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O Globo: Confira a estratégia do governo para atrair apoio a Arthur Lira

Parlamentares das legendas têm indicações no governo Bolsonaro e temem retaliações

Natália Portinari, Paulo Capelli e Bruno Góes, O Globo

BRASÍLIA - A pressão do governo federal com oferta de cargos e verbas e ameaças de retaliação estão por trás do crescimentos de dissidências a favor da candidatura de Arthur Lira (PP-AL) para a presidência da Câmara no DEM de Rodrigo Maia e no PSDB do governador paulista João Doria. As cúpulas das duas legendas acertaram o apoio a Baleia Rossi (MDB-SP).

Entenda:  O racha no DEM, que fez Maia cobrar ACM Neto

Maia chegou a dizer nesta semana a ACM Neto, presidente de seu partido, que o DEM corria o risco de ficar conhecido como “partido da boquinha” se cedesse à pressão do governo. Segundo ele, estava repassando o que um empresário havia dito. Neto afirma que há apoio institucional a Baleia, mas não pretende punir dissidentes.

Os apoiadores de Lira nas duas legendas têm diversos cargos no governo federal. Elmar Nascimento (DEM-BA) mantém um indicado na presidência da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco), Marcelo Andrade Moreira Pinto. Arthur Maia (DEM-BA) tem indicações na Codevasf, Incra e Secretaria de Patrimônio da União (SPU).

Paulo Azi (DEM-BA) indicou o superintendente do Incra na Bahia, Paulo Emmanuel Macedo de Almeida Alves. Ele assumiu o posto em setembro do ano passado. José Mario Schreiner (DEM-GO), também contabilizado pelos apoiadores de Lira como um voto no candidato governista, tem um apadrinhado à frente da superintendência da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) em Goiás.

Leur Lomanto Jr. (DEM-BA) tem a indicação de um superintendente do Ibama na Bahia. O próprio ACM Neto é tido como responsável pela recondução de José Carlos Aleluia (DEM) ao conselho de Itaipu.

Cota tucana

Os deputados do PSDB também já tiveram direito a indicações. Adolfo Viana (PSDB-BA) apadrinhou Lucas Maciel Lobão Vieira, coordenador do DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas) na Bahia. O superintendente do Ministério da Agricultura em Goiás é indicado de Célio Silveira (PSDB-GO). Luiz Carlos (PSDB-AP), por sua vez, indicou um coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena.

Reunião com deputados:  Bolsonaro diz que espera influenciar na eleição da Câmara

Como revelou o GLOBO anteontem, diversos deputados já foram retaliados pelo governo. Flaviano Melo (MDB-AC), Hildo Rocha (MDB-MA), Fabio Reis (MDB-SE) e Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) perderam seus indicados por apoiar Baleia Rossi.

Além de manter os cargos que já têm, deputados ouviram de Arthur Lira a promessa de que receberão verbas “extra” liberadas pelo governo. Nesse tipo de negociação, o Executivo paga valores para um município indicado pelo deputado de forma informal, e não com emendas parlamentares.

Embora o governo tenha sinalizado que pode pagar R$ 636 milhões em verbas para os deputados, não há como cumprir essa promessa agora, já que o Orçamento de 2021 não foi aprovado pelo Congresso. Arthur Lira, portanto, fica restrito a prometer valores pagos “a prazo”, depois da eleição.

Ontem, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acusou o governo de prometer R$ 20 bilhões em verbas desse tipo, “emendas extraorçamentárias”, em troca de votos. Ele ressaltou, no entanto, que esse seria um valor inexequível para o Orçamento previsto para 2021.

— Pela conta que eu fiz, e pelo orçamento que nós teremos para 2021, pelo que eu já vi que o governo está prometendo junto com o seu candidato, vai dar pelo menos uns R$ 20 bilhões de emendas extraorçamentárias. Eu quero saber em que orçamento para o ano de 2021, com todo o problema do teto de gastos, (terá espaço). (Como) eles poderão cumprir, se vitoriosos, essa promessa? — questionou.

No DEM, há 13 deputados com apoio declarado a Arthur Lira. É preciso 16 para definir a posição na eleição à presidência. Apoiadores de Lira pressionam ACM Neto para que o partido possa aderir ao bloco governista. ACM é resistente à ideia e argumenta que uma “guerra de listas” deixaria o partido desmoralizado.

Disputa:  Rossi intensifica atuação para evitar votos em Lira dentro do próprio bloco

Maia tem criticado ACM Neto nos bastidores por não ter agido de forma enérgica para impedir as traições. Para Elmar Nascimento, apoiador de Lira, ACM Neto não deve isso a Rodrigo Maia.

— Ele (Maia) se julga credor de todo mundo. Por que é que o Neto vai fazer um trabalho em prol da candidatura do Baleia, do MDB, quando ele é presidente do partido e tem que enxergar o todo? O Neto já está fazendo demais pelo Rodrigo ficando neutro. O certo era ele ficar do nosso lado.

Dissidência no PSDB

O líder do DEM, Efraim Filho (PB), deve convocar uma reunião para que a bancada debata de que lado quer estar. Assim, evita a “guerra de listas”, mas dá espaço para que os deputados a favor de Arthur Lira virem o jogo.

No PSDB, que terá 29 votantes, o líder do partido, Rodrigo Castro, declarou voto em Baleia Rossi, mas ao menos quatro integrantes da legenda afirmam abertamente que votarão em Arthur Lira: Luiz Carlos (AP), Célio Silveira (GO), Celso Sabino (PA) e Mara Rocha (AC). Há expectativa de dissidências também na bancada mineira. Deputados da legenda ouvidos em caráter reservado avaliam que, apesar do discurso, Baleia deve compor com Bolsonaro em caso de vitória e, por isso, é melhor melhor se antecipar e já costurar essa proximidade com o Planalto.


William Waack: Impeachment de oportunidade

O cenário político não sugere riscos imediatos a Bolsonaro, mas a volatilidade é alta

Trazido por ele mesmo à discussão, o impeachment de Jair Bolsonaro é uma possibilidade de baixíssima probabilidade no momento. A razão está em linha com o principal aspecto da política no Brasil de longa data: o impeachment não é visto como uma questão de princípio, mas, sim, como de oportunidade.

É a oportunidade percebida pelos agentes políticos que faz surgir os motivos, e não o contrário. Soa bastante cínico para quem acredita em princípios na política, e aí reside provavelmente a grande originalidade de Maquiavel: na política é impossível realizar princípios.

Bolsonaro provavelmente tem consciência clara – pois se trata da própria sobrevivência política – de que os interessados em tirá-lo do poder não tem carência alguma de motivos sólidos para montar contra ele um processo político de impeachment. Cumpre, portanto, não criar a oportunidade.

Por enquanto ela está afastada diante do fato de Bolsonaro ter entregue ao Centrão o comando da política – exatamente as forças que ele prometeu nas eleições tirar do mapa. Como se trata de um governo com escasso comando de qualquer programa (qual, aliás?) e norteado apenas pelo princípio da sobrevivência política em nome da reeleição, o entendimento com forças políticas como as do Centrão é bastante conveniente, e fácil.

É o que está acontecendo. Escapar da oportunidade do impeachment não é a única preocupação do atual governo e seu chefe. A outra, igualmente importante, é assegurar algum tipo de continuidade em programas assistenciais num ambiente fiscal sufocante. Considerando o que sempre foi a política brasileira, é fácil prever o que virá.

Confrontados com escolhas políticas difíceis, porém incontornáveis, os governantes (aí entendido o Legislativo) seguirão o caminho do menor esforço. É o da renúncia fiscal para acomodar interesses setoriais (como reduzir impostos sobre combustíveis para agradar a uma plateia que considera importante, a dos caminhoneiros) e aumentar a arrecadação via aumento de tributos – algo que não só o governo federal pratica. 

Atacar a questão fiscal pelo lado do corte de despesas significa não só controlar os chicletes e latas de leite condensado adquiridos pelo governo federal. Significa enfrentar seu maior componente, as folhas de pagamento do funcionalismo, e esta é uma espinhosa questão política para um governo que só pensa em soluções mágicas e adocicadas. Significa mobilizar uma considerável energia política para pelo menos tentar uma reforma tributária que – inevitavelmente – vai bater em setores acostumados a defender seus (legítimos) interesses às custas dos cofres públicos.

Do jeito que a agenda eleitoral de Bolsonaro (assumindo que existisse alguma bem articulada) se deteriorou nos últimos dois anos, hoje não se sabe se o presidente repete um mantra verbalizado por Guedes ou se Guedes repete um mantra cunhado por Bolsonaro. Ambos mantêm discurso razoavelmente afinado, no qual cada vez menos gente acredita, segundo o qual, com a pandemia de alguma forma controlada, a economia se recupera de alguma forma, as reformas (só então) se concretizam de alguma forma e então a reeleição se dará de qualquer forma.

Não é uma aposta descabida, dados o ambiente da política brasileira e a incapacidade até aqui demonstrada pelas forças democráticas centristas de organizar um nome, uma agenda e uma estratégia de ação para substituir Bolsonaro e o que ele representa. Existe um componente enorme de volatilidade nesse cenário de precário equilíbrio. É o fato de que, até aqui, Bolsonaro foi o pior adversário de si mesmo. E a boa vontade de quem por ofício terá de denunciá-lo é muito menor do que as aparências sugerem.


Luiz Felipe D’Ávila: Três medidas para enfrentar o populismo

Para derrotá-lo, a união do centro em torno de propostas factíveis e um candidato competitivo

A democracia necessita de civilidade, instituições e lideranças exemplares para prosperar. Os valores e princípios que moldaram o florescimento da liberdade, do Estado de Direito, da igualdade de oportunidades e da criação de riqueza por meio da economia de mercado livraram milhões de pessoas de três males que acometeram a humanidade durante séculos: a tirania, a miséria e a barbárie.

Mas as democracias não são perfeitas. Elas enfrentam crises que as obrigam a rever crenças, valores e leis. Nos Estados Unidos, a escravidão era um direito constitucional no século 18, mas foi abolida na segunda no século 19. O apartheid racial só foi sepultado em 1964, quando se aprovou a Lei dos Direitos Civis. Em 2008 os americanos elegeram Barack Obama, o primeiro presidente negro do País.

Crises costumam liberar os glóbulos brancos das democracias, permitindo que elas evoluam de maneira gradual para adaptar as instituições, as leis e os costumes aos novos tempos. A democracia norte-americana deve sair mais forte da era Trump. O presidente que dizimou a civilidade na política e buscou destruir a credibilidade das instituições foi expurgado do poder pelos eleitores. O Partido Republicano, que agiu de maneira oportunista e abandonou suas bandeiras para surfar no populismo de Trump, foi dilacerado. As fissuras internas entre a ala histórica e os trumpistas demandarão um penoso esforço para desintoxicar o partido do populismo e resgatar seus valores e ideais. A intolerância e o ódio desencadeados pelo populismo acirraram a divisão política, econômica e social, obrigando os Estados Unidos a enfrentar os reais problemas: a questão racial, a crescente desigualdade de oportunidades e a raivosa política de identidade que minou a civilidade e a tolerância no País.

Joe Biden assumiu a presidência dos Estados Unidos prometendo restaurar a decência na política. Não há missão mais importante neste momento. Restaurar a decência significa respeitar a Constituição, as leis e as instituições, e não se sublevar contra elas quando as decisões não nos agradam. Implica honrar o mandato, travando o debate político no âmbito das regras do jogo, da civilidade e da cordialidade, e repudiando os atalhos do ódio e da intolerância, que esgarçam a confiança na democracia. Requer esclarecer a opinião pública e ter a coragem de frustrar alguns eleitores para defender os interesses da nação e das futuras gerações.

O Brasil pode extrair lições importantes da experiência norte-americana. Os efeitos colaterais do populismo podem ser mitigados com três medidas.

Primeira: a imprensa séria não pode agir como as redes sociais – que muitas vezes atuam como a cracolândia da informação. Precisa concentrar-se em noticiar os fatos que afetam o destino do País, mas necessita de discernimento para ignorar o turbilhão de impropérios que alimentam o Twitter dos populistas e de seus seguidores. Ao dar projeção nacional ao palavrório irresponsável que encanta a tribo dos radicais, a imprensa contribui para alimentar a covid do populismo. A indiferença é um potente antibiótico, sem a luz dos holofotes o vírus perece.

Segunda: os contrapesos constitucionais têm de agir para preservar a democracia. O Congresso precisa aprovar as reformas para tirar o País do atoleiro do baixo crescimento e libertar a Nação do cativeiro de privilégios concedidos ao corporativismo público e privado. Esses males comprometem a qualidade do serviço público, a eficiência do governo e a credibilidade das instituições democráticas. É imperioso que o Judiciário restaure o seu papel de guardião das leis e da Constituição e abandone o voluntarismo de juízes e de promotores que transformaram a interpretação da lei num vespeiro de insegurança jurídica. Por fim, tanto o Legislativo como o Judiciário devem exercer o seu papel fiscalizador e empregar os contrapesos constitucionais para frear as tentativas espúrias de governantes populistas que buscam achincalhar o Estado de Direito e as instituições democráticas.

Terceira: o centro democrático precisa se organizar rapidamente. Hoje, sua atuação é marcada pela absoluta ausência de ideias, propostas e liderança. Como diz o poeta W. B. Yeats, “o centro não se sustenta. Os melhores sem suas convicções, os piores com as mais fortes paixões”. A maioria dos eleitores precisa estar convencida de que existem alternativas concretas e líderes preparados para livrar o País do desastroso legado populismo: aumento recorde da pobreza e do desemprego, baixo crescimento econômico, calamitosa gestão da crise da pandemia, descrédito internacional e governos incompetentes e incapazes de reformar o Estado.

Em 1994 o centro tinha um plano (o Real) antes do surgimento da sua candidatura (Fernando Henrique Cardoso). Quando Fernando Henrique se tornou o rosto do Plano Real, venceu o populismo no primeiro turno em 1994 e em 1998. Somente a união do centro em torno da construção de propostas factíveis e de uma candidatura competitiva podem derrotar o populismo nas urnas em 2022.


Rosângela Bittar: Com as mãos ao alto

A capitulação da Câmara significa muito mais do que engavetar o impeachment

As lideranças políticas estão a cinco dias da rendição ao presidente Jair Bolsonaro, o que se consumará ao elegerem o novo comando do Poder Legislativo. A confirmarem-se as prévias, estarão os parlamentares promovendo sua incorporação às vilanias do governo. Tiremos desta grave onda de cumplicidade o Senado, onde a extremada independência de cada um supera qualquer imposição de compromissos da cúpula.

Na Câmara, porém, é outra a essência do poder. As indicações de insidiosa conspiração parlamentar fazem o favoritismo do candidato Arthur Lira, patrocinado por Bolsonaro com todas as garantias de sucesso. Inclusive os habituais objetos da feira de trocas de favores, avançando pela coação em casos de resistência.

À população, traída, resta levantar as mãos ao alto enquanto alimenta a esperança de reversão do golpe legislativo, pela traição. Embora o momento exija coragem e não esta covardia marota, os deputados, em maioria, estão levando na displicência esta grave iminência de desastre político.

Como se fosse natural, os brasileiros amanhecem o dia temendo a morte, que já levou 220 mil cidadãos por idiossincrasias, crendices e incompetência do governo. Têm crescido os protestos de rua e manifestos propondo o impedimento do presidente. Crimes de responsabilidade foram cometidos, sobretudo na gestão da crise sanitária mundial. O País tinha, até agora, no Judiciário e no Legislativo, sua fresta de oxigênio.

Mas a Câmara parece disposta a sujeitar-se e debandar. Sem ter consciência de que está prestes, inclusive, a referendar o projeto de reeleição de Jair Bolsonaro para continuar o desgoverno que vem liderando.

A capitulação da Câmara significa muito mais do que engavetar o impeachment. O compromisso inclui a aprovação de políticas contrárias aos interesses da população.

O candidato favorito fala a linguagem do presidente. Fugiu do debate alegando que a pandemia é assunto demagógico. Se ainda houvesse dúvida sobre tão estreita afinidade, está sobre a mesa, já compromissado, o aumento de impostos, com a aprovação da mal afamada CPMF.

Negacionista desumano, para quem vida e morte são a mesma coisa, Bolsonaro escolheu para exercer o controle da Câmara, em seu nome, alguém ardorosamente com ele identificado. O faroeste não é um modelo de projeto parlamentar, entretanto será o único possível com a direção da Câmara subjugada pelo presidente da República.

Bolsonaro perdeu Donald Trump, cujo exemplo copiava e se esgotou como modelo. Está isolado politicamente e escolheu para o Brasil a posição de pária. Seu governo é fraco, sem maioria, investigado em inquéritos judiciais variados. Contudo, supera estas desvantagens com um arsenal de guerra que construiu para resguardar sua cidadela.

Registros de uma breve memória: já reuniu a proteção do procurador-geral da República; duas vagas no STF; duas vagas no TSE por onde tramitará sua denúncia de fraude no sistema eleitoral; a cooptação das polícias militares, que deseja agregar oficialmente ao portfólio de poder; boa parte da Polícia Federal; o apoio das tropas armadas, que cultiva como se líder sindical ainda fosse; acesso às violentas seitas da conspiração; a fidelidade de extremistas e milícias, sob o comando do gabinete do ódio e de empresários do círculo íntimo.

São itens especiais: o culto às armas de fogo, que segue em velocidade e disseminação preocupantes; e a produção de uma rede de filhos e amigos dispostos a cometer o que for preciso para autenticar seu método.

A rendição irrestrita da presidência da Câmara é armação política de um pacto que tornará o Executivo e o Legislativo um só bloco, indiferente à dor, ao luto e à indignação do povo.


Correio Braziliense: Lira crê em vitória no primeiro turno; Maia aposta em virada final

Aliados do candidato apoiador por Bolsonaro estimam que conseguirão aproximadamente 300 votos. Para isso, contam com diversas traições entre os partidos que apoiam Baleia Rossi

Jorge Vasconcellos e Wesley Oliveira, Correio Braziliense

Faltando menos de uma semana para a eleição da Mesa Diretora do Legislativo, aliados do deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato à presidência da Câmara, apostam na vitória no primeiro turno. A eleição ocorre em 1º de fevereiro e, para vencer, o postulante precisa reunir no mínimo 257 votos entre os 513 parlamentares.

O grupo do candidato do Progressistas e líder do Centrão estima ter 300 votos no primeiro turno. O bloco de Lira é composto por 11 partidos, que, juntos, somam 230 deputados. Seus aliados apostam nas “traições” contra Baleia Rossi (MDB-SP), principal adversário na disputa.

A maioria dessas dissidências, segundo apoiadores do deputado alagoano, deverá ocorrer na bancada do Democratas, partido do atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), padrinho da campanha de Rossi. Dos 29 deputados do DEM, cerca de 18 já teriam sinalizado apoio a Lira. Entre eles, os deputados Elmar Nascimento (BA) e Luís Miranda (DF).

O presidente do DEM, ACM Neto, e a bancada de cinco deputados da sigla na Bahia estiveram, ontem, reunidos com Lira. Os parlamentares baianos sinalizaram que pretendem apoiar o nome do Centrão, o que foi visto como um atrito entre o ex-prefeito de Salvador e Maia dentro da cúpula do partido.

Apesar disso, o presidente da Câmara minimizou o encontro e, mais uma vez, reforçou que Lira é o candidato apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro. “Esse jogo que a candidatura patrocinada pelo presidente da República faz, é um jogo que nunca vi aqui na Câmara, de trabalhar para criar conflito interno dentro dos partidos. Todo mundo, aqui, tem maturidade. O DEM estará no bloco (de Baleia), é isso que o ex-deputado e ex-prefeito ACM Neto vai informar ao deputado Arthur Lira. Falei com ele mais cedo, que o partido vai formar parte do bloco do deputado Baleia”, disse Maia.

Aliados do emedebista e do presidente da Câmara no DEM afirmam que as dissidências na bancada devem chegar a oito, incluindo os ministros Onyx Lorenzoni (Cidadania) e Tereza Cristina (Agricultura), que pedirão exoneração dos cargos para a votação. Ambos são deputados licenciados de seus mandatos.

Além do DEM, o PSDB é outro partido que está no bloco de Baleia, mas que poderá render uma boa quantidade de votos para o candidato do PP. O partido soma 33 votos, mas Lira deverá receber a chancela de 15 parlamentares tucanos. Além disso, o deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) lançou seu nome na disputa de forma independente.

Tebet expõe compromisso para gestão do Senado

Os candidatos à Presidência do Senado Simone Tebet (MDB-MS) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) aprofundaram as articulações para atrair apoios. Ela protocolou, ontem, uma carta-compromisso dirigida aos colegas em que prega a união de forças no apoio ao plano nacional de vacinação contra a covid-19 e defende a aprovação de reformas importantes para o país enfrentar a crise. A parlamentar também se comprometeu a “assegurar a soberania do plenário, com a participação democrática de cada uma das senadoras e dos senadores” e “democratizar a deliberação das pautas, com implantação efetiva e representativa do Colégio de Líderes”. Até o momento, Pacheco, que tem o apoio do presidente Jair Bolsonaro, é apontado como favorito na disputa, contando com o apoio de nove partidos (DEM, PSD, PP, PL, PT, PDT, Republicanos, Pros e PSC), que reúnem 41 parlamentares. Tebet, por sua vez, conta com apoios do MDB, Podemos, Cidadania e PSB, que somam 28 senadores.

Enquanto os aliados do deputado Arthur Lira (PP-AL) estão otimistas com a vitória no primeiro turno, o grupo de Baleia Rossi (MDB-SP) acredita na vitória no segundo turno. O bloco do emedebista conta com 11 partidos, que somam 238 votos, mas estima-se que ele deverá receber cerca de 220 votos.

Mesmo sem o número mínimo para vencer a disputa, a pulverização de candidatos –– nove nomes estão na disputa até o momento –– deverá fragmentar as escolhas no primeiro turno, fazendo com que Lira não alcance os 257 votos necessários. Com isso, os aliados afirmam que será possível virar contra o deputado do PP. O PSol, que lançou Luiza Erundina (SP) na disputa, se juntaria às demais legendas da oposição na campanha por Baleia.

Segundo aliados de Rossi, muitos deputados que estão no bloco partidário de Lira pretendem votar em Baleia, no entanto, não pretendem declarar voto por medo de represálias por parte do governo. Durante a campanha, a articulação do Palácio Planalto sinalizou liberação de emendas e distribuição de cargos para os parlamentares que embarcassem na candidatura de Lira.

“Nossas projeções caminham para um segundo turno, no qual Baleia termina o primeiro turno em primeiro lugar. Acho que, hoje, pelas nossas projeções, Baleia já passou a ser favorito”, estimou Rodrigo Maia. Ele projeta que seu candidato tem, atualmente, 230 votos e disse que Lira teria menos de 200, perdendo espaço para o candidato avulso Fábio Ramalho (MDB-MG).

O presidente da Câmara voltou a criticar a decisão dos aliados de líder do Centrão de fazer a eleição de forma presencial. Ele disse que deputados de grupo de risco da covid-19 estão preocupados, mas que não há mais tempo para preparar o pleito para um sistema híbrido.

“Alguns deputados que estão no grupo de risco me mandaram mensagem, questionando, preocupados. Qualquer servidor ou deputado que esteja no grupo de risco, e venha a ser contaminado saindo da sua cidade para cá, e tenha algo mais grave, quero deixar claro que essa responsabilidade não é minha e não será minha porque votei contra”, salientou.

Maia também criticou a decisão de fazer a eleição para a Presidência da Câmara em 1º de fevereiro –– defendia que fosse dia 2. Para ele, isso fará com que a votação ocorra por volta das 21h30, já que os blocos partidários devem ser registrados no mesmo dia.


O Estado de S. Paulo: Líderes religiosos reforçam pressão por impeachment de Bolsonaro

Representantes católicos e evangélicos decidem formalizar na Câmara um pedido de afastamento do presidente, por negligência na condução da pandemia de covid-19

Daniel Weterman, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – Líderes evangélicos e católicos vão aumentar a pressão pela abertura de um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro no Congresso. Em um movimento que será apresentado como uma “frente de fé”, um grupo de religiosos formalizará nesta terça-feira, 26, na Câmara dos Deputados, um pedido de afastamento de Bolsonaro, sob o argumento de que ele agiu com negligência na condução da pandemia de covid-19, agravando a crise. É a primeira vez que representantes desse segmento encaminham uma denúncia contra o presidente por crime de responsabilidade.

pedido de impeachment é assinado por religiosos críticos ao governo. Na lista estão padres católicos, anglicanos, luteranos, metodistas e também pastores. Embora sem o apoio formal das igrejas, o grupo tem o respaldo de organizações como o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil, a Comissão Brasileira Justiça e Paz da Confederação Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) e a Aliança de Batistas do Brasil.

“Uma parcela da igreja deu um apoio acrítico e incondicional ao Bolsonaro independentemente do discurso que ele defendia. Queremos mostrar que a fé cristã precisa ser resgatada e que a igreja não é um bloco monolítico”, disse ao Estadão/Broadcast o teólogo Tiago Santos, um dos autores do pedido de impeachment.

As falhas do governo durante a crise do coronavírus, na esteira de idas e vindas sobre a importação de vacinas da China e da Índia, elevaram a temperatura política. Partidos de esquerda como PT, PDT, PSB, PSOL e PCdoB, além da Rede, também vão protocolar na Câmara, nesta quarta-feira, 27, um outro pedido de afastamento de Bolsonaro, desta vez com o mote “Pelo impeachment, pela vacina e pela renda emergencial”. As siglas adiaram a formalização da denúncia, antes prevista para esta terça-feira, justamente a pedido dos religiosos, que temiam confusão entre os dois movimentos.

“A palavra é ‘emergencial’. O que é emergencial? Não é duradouro, vitalício. Não é aposentadoria. Lamento muita gente passando necessidade, mas a nossa capacidade de endividamento está no limite”, afirmou Bolsonaro, nesta segunda-feira, 25, em conversa com apoiadores, no Palácio da Alvorada.



Em uma aliança que juntou partidos de esquerda à centro-direita, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também tomou a frente de um movimento que pode ser a prévia da nova articulação para tentar derrotar Bolsonaro em 2022, quando ele pretende disputar a reeleição.

A decisão de dar ou não o pontapé inicial no impeachment cabe ao presidente da Câmara, que também pode engavetar os pedidos – desde o início do mandato de Bolsonaro foram protocoladas 61 ações desse tipo contra ele, das quais 56 estão ativas.

O Palácio do Planalto faz campanha para emplacar o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), líder do Centrão, na cadeira de Maia, com a expectativa de que, nesse cenário, uma denúncia contra ele não avançará no Congresso. Adversário de Lira, o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), apoiado pelo presidente da Câmara, promete analisar “com equilíbrio” os pedidos de afastamento de Bolsonaro se vencer a disputa. A eleição que vai renovar as cúpulas da Câmara e do Senado está marcada para 1º de fevereiro. 

No pedido que será formalizado nesta terça, os líderes religiosos acusam o presidente de agravar a crise do coronavírus e, consequentemente, o número de mortes. Para eles, Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade e desrespeitou princípios constitucionais e o direito à vida e à saúde. Mais de 200 mil pessoas já morreram em decorrência de covid-19.

Declarações de Bolsonaro durante a pandemia, como chamar o novo coronavírus de “gripezinha”, são citadas no pedido de impeachment a ser apresentado pelos religiosos. “As ações e omissões de Jair Bolsonaro, que seguem em repetição e agravamento, levaram e seguem levando a população brasileira à morte e geraram danos irreparáveis. Isso é crime de responsabilidade. Crime contra os direitos e os princípios constitucionais mais primários: à vida e à saúde”, diz a peça.

O bispo primaz da Igreja Anglicana do Brasil, Naudal Alves Gomes, a presidente da Aliança de Batistas do Brasil, Nívia Souza Dias, e os teólogos Lusmarina Campos Garcia, Leonardo Boff e Frei Betto também estão entre os signatários da ação. 

A posição desses líderes vai na contramão de pastores evangélicos que defenderam a eleição de Bolsonaro, em 2018, e integram a base de apoio ao governo. Entre os defensores do chefe do Planalto estão Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, José Wellington Bezerra da Costa, da Assembleia de Deus Belém, Edir Macedo, da Universal do Reino de Deus, e R.R. Soares, da Igreja Internacional da Graça de Deus.

Durante a crise, Bolsonaro chegou a ser cobrado por esses aliados para reagir a decretos de prefeitos e governadores que determinaram o fechamento de igrejas, em função do isolamento social necessário para evitar a covid-19. 

Pastores pediram ao presidente que investisse na vacinação em massa para que o País voltasse às atividades econômicas. Sem cultos nos templos, que estão fechados, a arrecadação também cai para essas igrejas.

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Alon Feuerwerker: Lacrou

Agora, quando a pandemia dá sinais de pretender durar mais tempo que o inicialmente projetado, e quando os efeitos globais mais abrangentes da vacinação estão previstos apenas para o final deste ano, governos e sociedades veem-se às voltas com a pergunta clássica: o que fazer?

No cenário utópico, a vida social seria congelada até atingir-se a taxa de imunes que inviabilizaria a circulação viral. Porém, dado ser uma impossibilidade prática, governantes são empurrados a fazer algo, qualquer coisa, mesmo que apenas para dizer que estão fazendo.

Por enquanto, quem lidera a corrida dos factoides é o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, que enfrenta em março (mais) uma dura eleição. Na era da lacração, ele literalmente decidiu lacrar o país por uma semana. Ninguém entra. Para evitar a chegada de novas variantes do SARS-CoV-2, diz (leia).

Como não há estudo científico que preveja o desaparecimento delas daqui a algumas semanas, depreende-se que o movimento de Bibi (apelido dele) é para dar uma freada que lhe permita chegar no dia da urna com números não tão ruins.

Israel é líder mundial em vacinação, mas o resultado não é imediato. Nem seria sensato esperar uma solução instantânea. E Israel acaba de passar o Brasil na taxa de novas mortes proporcionalmente à população.

Depois de ultrapassada a eleição, aí será menos custoso dar a real ao eleitor, como aliás fez estes dias Joe Biden. Na campanha, ele dissera "ter um plano" (sempre lembro do filme "Parasita" quando alguém diz ter um plano). Agora informa que nada pode mudar a trajetória da pandemia nos EUA nos próximos meses (leia). 

E isso porque lá se está vacinando em massa. Como aliás deve mesmo ser feito. Mas sem enganar o povo.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação


Luiz Carlos Mendonça de Barros: A covid 19 contra-ataca

No curto prazo não sobra alternativa de defesa senão uma outra rodada de estímulos econômicos, inclusive transferência de renda para os mais pobres

Confesso ao leitor do Valor que meu otimismo estrutural com a ação do ser humano diante de uma crise grave que atinge, de tempos em tempos, nossa sociedade está sendo fortemente questionado neste início de 2021. Esperava eu que com o início da vacinação em grande número de países, a crise da saúde - e sua derivada econômica - poderiam continuar a ser enfrentadas com as armas hoje à disposição de governos e sociedade. Com a redução das medidas de afastamento social testadas ao longo de vários meses e as medidas de natureza keynesianas implantadas na maioria das economias de mercado, a profunda recessão que se seguiu foi controlada e, nos últimos meses de 2020, iniciamos a volta de um ciclo econômico de normalidade.

Os dados econômicos conhecidos até o mês de novembro mostram uma recuperação em V com o braço ascendente da curva da atividade econômica na maioria dos países chegando quase ao mesmo nível de março passado, quando a crise chegou aos mercados mais importantes do mundo. Apenas os indicadores das atividades do setor de serviço - principalmente as de refeições fora do domicílio e mobilidade aérea - tiveram uma recuperação mais lenta e terminaram 2020 bem abaixo de antes do início da crise.

Meu otimismo com 2020/2021 vinha exatamente da abrangência das medidas econômicas implantadas pelos governos nacionais e da certeza que as reações dos agentes econômicos diante de tantos estímulos fiscais que chegaram a mais de 10% do PIB e uma postura altamente expansionista dos Bancos Centrais seria a de acelerar seus negócios.

Me ajudou muito, na compreensão do que iria acontecer, o acompanhamento da crise vivida pelos Estados Unidos em 2008 e que, posteriormente, se transformou em uma depressão mundial que durou quase dez anos. A recessão da covid-19, pelas suas características particulares, me parecia ser ainda mais fácil de ser superada pelas ações de política fiscal e monetária tomadas rapidamente pelas autoridades econômicas. Em 2008, pelas circunstância das eleições americanas e de um novo governo democrata, apenas em 2010 é que as primeiras medidas para enfrentamento da recessão foram implantadas. Além disto, em 2008 tivemos uma crise bancária de grandes proporções nos Estados Unidos o que sempre torna muito mais difícil a volta da confiança aos mercados e a recuperação da atividade econômica.

Este modelo de recuperação da recessão econômica que tracei em função da teoria econômica disponível e do acompanhamento por vários anos dos acontecimentos vividos entre 2008 e 2020 tinha, entretanto, uma falha grave. Não incorporava os riscos associados a uma pandemia como vivíamos, por falta de conhecimento meu e da grande maioria dos analistas que serviam como referência para seu acompanhamento. Não tínhamos conhecimento de uma pandemia da natureza que estamos vivendo e as referências já conhecidas como a da Saar em 1997 - e que provocou a crise econômica conhecida como “crise da Asia” - se revelaram enganosas pela rapidez como foi superada.

Em 1998 a economia mundial já tinha se recuperado da curta recessão vivida e os negócios no mundo tinham voltado à plena atividade. Dou aqui um exemplo marcante deste fato pois fui o responsável pela maior privatização já realizada na América Latina - 12 empresas do sistema Telebrás - em junho de 1998 pelo valor de US$ 20 bilhões.

Esta diferença entre uma pandemia geograficamente mais localizada como foi a Saar - embora da mesma natureza viral como a covid-19 - e a que estamos vivendo é um alerta grave para o potencial destruidor que as crises provocadas pela Natureza podem ter sobre a Humanidade. Mesmo com o potencial cientifico que acumulamos hoje, o arsenal de uma natureza agredida pode se revelar muito maior.

A violência como o vírus da covid-19 contra-atacou uma sociedade acostumada com uma liberdade quase sem limites para organizar suas cadeias de negócios, como se a distância entre mercados e empresas espalhadas pelo mundo não existisse, foi a arma mais poderosa que a covid-19 encontrou para se espalhar pelo mundo. Por outro lado, a incrível capacidade que mostra o vírus para mudar sua natureza é uma advertência vigorosa para a dimensão de seu potencial destruidor.

Hoje a dúvida se uma vacina identificada e testada vai servir para qualquer nova mutação do vírus assusta a todos, mas principalmente os cientistas do setor. A mensagem a toda a humanidade está feita e cabe agora aos governos nacionais o desenvolvimento não só de programa de vacinações com o material que temos hoje, mas, principalmente, de um sistema logístico com um protocolo protetor de outra natureza.

No curto prazo não sobra alternativa de defesa senão uma outra rodada de estímulos econômicos, inclusive transferência de renda para os mais pobres para acomodar uma nova rodada de isolamento social, talvez até mais intenso do que já vivemos entre março e junho de 2020. Mesmo que isto cause calafrios nos economistas que formam hoje o pensamento dominante nos mercados financeiros.

*Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.


Andrea Jubé: As pedras no caminho para 2022

Rachados, DEM e PSDB serão fiéis da balança na Câmara

À medida que se aproximam “o dia D e a hora H” da eleição para as Mesas Diretoras da Câmara e do Senado, fica claro como o espelho d’água do Congresso o vínculo entre a disputa no Legislativo e a sucessão presidencial.

O empecilho ao sucesso dessas articulações temporãs é a pedra no meio do caminho, para usar uma metáfora de Drummond. Atiraram a pedra no espelho d’água, e agora a turbulência pode afundar o barco das alianças para 2022, num cenário em que PP, DEM, PSDB e MDB querem ser os timoneiros.

O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), já expressou o apoio à reeleição de Jair Bolsonaro em uma coligação precoce que agrega o PL de Valdemar Costa Neto. O enlace é o pano de fundo do apoio do Palácio do Planalto à candidatura do líder do PP, Arthur Lira (AL), à presidência da Câmara.

Nogueira armou-se até os dentes para eleger Lira, enquanto em paralelo blinda Bolsonaro de um hoje remoto avanço do impeachment.

No último domingo, Nogueira, que não é ativo nas redes sociais, foi ao Twitter para interferir em um debate entre Lira e Baleia Rossi (MDB-SP) sobre a disposição do vencedor da eleição em pautar o impeachment.

Lira acusa Baleia de prometer ao PT a abertura do processo, se for eleito. E o emedebista questiona Lira quanto a um eventual compromisso com o Planalto de engavetá-lo.

“Seria bom que o candidato Baleia Rossi afastasse mais uma das inúmeras dúvidas que o cercam: existe de fato um compromisso dele em pautar um pedido de impeachment, ou ele pode chamar isso claramente de mentira da Gleisi [Hoffmann], presidente do PT?”, cobrou Nogueira, advogando para Bolsonaro.

No campo adversário, no entorno do governador de São Paulo, João Doria - pré-candidato do PSDB à sucessão de Bolsonaro - a percepção é que prioridade máxima agora é arregaçar as mangas para eleger Baleia. O projeto de Doria contempla uma coligação de apoio à sua candidatura liderada por DEM e MDB.

Para aliados de Doria, a eleição de Lira ampliaria exponencialmente a influência de Bolsonaro no Legislativo, com hegemonia das pautas de seu interesse nas duas Casas. Nessa contabilidade, o Senado já aparece comprometido com o Planalto sob Davi Alcolumbre (DEM-AP). E assim permaneceria sob Rodrigo Pacheco (DEM-MG) - se o favoritismo do mineiro se confirmar.

Na Câmara sob Lira, a reforma tributária, bandeira do MDB, DEM e PSDB, perderia o protagonismo para outras pautas anunciadas pelo progressista, como a PEC Emergencial e a reforma administrativa.

Além disso, o comando da Câmara é estratégico pela atribuição pela abertura do impeachment. Ainda que o julgamento ocorra no Senado, na verdade, se os deputados afastarem o presidente do cargo, dificilmente ele reassume a cadeira.

É nessa conjuntura que a eventual vitória de Baleia Rossi aquece as articulações pela consolidação de um bloco que reúna PSDB, DEM e MDB em 2022. O MDB se comprometeria a não lançar candidatura própria. Em troca, teria o respaldo de DEM e PSDB à recondução do emedebista à presidência da Câmara.

A pedra - quiçá, paralelepípedo - no caminho desses planos é o racha interno no DEM e no PSDB. Por causa dessa divisão, as duas bancadas despontam como fiéis da balança na disputa pelo comando da Câmara. Estimam-se 20 votos de dissidentes para lá, ou para cá. A depender da destinação desses apoiamentos, o embate pode ir para o segundo turno.

Ontem os times de Baleia e Lira celebraram vitórias relevantes. Baleia comemorou o compromisso da bancada petista de entregar todos os 57 votos, zerando a dissidência concentrada nos paulistas.

Mas a festa do líder do PP teve gosto de fel para o grupo de Baleia e de seu maior cabo eleitoral, o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Ontem Lira foi recebido em Salvador (BA) pelo presidente do DEM, ACM Neto, expondo um racha na cúpula partidária. Segundo apuração dos repórteres Raphael di Cunto e Marcelo Ribeiro, seis deputados baianos declararam apoio a Lira: cinco do DEM e um do PSDB.

Essa agenda implica, em contrapartida, os sete votos do PP no Senado no candidato do DEM, Rodrigo Pacheco.

A leitura desse movimento nos bastidores é de que ACM Neto investiu todas as fichas na eleição do Senado, para garantir a permanência do comando do Senado na cota do DEM.

É nesse contexto que as planilhas dos grupos de Baleia e Lira se debruçam com atenção redobrada sobre os votos do DEM e PSDB. No time de Lira, a expectativa ontem era de 19 defecções a seu favor dos 33 deputados tucanos. Na planilha de Baleia, as traições no PSDB não passam de dez.

No DEM, o time de Lira contabiliza 22 deputados com ele, dos 32 da bancada de Rodrigo Maia. Em contrapartida, Maia e Baleia somam 29 votos do DEM, com quatro dissidentes.

Essa divisão conturba os planos para 2022, porque um grupo de deputados tucanos que apoia Lira prefere o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), em um projeto presidencial - na cabeça de chapa, ou como vice em uma chapa competitiva.

Doria, revigorado pela entrega da CoronaVac, mesmo assim, tem praticamente uma avalanche no caminho do projeto. Além do racha no próprio partido, há o projeto de poder do DEM.

Com três governadores, o partido de ACM Neto e Rodrigo Maia foi o que mais cresceu na eleição municipal entre os seis maiores (MDB, PP, PSD, PSDB, PT e PSL), e elegeu prefeitos de quatro capitais. Por isso, o DEM resiste a repetir o papel de vice do PSDB, e articula uma candidatura própria.

O plano A do DEM é filiar Luciano Huck. Se não prosperar, há o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta no radar, em uma aliança que reuniria MDB, Podemos e Cidadania.

Mas a pedra no caminho do DEM é o projeto de eleger o atual vice-governador Rodrigo Garcia como sucessor de Doria em 2022 - hoje, a prioridade zero de ACM Neto. Uma articulação que pode degringolar se não contar com o apoio de Doria a Garcia.


Cristina Serra: Pandemia e barbárie

Solidariedade. É disso que mais precisamos

A tragédia humanitária e sanitária em que estamos mergulhados nos confronta com uma crise ética e civilizacional de igual gravidade. Estamos todos perdendo com a negligência criminosa do governo. Mas quem tem dinheiro acha que pode contornar a demora na imunização passando à frente dos que deveriam estar em primeiro lugar: profissionais de saúde, idosos e quem tem comorbidades.

No começo deste mês, soube-se que clínicas privadas negociavam diretamente com uma farmacêutica na Índia a compra de vacinas, alegando tratar-se de ação complementar ao SUS. Agora, a coluna Painel informa que grandes corporações negociam com o Ministério da Saúde a compra de doses no exterior.Metade seria entregue ao SUS, metade ficaria para funcionários das empresas e seus parentes.Cientistas renomados tem insistido que vacinação é estratégia coletiva, que só dá resultados quando aplicada em larga escala. Ninguém está a salvo do vírus individualmente ou em pequenos nichos. No Império, o voto era "censitário", de acordo com a renda do cidadão. Agora, estaríamos diante da vacina "censitária". Uma ilusão que só agravaria a desigualdade realçada pela pandemia.

Do ponto de vista ético, a generosidade de Albert Sabin deveria ser o nosso norte neste momento. O cientista renunciou aos direitos de patente da gotinha contra a poliomielite, o que permitiu proteger milhões de crianças no mundo inteiro. Solidariedade. É disso que mais precisamos.

Não se trata de demonizar o setor privado, que pode ajudar de muitas outras formas, como em logística, armazenamento e transporte. Desde que suas ações reforcem a política pública e não concorram com ela. As empresas não confiam na capacidade do governo federal? Procurem os governos estaduais, que podem e devem mobilizar suas estruturas e capilaridade.

Contra o coronavírus, já temos vacinas. Precisamos, desesperadamente, de um antídoto contra a barbárie.


Hélio Schwartsman: O ponto de virada pelo impeachment

Os próximos dias dirão se a mudança de humor veio para ficar

Na última coluna em que defendi o impeachment de Bolsonaro, dia 11, eu pregava para convertidos. Em duas semanas, a maré virou, e a possibilidade de afastamento do presidente se tornou o grande tema nacional. O que houve nesses 15 dias?

A mudança não se deu no panorama geral. A inadequação do presidente e de seu governo, consubstanciada na sucessão de eventos passíveis de enquadramento como crime de responsabilidade, já estava presente.

Também já estavam em curso fenômenos que sabíamos que afetariam negativamente a popularidade da gestão, como o fim do auxílio emergencial e a segunda onda da epidemia. Ainda que tenham contribuído para a mudança, esses fatores não são bons candidatos a "tipping points" (pontos de virada).

O que surgiu de novo na última quinzena foram os relatos de pacientes morrendo por asfixia em Manaus, devido à incompetência do governo em assegurar estoques adequados de O2, e a constatação de que, também por culpa do governo, o Brasil só conseguiu uma quantidade mínima de vacinas.

Enquanto países que se prepararam, como Israel e o Reino Unido, já imunizaram coortes importantes da população e podem estar colhendo os frutos em termos de redução das hospitalizações, no Brasil não conseguimos doses nem para inocular os profissionais de saúde que lidam diariamente com a doença.

Ambas as "novidades" reúnem atributos de "tipping points" poderosos, que falam diretamente a nossos cérebros. A história de Manaus cutuca nosso medo ancestral de morrer por asfixia. A das vacinas apela a uma realidade alternativa muito desejada que só não se concretizou porque alguém (Bolsonaro) fez uma terrível besteira.

Os próximos dias dirão se a mudança de humor veio para ficar ou se não passa de um soluço. De qualquer forma, erra quem acredita que o apoio do volúvel centrão é proteção suficiente contra uma virada genuína da opinião pública.


Rubens Barbosa: Notas sobre a carta de Bolsonaro a Biden

Importante entender as entrelinhas. Não vai ser fácil o diálogo entre os dois governos

A carta do presidente Bolsonaro enviada a Joe Biden por ocasião da posse como presidente dos EUA, na forma, parecia ter sido escrita pelo velho Itamaraty ao descrever a relação entre os dois países. Os comentários sobre os valores compartilhados, as coincidências e os avanços recentes refletem as posições do atual Itamaraty durante o governo Trump e estão longe de poder ser associadas ao governo Biden, a menos que o texto indique uma bem-vinda correção de rumos na política externa brasileira… Importante é entender o que está nas entrelinhas da correspondência presidencial.

Uma primeira observação esclarecedora diz respeito à referência de que o atual governo “corrigiu os equívocos de governos brasileiros anteriores, que afastaram o Brasil dos EUA, contrariando o sentimento de nossa população e os nossos interesses comuns”. Como embaixador em Washington nos governos FHC e Lula (1999-2004), devo dizer que recebi diretamente dos dois presidentes instruções precisas para manter e ampliar as relações bilaterais, o que foi feito com resultados muito concretos para o Brasil durante os cinco anos em que lá permaneci. O posterior predomínio de considerações partidárias a partir de certo momento no governo Lula e no governo Dilma realmente afetou o relacionamento entre os dois países, como tive ocasião de prever e registrar em meu relatório final de gestão. A normalidade e o tratamento construtivo na relação entre os dois países foram retomados em seguida, com o governo Michel Temer.

A afirmativa de que “os empresários de nossos dois países têm interesse em um abrangente acordo de livre-comércio” exagera a vontade empresarial quanto a esse acordo amplo (como se vê pela relutância em avançar as negociações com a Coreia do Sul em decorrência da baixa competitividade brasileira), bem assim quanto à disposição do governo de Washington, que não tem nem mandato do Congresso, nem interesse em abrir negociações com o Brasil.

Nas organizações econômicas internacionais, a carta diz que “o Brasil está pronto para continuar cooperando com os EUA para a reforma da governança internacional. Isso se aplica, por exemplo, à OMC, onde queremos destravar as negociações e evitar as distorções de economias que não seguem as regras de mercado”. Essa ação proposta por Trump, e que deverá ser mantida por Biden, visa a atingir a China, não considerada pelos EUA como economia de mercado. Apoiada pelo Brasil até aqui, com base na coincidência com as políticas de Trump, vai continuar agora à luz da dependência do suprimento de vacinas e insumos chineses para combater a pandemia? O governo brasileiro vai mudar sua percepção negativa sobre o multilateralismo e seus efeitos maléficos sobre as nações e passar a apoiar a nova linha do governo Biden?

Resta saber se a afirmação de que “necessitamos também continuar lado a lado enfrentando as graves ameaças com que hoje se deparam a democracia e a liberdade em todo o mundo e que se tornam mais prementes no mundo pós-covid” será suficiente para justificar, apesar de tudo, convite ao Brasil para participar da grande conferência sobre democracia que Biden convocará neste ano.

O aspecto mais importante da correspondência se refere à “disposição a continuar nossa parceria em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção do meio ambiente, em especial a Amazônia, com base em nosso Diálogo Ambiental, recém-inaugurado”. Em relação ao Acordo de Paris, “nota que o Brasil demonstrou seu compromisso com a apresentação de suas novas metas nacionais” e que, “para o êxito do combate à mudança do clima, será fundamental aprofundar o diálogo e aumentar a cooperação na área energética, visto ter o Brasil sido escolhido país líder para o diálogo de alto nível da ONU sobre Transição Energética”. A relevância desse trecho reside no fato de o Brasil ter dado o roteiro às demandas do governo Biden para que sejam apresentados resultados concretos na preservação da Amazônia (combate ao desmatamento, queimadas, garimpo ilegal e proteção das comunidade indígenas), conforme previsto pelo recém-firmado Diálogo Ambiental; para cobranças no aprofundamento das metas nacionais sobre redução de emissão de gases de efeito estufa, pois, contrariando o compromisso de 2015, ao invés de ampliar as metas, o governo promete emitir mais CO2 até 2030 e as condicionou a recursos externos, o que acarretou a exclusão do Brasil da Cúpula de Ambição Climática sobre mudança de clima; ao aceitar participar do Diálogo sobre Transição Energética, o Brasil será cobrado a apresentar propostas ambiciosas em políticas climáticas

O Congresso americano, com o novo governo, começou a rever o sistema geral de preferências para países em desenvolvimento, em que se prevê a exclusão de países que não implementarem políticas relacionadas às leis ambientais nacionais ou compromissos internacionais. Caso o Brasil seja excluído, empresas nacionais deixarão de exportar com tarifa zero mais de US$ 2,2 bilhões. Será mantida a decisão de o Brasil acompanhar os EUA e aprovar os princípios da política de rede limpa (clean network) para excluir empresas chinesas da concorrência para a instalação da plataforma 5G?

Não vai ser fácil o diálogo entre os dois governos.

*Presidente do IRICE