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Marco Aurélio Nogueira: O presidente caricato

Democratas precisam evitar que Bolsonaro passe a controlar o Poder Legislativo

Surpreende que o mundo político, em sentido estrito – Congresso, parlamentares, partidos –, somente agora comece a cogitar de um possível impeachment presidencial por crimes de responsabilidade.

Quando o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ativo militante do moderantismo, veio a público declarar (15/1) que o afastamento de Bolsonaro do cargo de presidente da República “será debatido de forma inevitável no futuro”, ele deu o tom de uma inflexão que se poderá consolidar nos próximos meses. Aproveitou para chamar às falas o Congresso, que inexplicavelmente se mantém em recesso enquanto o País pega fogo.

Bolsonaro não havia sido, até agora, atingido por uma ameaça desse tipo. A primeira etapa de seu mandato foi um período de desgoverno e tragédia, em que ele pintou e bordou, agindo com uma mistura patética de tiranete, chefe de gangue e godfather tropical. O escárnio diante do vírus, do povo, da vacina e dos cientistas foi constante, mastigado com indiferença e como prova de “autenticidade” por uma população em grande parte anestesiada. Com a pandemia, sua personalidade desequilibrada e narcisista ganhou plena manifestação. Os meses foram se passando e os estragos, aumentando. Seu prontuário engordou.

O presidente fez política contra a política, empenhado em criar confusão para camuflar sua incompetência e atiçar seus seguidores. Em nenhum momento, porém, pôde proclamar-se vitorioso.

O padrão oposicionista seguiu roteiro conciliador, que travou os planos maléficos do presidente. Fez o rei ficar nu. Meio que em silêncio, com muito jogo de bastidores, possibilitou que houvesse alguma governação no Brasil, paralisando a Presidência da República.

Bolsonaro foi reduzido a uma caricatura de presidente, que fala compulsivamente, de modo agressivo, com cálculo de malandro, boca cheia de impropérios e grosserias, mas é inepto e pouco faz de positivo. Age como um animal encurralado, que ameaça sem morder. Continua a atacar as instituições, a instigar as Forças Armadas, a ameaçar retrocessos. Com os venenos que produz na cozinha do Palácio constrói um imaginário negativo, polarizador, que confunde e corrói. Suas orientações esvaziam e destroem setores estratégicos das políticas sociais, dos direitos humanos, da economia, da proteção ambiental. Sua indigência diplomática comprometeu até mesmo a produção das vacinas e a campanha de vacinação.

A oposição teve sucesso nessa que a mente afiada do cientista político baiano Paulo Fábio Dantas Neto chamou de “estratégia maricas”: o bolsonarismo foi forçado a negociar.

Os humores mudaram, porém. Quanto mais a pandemia se agravou, quanto mais os ministros de Bolsonaro mostraram sua desqualificação, quanto mais o País se foi marginalizando no sistema internacional e fracassando no comércio bilateral, mais aumentou a pressão para o encontro de uma solução.

Abriu-se assim uma nova etapa da luta política. Ainda que a “estratégia maricas” consiga continuar arrancando a fórceps decisões do governo federal, ela precisa ser complementada por uma estratégia mais contundente, que aperte o cerco, mas saiba evitar tentações polarizadoras, escolhos e armadilhas.

A nova fase transcorrerá em algumas frentes principais.

A primeira é a afirmação de um campo oposicionista democrático consistente, que consiga soldar os diferentes partidos e forças políticas numa unidade programática mínima, forjada sem vetos ideológicos, firulas acadêmicas e cálculos políticos sofisticados.

A segunda é a organização do clamor popular, com a invenção de formas de protesto que aumentem o som das panelas e contornem a dificuldade de se ter gente nas ruas.

A terceira é o processamento político das denúncias de crime de responsabilidade contra Bolsonaro. Disso dependerá a abertura ou não do impedimento constitucional do presidente. Por mais que esse seja um passo delicado, sobretudo quando se considera que o presidente tem apoio popular e parlamentar, há no Congresso lideranças com inteligência política e dignidade cívica para impedir que as labaredas da crise institucional incendeiem o País.

No curto prazo, uma quarta frente passa pelo desfecho da disputa pelas presidências da Câmara e do Senado. Muitos parlamentares estão em flutuação, marcando posição, sem compreender a importância de um evento que poderá definir muito do ritmo político daqui para a frente. Mas é o que se tem. Os operadores democráticos precisarão trabalhar dobrado, sensibilizar setores do Centrão e da esquerda para evitar que Bolsonaro passe a controlar o Poder Legislativo.

O recurso ao impeachment poderá catalisar o mal-estar que hoje, impregnado de horror, medo e repulsa, se espalha pela sociedade. Como está não pode ficar. A perspectiva conciliadora, vitoriosa em nossa História recente, só tem a ganhar se adquirir corpo e poder de direcionamento, contrapondo ao negativismo radical do presidente o ar renovado da política positiva. Sem o qual, aliás, nenhum vírus será derrotado.

*Professor titular de teoria política da Unesp


El País: Popularidade de Bolsonaro despenca ante piora da pandemia e fim do auxílio emergencial

Pesquisa Datafolha aponta aumento da desaprovação no Norte e no Nordeste, e levantamento da XP/Ipespe indica piora na percepção da atuação do presidente para enfrentar o novo coronavírus

Rodolfo Borges, El País

O presidente Jair Bolsonaro começou o ano dizendo que o país está quebrado e que, portanto, ele não consegue “fazer nada”. As últimas pesquisas de opinião de uma série de institutos indicam, contudo, que a população espera, cada vez mais, que o presidente faça alguma coisa. Um levantamento do Datafolha divulgado nesta sexta-feira aponta que a rejeição de Bolsonaro subiu para 40% desde dezembro, quando estava em 32%. já a aprovação caiu de 37% para 31% ―a maior queda desde o início de seu Governo. A última pesquisa XP/Ipespe, que circulou nesta semana, também mostra que o percentual de críticos do presidente (que foi de 35% para 40% em relação a dezembro) superou o de apoiadores (que caiu de 38% para 32%), algo que não acontecia desde julho do ano passado. Entre as razões apontadas por esses institutos de pesquisa para a mudança de humor dos brasileiros em relação ao presidente, estão o fim do auxílio emergencial e a forma como Bolsonaro tem lidado com a pandemia do novo coronavírus.

As análises são sustentadas pelos números das pesquisas. De acordo com o Datafolha, que ouviu 2030 pessoas em todo o Brasil por telefone, na região Nordeste, onde os moradores são mais dependentes do auxílio federal, a rejeição do presidente subiu de 34% para 43% ―até agora, a pior avaliação (ruim ou péssimo ) de Bolsonaro entre os nordestinos foi de 52%, em junho de 2020. Como se esperava, a retirada do auxílio emergencial para o enfrentamento da pandemia derrubou a última defesa de Bolsonaro contra o desconforto da população. Mas seu efeito na aprovação de Bolsonaro ainda pode ser sentido, como indica pesquisa PoderData divulgada na quinta-feira: entre aqueles que receberam o auxílio nos últimos meses, 52% aprovam o Governo, enquanto a maior parte do grupo que não o recebeu rejeita Bolsonaro (58%). O Instituto ouvi 2.500 pessoas por telefone.

Segundo o Datafolha, a maior queda na popularidade do presidente foi registrada no Norte, que, além de também depender mais do auxílio, viu a capital do Amazonas passar pelo desespero de não ter oxigênio para tratar seus pacientes. Desde de dezembro, o índice de ótimo e bom de Bolsonaro caiu de 47% para 36% por lá. Uma quarta pesquisa, da Exame/Ideia Big Data, deixa mais claro a influência da crise em Manaus na popularidade de Bolsonaro. Da semana passada para esta, a aprovação do presidente caiu de 37% para 26%, na maior queda semanal medida pelo instituto desde que ele assumiu o cargo ―60% dos entrevistados, aliás, consideram que o desempenho do presidente deve ser avaliado à luz do que acontece em Manaus.

“O movimento [de queda na popularidade] coincide com uma piora na percepção da atuação de Bolsonaro para enfrentar o coronavírus. São 52% os que a consideram ruim ou péssima, 4 pontos a mais que em dezembro”, diz o relatório da XP/Ipespe divulgado nesta semana ―o instituto ouviu 1000 pessoas por telefone entre 11 e 14 de janeiro. Não faltam exemplos para ilustrar esses números. Além de não ter conseguido prevenir a crise de saúde em Manaus, o Governo federal comprou todas as vacinas Coronavac produzidas pelo Instituto Butantan, mesmo depois de o presidente ter dito enfaticamente, três meses antes, que nunca o faria. Além disso, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que se mantém no cargo há meses porque, ao contrário dos dois antecessores, não ousa questionar as questionáveis posições do presidente, tentou convencer a população de que nunca tinha recomendado o controverso “tratamento precoce” contra a covid-19, apesar dos extensos registros de que o Ministério o fez.

O EL PAÍS publicou em primeira mão nesta semana um estudo em que Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e a Conectas Direitos Humanos diagnosticaram “a existência de uma estratégia institucional de propagação do vírus, promovida pelo Governo brasileiro sob a liderança da Presidência da República”. Os pesquisadores analisaram 3.049 normas federais produzidas em 2020 e concluíram: “Os resultados afastam a persistente interpretação de que haveria incompetência e negligência de parte do governo federal na gestão da pandemia. Bem ao contrário, a sistematização de dados, ainda que incompletos em razão da falta de espaço na publicação para tantos eventos, revela o empenho e a eficiência da atuação da União em prol da ampla disseminação do vírus no território nacional, declaradamente com o objetivo de retomar a atividade econômica o mais rápido possível e a qualquer custo”.

Tudo isso se soma às declarações desdenhosas de Bolsonaro sobre a pandemia e sobre as vacinas que podem ajudar a controlá-la. Nesta sexta-feira, em mais uma tentativa de atingir o governador de São Paulo, João Doria, que avança politicamente contra o presidente ao promover a Coronavac pelo país, Bolsonaro disse a jornalistas em Brasília que o imunizante do Butantan “não está comprovado cientificamente”, apesar do aval emergencial da Anvisa para a vacinação. O resultado das atitudes e afirmações de Bolsonaro durante a pandemia deve começar a ser sentido nas ruas neste fim de semana, para quando movimentos à direita, como o Movimento Brasil Livre (MBL), e à esquerda, como a Frente do Povo sem Medo, agendaram manifestações.

Protagonistas do clamor popular pelo impeachment de Dilma Rousseff, MBL e Vem pra Rua chamaram atos para o domingo. Já a Frente do Povo sem Medo convoca carreatas pelo país para o sábado. A pressão popular visa a tirar Brasília da letargia contra Bolsonaro. Nesta sexta-feira, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski encaminhou à Procuradoria Geral da União uma notícia crime oferecida pelo PCdoB contra o presidente. O partido pede que Bolsonaro e o ministro Pazuello sejam responsabilizados pelo colapso do sistema de saúde de Manaus. “O encaminhamento foi feito, pois apenas o PGR pode oferecer denúncia pela prática de crime comum contra o Presidente da República e Ministro de Estado,”, justificou Lewandowski.

O procurador-geral Augusto Aras avisou em nota divulgada na quarta-feira, entretanto, que “eventuais ilícitos que importem em responsabilidade de agentes políticos da cúpula dos Poderes da República são da competência do Legislativo”. Apesar do desconforto causado pela manifestação entre os subprocuradores e mesmo no próprio STF, o procurador-geral deixou claro que não pretende incomodar o presidente no âmbito de suas política de enfrentamento à pandemia. Enquanto isso, o Congresso Nacional se prepara para uma sucessão que encaminha-se para colocar no comando da Câmara e do Senado nomes da preferência do Palácio do Planalto. Caso isso se confirme, a pressão popular daqueles que desaprovam o presidente terá de se manifestar de forma muito expressiva para conseguir algum efeito prático na capital federal.


Folha de S. Paulo: Em eleição marcada por traições, deputados infiéis fazem ligações sigilosas e reuniões até de madrugada

Parlamentares se reúnem com bloco adversário em encontros reservados em hotéis e hangares de aeroporto; Lira e Baleia trabalham para reduzir margem de defecções

Gustavo Uribe e Julia Chaib, Folha de S. Paulo

Com uma eleição acirrada, os dois principais candidatos à presidência da Câmara dos Deputados têm adotado método pouco usual para garantir margem segura de vantagem na disputa.

Em uma corrida marcada por ameaças de defecções, tanto Arthur Lira (PP-AL) como Baleia Rossi (MDB-SP) têm recebido ligações sigilosas e participado de encontros reservados com deputados filiados a partidos do bloco adversário.

As reuniões discretas não são incluídas nas agendas oficiais dos candidatos, um pedido dos deputados infiéis para não sofrerem retaliações de seus partidos, e costumam ser solicitadas pelos próprios traidores.1 8

O objetivo deles ao declarar de maneira reservada apoio ao candidato rival é tanto garantir que nomeados políticos não sejam exonerados como assegurar um canal de diálogo caso o adversário ganhe a eleição a presidente.

Os encontros têm ocorrido durante as viagens de campanha dos candidatos.

Segundo relatos feitos à Folha, reuniões são promovidas nos apartamentos de deputados, nos hotéis onde os candidatos estão hospedados ou até mesmo em hangar de aeroporto.

Para garantir a discrição, alguns dos encontros são marcados em horários de pouco movimento, como de madrugada, e com a presença de pouca gente, para não chamar a atenção.

Os infiéis reclamam da marcação cerrada de governadores para apoiarem seus candidatos.

Uma dessas reuniões ocorreu neste mês em Fortaleza. Para evitar que o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), ficasse sabendo, já que ele apoia a candidatura de Baleia, um encontro de Lira com deputados federais do PDT foi promovido no apartamento de um dos participantes.

No Ceará, o candidato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem a simpatia de parcela dos partidos de esquerda. Isso torna maior o risco de traições.

Nas conversas reservadas, Lira faz questão de lembrar que votou em Ciro Gomes (PDT) no primeiro turno da eleição presidencial de 2018.

Neste mês, outro encontro foi promovido em Florianópolis, desta vez pelo candidato do atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Segundo relatos de aliados, Baleia se reuniu, em uma sala da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, com deputados federais do PSD, sigla que forma o bloco de apoio a Lira.

No estado, MDB e PSD têm uma relação de proximidade, apesar de os partidos terem lançado candidaturas próprias à Prefeitura de Florianópolis no ano passado.

Além do PDT, Lira também teve conversas individuais em São Paulo, Rio de Janeiro e Teresina com congressistas de PT, PSB e PSDB, siglas que apoiam Baleia. Já o emedebista teve reuniões discretas com deputados do centrão, bloco liderado justamente por Lira.

O candidato de Maia também tem sido obrigado a manter reserva em encontros com parlamentares que integram seu próprio bloco de apoio. Isso porque eles detêm indicados em cargos no governo federal e têm sido ameaçados de exoneração pelo Palácio do Planalto.

O deputado federal Flaviano Melo (MDB-AC), por exemplo, relatou a três colegas que o governo demitiu nomes apadrinhados por ele que estavam empregados em postos no Acre. Melo declarou apoio a Baleia e apareceu em fotos com ele.

Ainda no Acre, há deputados federais do PSDB que também possuem postos no governo e se reuniram de forma reservada com integrantes da campanha de Baleia pelo receio de serem retaliados.

Segundo relatos de aliados, ao tomar conhecimento das agendas dos candidatos, os deputados infiéis costumam telefonar para pedir audiências privadas. Com receio de serem descobertos, alguns deles optam por declarar apoio apenas pelo telefone.

Hoje, os dois blocos fazem um cálculo de que há um percentual de risco de defecção de pelo menos 20%. Ou seja, que no mínimo um quinto dos deputados federais que formam cada grupo partidário poderá votar no candidato adversário.

Para evitar uma margem grande de traições, tanto Lira como Baleia trabalham para reduzir esse percentual a 10%. Para isso, contam com a pressão de prefeitos e governadores, que sinalizam com a perda de cargos e liberação de obras.

Na tentativa de ter mais controle sobre a base de apoio, Lira e Baleia trabalham com um mapa de votações, que é dividido por partidos ou regiões.

Segundo relatos de deputados, cada grupo é delegado a um aliado, que tem o objetivo de checar e assegurar aquele apoio.

A contagem de votos é feita inclusive nos deslocamentos aéreos, realizados em jatinhos contratados pelas campanhas. Na tentativa de fidelizar apoios, Baleia conta com a atuação direta de seu padrinho eleitoral.

Maia tem participado de boa parte das viagens. Não só o presidente da Câmara dispara ligações para deputados como tem sido o principal responsável pelo contato com governadores, apoios considerados cruciais para evitar traições.

Bolsonaro expressa claramente a deputados a preferência por Lira. Além disso, o líder do centrão recebe apoio e ajuda de colegas cujos partidos integram o bloco antagônico, como Elmar Nascimento (DEM-BA) e Celso Sabino (PSDB-PA).

A vitória de Lira já era uma questão de honra para Bolsonaro, que deseja impor uma derrota política a Maia. Agora, porem, ganhou um peso maior.

Bolsonaro quer evitar que Baleia tenha o poder de decidir sobre a possibilidade de abertura de um processo de impeachment. Há 56 pedidos de impeachment contra Bolsonaro aguardando análise do presidente da Câmara.

O movimento tem ganhado força desde a semana passada, quando, além das siglas de oposição, entidades da sociedade civil encamparam a defesa da saída de Bolsonaro por causa da crise da Covid-19.

Apesar de a campanha legislativa não ter votação popular, Baleia e Lira cumprem agendas típicas de candidatos a cargos majoritários.

No Piauí, por exemplo, Baleia tomou cajuína, bebida típica do Nordeste. No Norte, Lira fez questão de comer chocolates de castanha e cupuaçu.

Além dos dois favoritos, candidatos avulsos também recebem ligações de infiéis. O deputado federal Fábio Ramalho (MDB-MG), por exemplo, teve sinalizações de apoio de parlamentares de partidos como PT e PSL.




O Estado de S. Paulo: Lira 'ganha' 41 votos no placar do Estadão e lidera corrida pela presidência da Câmara

Deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato defendido pelo presidente Jair Bolsonaro, soma 186 votos declarados na enquete feita com os 513 parlamentares; principal concorrente, Baleia Rossi (MDB-SP) tem 114

Adriana Ferraz, O Estado de S.Paulo

Três dias após a publicação do placar do Estadão sobre a disputa pela presidência da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) passou de 145 para 186 votos declarados na enquete. Candidato defendido pelo governo Jair Bolsonaro, o parlamentar "ganhou" 41 apoios públicos desde sexta-feira, 15, em função de uma mobilização da coordenação da campanha para transformar a opção "não respondeu" em voto no líder do Centrão e evitar casos de infidelidade partidária.

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Veja o placar da eleição para presidente da Câmara dos Deputados

Para se eleger presidente da Casa são necessários 257 votos em primeiro ou segundo turnos, quantia ainda distante tanto de Lira como de seu principal oponente, Baleia Rossi (MDB-SP), escolhido pelo atual presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ) para fazer frente aos interesses do Palácio do Planalto na pauta legislativa. O emedebista iniciou o placar com 107 votos declarados e tem agora 114. 

Integrantes do bloco formal de apoio a Lira, os deputados do PL, Republicanos e do próprio PP foram os que mais procuraram a reportagem para assinalar voto no parlamentar alagoano. Até mesmo aliados que já tinham se manifestado no levantamento fizeram questão de reafirmar sua posição na disputa. Foi o caso, por exemplo, do deputado Júnior Mano (PL-CE): "Meu voto já consta como do Artur Lira no placar do Estadão. Mas tô passando pra reforçar o voto em AL."

Além de reforçar o voto por meio de declarações à reportagem ou mesmo postagens nas redes sociais, houve parlamentares que também fizeram questão de publicar foto ao lado do candidato para provar a aproximação e apoio, como Cezinha da Madureira (PSD-SP) e Abílio Santana (PL-BA).

No sábado, 16, o candidato do Progressistas disse ao Estadão que estava "focado” em ouvir todos os parlamentares até a data da disputa. “Continuarei trabalhando, ouvindo meus colegas e minhas colegas. O placar que importa é o do dia da eleição." Baleia também fez questão de mostrar que nada está decidido. "Vamos construir maioria, deputado por deputado, deputada por deputada", afirmou. A cerca de 15 dias da eleição, ambos têm a estratégia de buscar votos no “varejo”.

Levando-se em conta a somatória dos votos por partido, Baleia teria assegurados os votos necessários para vencer a eleição, já que seu bloco formal reúne 275 votos, mas, numa eleição secreta, como será a da Mesa Diretora da Câmara, o risco de infidelidade partidária aumenta diante de interesses mais locais que partidários. Na lista atual de 186 votos públicos, Lira conta com apoios de parlamenatares do DEM, PSDB, Cidadania e PSL, todos do grupo de Baleia.

Apesar de a adesão do partido não garantir necessariamente todos os votos da sigla,  há um esforço de ambas as candidaturas para atrair as únicas duas legendas que ainda não se posicionaram na disputa: PTB e Podemos. Juntas, elas somam 21 votos. Nesta segunda, 18, é esperada uma definição de como e quando se dará a eleição. A expectativa é que pleito seja marcado oficialmente para o dia 2 de fevereiro, mas há dúvidas sobre a forma, se remota ou presencial.

A campanha de Lira questiona a tentativa já declarada de Maia de propor uma eleição híbrida, ou seja, com a possibilidade de voto presencial e também a distância, preferencialmente para deputados idosos e considerados grupo de risco para a covid-19.

No total, a eleição para a presidência da Câmara reúne oito candidaturas. Também disputam votos os deputados Fábio Ramalho (MDB-MG), Alexandre Frota (PSDB-SP), Capitão Augusto (PL-SP), Luiza Erundina (PSOL-SP), André Janones (Avante-MG) e Marcel Van Hattem (Novo-RS).

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Bruno Boghossian: Bolsonaro está mais perto de eleger aliados no Congresso do que do impeachment

Apesar do descalabro produzido pelo governo, matemática ainda favorece o presidente nesse processo

Jair Bolsonaro está mais próximo de eleger aliados para comandar a Câmara e o Senado do que de perder o cargo. O presidente já foi minoritário no Congresso, mas adquiriu proteção suficiente para ficar no poder, apesar do descalabro produzido pelo governo na pandemia.

Hoje, o cálculo do impeachment beneficia Bolsonaro. Para que a destituição avance, são necessários os votos de 342 dos 513 deputados. Graças ao apoio do centrão, o governo tem a seu lado um bloco que pode superar 200 parlamentares, o que torna essa matemática impossível.

Presidentes têm mais chances de escapar de processos desse tipo em ambientes políticos com alta fluidez ideológica. Como o centrão tem mais afinidades do que divergências com Bolsonaro, o governo consegue atrair essas siglas com facilidade, distribuindo cargos e verbas públicas.

Defensores do impeachment argumentam que é necessário abrir o processo mesmo que não haja apoio inicial suficiente para derrubar o presidente. Segundo eles, é possível construir o placar ao longo do caminho, numa campanha que exponha os crimes de responsabilidade praticados por Bolsonaro e auxiliares.

Ainda que isso seja possível, uma força contrária também atua a favor do governo, nesse caso. Na largada, se a percepção dos parlamentares for que Bolsonaro tem condições de sobreviver, muitos escolherão ficar com o presidente para colher benesses oficiais. Com isso, o lado pró-impeachment pode ficar mais perto dos 150 do que dos 342 votos.

Um processo frustrado tem seus custos. Uma vitória de Bolsonaro exporia a fragilidade da oposição e fortaleceria os vínculos do Congresso com o governo. O presidente diria que derrotou um golpe e desestimularia novos pedidos de destituição.

O impeachment ainda depende de uma virada nas condições políticas e sociais. Às vésperas da queda de Fernando Collor, 84% dos brasileiros diziam que ele estava envolvido em corrupção. Agora, só 8% afirmam que Bolsonaro é o principal culpado pelas mortes na pandemia.


Cláudio Couto: Na disputa pela Câmara, resultado é imprevisível

Presidente Jair Bolsonaro tem motivos adicionais para valorizar a eleição na Casa

A disputa pela presidência da Câmara dos Deputados é crucial no xadrez político brasileiro, pois o chefe máximo dessa casa legislativa detém considerável poder de agenda, cabendo-lhe encaminhar decisões cruciais – em especial as que interessam ao Poder Executivo.

Por determinação constitucional, todo projeto de lei oriundo do Executivo inicia sua tramitação na Câmara, cabendo ao seu presidente determinar – junto com os líderes partidários – a pauta de votações. Também processos de impeachment, para começarem a tramitar, dependem da anuência do presidente da Câmara; daí porque o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) é bastante criticado por não ter dado seguimento às dezenas de pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro.

Considerando esses dois poderes substanciais, é de grande importância para o presidente da República contar com um chefe da Câmara com quem tenha boa relação. Se, mais do que bom relacionamento, contar com um fiel aliado, ou com um serviçal (tal qual o atual procurador-geral da República), melhor ainda. Os antecessores de Bolsonaro puderam experimentar tanto as benesses de contar com aliados, como os dissabores causados por desafetos. O atual chefe do Executivo, incurso em muitos crimes de responsabilidade que motivam seu impeachment e sequioso de fazer avançar sua agenda reacionária de costumes, tem motivos adicionais para valorizar a disputa pelo posto.

O cenário atual, como mostra a pesquisa do Estadão, torna difícil antecipar o desfecho da disputa, já que a maior parte dos deputados prefere não revelar as preferências. Como Rodrigo Maia preconiza o voto aberto, mas Arthur Lira defende o sufrágio secreto, talvez o segredo dos legisladores seja um alento para o candidato bolsonarista. Contudo, não se trata de inferência tão simples, já que muitos preferem o segredo justamente para não se indispor com o Poder Executivo, junto ao qual buscam benesses. Isso, porém, vale mais para os governistas do que para a oposição, que também esconde seu voto. O jogo está aberto.

*Professor de ciência política na FGV Eaesp


O Estado de S. Paulo: Bloco de Lira tem mais confirmação de apoio partidário

Segundo o placar, declaração de apoio a candidato ligado ao Planalto chegou a 65% das siglas aliadas, ante 39% de Baleia Rossi

Adriana Ferraz e Fernanda Boldrin, O Estado de S.Paulo

Ainda faltam 70 votos para os deputados dos partidos que sustentam a candidatura de Arthur Lira (PP-AL) ao comando da Câmara dos Deputados declararem individualmente o apoio assegurado por seus líderes, mas o total até agora, de 65%, supera com ampla margem a fidelidade do bloco adversário, liderado por Baleia Rossi (MDB-SP). De acordo com o placar do Estadão, o candidato do atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-SP), tem, por enquanto, 39% dos 275 votos prometidos pelos aliados.

A enquete revela que o Patriota supera até mesmo PP e MDB quando o assunto é fidelidade partidária. Fechado com Lira, o partido declarou seus seis votos em favor do candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro. O Republicanos também avança nos votos públicos para o deputado de Alagoas, assim como o PL, dono da terceira maior bancada da Casa.

“Todos vão anunciar que votam nele, pode ter certeza. Essa é a condição natural, não podemos mais ficar nesse marasmo. Nós, do PL, temos noção do que é melhor para o Brasil e para o Parlamento”, afirmou o líder do partido, Wellington Roberto (PB), que repassou aos correligionários o link da enquete publicada sexta para “incentivar” que mais votos em Lira se tornassem públicos – a eleição, marcada para o dia 2, é secreta.

Do outro lado da disputa, o mais rigoroso à determinação de apoiar Baleia é o PT. Dos 52 deputados petistas, 35 (67%) aceitaram falar publicamente que votarão no candidato de Maia, seguindo determinação da maioria da bancada.

Para o deputado Alencar Santana (PT-SP), o resultado mostra que o partido é coerente e, acima de tudo, partidário. “Nossas posições são frutos de amplo debate e assim vai se construindo a opinião política entre todos”, afirmou, mesmo entre os que perdem a discussão.  “Sou um dos parlamentares do PT que defendeu candidatura própria, mas, uma vez vencido, vou acompanhar o partido e votar no Baleia Rossi. Vou votar contra o Bolsonaro”, ressaltou Waldenor Pereira (BA).



De acordo com o levantamento, DEM e PSDB são os partidos mais infiéis até aqui, ao menos na declaração de votos. Apesar de terem sido os primeiros a formar o bloco de oposição à candidatura de Lira, mesmo sem o anúncio de um nome para a disputa, ambos atingem só 21% de apoio formal a Baleia. A grande maioria da soma dos parlamentares não quis responder em “on” ao placar do Estadão até as 19h de sexta-feira, 15.

Racha

Enquanto parte dos acordos de traição é firmada nos bastidores, nenhuma legenda trouxe fraturas mais explícitas à disputa que o PSL. Formalmente, o partido está com Baleia Rossi, mas a maioria da bancada apoia Arthur Lira.

Ao Estadão, 28 deputados disseram que pretendem votar no candidato do Planalto, enquanto apenas quatro disseram que seguirão o caminho oficializado pela legenda de apoio ao emedebista. O número dos parlamentares que não quiseram responder chegou a 21.

Ex-líder do governo na Câmara, Vitor Hugo (PSL-GO), articulador da lista dos parlamentares do PSL que apoiam Lira, afirma que a candidatura de Baleia se tornou uma candidatura de oposição. “Eu não quero estar no mesmo bloco que PT, PCdoBPV. Eu não consigo vislumbrar o PSL, que se elegeu com pautas de direita, liberais, no mesmo bloco que esses partidos”, disse.

Já para o vice-presidente da legenda, o deputado federal Bozzella, que defende o nome de Baleia, a disputa não está se desenhando entre os eixos direita e esquerda, mas sim entre um bloco que ele chama de “independente” e um bloco classificado pelo parlamentar como “fisiológico”. “Não deixa de ser uma infração você dar apoio a um candidato apoiado pelo presidente da República que está loteando o Estado para poder interferir nas decisões do Parlamento”, diz, em referência à aliança dos governistas em torno de Lira.

Para o cientista político Rafael Cortez, a eleição vai testar a coesão interna dos partidos e a capacidade dos líderes em impor disciplina às suas bancadas diante de uma série de interesses que se cruzam e não necessariamente se alinham. “Eventualmente, interesses locais se contradizem com a política da legenda, e a tendência é que isso dificulte um monitoramento dos votos para os diferentes candidatos, impossibilitando a antecipação do resultado”, afirmou.

O deputado Carlos Henrique Gaguim (DEM-TO) tem o seu próprio placar. Ao lado de Lira, diz que a votação será definida em primeiro turno e que o DEM ajudará o opositor de Maia a se eleger com ao menos 20 votos. “Essa é a nossa previsão.”

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Folha de S. Paulo: Lira é alvo de ações penais no STF e acusado de violência doméstica

Deputado responde a processo de corrupção passiva, e ex-mulher diz ter medo 24 h por dia; denúncias são infundadas, afirma ele

Constanza Resende, Folha de S. Paulo

Candidato à presidência da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL) é alvo de ações penais no STF (Supremo Tribunal Federal) e de uma recente acusação enviada à Vara de Violência Doméstica do Distrito Federal.

A medida decorre de um documento apresentado pela sua ex- mulher, mãe de seus dois filhos, Jullyene Cristine Santos Lins, em agosto do ano passado, ao STF.

Na petição, anexada a um processo em que Jullyene acusa Lira de injúria e difamação, ela afirma que “o medo a segue 24 horas por dia, pois sabe bem o que o querelado [Lira] é capaz de fazer por dinheiro”. Por outro lado, Lira diz que, ao longo do tempo, as denúncias da ex-mulher "mostraram-se infundadas".

Jullyene diz que o deputado, com quem foi casada por dez anos, faz insultos não só contra ela, “mas também tentando diuturnamente promover o afastamento familiar dos filhos, principalmente o mais novo, com discursos de ódio e chantagens emocionais”. Cita o “enquadramento do querelado na Lei Maria da Penha e necessidade de proteção urgente” para ela e o seu atual companheiro.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu em outubro que o caso fosse encaminhado para um dos Juizados de Violência Doméstica “do local dos fatos”.

O parecer foi aceito pelo ministro relator do caso no Supremo, Luís Roberto Barroso, que encaminhou a um Juizado de Violência Doméstica de Brasília. Lira, porém, apresentou recurso contra a decisão, que deve ser julgado pelo STF em fevereiro.

Em outra decisão do tribunal, de 2018, o deputado perdeu o registro de sua arma, uma pistola de marca Glock calibre 380, por decisão do ministro Edson Fachin, e teve que entregá-la à Polícia Federal para destruição.1 8

O processo foi aberto em decorrência de outra ação de violência doméstica movida por Jullyene contra Lira, em que o deputado foi absolvido nove anos depois. Em 2006, ela apresentou queixa por lesão corporal contra o então deputado estadual à Polícia Civil.

Afirmou no depoimento que, após ficar sabendo que ela estava se relacionando com outro homem, depois da separação, Lira foi até sua residência e a agrediu com tapas, chutes, pancadas e “arrastada pelos cabelos, tendo sido muito chutada no chão”.

Disse que, indefesa, perguntava o porquê daquilo, ao que o deputado a chamava de "rapariga e puta". Acrescentou que, no momento em que agredia, Lira colocava a mão em sua boca para abafar seus gritos e dizia que mataria a declarante para ficar com os seus filhos.

A agressão, segundo ela, durou 40 minutos. A babá teria ouvido gritos de socorro e ligou para a mãe de Jullyene, pedindo ajuda. Esta teria chegado ao local e expulsado o homem, que chegou a dizer, segundo ela, que "onde não há corpo, não há crime”.

Jullyene anexou fotos das lesões ao processo e o caso foi parar no STF. Em 2015, Lira foi inocentado do caso, após ela mudar a versão da história, assim como todas as testemunhas, e dizer que fez a denúncia “por vingança”.

Em 2007, ela fez outra denúncia contra Lira, desta vez por ameaça. Segundo a acusação, a ex-mulher afirmou que Lira disse à babá que “os seus dias estavam contados” e que iria buscar o filho menor, mesmo sem sua permissão. A babá confirmou a denúncia, e Lira foi indiciado no Tribunal de Justiça de Alagoas.

O desembargador Orlando Monteiro Cavalcanti aceitou a denúncia, em dezembro de 2007, e proibiu Lira de manter contato pessoal, telefônico, por escrito, ou qualquer outro meio com a vítima, seus familiares, ou testemunhas do caso.

Lira teria recusado a aceitar a ordem dizendo ao oficial de Justiça "eu recebo já essa merda”. Depois disso, o desembargador o enquadrou no crime de coação no curso do processo e mandou prender Lira. O caso também foi parar no STF, mas prescreveu e o deputado não recebeu punição.

Na acusação feita no ano passado, Jullyene diz que o único objetivo de Lira é “continuar coagindo e assustando quem há 12 anos sofre com processos judiciais intermináveis, intervenção com busca e apreensão em casa pela Polícia Federal”.

Ela também acusou Lira de ocultação de bens segundo ela, o deputado tem um patrimônio de R$ 11 milhões. A denúncia foi enviada ao Ministério Público de Alagoas, que investiga o caso.

Além disso, Lira, apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na eleição para a presidência da Câmara em fevereiro, responde a dois processos no STF.

Um deles é sob acusação de corrupção passiva, em denúncia oferecida em abril de 2018 pela PGR.

Lira, segundo o órgão, teria recebido propina de R$ 106 mil do então presidente da CBTU (Companhia Brasileira de Transportes Urbanos), Francisco Colombo, em 2012. Em troca, teria prometido apoio político para se manter no cargo.

O valor foi apreendido no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com um assessor parlamentar de Lira, que tentava embarcar para Brasília com o valor escondido nas roupas. Em novembro, a 1ª Turma do STF rejeitou um recurso do parlamentar e decidiu mantê-lo como réu.

O deputado também responde ao inquérito chamado “quadrilhão do PP”, por suposta participação em esquema de desvios da Petrobras. De acordo com a acusação, desdobramento da Lava Jato, integrantes da cúpula do PP integrariam uma organização criminosa, com ascendência sobre a diretoria da Petrobras, e que desviava verbas em contratos da estatal.

A denúncia foi aceita pela 2ª Turma do Supremo, em junho de 2019, mas a ação penal ainda não começou a tramitar.

Já em junho do ano passado, a PGR denunciou Lira sob acusação de corrupção passiva por supostamente ter recebido R$ 1,6 milhão de propina da empreiteira Queiroz Galvão em troca de apoio do PP para a permanência de Paulo Roberto Costa como diretor da Petrobras. Porém, três meses depois, a PGR voltou atrás da denúncia e disse que havia fragilidade nas provas produzidas por ela própria.

No STJ (Superior Tribunal de Justiça), tramita um recurso movido por Lira para tentar liberar bens que foram bloqueados em uma ação da Lava Jato há quatro anos. Ele e o seu pai, Benedito de Lira (PP), ex-senador e atual prefeito de Barra de São Miguel (AL), tiveram bens bloqueados no valor de até R$ 10,4 milhões.

O pedido decorreu de uma ação da 11ª Vara Federal do Paraná de improbidade administrativa em que os dois são acusados de se beneficiar de R$ 2,6 milhões desviados da Petrobras.

No mês passado, Lira também foi absolvido das acusações de prática de "rachadinha" pelo Tribunal de Justiça de Alagoas. A denúncia contra Lira pedia a condenação do deputado por peculato, a proibição do exercício de função pública e ainda pagamento de indenização por dano moral coletivo.

Ele havia sido acusado pela PGR de desvio de verbas da Assembleia Legislativa de Alagoas, por meio de apropriação de salário de servidores e empréstimos na rede bancária pagos com verba de gabinete. O juiz Carlos Henrique Pita Duarte aceitou a tese da defesa de que a Justiça Federal não deveria atuar no caso porque os fatos são relacionados a supostos desvios de recursos estaduais.

PROCESSOS JÁ JULGADOS FORAM ARQUIVADOS, AFIRMA DEPUTADO

Por meio de sua assessoria, Arthur Lira afirmou que todos os processos da Lava Jato que vieram a julgamento foram arquivados e os próximos devem ter o mesmo desfecho.

"Três processos no STF foram arquivados e, no quarto processo, a própria Procuradoria-Geral da República pede o encerramento. Em outro, a acusação nem sequer possui amparo legal válido para o período questionado. É natural, portanto, a solicitação da liberação dos bens bloqueados referentes a essas acusações", disse.

Sobre os relatos da ex-mulher, Lira diz que as denúncias dela sempre se mostraram infundadas.

O parlamentar disse ainda que seu patrimônio "é declarado publicamente a cada nova eleição". "As alegações de ocultamento estão relacionadas a patrimônio que já está em posse da ex-mulher, por meio de um acordo judicial. Ou seja, não pertencem mais ao deputado e a disputa judicial está encerrada. A guarda dos filhos também está decidida pela Justiça", disse.

O deputado afirmou que possuía posse de arma "para mantê-la em sua residência". "Na sua renovação de posse, por ter processo na Justiça em andamento e em cumprimento ao Estatuto do Desarmamento, foi indicado que não poderia renovar o registro. Assim, o deputado solicitou a transferência de titularidade para entregá-la a um terceiro."

Também disse que nunca foi preso ou detido. "Por estar em uma sessão, não pôde receber um oficial de Justiça no exato momento em que chegou à Assembleia Legislativa de Alagoas. O oficial não quis aguardar o final da sessão e retornou ao tribunal. A ordem de prisão que se seguiu foi feita de forma ilegal e abusiva."

Jullyene e o advogado dela não responderam à reportagem.


O Globo: Conheça as táticas dos estrategistas de Rossi e Lira para conquistar o voto dos deputados

Candidato do MDB aposta em campanha digital, com críticas ao governo Jair Bolsonaro, enquanto Lira investe em estratégia mais "analógica"

Natália Portinari, O Globo

BRASÍLIA — Aconselhadas por estrategistas, as campanhas de Baleia Rossi (MDB-SP) e Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara dos Deputados adotam táticas diferentes de comunicação para conseguir o voto dos parlamentares. Baleia aposta em campanha digital, fazendo críticas ao governo Jair Bolsonaro, enquanto Lira investe em estratégia mais "analógica".

Em evento na quarta-feira, Baleia lançou a candidatura ao lado de onze partidos de centro-direita e esquerda. Defendeu a "vacina para todos e gratuita", dizendo que o Congresso deve agir para garanti-la. A ideia é se contrapor à política de Bolsonaro, com bandeiras como a defesa da democracia e dos direitos das minorias.

Eleições Câmara: Confira o placar dos partidos que apoiam Rossi e Lira

Antes de seu discurso, foi exibido um vídeo produzido por Chico Mendez, marqueteiro que trabalhou em 2018 na campanha de Henrique Meirelles (MDB) à Presidência. Mendez se tornou conhecido pelo trabalho bem-sucedido na eleição do petista Fernando Pimentel para o governo de Minas Gerais em 2014.

A identidade visual da campanha de Baleia conta com uma imagem que representa os assentos da Câmara com as cores azul, vermelho e amarelo, representando a direita, esquerda e o centro. Havia ainda um slogan exibido nos pôsteres: "Câmara livre, democracia viva". A aposta é engajar a sociedade na campanha.

CâmaraChance de eleição virtual cria racha entre aliados de Rossi e Lira

Arthur Lira, por outro lado, conta com conselhos do consultor político Mário Rosa. Ele disse ao GLOBO que não é remunerado pelo PP e está apenas dando conselhos pela amizade que tem com o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do partido. Ele já trabalhou com Ricardo Teixeira, Fernando Henrique Cardoso e Lula.PUBLICIDADE

Rosa defende que a eleição para a presidência da Câmara é "como a escolha do Papa" — é decidida de forma sigilosa, por um grupo de pessoas que já se conhecem e pouco influenciável pela opinião pública. A estratégia é ganhar o voto dos deputados com viagens e conversas individuais, sem apelar para a pressão popular.

— Eles têm que decidir se querem o Oscar de melhor campanha ou ganhar a eleição para presidência da Câmara — ironiza. — Tem uma campanha aparentemente muito conectada com a voz das ruas e outra, conectada com os deputados.

O slogan da campanha de Arthur já traduz essa abordagem: "Para toda a Câmara ter voz". A ideia é não entrar em debates nacionais e fugir também do confronto com Rodrigo Maia (DEM-RJ), atual presidente e principal aliado de Baleia Rossi.

Em suas postagens em redes sociais e conversas com deputados, Lira também vem tentando desconstruir a imagem de que Baleia Rossi é um candidato independente do governo. Lembra que o MDB tem hoje a liderança do governo no Congresso Nacional e no Senado e que Baleia é alinhado ao Executivo nas votações.

Aliados de Baleia, por outro lado, defendem que a Câmara irá se tornar um "puxadinho" do Palácio do Planalto sob a gestão de Lira. Eles argumentam que Lira usará a Casa como um instrumento de "toma lá, dá cá" para negociar cargos e emendas — nas últimas semanas, a Secretaria de Governo ofereceu cargos em troca de apoio a Lira.

A pandemia mudou a rotina das campanhas. Em anos anteriores, era comum distribuir panfletos pelos corredores da Câmara dos Deputados e fazer reuniões presenciais para definir apoios. Agora, os candidatos devem intensificar a agenda de viagens para os estados para compensar a ausência desses encontros em Brasília.

Baleia congrega partidos com visões políticas opostas, unidos por uma pauta de independência da Câmara. Tem o PT, com 52 parlamentares, e o PSL, com 53. Partidos de centro e de esquerda completam a lista: MDB, PSDB, DEM, PSB, PDT, PCdoB, Cidadania, PV e Rede. São 11 legendas com 278 deputados.

O bloco de Arthur Lira, por outro lado, possui 195 parlamentares mais alinhados ao governo. As maiores bancadas são as do PL, com 43 deputados, e do PP, com 40. Também estão no grupo Republicanos, Solidariedade, Pros, PSC, Avante e Patriota.


Correio Braziliense: Candidato da oposição na Câmara, Rossi foi mais fiel ao governo que Lira

Na disputa pela Presidência da Câmara, Baleia Rossi conta com o apoio da oposição, e Arthur Lira, do Planalto. Porém, ambos têm posturas similares e Rossi chegou a ser mais fiel ao Executivo e votações que seu adversário

Wesley Oliveira, Correio Braziliense

Mesmo em lados opostos na disputa pela Presidência da Câmara, os deputados Arthur Lira (PP-AL) e Baleia Rossi (MDB-SP) sempre tiveram perfis parecidos e, até certo ponto, andaram alinhados em seus posicionamentos dentro do Congresso. Apesar do discurso distinto nas campanhas — o político alagoano é apontado como candidato do governo, e o paulistano, da oposição —, ambos deverão manter o modelo de condução dos trabalhos, seja qual for o vitorioso. O pleito na Casa está marcado para 1º de fevereiro.

Nos bastidores, Lira e Rossi são conhecidos como conciliadores em momentos de crise, portanto, atuam como negociadores nas pautas em consenso. Além disso, os dois deputados são lembrados pelos demais colegas por cumprirem os acordos firmados entre os líderes da Casa. Ou seja, nesse sentido, só deverão andar pautas que tiverem anuência da maioria.

Apesar do apoio do Palácio do Planalto, Lira tem se comprometido com seus pares a manter a postura independente da Casa em relação ao Executivo. Entre as promessas do líder do Centrão estão a distribuição de relatorias dos projetos e presidências dos colegiados de acordo com o tamanho das bancadas. Isso favorece tanto o PT (52 deputados), da esquerda, quanto o PSL (50), da direita.

Já Baleia Rossi foi o escolhido pelo atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), como seu candidato, no intuito de não favorecer o Planalto nas chamadas pautas de costume. “Minha preferência é por um nome que consiga manter de pé um projeto para derrotar essa pressão, essa pata do governo dentro da Câmara dos Deputados, que vai ser muito ruim”, disse Maia, enquanto buscava um nome para a sucessão dele.

Mesmo assim, o MDB, partido que Baleia preside, conta com parlamentares simpáticos ao governo de Jair Bolsonaro. Portanto, pedidos de impeachment contra o chefe do Executivo não deverão ser aceitos por nenhum dos dois candidatos, por exemplo.

Recentemente, Lira aproveitou uma entrevista à Rádio CBN para apontar que seu adversário não era “totalmente” independente do governo. “Continuo a dizer que, até que o MDB entregue as lideranças do governo no Senado e no Congresso, até que os seus deputados entreguem todos os cargos que têm na administração pública nos estados e no governo federal, que o líder Baleia entregue a Secretaria Nacional de Habitação, eles são tão governo quanto qualquer partido de centro. Todos são da base”, enfatizou.
Logo após receber o apoio oficial do PT, na segunda-feira, Rossi afirmou que seu bloco é composto por partidos compromissados com a democracia. “Tem esquerda, centro, direita. Diferentes que se juntam num objetivo comum: manter a Câmara livre e a democracia viva”, escreveu o emedebista, em uma rede social.

Um levantamento da consultoria de análise política Arko Advice mostra que tanto Lira quanto Rossi mantiveram posicionamentos parecidos em votações de interesse do Executivo nos últimos dois anos. O emedebista teve um índice de apoio de 90,24% ao governo, em 2019; e Lira, de 86,29%. Em 2020, os percentuais foram de 77,82% e 70,59%, respectivamente.

Gráficos mostram como votaram os dois candidatos à Presidência da Câmara
Gráficos mostram como votaram os dois candidatos à Presidência da Câmara(foto: Editoria de Arte/CB)

Diálogo

Na avaliação de Breno Montezano, consultor e analista político pela Fundação Getulio Vargas (FGV), os dois postulantes à Presidência da Câmara são do Centrão, portanto, atuam da mesma forma. “Eles podem adotar discursos diferentes agora, mas, pela quantidade de partidos dentro da Câmara, todo candidato sempre tem o mesmo perfil. É preciso conversar e dialogar com os vários pares para que haja avanço nos projetos”, explica.

Apesar da expectativa de que Lira dê prioridade às pautas governistas, o analista destaca que não haverá clima para grandes mudanças. No mesmo sentido, ele frisa que Rossi não fará muitas concessões para a esquerda. “Por se tratarem dos dois últimos anos de mandato, o próximo presidente da Casa não terá tempo para fazer mudanças bruscas dentro do Parlamento. As reformas de interesse do governo vão andar de acordo com a vontade e a pressão do mercado e se houver consenso sobre a matéria”, ressalta. “Já pautas conservadoras ou progressistas ficarão esquecidas, pois ambos estarão de olho no eleitor de 2022.”

No entendimento do economista Paulo Jorge Gomes, as propostas de menor envergadura e com mais consenso vão continuar passando no Congresso, como os marcos regulatórios — entre os quais, a lei do gás e o projeto de ferrovias. Além disso, a proposta de emenda à Constituição (PEC) Emergencial, de corte de gastos públicos, deve ser aprovada, mas com tamanho muito menor do que era previsto.

“A pulverização dentro do Congresso não favorece grandes mudanças. Além disso, a pandemia mudou o foco do parlamento, que prometia ser reformista. Os próximos dois anos serão para planejar as eleições. Então, qualquer que seja o novo presidente da Câmara, o trabalho será de continuidade do que já temos até agora”, avalia.


O Estado de S. Paulo: Mesa Diretora estuda fazer eleição virtual para sucessão de Maia

Embora não haja decisão sobre o assunto, deputado Arthur Lira já se articula para barrar eventual mudança no sistema de votação

Rafael Moraes Moura e Camila Turtelli, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A cúpula da Câmara dos Deputados avalia a possibilidade de promover votação virtual na eleição que vai escolher o sucessor do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em 1° de fevereiro. Embora ainda não haja decisão sobre o assunto, o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, já se articula para barrar eventual mudança no sistema de votação e seus aliados falam até em risco de ataques hackers.

A mobilização de 513 deputados para eleger quem comandará a Câmara no biênio 2021-2022 impõe um desafio logístico ao Legislativo por causa da pandemia do novo coronavírus. O candidato de Maia é o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), que será lançado oficialmente nesta quarta-feira, 6, em ato na Câmara. Após atrair o apoio do PT e de outros partidos de oposição, Baleia formou um bloco com maior número de deputados do que o de Lira, líder do Centrão.

Nos bastidores, adeptos da campanha de Lira dizem agora que ele tem mais chances de vencer a disputa se a eleição for presencial, porque pode virar votos no corpo a corpo, e há até mesmo quem aponte o receio de fraude durante a votação. Em documento enviado a Maia no dia 22 de dezembro, o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do Progressistas, observou que o regimento da Câmara dos Deputados prevê apenas votações presenciais.

“Como garantir que o processo de escolha daquele que ocupará a 3ª posição constitucional na linha sucessória da Presidência da República não seja contaminado por ataques de hackers, que têm quebrado sistemas de segurança de órgãos, entidades e empresas mundiais?”, perguntou Ciro a Maia. “Qual a garantia de que o sigilo do voto de cada parlamentar será preservado, bem assim a integridade de sua escolha, já que o processo de votação será realizado pela ‘internet’, abrindo-se a possibilidade de ataques e manipulações externas?”

Após a reportagem ser publicada nesta quarta-feira, 6, o próprio Lira foi ao Twitter criticar a possibilidade de eleição virtual. "Nas eleições,148 milhões de eleitores tiveram a obrigação de ir às urnas e votar em plena pandemia. Agora,o presidente da Câmara @rodrigomaia e seu candidato @baleiarossi  querem votar remotamente na eleição p/ presidência da Câmara. Qual a verdadeira intenção por trás disso?", questionou.

Diante da polêmica, a Mesa Diretora da Câmara também estuda um modelo misto, no qual apenas os idosos, grupo de risco para o novo coronavírus, votariam de forma remota.

Definição

Oficialmente, a Câmara informa que “ainda não há uma definição sobre a forma como ocorrerá a sessão de votação para escolha da nova Mesa Diretora”. No mês passado, Maia cogitou a possibilidade de ampliar o espaço físico da votação e espalhar urnas pelo Congresso, para além do plenário, como no Salão Verde da Casa, o que poderia evitar aglomerações.

“Estou pensando em fazer presencial e ampliar o espaço do plenário, talvez fechando o Salão Verde. É uma ideia inicial”, afirmou o presidente da Casa no dia 16 de dezembro.

A possibilidade de se convocar os 513 deputados para irem a Brasília, no entanto, é criticada até mesmo entre aliados de Maia. Para o líder do PSB, Alessandro Molon (RJ), seria uma "irresponsabilidade". “Considerando as circunstâncias em que País se encontra em função da pandemia, seria uma irresponsabilidade obrigar todos os parlamentares, muitos dos quais de grupos de risco, irem a Brasília para votar. É fundamental garantir a possibilidade de se votar remotamente”, afirma Molon, que apoia Baleia. 

Se a Câmara optar pelo formato remoto, esta não seria a primeira vez que os parlamentares escolheriam a distância nomes da Mesa Diretora. Em julho do ano passado, a Câmara elegeu os deputados Expedito Netto (PSD-RO) e Paulão (PT-AL) para os cargos, respectivamente, de 3.º secretário e 4.º suplente usando o sistema virtual. Eles substituíram Fábio Faria (PSD-RN), que assumiu o Ministério das Comunicações, e Assis Carvalho (PT-PI), que morreu após sofrer um infarto. O Sistema de Deliberação Remota (SDR) foi adaptado para assegurar o cumprimento do regimento interno, que exige o voto secreto.

Entre os que são contra a eleição remota está o candidato à primeira vice-presidência na chapa de Lira, o deputado Marcelo Ramos (PL-AM). “A eleição deve ser presencial. Formalmente a eleição para a Câmara só tem um dia de campanha para apresentação de chapa e contato com os eleitores. Devemos aumentar muito o número de locais de votação, usando as salas das comissões e controlando o acesso, mas a votação tem que ser presencial”, disse. 

Há ainda os que defendam o formato misto, como é o caso da deputada Joice Hasselmann (PSL-SP). “Dá pra fazer das duas formas. Na minha opinião o melhor modelo seria o misto. Se for apenas presencial será uma eleição que pode demorar o dia todo porque são 513 votos e não pode aglomerar. Mas a coisa está caminhando para o presencial. Mas tenho receio de muitas faltas, em especial dos mais idosos”, afirmou.

No Senado, ainda não foi escolhido o modelo, mas a tendência é adotar o mesmo utilizado para a votação de autoridades -- indicações para agências, embaixadores e outros órgãos. Neste formato, equipamentos são colocados na garagem do Congresso e senadores podem votar sem sair dos próprios carros, numa espécie de “drive thru”.  / COLABOROU DANIEL WETERMAN


El País: Para conter Bolsonaro, esquerda se alia a candidato de Maia na sucessão da Câmara

Baleia Rossi, um dos articuladores do impeachment de Dilma em 2016, formaliza candidatura nesta quarta. Estratégia visa barrar ao menos pautas de costume de Bolsonaro, avalia especialista

Afonso Benites e Heloísa Mendonça, El País

Por falta de opção, a esquerda representada na Câmara dos Deputados se viu numa encruzilhada. Ou apoiava o candidato de Jair Bolsonaro à presidência da Casa, Arthur Lira (PP-AL), ou seguia com Baleia Rossi (MDB-SP), um fiel aliado do ex-presidente Michel Temer e um dos articuladores pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016. Decidiu pela segunda opção e oficializou o suporte à candidatura do emedebista, que também é o escolhido pelo atual presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Para se chegar a essa definição, contudo, ocorreram intensos debates internos entre os parlamentares do maior partido opositor, o PT, que tem 52 deputados. Em uma reunião da bancada, houve 27 votos a favor do apoio a Rossi, 23 votos por uma candidatura própria e uma abstenção. “Vamos marchar com a centro-direita para buscar o caminho de independência e de enfrentamento das aleivosias do presidente da República”, disse o líder da minoria, José Guimarães (PT-CE).

Para o cientista político Cláudio Couto, professor da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, o apoio da esquerda a um nome indicado por Rodrigo Maia representa a tentativa de manter os Poderes independentes. “É uma aliança visando estabelecer a independência do Legislativo, ainda mais diante dos arroubos autoritários do Bolsonaro. Se ele se comportou até aqui dessa forma tendo o Congresso independente, imagina se não tivesse.” A aliança também pode fortalecer João Doria (PSDB-SP), o governador paulista que tenta se cacifar para ser o nome da centro-direita na eleição presidencial de 2022. O MDB, partido presidido por Rossi, o PSDB, comandado por Bruno Araújo (aliado de Doria), e o DEM, que tem Maia como um a de suas principais lideranças, têm um acordo para seguirem juntos nas próximas eleições nacionais.

Inicialmente, a cúpula petista tentava sinalizar que a maioria a favor de Baleia Rossi, que formaliza sua candidatura ao comando da Câmara nesta quarta, era clara. O que não se configurou. Como o voto para a presidência da Câmara é secreto, há a possibilidade de defecções. Lira conta com apoio de antigos aliados do PT, de quem já foi um dos membros da base no Governo Dilma. Além do PT, outros quatro partidos de oposição já aderiram à candidatura de Baleia Rossi: PSB, PDT, PCdoB e REDE. Apenas o PSOL, que tem dez deputados, não se definiu. Deve fazê-lo em 15 de janeiro. O emedebista ainda conta com o apoio de MDB, PSDB, DEM, PV, Cidadania e PSL. Enquanto Lira tem apoio do PL, PP, PSD, Republicanos, Solidariedade, PTB, Podemos, PROS, PSC, Patriota e Avante.

Em tese, levando em conta os apoios declarados pelos partidos, o candidato apoiado por Bolsonaro teria entre 200 e 210 votos, enquanto Rossi, entre 250 e 280. A variação ocorre porque alguns deputados de siglas que declararam apoios já anunciaram que não seguirão a orientação partidária. Para se eleger presidente da Câmara é necessário obter ao menos 257 votos entre 513 parlamentares.

A votação em 1º de fevereiro é crucial para a segunda metade do Governo Bolsonaro. Se Lira for o escolhido, há a possibilidade de andarem pautas de costumes que Bolsonaro não conseguiu emplacar em seus dois primeiros anos de mandato, como permitir uma ampliação do armamento da população, a escola sem partido ou a flexibilização da punição para policiais que matarem suspeitos em operações, a licença para matar. Além disso, há a expectativa de caminharem pautas da agenda econômica, como a privatização de dezenas de empresas públicas ou a autonomia do Banco Central.

Para apoiar Rossi, as legendas de esquerda cobraram que ele autorize a abertura de comissões parlamentares de inquérito (CPIs) contra o Governo Bolsonaro, que analise a gravidade de eventuais novos pedidos de impeachment e que declare apoio público à vacinação contra a covid-19. Também pedem algo que nem os 14 anos de governos petistas foram capazes de fazer: propor a taxação das grandes fortunas no Brasil.

Agenda econômica deve dividir parlamentares, de olho em 2022

Neste ano, a eleição tem um peso ainda mais forte por acontecer em meio a um momento particular de crise sanitária e econômica, devido à pandemia do novo coronavírus. “Temos um crescimento que é pífio, estamos esperando um primeiro trimestre muito ruim, pressão inflacionária principalmente sobre os mais pobres, temos o fim do auxílio emergencial, aumento de casos de covid-19, o barata voa da logística da vacina. Tudo isso abre o ano com um ambiente que não é bom”, explica Maria Cristina de Barros, economista e sócia da consultoria MB Associados.

Na avaliação da economista, há grande possibilidade que o Governo chegue em fevereiro sem uma agenda clara. Para Barros, o mais provável é que os parlamentares já comecem a se mover pensando nas eleições de 2022. “Vamos ter a dicotomia de um grupo querer gastar mais, porque muitos estão brigando pela reeleição, e outros vão ser comedidos na questão fiscal”. Segundo ela, o candidato do bloco de Rodrigo Maia terá uma pauta econômica mais forte e preocupada com o lado fiscal do que a do candidato Arthur Lira, embora o deputado do PP seja visto como uma pessoa que cumpre acordos. “Nós temos dúvida sobre a capacidade de Lira priorizar a pauta econômica, porque não há consenso sobre os itens que estão já na agenda e Bolsonaro não é amigável. O presidente quer o pensamento mágico, quer recursos, mas não quer brigar com os grupos de apoio “, explica.

A economista ressalta ainda que Maia sempre teve clareza da pauta econômica liberal e foi responsável em grande medida por conduzir a Câmara a reforma da Previdência. “A interlocução do Executivo foi muito pequena neste tema. Ele atuou em duas frentes, tentou passar a pauta econômica e segurar a pauta de costume, que é a agenda de Bolsonaro. O seu sucessor seguiria a mesma linha”, diz.

Já Lira, segundo Barros, deve, caso eleito, encampar mais as pautas bolsonaristas e minimizar a questão fiscal, que é o grande problema de 2021. “O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem um discurso muito ufanista, de recuperação em V, e parte das pessoas que apoiam Lira está de acordo com essa visão, de que a recessão passou e a economia vai bombar em 2021, o que obviamente não é verdade”. Ela ressalta, no entanto, que mesmo que Lira entre “fechado com o Governo Bolsonaro”, não significa que ele continuaria assim no mês seguinte. “Ele sempre vai estar fazendo a avaliação do custo benefício de estar de um lado ou de outro.”

Ainda falta quase um mês para a votação. Até lá, pode haver reviravoltas. Rossi esperava a declaração de apoio da esquerda para poder lançar oficialmente sua candidatura, o que deve ocorrer na quarta-feira.