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"Não pedi demissão", assegura Guedes em pronunciamento com Bolsonaro

Ministro da Economia defendeu o furo no teto e disse que a saída de secretários da pasta "é natural"

Israel Medeiros / Correio Braziliense

O ministro da Economia, Paulo Guedes, negou, nesta sexta-feira (22/10), que tenha pedido demissão ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) após a debandada dos secretários Bruno Funchal (Tesouro e Orçamento), e Jeferson Bittencourt (Tesouro Nacional), e dos secretários Gildenora Dantas e Rafael Araújo. Ele se encontrou com Bolsonaro no início da tarde para tratar da crise envolvendo sua permanência no cargo.

Segundo Guedes, não houve nenhuma sinalização por parte dele ou de Bolsonaro nesse sentido. “Eu não pedi demissão. Em nenhum momento pedi demissão, em nenhum momento o presidente insinuou qualquer coisa semelhante”, disse ele, após conversar com o presidente a portas fechadas.

Ele também disse que durante o período em que estava na reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI), fora do país, houve uma movimentação política por parte de “fura tetos”, que inclui ministros do governo. Em um ato falho, ele citou o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual, como substituto do secretário Bruno Funchal, mas se corrigiu na sequência e apontou o verdadeiro substituto: o ex-ministro do Planejamento, Esteves Colnago.

“Quando me referi ao André Esteves é porque eu soube que enquanto estava lá fora [do país] houve uma movimentação política aqui, normalmente não digo que sejam ministros, existe uma legião de fura tetos. O teto é desconfortável”, disse.

Ele também criticou falas de ex-ministros da Fazenda que têm dito que a permanência dele no cargo é prejudicial ao país, e disse que continua acreditando no governo, nas reformas e na democracia.

“Eu vim acreditando no presidente, que tem boas intenções no Congresso, que é reformista. Eu estou esperando que todo mundo mantenha as posições originais, acho que o presidente me apoia, acho que a mídia apoia as reformas corretas. Eu acredito na democracia brasileira, ponto. Agora, me chamam de extremista por servir um presidente democraticamente eleito”, afirmou.

O ministro também disse que é necessário gastar mais e ir além do teto de gastos para evitar que os mais pobres passem fome.

Encontro com Bolsonaro

Bolsonaro chegou ao Ministério da Economia por volta das 14h30 e entrou pela garagem do bloco P, sem falar com a imprensa. O encontro não estava na agenda das autoridades. A ideia era conversar com o ministro Paulo Guedes para tentar segurá-lo no cargo após a debandada de secretários da Economia ontem (21).

Na ocasião, Bruno Funchal, Secretário do Tesouro e Orçamento, pediu demissão do cargo e foi acompanhado do secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, e dos secretários Gildenora Dantas e Rafael Araújo. Eles eram considerados parte importante do que Guedes já chamou de “coração da política econômica”.

Eles não concordaram com a mudança de posicionamento de Guedes que, pressionado e enfraquecido, sinalizou que cederia e poderia romper o teto de gastos.

Depois do anúncio da demissão, o ministro cancelou a participação em um evento que ocorreria à noite e não se pronunciou desde então. Em uma entrevista à CNN, Bolsonaro garantiu que Guedes ficaria no cargo e lamentou a saída dos secretários.

Ao longo desta sexta, diversos boatos e informações falsas circularam entre membros do mercado financeiro. A maioria dizia respeito ao suposto pedido de demissão que, no fim das contas, não se confirmou.

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/10/4957344-nao-pedi-demissao-assegura-guedes-em-pronunciamento-com-bolsonaro.html


Samuel Pessôa: Longos ciclos cambiais

Se situação fiscal for minimamente arrumada, haverá grande espaço para queda do dólar

O quadro abaixo apresenta duas curvas. A curva azul representa a evolução do câmbio a preços do 3º trimestre de 2020.

Para controlar pela inflação, considerei a diferença de inflação entre o Brasil e nossos parceiros comerciais, ponderada pelo peso dos parceiros na corrente de comércio. Cada ponto do gráfico representa o câmbio médio em um trimestre. O gráfico se inicia no 1º trimestre de 2000 e termina no 3º trimestre de 2020.

A curva preta apresenta o câmbio a preços constantes controlado por duas variáveis diretamente associadas ao comércio internacional: produtividade do trabalho e termos de troca. Para ambas, foi considerada a diferença da taxa de crescimento entre o Brasil e nossos parceiro comerciais. Novamente ponderada pelo peso dos parceiros na corrente de comércio.

A curva preta pode ser interpretada como o câmbio de equilíbrio dado pelos fundamentos de comércio internacional. A variabilidade dela responde por 60% da variabilidade da curva azul. Os 40% restantes da variabilidade do câmbio observado na frequência trimestral, a curva azul, são dados por movimentos especulativos da conta financeira.

Voltando à curva que descreve o câmbio dado pelos fundamentos de comércio internacional, a curva preta, há um longo ciclo de valorização do real --do fim de 2002 até 2011—e outro de desvalorização da moeda— de 2011 até 2016. O câmbio dado pelos fundamentos sai de R$ 4,8 no 4º trimestre de 2002 para R$ 2,6 no 3º trimestre de 2011 e, em seguida, atinge R$ 4,6 no 1º trimestre de 2016. De lá para cá, tem oscilado.

O câmbio observado a preços do 3º trimestre de 2020, dado pela curva azul, fica sistematicamente acima da curva preta em duas oportunidades. No fim do governo FHC e nos dois primeiros anos do governo Lula. E, agora, nos três trimestres de 2020, abriu-se uma verdadeira boca de jacaré entre o câmbio medido pelas duas curvas. O desvio no 3º trimestre de 2020 foi de 47%, o maior diferencial desde 2000 --dólar a R$ 5,4, ante R$ 3,7 dados pelos fundamentos.

Como abordei na coluna de 3 de outubro, a desvalorização do câmbio é inflacionária quando o câmbio observado caminha na direção oposta àquela que é dada pelo câmbio dos fundamentos. Tem sido esse o comportamento da série desde o 2º trimestre de 2019, quando ambas marcavam R$ 3,9. De lá para cá, o câmbio dado pelos fundamentos valorizou-se até R$ 3,7, e o câmbio observado desvalorizou-se para R$ 5,4.

A grande boca de jacaré que se abriu entre as duas séries indica que o mercado já colocou no preço a probabilidade de desorganização fiscal.

Se a situação fiscal for minimamente arrumada, haverá grande espaço para valorização da moeda e, portanto, redução da inflação em 2021.Samuel Pessôa

* Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.