e resolveu usar uma entrevista ministerial para fazer reparos ao trabalho da imprensa.

“Desde que começou essa crise do coronavírus, nós temos observado uma cobertura maciça dos fatos negativos”, disse o chefe da Secretaria de Governo. “No jornal da manhã é caixão e é corpo, na hora do almoço é caixão e é corpo, no jornal da noite é caixão, é corpo e é número de mortes”, protestou.

À moda de Costa e Silva, o ministro afirmou que o jornalismo “não está ajudando”. Ele sugeriu que os repórteres se colocassem no lugar de uma senhora de idade que gostaria de se sentir melhor na pandemia. “Tem tanta coisa positiva acontecendo... É muita notícia ruim, mas vamos também divulgar notícias boas”, apelou.

Apesar do tom edificante, Ramos não está preocupado com o bem-estar das velhinhas. Se isso fosse verdade, ele convenceria o chefe a parar de sabotar a quarentena. O objetivo das medidas de isolamento é proteger os grupos mais vulneráveis do vírus. O presidente prefere empurrá-los para o sacrifício em troca da reabertura imediata do comércio.

Os bolsonaristas sonham viver no Turcomenistão, onde o ditador Gurbanguly Berdimuhammedow proibiu a imprensa de usar a palavra “coronavírus”. Ontem o novo ministro da Saúde, Nelson Teich, declarou que o Brasil “é um dos países que melhor performa (sic) em relação à Covid”. No mundo real, faltam leitos de UTI e há cemitérios abrindo valas comuns para enterrar vítimas da doença.