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BRICS ainda é prioridade estratégica para o Brasil

Serra faria bem em enviar um sinal inequívoco de que país está disposto a fortalecer a cooperação.

Há quase dez anos, em 2007, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva era um dos palestrantes mais esperados no Fórum Econômico Mundial de Davos. Um enorme fluxo de investimentos transbordava um dos mercados emergentes mais empolgantes do mundo, e o chanceler Celso Amorim — que mais tarde seria considerado “o melhor ministro das relações exteriores do mundo” pela revista norte-americana Foreign Policy — estava começando a expandir a presença econômica e diplomática do Brasil ao redor do mundo.

Era a primeira vez que um país da América do Sul estabelecia uma rede tão ampla de embaixadas, a ponto de rivalizar com as de grandes potências. Um ano mais cedo, Amorim começara a se encontrar regularmente com seus pares na Rússia, Índia e China para discutir como os países BRIC poderiam fortalecer seus laços de cooperação e articular posições para lidar com desafios globais de forma conjunta. O grupo BRICS (que desde 2010 passou a incluir a África do Sul) se tornou rapidamente uma das inovações mais importantes da política mundial desde a virada do século, e foi capaz de chamar a atenção de potências tradicionais para a necessidade de adaptar estruturas globais a novas realidades.

De volta a 2016, o desempenho da economia brasileira é um dos piores do mundo, o país é comandado por um Governo interino envolto em escândalos e abalado por protestos, medidas de austeridade e uma espantosa investigação de esquemas de corrupção que ameaça as carreiras de grande parte da elite política do Brasil. Observadores internacionais consideram os BRICS como algo do passado, e alguns analistas brasileiros acreditam que o grupo já não deve ser prioridade para a política externa brasileira.

Eles não poderiam estar mais errados.

A sugestão de negligenciar o BRICS não leva em consideração as amplas vantagens estratégicas que a participação no grupo traz ao Brasil. Não tratá-lo como uma prioridade (por exemplo, se esquivando de ir à Cúpula anual) seria um erro cabal. Há três razões pelas quais o grupo é essencial para os interesses estratégicos do Brasil.

A primeira e mais importante é que a adesão aos BRICS providencia ao Brasil acesso direto e institucionalizado às lideranças políticas em Nova Déli e Pequim — um privilégio que o país não necessariamente teria de forma automática a cada ano. Apesar da desaceleração do crescimento econômico, espera-se que a China cresça em torno (ou até mais) de 6% em 2016 e 2017. O desempenho da Índia tem sido ainda melhor e espera-se que o país crescerá mais rápido do que a China. O FMI prevê que a China e a Índia contribuirão com mais de 40% da expansão da economia global até 2020 – em comparação, os Estados Unidoscontribuirão com apenas 10%. Atualmente, já se contabiliza mais riqueza privada na Ásia do que na Europa, e espera-se que a China, independentemente da atual desaceleração, supere os Estados Unidos como a maior economia do mundo.

O Brasil deve fazer muito mais para se adaptar a essa nova realidade, e não há dúvidas de que o futuro do país dependerá em grande parte da Ásia. O grupo BRICS importa neste contexto porque representa muito mais do que cúpulas presidenciais anuais. Na realidade, o grupo inclui mais de 15 reuniões a nível ministerial por ano, que auxiliam na promoção de cooperação intra-BRICS em áreas tão diversas como agricultura, educação, economia, ciência e tecnologia — sem mencionar o Novo Banco de Desenvolvimento, criado no âmbito do BRICS.

Como a influência crescente da China na Venezuela afeta os interesses nacionais brasileiros? Como a região como um todo deveria responder ao papel da China? Nenhuma dessas questões tem sido abordada a sério.

Em segundo lugar, a próxima reunião de Cúpula do BRICS na Índia em outubro é uma chance única para o presidente interino Michel Temer apresentar como ele está tentando superar as atuais adversidades do Brasil. Com a reputação do país em frangalhos, investidores asiáticos precisam ser reassegurados de que a investigação sobre corrupção em andamento é um passo na direção certa, que em última instância levará o Brasil a ser um país mais amigável para investidores. Temer, portanto, deveria ser acompanhado dos principais líderes da sua equipe econômica, os quais deveriam visitar investidores em vários centros financeiros asiáticos após o encontro da cúpula.

Finalmente, a adesão do Brasil ao grupo BRICS, junto com seu status de membro fundador no Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB) e o Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS, são sinais importantes de que a presença global estratégica do país estabelecida na primeira década do século 21 é permanente e não será afetada substancialmente pela crise atual. As instituições citadas acima são símbolos de um maior deslocamento em direção à Ásia, que impactará o Brasil mais do que muitos estão cientes.

Enquanto a China se tornou o maior parceiro comercial do Brasil em 2009, a elite brasileira na política, nos negócios, na mídia e na academia estão ainda lamentavelmente ignorantes em relação à China e à Ásia como um todo. Pouquíssimos diplomatas brasileiros falam chinês e jovens estudantes nas melhores universidades brasileiras ainda preferem passar seus semestres de intercâmbio em Barcelona ou Paris em vez de Pequim ou Xangai. Não há um único programa de dupla diplomação entre universidades brasileiras chinesas e, no lugar de enviar correspondentes para a China, muitos jornais brasileiros compram conteúdo relacionado à China de jornais estrangeiros.

Isso mostra que o Brasil está entre os grandes países menos preparados para o surgimento de uma ordem mundial centrada na Ásia. Considerando a crescente influência da China na América do Sul, esta falta de preparo cria sérios riscos estratégicos. Como a influência crescente da China na Venezuela afeta os interesses nacionais brasileiros? Como a região como um todo deveria responder ao papel da China? Nenhuma dessas questões tem sido abordada a sério. O fato de que alguns pensadores (particularmente entre a esquerda da América Latina) ainda veem o crescimento da influência chinesa na região como positiva simplesmente porque Pequim é tido como adversário de Washington mostra quão incipiente é o debate na região — como o exemplo africano mostra, as coisas são bem mais complexas do que isso.

Independentemente da orientação ideológica de seu Governo, qualquer país no mundo hoje deve construir o conhecimento necessário para se envolver significativamente com a Ásia (e especialmente a China), que será em breve o centro econômico do mundo. Com o grupo BRICS, o Brasil já tem a sorte de ser parte de um fórum institucionalizado que facilita esse processo.

É pouco provável que o Brasil se afastará do grupo de maneira abrupta. O chanceler sabe da importância do BRICS. No entanto, considerando que há algumas dúvidas em Pequim e Déli em relação ao compromisso do novo Governo com o grupo, José Serra faria bem em enviar um sinal inequívoco de que o Brasil está disposto a não só manter, mas a fortalecer a cooperação intra-BRICS.


Oliver Stuenkel é Professor Adjunto de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo

Fonte: El País


Cristovam Buarque: Esqueceram do Brasil

Nesta semana, ouvi um professor chileno dizer: “Tenho pena do Brasil”. Esta frase me incomodou mais do que as matérias sobre as tragédias brasileiras destes tempos sombrios. Ainda mais quando imaginei a pergunta que ele não fez: “Como vocês deixaram o Brasil chegar a esta situação?” Como senador, senti constrangimento por esta pergunta não feita, e pela resposta que daria: “Há décadas, os políticos não colocam o Brasil como o personagem central de suas decisões”. O Brasil tem sido preocupação de sociólogos, literatos, jornalistas, economistas, mas não dos políticos. A Lava-Jato está mostrando que alguns usam a política para o enriquecimento pessoal; outros, para financiar campanhas e continuarem com seus mandatos; os melhores fazem política servindo a desejos imediatos de grupos específicos dos eleitores que os apoiam; as leis são feitas para beneficiar trabalhadores, empresários, aposentados, servidores públicos, consumidores, mas raramente ao Brasil como um todo, no longo prazo.

Há parlamentares dos professores, não da educação; dos aposentados, não da aposentadoria; dos universitários, não da ciência e tecnologia; da assistência social, não da emancipação do povo; do apoio à indústria, não ao desenvolvimento industrial; dos médicos, não da saúde. Ao longo da história, querendo atender cada grupo no imediato, sem considerar o Brasil no longo prazo, relegamos a opção por prioridades: o resultado tem sido o aumento nos gastos públicos acima da disponibilidade de recursos e, em consequência, o endividamento e a inflação. A ausência do Brasil nas decisões políticas provoca um esquecimento da perspectiva de nação ao longo das décadas e séculos no futuro. Para beneficiar cada grupo, sacrificamos todos e o país. O debate sobre o impeachment é um exemplo de que “esqueceram o Brasil”. Com opção já tomada, defende- se a cassação ou a continuidade do mandato da presidente, sem aprofundar o debate sobre o que será melhor para o Brasil.

A disputa se dá entre os que desejam a continuidade do governo do PT, depois de 13 anos, mesmo sabendo dos riscos de a volta da irresponsabilidade fiscal desestruturar ainda mais as finanças públicas e de o corporativismo vir a desarticular ainda mais o tecido social e o futuro do Brasil; os outros não querem a continuidade do governo de Dilma, sem refletir sobre as consequências da interrupção do mandato do segundo presidente entre os quatro eleitos. Não há consideração sobre qual destas duas alternativas será capaz de consolidar nossa democracia, assegurar estabilidade fiscal e monetária, induzir o país na direção de uma economia produtiva, uma sociedade justa, um setor cientifico e tecnológico sólido, cidades eficientes, educação de qualidade igual para todos; não há consideração sobre qual será capaz de conduzir as reformas de que o Brasil necessita. Esqueceram do Brasil, esta é a causa de o Brasil dar pena em quem observa sua tragédia atual. (O Globo – 25/06/2016)


Cristovam Buarque é senador (PPS-DF)


Brasil: Vanguarda Ambiental e Agrícola

Foi-se o tempo em que o Brasil era grassado como o país do futebol. Talvez menos pelos deméritos recentes de nossa seleção canarinho e muito mais pelo amadurecimento de outras vocações nacionais, hoje podemos nos orgulhar de ostentarmos uma condição ímpar: somos uma grande potência agrícola e somos, ao mesmo tempo, a grande potência ambiental do planeta. Apesar do aparente paradoxo, o Brasil está conseguindo avançar simultaneamente nestas duas direções: produzir cada vez mais alimentos para o mundo e preservar recursos naturais para as futuras gerações. Ao contrário do que muitos apregoam, não são caminhos opostos, pelo contrário, são simbioticamente complementares.

O Brasil guarda 12% da água doce do mundo, tem 500 milhões de hectares de florestas, 350 milhões de hectares de áreas marinhas e 2 milhões de espécies vivas distribuídas em 6 diferentes biomas. Ao mesmo tempo, produz 200 milhões de toneladas de grãos por ano, é o maior produtor de soja, café, açúcar, laranja e o segundo maior exportador mundial de produtos agropecuários.

O Brasil optou por reservar mais de 60% de seu território para preservação ambiental. Não estamos falando de áreas inóspitas ou inabitáveis. São terras que poderiam ser convertidas e destinadas ao aproveitamento econômico. No entanto, de forma muito sábia e corajosa, o povo brasileiro decidiu destinar à exclusiva proteção de nossa riquíssima biodiversidade quase dois terços das terras brasileiras. Enquanto isso, a agricultura, que ocupa apenas 8% do território nacional, graças à sua extraordinária pujança e desenvolvimento tecnológico, é a grande responsável por garantir a segurança alimentar e energética do mundo, agora e principalmente no futuro.

Esta nossa realidade, sem paralelo no cenário planetário, descortina para nós um tempo vindouro especialmente promissor. Temos em nosso país uma incomparável vantagem comparativa e estratégica: conseguimos preservar nossa biodiversidade ao mesmo tempo que nos tornamos os grandes fornecedores mundiais de comida, de energia renovável e, sobretudo, de imprevisíveis e reveladoras descobertas científicas sobre nosso preciosíssimo patrimônio genético, já que 90% dele ainda é desconhecido.

Nesta semana do meio ambiente, vale a pena fazer um resumo de como conseguimos chegar nesta privilegiada situação. Especialmente em São Paulo, seguindo diretriz do Governador Alckmin, existe um esforço permanente para fazer com que nossa agricultura fique na vanguarda da sustentabilidade. Este esforço é de nossas universidades, entidades da sociedade civil, institutos de pesquisa e de milhares de profissionais e agricultores que se dedicam a experimentar técnicas de sustentabilidade.

Comemoramos recentemente inúmeras novidades na área do controle biológico de pragas e doenças por meio da utilização de ácaros predadores, fungos, parasitas, nematoides e insetos, conforme pesquisas desenvolvidas por nosso Instituto Biológico. Estas novas tecnologias são capazes de substituir a utilização de agroquímicos, não deixam resíduos, não afetam a saúde de ninguém e não causam impacto ambiental relevante. Quanto à preservação dos solos e das águas, editamos novas normas para melhor a aplicação de técnicas de manejo e plantio, especialmente para a cana-de-açúcar. Por meio dos exitosos programas “Integra” e “Nascentes”, financiamos a recuperação de áreas degradadas e incentivamos fortemente a recuperação de matas ciliares. O programa “Melhor Caminho” recupera estradas vicinais e, sobretudo, ensina técnicas de conservação que evitam erosões e assoreamentos. O programa “Aplique Bem” qualifica profissionais para o uso racional de agroquímicos e nossas equipes de extensão rural da CATI difundem as técnicas de plantio direto, tratamento de dejetos animais, biodigestão ou compostagem de materiais orgânicos e carcaças, nitrogenação biológica de solos, integração lavoura-pecuária-floresta, recuperação de pastagens degradadas, Sistemas Agro-Florestais e outras voltadas à agricultura ecológica e orgânica. Nosso Instituto de Zootecnia tem desenvolvido técnicas extraordinárias para dar mais precocidade aos rebanhos (como é o caso do Boi 777, cujo ciclo completo até o abate é de apenas 21 meses), fortificação de leite, melhoria da nutrição animal, etc. O Instituto Agronômico, que completa 129 anos neste mês, não cansa de lançar novos cultivares, mais resistentes à estresse hídrico, às pragas e que melhoram a produtividade de nossa agricultura. O Instituto de Tecnologia de Alimentos desenvolve técnicas para o melhor aproveitamento dos alimentos e o Instituto de Pesca tem conseguido resultados importantes no repovoamento de nossa fauna aquática. Estamos na reta final da elaboração do Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono) paulista e fizemos recentemente um aprofundamento da compreensão e planejamento para o desafio de Segurança Alimentar X Mudanças Climáticas. Tudo isso representa uma agricultura harmônica com o meio ambiente e de baixa emissão de Gazes de Efeito Estufa. É a agricultura de baixo carbono que garante produtividade no campo ao mesmo tempo que cumpre nossa missão de combater o agravamento das mudanças climáticas.

Além de todas estas tarefas que exigem compromisso com a preservação ambiental, sabemos que a melhoria da renda de quem mora no campo é um grande aliado da conservação. Por isso, ainda para comemorar a semana do meio ambiente, no último dia 31 assinamos 134 projetos para o desenvolvimento rural de associações ou cooperativas de pequenos produtores agrícolas, com aporte financeiro de R$ 58 milhões a fundo perdido por meio do programa “Microbacias II”. Fomentar o progresso sustentável dos pequenos agricultores é diretriz do Governo de São Paulo que seguimos à risca com efeitos extremamente benéficos do ponto de vista ambiental.

Finalmente, com orgulho, podemos afirmar que São Paulo foi o primeiro aluno da classe no cumprimento da hercúlea tarefa de inscrever posses e propriedades rurais no Cadastro Ambiental Rural – CAR. Se pegarmos como base os dados do IBGE, que servem de parâmetro para medir performance do cadastramento nos estados brasileiros, São Paulo atingiu 100% da área cadastrável. Isto é um feito notável, só atingido graças ao empenho de milhares de profissionais, do setor público e privado, que demostraram ser apuradíssima a consciência ambiental dos agricultores paulistas. Nosso próximo passo será dar início ao Programa de Regularização Ambiental – PRA das propriedades rurais, confirmando que São Paulo sabe produzir ao mesmo tempo em que conserva.

Muito mais do que petróleo, o mundo precisará nos próximos 30 anos de comida, água potável e energia limpa. Precisará de medicamentos, fibras, compostos e descobertas científicas. São Paulo e o Brasil estão prontos para se inserir neste futuro promissor como grandes protagonistas. Vamos ao futuro!


Arnaldo Jardim – Deputado federal licenciado (PPS-SP) e Secretário de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo

Rubens Rizek – Foi Secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo e atual Secretário Adjunto de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo


Alberto Aggio: Dilma y el discurso de la victimización golpista de la izquierda

En abril de 1964, después del Golpe de Estado, el presidente João Goulart se exilió en Uruguay y su cuerpo solo retornó a Brasil para ser enterrado, en São Borja, en 1976. Después de su exhumación, fue sepultado, pasados 37 años desde la primera inhumación, con honras de Jefe de Estado. En septiembre de 1973, Salvador Allende fue retirado muerto del Palacio de La Moneda, después de un intenso bombardeo. Una circunstancia dramática llevó a Allende al martirio en nombre de una causa que defendía.

Era una época de golpes de Estado en América Latina, con su cortejo de violencia y terror. El de 1964, en Brasil, y el de 1973, en Chile, son considerados paradigmáticos. No se agotaron en un cuartelazo y, aunque diferentes entre sí, solaparon la democracia entonces existente para, en seguida, instalar regímenes autoritarios de larga duración.

Lo que ocurre en Brasil con el proceso de revocación todavía en curso de la Presidenta Dilma Rousseff no encuentra parámetro comparativo ni con lo que ocurrió con Goulart y menos todavía con lo que pasó con Allende.

Con la aprobación del Senado del procedimiento constitucional de investigación y juzgamiento de crímenes de responsabilidad de que es acusada, la Presidenta fue notificada y dejó el Palacio de Planalto, con toda seguridad. Acto seguido, discurseó para una platea de adherentes que no fue molestada de ninguna manera. Después se dirigió al Palacio de Alvorada, su residencia oficial, y tiene garantizadas sus prorrogativas de Presidenta de la República.

Tales circunstancias, además de evidenciar una distancia de años luz en relación con el destino impuesto a los dos ex presidentes mencionados, muestran que la Presidenta separada de su cargo continúa actuando políticamente sin constreñimientos y con mucha desenvoltura. El parámetro comparativo entre las situaciones es evidente por sí mismo y contribuye para que el proceso de destitución no deba ser calificado como Golpe de Estado.

Los acontecimientos que marcaron el final de los gobiernos de Goulart y Allende son típicamente los de un Golpe de Estado, en tanto los eventos a los que asistimos en el proceso contra Dilma Roussef no son nada más que una serie de episodios y decisiones ajustadas al funcionamiento de la democracia y de sus instituciones, con sus ritos y su ritmo, todos sancionados por el Supremo Tribunal Federal (STF).

En esas circunstancias, si se consumara la revocación de Dilma, aunque parezca obvio decirlo, no se instalará ningún nuevo régimen político, como ocurrió en los dos casos paradigmáticos mencionados. La democracia sigue su curso, sin tener arañada su legitimidad.

Mientras tanto, la presidente separada, el PT y sus aliados insisten en calificar como un golpe el proceso político, inflamando, con insistencia, las redes sociales y los medios de comunicación en general. Además de contrafactual y de la clara intención victimista, lo que esos actores objetivan es la difusión de una nueva epistemología del golpe, diversa de los casos paradigmáticos y de cualquier otro. Como hoy vivimos otro tiempo histórico, distinto de la guerra fría, cuya centralidad reposaba en la lucha entre capitalismo y comunismo, y como las democracias en América Latina, así y todo con sus problemas, cuentan con una historia razonable de implantación, obteniendo con eso una adhesión generalizada, incluso entre los movimientos y partidos de izquierda, los adherentes de Dilma y del PT perciben que el argumento del golpe, vocalizado en los viejos términos, no se sustenta por la simple evidencia de los hechos, o, más precisamente, por la ausencia de estos.

Aislado y fragilizado, el petismo mantiene el discurso del golpe, mientras busca encontrar una justificativa teórica plausible para sustentarlo, visando a dar a él un carácter propio al nuevo tiempo, De acuerdo con el petismo, puesto en movimiento, ese golpe hiere la democracia, pero no la elimina. Según esa nueva teorización, las condiciones jurídico-políticas de las democracias hoy existentes permitirían que las clases dominantes, apoyadas en los medios de comunicación monopolistas y en las clases medias reaccionarias, urdiesen un golpe de Estado ya no más con tanques y soldados, sino que por medio de acciones comunicacionales, jurídicas y parlamentarias. Todos esos elementos hacen parte de un mismo dispositivo: un golpe de nuevo tipo”.

De este modo, de acuerdo con esa teorización, no estaríamos delante de un golpe violento de tipo convencional, y tampoco de un golpe parlamentario. El golpe de nuevo tipo tiene su fundamento en un sofisma que parte del presupuesto de que ninguna Constitución posee mecanismos de autodefensa contra quien actúe contra ella misma. Pero esta es una formulación equivocada: la supremacía formal que tiene la Constitución además de sus cláusulas pétreas, componen su auto defensa,además del papel activo de los ciudadanos, y no necesitan de una normativa específica. El presupuesto no tiene base jurídica, pero es extremadamente peligroso para el ordenamiento democrático.

El PT, en su evaluación de la coyuntura, después de la separación de Dilma, lamentó no haber seguido el camino venezolano, que impone desde el inicio una Constitución con los debidos “mecanismos de defensa”, y que han permitido al actual presidente Maduro mantenerse en el poder y bloquear cualquier salida a la dramática crisis que vive Venezuela. Es sumamente revelador que el PT lamente haber confiado en el orden democrático fundado en la Carta de 1988, una Constitución “indefensaque permitió que el partido fuera “golpeadopor aquellos que condujeron la revocación.

La tesis de un golpe de nuevo tipo advierte a la izquierda que, incluso adhiriendo a la democracia, no estará inmune al golpe, toda vez que la democracia carece de las condiciones para protegerse de los golpistas. La tesis es reiterativa y tiene sus fundamentos en los pergaminos que dictan que el objetivo de la izquierda sigue siendo instalar un régimen (también) de “nuevo tipo, que sobrepase la democracia vigente. Pero respecto a ese régimen, como recordamos, los presagiosfueron siempre atemorizantes.


Fonte: elmostrador.cl


Sete passos essenciais para o Brasil entrar na economia de baixo carbono

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura elaborou sete objetivos para promover a economia de baixo carbono e dar início à implementação dos compromissos brasileiros assumidos no Acordo de Paris contra o avanço das mudanças climáticas. São ações de advocacy que os grupos de trabalho do movimento defenderão em curto prazo.

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura identificou objetivos a serem cumpridos ainda em 2016 para iniciar a implementação da economia de baixa emissão de carbono, uma nova ordem global, selada com a assinatura do Acordo de Paris. O propósito é diminuir a emissão de gases do efeito estufa (GEE) e, assim, concretizar as metas do clima.

Mais de 70 especialistas, distribuídos em sete grupos de trabalho (GTs) da Coalizão Brasil, elaboraram os sete objetivos para 2016, bem como planos de ação de curto e médio prazos. Tais objetivos giram em torno dos temas-chave do movimento: agricultura de baixo carbono, bioenergia, Código Florestal, economia da floresta tropical, restauração/reflorestamento, valoração e serviços ecossistêmicos, além de cooperação internacional.

Agricultura de baixo carbono – O objetivo do GT dedicado a esse tema é fomentar a disseminação de tecnologias de alta rentabilidade e baixa emissão de carbono em escala no país. "Já existe um arsenal tecnológico que permite produzir com baixa emissão de GEE, mas é preciso divulgar que são práticas lucrativas, eficientes e rentáveis", ressalta Luiz Cornacchioni, diretor executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). "Elas também devem ser mais disseminadas e acessíveis, de modo que o produtor se sinta incentivado e seguro para adotá-las", completa Marina Piatto, coordenadora de clima e agropecuária do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora). Para cumprir o objetivo, o GT irá mapear as iniciativas já existentes, que promovem ou podem vir a promover a disseminação de tecnologias de baixo carbono, identificar estudos que mensurem resultados, produzir e divulgar a estratégia desses programas.

Bioenergia – Pelo Acordo de Paris, o Brasil se comprometeu, até 2030, a ter a participação de 18% de biocombustíveis na matriz energética e alcançar 23% de participação de energias renováveis (além da hídrica) na bioeletricidade até 2030. O GT dedicado à bioenergia definiu como objetivos: a articulação de uma política pública para alcançar esses compromissos; a elaboração de um plano de ação para cooperação internacional em bioenergia; e o desenvolvimento de uma estratégia para a padronização global de biocombustíveis. "É preciso que haja diretrizes públicas de longo prazo, bem como diferenciação tributária para valorizar o biocombusível, além de uma padronização global", afirma Elizabeth Farina, diretora presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica). "Já na área de bioeletricidade, faz-se necessário instituir um programa de contratação de leilões diferenciados por fonte e/ou regiões e sanar os obstáculos de conexão da bioeletricidade à rede distribuidora, entre outros fatores que podem alavancar a energia renovável", completa Elizabeth de Carvalhaes, presidente executiva da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá).

Código Florestal – O GT assumiu como objetivo contribuir para a completa implementação do Código Florestal, articulando esforços dos diversos atores envolvidos em uma agenda de consenso. A lei no 12.651/2012, conhecida como Código Florestal, foi usada como base para muitos dos compromissos brasileiros para o Acordo de Paris (a chamada INDC), a exemplo da restauração e reflorestamento de 12 milhões de hectares, o que criou uma agenda ambiciosa, envolvendo conservação de recursos naturais e oportunidade de geração de empregos e divisas. "É preciso concluir o Cadastro Ambiental Rural (CAR), regulamentar as Cotas de Reserva Ambiental (CRA) e agilizar a regulamentação e implantação dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs) nos estados", afirma Gustavo Junqueira, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB). O GT também irá promover a regularização dos mecanismos econômicos contidos no Código Florestal e estimular a compensação de Reserva Legal (RL), um dos principais instrumentos para evitar o desmatamento e promover conectividade de áreas protegidas com a regularidade ambiental da produção agrícola.

Economia da Floresta Tropical – O GT desse tema definiu atuar na promoção da transparência no licenciamento e nas transações do setor florestal de madeira nativa, a fim de combater o desmatamento ilegal. O acesso aos dados de licenciamento, responsabilidade técnica, produção, beneficiamento, comercialização e transporte de madeira nativa permitirá, por exemplo, reduzir fraudes na emissão de licenças de exploração, aumentar a capacidade de monitoramento da atividade e expandir a rastreabilidade da madeira. "A transparência contribuirá, ainda, para o aumento da competitividade dos produtos de madeira tropical no mercado internacional e para melhorar a reputação do setor no exterior", afirma Maurício Voivodic, gerente de projetos do Imaflora. “O plano de ação inclui articulação política de alto nível, em âmbito federal e estadual, para oferta de dados relacionados à autorização de exploração florestal, além do suporte da Coalizão Brasil a iniciativas de transparência no manejo florestal”, observa Roberto Waack, presidente do conselho da Amata.

Restauração/Reflorestamento – O objetivo é impulsionar programas de restauração e reflorestamento em larga escala, por meio da criação de uma plataforma para monitorar fatores críticos, da formatação de um programa de desenvolvimento tecnológico de silvicultura tropical e do incentivo à qualificação de agentes da cadeia da restauração. "O Brasil tem condições ideais para desenvolver um grande programa de restauração e reflorestamento, começando pela área disponível: 170 milhões de hectares de pastagens degradadas", afirma Rachel Biderman, diretora do WRI (World Resources Institute) Brasil. "Também são bem-vindos e necessários o estabelecimento de políticas públicas que apoiem iniciativas de restauração e de instrumentos para viabilizar investimentos no setor e o devido acompanhamento dos resultados", conclui Rachel.

Valoração e Serviços Ecossistêmicos – São metas desse GT: influenciar a política nacional para pagamentos por serviços ambientais; apresentar elementos-chave, como forma de contribuição, para a Estratégia Nacional de REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal); avaliar as melhores alternativas para precificação do carbono; e viabilizar a contabilização das remoções por reflorestamento e restauração nas plataformas de relatos corporativos. "As ações para aprimorar e valorizar os mecanismos econômicos de carbono e outros serviços ecossistêmicos contribuem para cumprir as metas do Acordo de Paris, além de trazerem impactos positivos para a sociedade, conservação de recursos hídricos e biodiversidade", afirma André Guimarães, diretor executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).

Cooperação Internacional – Estabelecer parcerias internacionais consistentes para ações estratégicas envolvendo conhecimento, tecnologia e advocacy é o objetivo desse GT. "As mudanças climáticas são um desafio global, portanto, é fundamental costurar ações coordenadas internacionalmente. No caso da Coalizão, nosso trabalho está em identificar agendas comuns no que se refere ao uso da terra e à economia de baixo carbono, para compartilhar soluções de governança e de tecnologias entre o Brasil e outros países", afirma Marcelo Furtado, diretor executivo do Instituto Arapyaú. Em seu plano de ação, o grupo irá definir prioridades e contribuições com os demais GTs da Coalizão Brasil, incentivar os membros do movimento a firmar programas internacionais e mapear iniciativas já existentes no país e no exterior.

Os objetivos da Coalizão Brasil foram lançados no seminário Oportunidades Econômicas no Contexto das Mudanças Climáticas, realização conjunta com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e o Museu do Amanhã, entre os dias 1º e 2 de junho, na cidade do Rio de Janeiro.

Sobre a Coalizão Brasil

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura é um movimento multissetorial que se formou como o objetivo de propor ações e influenciar políticas públicas que levem ao desenvolvimento de uma economia de baixo carbono, com a criação de empregos de qualidade, o estímulo à inovação, à competitividade global do Brasil e geração e distribuição de riqueza a toda a sociedade. Mais de 120 empresas, associações empresariais, centros de pesquisa e organizações da sociedade civil já aderiram à Coalizão Brasil – coalizaobr.com.br.


Fonte: cidadessustentaveis.org.br


Brasil terá que escolher entre combater pobreza ou manter privilégios fiscais, alerta Banco Mundial

Gastos do governo com assistência social aos mais pobres são menores que um terço das despesas com previdência para brasileiros em melhor situação. Benefícios previdenciários ultrapassam também gastos primários com saúde e educação.

Banco Mundial destaca que a atual crise revelou necessidade de enfrentar problemas estruturais da economia, como a baixa produtividade.

Em relatório publicado na segunda-feira (16), o Banco Mundial alerta que a desvalorização das commodities no mercado mundial desde 2011 e a resposta pouco eficiente do governo brasileiro para contornar a queda dos lucros das exportações estão entre as causas da recessão enfrentada pelo Brasil desde 2015.

A crise, porém, não precisa significar o abandono das políticas de redução da pobreza que retiraram 24,6 milhões de brasileiros da miséria de 2001 a 2013, mesmo porque os programas de transferência de renda custam relativamente pouco e são comprovadamente eficazes, segundo o Diagnóstico Sistemático de País para o Brasil — documento elaborado pelo organismo internacional.

Em 2014, iniciativas de assistência social direta aos pobres representaram 7,7% dos gastos primários do governo brasileiro. Consideradas as despesas com saúde básica, pré-escola e ensino fundamental, o valor sobe para 16,4%.

O percentual, no entanto, continua bem abaixo do montante de benefícios previdenciários concedidos aos não pobres (28,9%) — recursos que movimentam um sistema de gastos rígidos e considerado “explosivo” pelo Banco Mundial. A proporção do orçamento público dedicada à previdência ultrapassa as fatias dedicadas a educação, saúde e ensino superior somadas (28,6%).

Para o organismo financeiro, o momento atual exige reformas capazes de renovar o ciclo de combate à pobreza e solucionar problemas estruturais da economia brasileira, como a baixa produtividade e o gargalo da infraestrutura — mascarados pela alta global das matérias-primas na última década.

Alta das commodities impulsionou renda, emprego e assistência

De acordo com o Banco Mundial, o período entre 2003 e 2013 foi marcado por uma valorização mundial dos preços de commodities como a soja e o minério de ferro — o que permitiu ao Brasil investir em assistência social, aumentar o nível de emprego e os salários.

As conquistas do país na luta contra a miséria representam quase 50% da redução da pobreza em toda a região da América Latina e Caribe.

Dados do Banco Mundial indicam que, de 2004 a 2013, a geração de empregos e a redução da informalidade foram os principais responsáveis pelo declínio da pobreza — condição de quem vive com 140 reais por mês.

No entanto, quando considerada a queda de 62% da pobreza extrema — 70 reais mensais per capita — para o mesmo período, o relatório destaca que esta teria sido provocada por rendimentos não salariais, principalmente por programas de transferência de renda como o Bolsa Família.

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Apesar dos avanços, entre 2003 e 2014, enquanto os salários mínimo e real cresceram em média 68% e 38%, respectivamente, a produtividade por trabalhador aumentou apenas 21%.

Para o Banco Mundial, a baixa produtividade do Brasil — ainda não superada — se configura como um dos principais entraves ao crescimento econômico no período pós-2013, quando as matérias-primas passaram a registrar forte desvalorização no mercado mundial.

Para tentar contornar a depreciação, o governo apostou em subsídios a alguns setores da economia, incentivos fiscais, controle de preços e crédito adicional oferecido pelos bancos estatais.

Mas a estratégia, além de pouco eficiente para estimular o crescimento, contribuiu para gerar um clima de incerteza que desestimulou investimentos e aumentou o déficit nas contas públicas. Como resultado desse processo e de uma economia externa em baixa, a queda na atividade econômica brasileira fez o PIB do país contrair 3,8% em 2015.

‘Ajuste fiscal e progresso social não são contraditórios’

O Banco Mundial aponta que, somente em 2016, o Brasil constatou a necessidade de um doloroso ajuste macroeconômico e fiscal que, no entanto, ainda não chegou a resolver os conflitos distributivos entre gastos com combate à pobreza e despesas previdenciárias com os não pobres.

O organismo alerta para transferências a empresas — inclusive renúncias e transferências fiscais implícitas por intermédio dos bancos estaduais e por meio de isenções fiscais pouco transparentes e eficientes — que ultrapassaram 5% do Produto Interno Bruto (PIB) ou quase 14% dos gastos primários.

Caso esses benefícios fossem reduzidos, mais recursos seriam liberados para melhorar os serviços públicos e as políticas voltadas à população desfavorecida. A gestão mais eficiente de recursos públicos e investimentos em saúde, educação e moradia poderiam avançar o combate à pobreza.

“Brasil enfrenta o dilema de solucionar as injustiças nos gastos públicos, reduzindo as transferências para aqueles em melhor situação, ou contemplar a necessidade de desativar programas sociais e reverter algumas das conquistas da década de ouro”, aponta relatório.

Em março, um estudo das Nações Unidas já havia chamado atenção para injustiças fiscais no Brasil que beneficiavam com isenção os chamados super-ricos.

Para o Banco Mundial, a crise trouxe à tona também outros desafios já existentes, como os baixos produtividade e dinamismo associados ao “estado de abandono da infraestrutura física do país e à limitação da concorrência resultante de regulamentações domésticas”.

De 2000 a 2013, apenas a agricultura apresentou aumento expressivo na sua produtividade (105,6%), ao passo que a indústria registrou queda (-5,5%) e serviços verificaram uma taxa quase constante. Curiosamente, o setor industrial registrou o maior aumento de vagas de trabalho — o que sugere que a maior parte dos postos não têm um rendimento tão alto quanto poderiam.

O organismo internacional destaca ainda os fracos incentivos à inovação, inclusive à adaptação de tecnologias, devido a uma série de intervenções governamentais ineficientes.

A superação dessas obstáculos exigirá o aprimoramento de formas de gestão e a capacitação da mão de obra que poderia utilizar novas tecnologias nas cadeias produtivas, tornando-as mais dinâmicas e competitivas.

Mesmo com o aumento dos investimentos públicos em Pesquisa & Desenvolvimento, iniciativas ainda não se traduziram em transformações significativas da produção do Brasil, ainda uma país de tecnologia média.


Fonte: nacoesunidas.org


Pobreza permanece concentrada no Norte e no Nordeste do Brasil, diz estudo de centro da ONU

Entre 2004 e 2013, os índices de pobreza no país caíram de 20% para 9% da população e de 7% para 4% no caso da pobreza extrema. No entanto, os principais aspectos ou perfis da pobreza continuam os mesmos: ela está mais presente no meio rural e nas regiões Norte e Nordeste do Brasil.

No estudo, os autores indicam que o investimento na agricultura familiar pode potencialmente contribuir para a redução da extrema pobreza nessas regiões.

Entre 2004 e 2013, os índices de pobreza caíram de 20% para 9% da população e de 7% para 4% no caso da pobreza extrema. No entanto, os principais aspectos ou perfis da pobreza continuam os mesmos: ela está mais presente no meio rural e nas regiões Norte e Nordeste do Brasil.

Essa é a conclusão de estudo divulgado em abril pelo Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG), vinculado ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

“A redução da pobreza não acompanhou as alterações em seus principais aspectos ou perfis”, disseram os especialistas no estudo. “Em termos regionais, pouco mudou, com as regiões Norte e Nordeste apresentando as maiores taxas de prevalência da pobreza, bem como as áreas rurais em todas as regiões.”

Critérios adotados

O estudo considerou como extremamente pobres pessoas que ganham 70 reais por mês e pobres aquelas que vivem com 140 reais mensais, de acordo com critérios adotados pelo governo federal.

Quanto ao meio rural, o estudo considerou como domicílios agrícolas aqueles onde há pelo menos um membro empregado no setor agrícola e 67% ou mais da renda do trabalho vindo de atividades agrícolas.

Já os domicílios pluriativos são aqueles em que pelo menos um membro está empregado no setor agrícola, mas menos de 67% da renda do trabalho vem da agricultura.

O estudo considerou ainda domicílios rurais não agrícolas como aqueles que se localizam em áreas oficialmente rurais, mas sem qualquer membro do domicílio trabalhando na agricultura. Já os domicílios urbanos não agrícolas estão localizados em áreas oficialmente urbanas, com nenhum membro domiciliar empregado na agricultura.

Conclusões do relatório

O estudo concluiu que no período analisado a pobreza caiu mais nos domicílios agrícolas, assim como a extrema pobreza. Por outro lado, a pobreza e a extrema pobreza nos domicílios pluriativos permaneceu estável.

“Quase a totalidade dos residentes em domicílios agrícolas e pluriativos extremamente pobres do Nordeste têm terra insuficiente, trabalham informalmente e residem em domicílios com idosos, mas sem qualquer aposentadoria”, disseram os pesquisadores.

Em 2013, 37% dos domicílios pluriativos recebiam recursos do Programa Bolsa Família, enquanto nos domicílios agrícolas esse percentual era de 22%.

“Benefícios assistenciais como Bolsa Família ajudam, contudo, não são suficientes para retirá-los da extrema pobreza. Deve haver políticas sociais voltadas para os pequenos agricultores, que considerem as fragilidades dessas famílias, que buscam a sua sobrevivência na agricultura familiar”, disseram.

“A pluriatividade nordestina parece surgir como única alternativa de sobrevivência das famílias em situação de extrema pobreza.”

No Norte, a pobreza caiu menos que no Nordeste e no Brasil como um todo. Segundo o levantamento, a persistência da pobreza extrema no Norte, particularmente entre os domicílios pluriativos e aqueles não agrícolas, é especialmente preocupante. Já as taxas de pobreza são praticamente as mesmas em 2004 e 2013.

“Embora o Norte seja menos pobre do que o Nordeste, o progresso tem sido mais lento lá em comparação às demais regiões do país”, disse o estudo.

Acesso a consumo e saneamento básico

Enquanto entre 2004 e 2013 o percentual de domicílios agrícolas do Norte com geladeiras aumentou de 42% para 78%, o percentual com esgotamento sanitário aumentou de 20% para 26%.

Já no Nordeste, o acesso das famílias agrícolas ao esgotamento sanitário aumentou de 24% para 36% no período, deixando a região dez pontos percentuais à frente da região Norte, que é relativamente mais rica.

“O Nordeste obteve melhores resultados. Nessa região, há mais acesso a infraestrutura pública que no Norte, provavelmente em razão do fato de que o Nordeste não tem que superar as longas distâncias que os governos do Norte precisam superar”, disseram os pesquisadores.

Com relação à posse de geladeira, 89% dos domicílios no Nordeste têm ao menos uma geladeira. No Norte, esse percentual é de 78% e, no Brasil, chega a 92%.

Análise por municípios

O estudo indicou — a partir da análise dos mapas de pobreza e extrema pobreza em âmbito municipal — que o problema da pobreza rural no Brasil é, em grande medida, um problema dos domicílios agrícolas no Norte e Nordeste.

Poucos municípios nas outras três regiões do Brasil apresentam taxas de pobreza superiores a 30% e, em muitos essas taxas são inferiores a 15%. No Norte e Nordeste, no entanto, muitos municípios apresentam taxas de pobreza superiores a 60% e alguns ainda têm taxas tão altas quanto 90%.

“As diferenças são muito acentuadas entre os domicílios agrícolas. A Amazônia ocidental e o estado do Maranhão são áreas que apresentam níveis muito elevados de pobreza agrícola”, afirmou o estudo.

Acesse o documento clicando aqui.


Fonte: nacoesunidas.org


Brasil: Violência, pobreza e criminalização ‘ainda têm cor’, diz relatora da ONU sobre minorias

Em relatório publicado nesta semana, a especialista independente da ONU sobre minorias, Rita Izsák, alertou: cerca de 23 mil jovens negros morrem por ano, muitos dos quais são vítimas de violência pelo Estado. Cenário evidencia ‘dimensão racial da violência’, que movimentos sociais descrevem como ‘genocídio da juventude negra’.

Para a especialista, polícia militar deveria ser ‘abolida’, bem como a categoria do ‘auto de resistência’, considerada um ‘escudo de impunidade’. A relatora destacou que, no Brasil, os negros respondem por 75% da população carcerária e por 70,8% dos 16,2 milhões de brasileiros vivendo na extrema pobreza.

No Brasil, a violência, a criminalização e a pobreza “continuam a ter uma cor”, afetando de forma desproporcional a população negra do país. Esta foi a constatação da relatora especial das Nações Unidas sobre questões de minorias, Rita Izsák, que apresentou nesta terça-feira (15) suasavaliações sobre a conjuntura brasileira ao Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Mesmo após 20 anos de políticas públicas e ações específicas voltadas para os afrodescendentes, o Brasil ainda “fracassa” em combater a discriminação, a exclusão e a miséria historicamente enraizadas – que acometem, particularmente, os moradores de favelas, periferias e em comunidades quilombolas.

Segundo a especialista, o “mito da democracia racial” permeou por muito tempo o imaginário brasileiro, colocando obstáculos à abordagem explícita de questões como racismo e preconceito e levando a suposições de que a situação marginalizada dos negros seria causada apenas por fatores de classe, e não por aspectos raciais também.

Os resultados mostrados pela especialista foram fruto de uma visita oficial ao Brasil no ano passado. Durante sua passagem pelo país, a relatora visitou a comunidade Santa Marta no Rio de Janeiro, a região da periferia de São Paulo conhecida como Brasilândia e quilombos e comunidades praticantes de religiões de origem africana tanto no estado de São Paulo como na Bahia.

Violência tem ‘clara dimensão racial’ no Brasil

Izsák destacou que, dos 56 mil homicídios registrados a cada ano, cerca de 23 mil têm, como vítimas, negros de 15 a 29 anos de idade. “O que é desconcertante é que um número significativo é perpetrado pelo Estado, frequentemente através do aparato da polícia militar”, afirmou a especialista.

Segundo informações coletadas pela relatora, no estado de São Paulo, as mortes de afrodescendentes em decorrência de ações policiais são três vezes mais numerosas do que as registradas para a população branca. No Rio de Janeiro, quase 80% das vítimas de homicídios associados a intervenções da polícia são negros. Desse contingente de afrodescendentes mortos, 75% eram jovens entre 15 e 29 anos.

A relatora ressaltou que um dos elementos integrantes dessa violência é a impunidade de que gozam os oficiais envolvidos nos crimes.

“Policiais são raramente levados à justiça e a ampla maioria das vítimas não obtém qualquer tipo de reparação. Por exemplo, uma recente revisão de 220 investigações de mortes pela polícia, aberta em 2011 na cidade do Rio de Janeiro, descobriu que, após quatro anos, apenas um oficial de polícia havia sido acusado”, explicou a especialista.

Como resultado da alta mortalidade, somada à impunidade “generalizada” e ao medo de retaliação que desestimula testemunhas dos crimes de policiais a se pronunciarem, movimentos sociais descrevem o cenário como “um genocídio da juventude negra”, em alerta à “clara dimensão racial” da violência no Brasil.

De acordo com Izsák, um dos principais mecanismos que abre brechas para os homicídios e a impunidade são os chamados autos de resistência, “um resquício da ditadura militar” responsável por legitimar mortes, justificadas pelo princípio da autodefesa. Além de abolir essa categorização, o Estado deveria implementar outras medidas, como a reestruturação das forças policiais, incluindo o fim da polícia militar.

No Rio de Janeiro, uma resolução da Polícia Civil do estado determinou a suspensão do uso do mecanismo do “auto de resistência”, o que teria gerado impactos positivos para a redução do número de homicídios policiais.

O projeto de lei 4471/2012, ainda pendente para votação no Congresso, também poderia aprimorar a forma como são conduzidas as investigações de crimes envolvendo oficiais, uma vez que estabelece procedimentos para preservar as cenas do crime e assegurar sua averiguação em nível federal.

Durante visita à comunidade Santa Marta, Izsák observou o impacto da presença de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Apesar de contribuir para a redução de certos crimes, a relatora criticou o fato de o organismo ser a única iniciativa do governo na favela.

Oficiais permanecem pesadamente armados e desempenham funções policiais ao mesmo tempo em que administram serviços sociais e programas de educação, sem possuir treinamento adequado para tanto, ressaltou a relatora.

Criminalização, pobreza e vulnerabilidades de gênero afetam população negra de forma desigual

A relatora expressou preocupação quanto ao fato de 75% da população carcerária do Brasil ser composta por negros. Parte desta disparidade estaria associada à abordagem discriminatória da polícia. Pesquisas também indicam que, quando acusados, afrodescendentes são mais propensos a serem mantidos na cadeia e a serem condenados à privação da liberdade do que a receberem penas alternativas.

Para Izsák, a política de “guerra às drogas” do Estado brasileiro é marcada por “ambiguidades”, que permitem a policiais criminalizar indivíduos com determinado perfil étnico e social. Enquanto os negros encontrados portando drogas são acusados com o crime mais sério de tráfico, brancos talvez sejam acusados de posse de drogas ou simplesmente receberão uma advertência.

Desde 2005, um ano antes da aprovação de lei de drogas 11.343/2006, o número de pessoas encarceradas por violações associadas a drogas aumentou 344,8%. Estima-se que, atualmente, 25% dos homens e 63% das mulheres na prisão foram acusados e condenados por infrações vinculadas a drogas.

A relatora especial se disse ainda “alarmada” pela proposta de emenda constitucional que reduziria a idade penal para 16 anos. Caso seja aprovada, a nova lei não apenas irá contra as recomendações do Comitê sobre os Direitos da Criança, como também contribuirá para perpetuar a criminalização da comunidade negra brasileira. A redução da maioridade penal é uma violação à Convenção sobre os Direitos da Criança, tratado internacional assinado e ratificado pelo Brasil.

Esta comunidade é a mesma que responde por 70,8% dos 16,2 milhões de brasileiros vivendo em extrema pobreza e por 80% dos analfabetos do país. Os salários médios dos negros no Brasil chegam a ser 2,4 vezes menores do que os recebidos por cidadãos brancos e de origem asiática. Estudos mostram que 64% dos afrodescendentes não completaram a educação básica.

A situação das mulheres brasileiras negras também preocupou Izsák. Pesquisas revelam que essa parcela do público feminino está mais sujeita a violência: em 2013, mulheres negras foram mortas numa proporção 66,7% maior do que as brancas.

Em comunidades marginalizadas, como favelas e periferias, meninas e mulheres afrodescendentes permanecem particularmente mais suscetíveis a diferentes formas de abuso, incluindo violência sexual e doméstica.

Na Brasilândia, crianças de dez e 11 anos informaram à relatora que elas eram proibidas de sair de casa após chegar da escola por medo de serem estupradas, uma agressão descrita como recorrente na vizinhança.

Religiões de origem africana também foram destaque de relatório

Em sua avaliação, a relatora especial também chamou atenção para o preconceito que praticantes de religiões de origem africana, como o Candomblé e a Umbanda, dizem enfrentar.

Izsák afirmou ter ficado “seriamente perturbada” ao receber relatos crescentes de episódios de assédio, intimidação, discurso de ódio e, mesmo, de atos de violência, voltados contra os fiéis dessas práticas religiosas. Apenas durante sua visita de duas semanas ao Brasil, dois templos de Candomblé foram queimados no Distrito Federal.

Informações do Centro Nelson Mandela, na Bahia, apontam que um terço de todas as queixas recebidas pela instituição diz respeito à intolerância contra religiões africanas. Membros desses cultos são vítimas de discriminação por conta de suas vestimentas e adereços tradicionais, frequentemente proibidos em locais de trabalho.

Segundo Izsák, entre os praticantes de religiões africanas, há a percepção de que a expansão das doutrinas evangélicas teria tido consequências para as liberdades religiosas. Frequentadores de terreiros relataram ter sido assediados por evangélicos, que empreendem esforços de conversão agressivos, como a distribuição e colagem de panfletos em seus locais de culto.

Outras preocupações comuns entre os praticantes que a relatora conheceu envolvem a disseminação de estereótipos negativos sobre as religiões africanas em veículos de mídia controlados por evangélicos e desigualdades na proteção dessas religiões pelas autoridades, em comparação a outras.

Quilombos enfrentam mais riscos e discriminação

Comunidades tradicionais de afrodescendentes, os quilombos enfrentam discriminação e racismo adicionais, enquanto agrupamentos pobres, rurais e de zonas periféricas que nem sempre conseguem fazer valer seus direitos a terra e recursos naturais.

Até o momento, apenas 189 escrituras foram emitidas para grupos quilombolas, oficializando a posse da terra. Estima-se que haja, atualmente, 1.516 processos abertos envolvendo a demarcação dessas comunidades. Segundo informações recebidas pela relatora da ONU, existem mais de 3 mil quilombos no Brasil.

Apesar de reconhecidos constitucionalmente, quilombos permanecem vulneráveis a pressões do Estado e do setor privado, cujas obras e iniciativas têm desrespeitado os limites das comunidades.

É o caso do Quilombo baiano Ilha da Maré, onde projetos de desenvolvimento provocaram a contaminação do solo e da água da região com metais pesados. As consequências ambientais levaram ao aumento do número de casos de câncer na comunidade e causaram muitas mortes entre jovens que foram envenenados pelas substâncias tóxicas. Devido ao fluxo de trabalhadores que chegaram ao local, mulheres quilombolas também ficaram particularmente mais vulneráveis à violência sexual e de gênero.

A “grave” situação do Quilombo dos Macacos, na região metropolitana de Salvador, também foi citada no relatório, sendo descrita por Izsák como motivo de “preocupação ainda maior”. A instalação de uma base da Marinha dividiu as terras da comunidade. Além de terem familiares monitorados, quilombolas informaram à relatora que sofrem abusos e violência perpetrados por militares, incluindo tortura e agressões sexuais envolvendo mulheres do Quilombo.

Governo brasileiro respondeu às avaliações feitas pela relatora

No que diz respeito aos esforços para prevenir e punir qualquer tipo de violência e abuso alegadamente cometidos pela polícia, o Estado brasileiro destacou que, em janeiro desse ano, o Conselho Superior de Polícia, vinculado à Polícia Federal, e o Conselho Nacional de Chefes da Polícia Civil adotaram uma resolução conjunta que aboliu, em todo o território nacional, o uso dos termos “autos de resistência” e “resistência seguida de morte”.

O objetivo da medida é garantir que os homicídios cometidos por agentes de segurança sejam devidamente investigados. A resolução instituiu que tais incidentes passassem a ser registrados como “lesão corporal decorrente de oposição à intervenção policial” ou “homicídio decorrente de oposição à ação policial”. Os casos devem ser encaminhados ao Ministério Público, mesmo que procedimentos internos de inquérito tenham sido iniciados pela polícia.

Quanto aos quilombos, o governo do Brasil “rejeita a noção de que o país prioriza as políticas econômicas e de desenvolvimento em detrimento dos direitos das comunidades tradicionais”. “Tais alegações não refletem, adequadamente, a realidade brasileira”, afirmou o governo brasileiro.

As autoridades ressaltaram que projetos de desenvolvimento precisam de licenças ambientais para ser executados e ter suas atividades monitoradas, quando houver risco de poluição e degradação da natureza.

Sobre o Quilombo dos Macacos, o Estado afirmou que a comunidade reivindica uma área que se tornou propriedade da Marinha em 1954, após uma doação de terra feita pela cidade de Salvador. Até o momento, todas as decisões judiciais envolvendo o local favoreceram a Marinha, que conseguiu provar a legalidade e a legitimidade da sua presença na região.

Desde 2010, tribunais expediram mandados de despejo para a comunidade que, no entendimento do Judiciário, poderia causar degradação ambiental e poluição das águas.

O despejo forçado dos quilombolas foi deliberadamente adiado pelo governo brasileiro a fim de assegurar uma solução pacífica, que inclua a realocação das famílias e garanta sua dignidade e o respeito aos seus direitos humanos. Desde 2012, autoridades ofereceram cinco acordos de reassentamento pacífico.

Acesse o relatório (A/HRC/31/56/Add.1) nos seis idiomas oficiais da ONU clicando aqui ou clicando aqui para acessar diretamente a versão em inglês.

Fonte: Nações Unidas


Crise que Dilma não consegue apontar saída vai deixando o brasileiro mais pobre

Apesar das circunstâncias que atormentam a vida da maioria dos brasileiros em razão da crise que assola o País, as eleições municipais de outubro próximo, como sempre foi no passado, não deixarão de demarcar a sua importância. Se as instituições da República suportarem a carga das crises que se avolumam a cada dia, provocada pelo desgoverno de turno, estaremos todos convocados a eleger ou reeleger os dirigentes das nossas cidades, desde as menores até as grandes metrópoles.

Apesar de tudo, os brasileiros, com a sua costumeira “desesperança esperançosa”, ainda creem no poder da sua participação por meio do voto. Pela via da política, estas eleições têm o poder de definir, mesmo que parcialmente, se o futuro imediato será ou não melhor do que os desencantos, as desilusões e as carências do presente.

O Brasil segue a tendência mundial de se afirmar como parte de um planeta cada vez mais urbano. É cada vez mais evidente que as cidades brasileiras devem ser pensadas de acordo com um tempo de mudanças aceleradas, mas de crise profunda e extensiva. Por isso elas necessitam de uma política que, além de enfrentar seus problemas setoriais com a eficiência requerida – como saúde, educação, segurança, mobilidade urbana, habitação e infraestrutura de saneamento básico -, se estruture a partir de uma orientação consonante com o tempo de grandes transformações que vivemos, especialmente na esfera da comunicação entre pessoas, corporações e instituições públicas e privadas.

Mas há alguns obstáculos que se antepõem a essa estratégia. O primeiro deles, e que faz parte do senso comum do brasileiro, é a visão de que as pessoas vivem nos municípios, e não nos Estados ou na Federação. Trata-se de uma meia-verdade. Os problemas das cidades brasileiras não se restringem apenas ao que ocorre cotidianamente nelas. É preciso entender que os municípios são entes federativos.

O vice-presidente Michel Temer, em artigo recente neste espaço, afirmou acertadamente que a nossa Federação é composta de Estados e municípios. As cidades brasileiras vivem sob o influxo de determinações políticas e financeiras dos três entes federativos (municipal, estadual e federal) que compõem o Estado brasileiro. E, como se sabe, uma das principais repercussões da crise hodierna do Estado brasileiro se manifesta pela crescente concentração de recursos no plano federal. Hoje, as finanças públicas dos municípios estão esgarçadas, provocando um desequilíbrio crescente que ameaça sua capacidade administrativa. É urgente repensar, portanto, um novo federalismo, que estabeleça uma nova divisão dos recursos públicos amealhado dos brasileiros.

As cidades brasileiras engendram historicamente exclusões e desigualdades, bolsões de segregação social e graves problemas ambientais. Essa realidade é conhecida dos especialistas e governantes, mas deve-se registrar que não há monopólio de nenhuma corrente intelectual ou força política a respeito das possíveis soluções para esses graves problemas. Por essa razão, é justo e imprescindível que se faça uma avaliação crítica do chamado “orçamento participativo”, uma política que, além de lidar com um porcentual irrisório de recursos do município, provocou ilusões e muitas distorções. Ela não foi efetivamente uma política democrática de participação e acabou cedendo espaço ao paternalismo, ao clientelismo e ao assistencialismo, impulsionando mais ainda elementos extremamente negativos na prática da política municipal.

A gestão democrática da cidade mostrou-se como uma questão de muito maior complexidade do que pensavam os arautos do “orçamento participativo”. Em artigo recente, a socióloga Maria Alice Rezende de Carvalho nos chama a atenção para o fato de que, no processo de modernização do Brasil das últimas décadas, passou-se da “cidade da ditadura”, com seus desastres habitacionais, de mobilidade e ecológicos, para a “cidade financista”, que elevou o mercado como a referência para o redesenho das necessidades urbanas e sociais básicas. O que nos leva a concluir que, no Brasil, a “cidade da democracia”, uma “polis contemporânea verdadeira”, não se tornou entre nós uma construção efetiva nestes últimos anos.

Recentemente, diversas mobilizações, tais como a Occupy Wall Street, os “indignados” ou as jornadas de junho de 2013 no Brasil, alimentaram a expectativa de que essa conquista emergiria das “cidades rebeldes”, numa difusa antevisão da “cidade futura”. No mundo intelectual, há tempos se fala em “cidades tecnológicas”, “inteligentes” ou “sustentáveis”, mas em todas as formulações a perspectiva de uma “cidade democrática” permanece distante e frágil como nexo fundante da acalentada “cidade futura”.

Alguns urbanistas qualificam as cidades brasileiras como “cidades cindidas, desiguais e insustentáveis”. Mas isso não é um destino. E a melhor maneira de enfrentar essa realidade talvez seja conectar democracia representativa e ativismo cidadão. O urbanista espanhol Josep Pascual chama essa estratégia de “governança democrática”, um modo de governar a “crescente complexidade e diversidade das sociedades contemporâneas, que se caracterizam pela interação de uma pluralidade de atores, pelas relações horizontais, pela participação da sociedade no governo e sua responsabilidade de fazer frente aos desafios socialmente colocados”.

Trata-se de uma proposta que pressupõe uma cidadania ativa, envolvida com a solução dos desafios sociais e que compartilha valores cívicos e públicos, a revalorização da política democrática e do governo representativo, além do fortalecimento do interesse geral, entendido como “construção coletiva”. O entendimento é que a “cidade futura” é sempre um arranjo inconcluso no qual não deve haver nem ganhadores nem perdedores definitivos. (O Estado de S. Paulo – 05/02/2016)

ALBERTO AGGIO É HISTORIADOR, PROFESSOR TITULAR DA UNESP E PRESIDENTE DA FAP (FUNDAÇÃO ASTROJILDO PEREIRA)

Fonte: PPS


#ProgramaDiferente apresenta uma "Terra de Ninguém" insustentável, desgovernada e desconhecida chamada Brasil

O #ProgramaDiferente desta semana trata, em diferentes escalas, de uma "Terra de Ninguém" existente no Brasil. Seja na política partidária, com a luta da Rede Sustentabilidade de Marina Silva contra obstáculos burocráticos inimagináveis para conseguir a sua legalização, seja no meio da Floresta Amazônica com a polêmica obra da usina hidrelétrica de Jirau, ou mesmo em plena cidade de São Paulo, com abusos e omissões do plano diretor e da lei de zoneamento, o termo figurativo criado na guerra ilustra bem esses territórios não ocupados, entre duas forças beligerantes.
São todos retratos instantâneos de uma realidade desconhecida da maioria da população, mas que tem consequências catastróficas para a cidadania, o meio ambiente, a qualidade de vida, os direitos humanos e a economia do país. Enquanto a grande imprensa segue pautada pela agenda oficial do governo e por interesses do sistema econômico e político, o Brasil real continua distante da TV.

Se diante do olhar atento do mundo, em grandes centros como São Paulo, Rio e Brasília, os escândalos se sucedem num ritmo alucinante, maior até do que a capacidade de fiscalização, controle, investigação e punição, imagine no meio da Floresta Amazônica. É o que vemos no debate sobre a Usina de Jirau, mais um escândalo patrocinado pelo governo federal - este no Estado de Rondônia, marcado por crimes ambientais e trabalhistas.

O vale-tudo ditado pelo poder econômico e político provoca danos irreparáveis à biodiversidade, com forte impacto na vida e na saúde das populações locais. A Sustentabilidade não pode ser apenas um rótulo moderno para ser tratado em rodas de intelectuais, mas uma premissa básica para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa, igualitária, fraterna e democrática.

Da obra escondida no meio da floresta, debatida pelos documentaristas da ONG Repórter Brasil, aos problemas urbanos do plano diretor e da lei de zoneamento da cidade de São Paulo, denunciados pela senadora Marta Suplicy. Passando ainda pelo empenho de Bazileu Margarido na luta diária pela legalização da Rede Sustentabilidade.

É esta "Terra de Ninguém" o tema que une todos os convidados desta edição do #ProgramaDiferente. O que buscamos, ainda que pareça uma luta inglória, é uma nova forma de fazer política, com ética, transparência, bom senso, dignidade e coerência. Assista.