arnaldo niskier

Webinar da Biblioteca Salomão Malina discute desafios da educação pós-pandemia

Arnaldo Niskier, Cristovam Buarque, Pollyana Gama e André Amado participam do evento online, no dia 11 de setembro, com transmissão ao vivo pela internet

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Mantida pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira) em Brasília, a Biblioteca Salomão Malina realiza, no dia 11 de setembro, das 18h30 às 20h, webinar para discutir perspectivas da educação pública brasileira no contexto após pandemia do coronavírus, com transmissão ao vivo pela sua página no Facebook. Participam do evento online o professor Arnaldo Niskier, membro da Academia Brasileira de Letras; o ex-senador e ex-ministro da Educação Cristovam Buarque e a professora Pollyana Gama. A mediação será feita pelo embaixador André Amado, diretor da revista mensal Política Democrática Online.

Assista ao vivo!

https://www.facebook.com/salomaomalina/videos/319607335951303/

A FAP vai fazer a retransmissão do webinar em seu site e em sua página no Facebook, assim como faz com todos os eventos online. Durante o debate, os especialistas devem destacar os principais problemas que assolam a educação pública brasileiras, mas também apontar caminhos para superá-los, colaborando, também, para a discussão de um dos assuntos que devem pautar as eleições municipais.

Em entrevista à revista Política Democrática Online de agosto, produzida pela FAP e com acesso totalmente gratuito, Niskier disse que “falta tudo à educação brasileira”. Segundo ele, país sofre sem um plano nacional de educação e com o principal órgão – o Ministério da Educação – minado por uma gestão precária que mistura ideologia com gestão escolar. “Essa mistura não é saudável: prejudica os beneficiários do processo – os estudantes”, avalia.

Na avaliação de Niskier, “o país precisa que o Ministério da Educação acorde definitivamente” para montar uma equipe positiva, que se preocupe com os verdadeiros problemas da educação, e não faça da ideologia um procedimento prioritário. “Porque não é essa a prioridade do nosso país”, avalia.

Um dos maiores defensores da educação pública de qualidade, Cristovam Buarque, que também é ex-ministro da Educação, entende que o melhor caminho é a federalização do ensino, que tem como objetivo passar às mãos da União a gestão de escolas administradas por estados e municípios. “A educação é uma questão nacional, e não municipal. Deve ser uma preocupação do presidente, não do prefeito. O primeiro desafio é, portanto, sair da municipalização para a federalização. Isso requer uma profunda mudança política”, diz ele.

Ex-vereadora de Taubaté (SP) e ex-deputada federal, Pollyana Gama integrou a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. Ela também presidiu a Subcomissão Permanente destinada a acompanhar a consolidação do texto da BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e a reformulação do Ensino Médio no país. Ela tem larga experiência em projetos para primeira infância, educação infantil, formação de professores e de melhoria dos índices do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).

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‘Falta tudo à educação brasileira’, diz Arnaldo Niskier à Política Democrática Online

Em entrevista à revista mensal da FAP, professor alerta para o apagão educacional no país

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Membro da Academia Brasileira de Letras e ex-membro do Conselho Nacional de Educação, o professor Arnaldo Niskier avalia que o país sofre sem um plano nacional de educação e com o principal órgão – o Ministério da Educação – minado por uma gestão precária que mistura ideologia com gestão escolar. "Essa mistura não é saudável: prejudica os beneficiários do processo – os estudantes", avalia, em entrevista concedida ao ex-senador Cristovam Buarque e ao sociólogo Caetano Araújo, publicada na revista Política Democrática Online de agosto. “Falta tudo à educação brasileira”, diz.

Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de agosto!

A revista mensal é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. Todas as edições podem ser acessadas, gratuitamente, no site da instituição. Niskier é autor de mais de 100 livros, especialmente sobre educação, professor aposentado de História e Filosofia da Educação da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e doutor em Educação pela mesma instituição. Foi membro do Conselho Federal de Educação, do Conselho Estadual de Educação e do Conselho Nacional de Educação e secretário de Estado do Rio de Janeiro por quatro vezes.

Na entrevista exclusiva, Niskier lembra que o Brasil tem 60 milhões de estudantes nas escolas do país, os quais, na opinião do especialista, estão mal servidos. “Não estão tendo a cobertura devida para suas necessidades, e isso é, sem dúvida, negativo”, lamenta.

De acordo com Niskier, “o país precisa que o Ministério da Educação acorde definitivamente” para montar uma equipe positiva, que se preocupe com os verdadeiros problemas da educação, e não faça da ideologia um procedimento prioritário. “Porque não é essa a prioridade do nosso país", avalia.

Em outro trecho, ele critica à falta de estrutura de tecnologia nas escolas. “"A grande maioria de nossas escolas, de um total de 190 mil escolas em todo o Brasil, ainda não tem condições operacionais legítimas, diante da ausência da internet. E como funcionar sem internet? Não dá", afirma.

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RPD | Entrevista Especial | Arnaldo Niskier: 'Falta tudo à educação brasileira'

O professor Arnaldo Niskier avalia que o país sofre sem um plano nacional de educação e com o principal órgão – o Ministério da Educação – minado por uma gestão precária que mistura ideologia com gestão escolar. “Essa mistura não é saudável: prejudica os beneficiários do processo – os estudantes”, avalia

Por Cristovam Buarque e Caetano Araújo

Membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e ex-membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), Arnaldo Niskier é o entrevistado desta 22ª edição da Revista Política Democrática Online. Autor de mais de 100 livros, especialmente sobre educação. É professor aposentado de História e Filosofia da Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ) e Doutor em Educação pela UERJ. Foi membro do Conselho Federal de Educação (CFE), do Conselho Estadual de Educação (CEE-RJ) e secretário de Estado do Rio de Janeiro por quatro vezes.

Nesta entrevista que concedeu ao presidente do Conselho Curador da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), o ex-senador Cristovam Buarque (Cidadania-DF), e a Caetano Araújo, da Diretoria Executiva da FAP, Niskier comenta a situação atual do educação no Brasil e possibilidades de futuro, entre outros temas.

“Talvez eu esteja sendo otimista em excesso, mas sei que o país precisa que o Ministério da Educação acorde definitivamente; que monte uma equipe positiva, uma equipe que se preocupe com os verdadeiros problemas da educação; e que não faça da ideologia um procedimento prioritário, porque não é essa a prioridade do nosso país”, avalia Niskier.

Confira, a seguir os principais trechos da entrevista de Arnaldo Niskier à Revista Política Democrática Online.

Revista Política Democrática Online (RPD): Estamos no quarto ministro da Educação deste governo. Os três primeiros foram inoperantes ou polêmicos, ou ambos. O quarto, depois da posse, não pôde trabalhar porque caiu vítima da Covid 19. A educação no Brasil aguenta essa conjuntura?

Arnaldo Niskier (AN): Não, acho que não. Na linha do meu artigo publicado na Folha de S. Paulo, considero que o MEC não sai do lugar, e que todo lugar em que ele ficou foi infelizmente um lugar desairoso. Falta tudo à educação brasileira, e o Ministério da Educação não corresponde às expectativas que temos em relação a este importante órgão público. Não corresponde, porque inclusive existe um Plano Nacional de Educação (PNE) que previa operação de 20 metas bastante objetivas, 20 metas e mais de 50 indicadores, e, dessas todas, duas ou três andaram um pouco, e as outras todas ficaram na saudade.

O problema não é, para mim, só o dinheiro, porque dinheiro acaba aparecendo. O problema é fundamentalmente a gestão do órgão que tem sido precária. Há uma mistura de ideologia com gestão escolar, e essa mistura não é saudável: prejudica os beneficiários do processo – os estudantes. O Brasil tem 60 milhões de estudantes nas escolas do país, e eles estão mal servidos, na minha opinião. Não estão tendo a cobertura devida para suas necessidades, e isso é, sem dúvida, negativo.

“O Brasil tem 60 milhões de estudantes nas escolas do país, e eles estão mal servidos, na minha opinião. Não estão tendo a cobertura devida para suas necessidades, e isso é, sem dúvida, negativo”

O quarto ministro, Milton Ribeiro, inspira-me alguma esperança. É um pastor presbiteriano, egresso da Universidade Mackenzie. Meu irmão, Silvio, trabalhou lá cerca de 25 anos, e sempre me passou relatórios muito favoráveis sobre funcionamento da instituição, que aprendi a admirar. Acredito, portanto, que, tão logo ele se recupere da Covid-19, poderá dar um jeito na situação.

Talvez eu esteja sendo otimista em excesso, mas sei que o país precisa que o Ministério da Educação acorde definitivamente; que monte uma equipe positiva, uma equipe que se preocupe com os verdadeiros problemas da educação; e que não faça da ideologia um procedimento prioritário, porque não é essa a prioridade do nosso país. A prioridade é acabar com o analfabetismo, que ainda atinge 12 milhões de pessoas acima dos 15 anos de idade; aperfeiçoar o ensino fundamental; dar a implementação devida ao ensino médio; tratar adequadamente o ensino superior. Eis algumas prioridades que alinho.

Cristovam Buarque (CB): Não há dúvida de que se deve receber bem o novo ministro. Comparado com os anteriores, é muito melhor. Mas a questão é se precisamos de ministro, de um Ministério da Educação de base. O MEC é um ministério que só cuida das universidades, do ensino superior, cujos sindicatos e associações dos estudantes tornam o ministro um prisioneiro. As universidades são muito fortes. Quando Paulo Renato criou o ENEM, o foco era avaliar o Ensino Médio. Mas ninguém dava importância. Quando virou um instrumento para o ingresso na universidade, que foi uma boa coisa, realmente, acho que mudou no tempo do Haddad, aí todo mundo descobriu o ENEM, para reservar, porém, maior importância à educação superior, descuidando-se da educação de base. Não seria o momento de o MEC voltar-se para a educação de base, deslocando-se o ensino superior para algum outro ministério, centrando-se a educação de base como tema primordial do governo federal, no colo do presidente da República?

E uma segunda pergunta: comemorei quando o FUNDEB foi renovado, depois de 20 anos. Mas o que vai mudar? O FUNDEF já tem dez anos. O primeiro PNE, com 15 anos; o segundo, com cinco. Há oito anos, alterou-se o piso nacional de salário para os professores. Isso melhora, mas não permite o salto, está aquém das possibilidades, das necessidades, da ambição.

AN: Recordo que o Brasil ocupa colocação lastimável no PISA. Estamos no 57º lugar entre 80, 90 países. Somos uma vergonha em matemática, em português e leitura.

CB: Dez anos depois do FUNDEB, tenho duas ambições: que o Brasil se situe entre os melhores no plano da educação, e que o filho do pobre estude numa escola tão boa quanto a do filho do rico. Em qualquer país decente do mundo, a escola não tem nada a ver com CEP, nem com o CPF. No Brasil, depende-se do CPF ou do CEP, de onde mora ou de quem é o pai. Não estamos querendo fazer uma comparação entre o nós hoje e o nós ontem, mas entre o “nós” daqui a 20 anos e a Finlândia daqui a 20 anos. Para isso, um Ministério da Educação específico terá de assumir a educação de base. São as duas perguntas: a ambição e a estrutura. Um MEC centrado na educação de base, para nos situarmos os melhores do mundo, e a escola igual para todos.

“Tive a oportunidade de conversar com o ministro da Educação finlandês, um jovem de cerca de 40 anos, a quem perguntei qual a razão principal do sucesso da Finlândia em matéria de desenvolvimento. E ele me respondeu: ‘São três razões. A primeira é educação, a segunda é educação, e a terceira é educação’”

AN: Você tem razão. Sei que tem defendido a ideia de que, para o ensino superior, deveria haver um outro ministério, mais ligado ao desenvolvimento científico, tecnológico e à inovação. Isso pode ser uma bela ideia. Mas é preciso que isso seja algo que esteja também na alma do presidente da República. Tenho a impressão de que ele não entende nada do que está acontecendo na nossa educação. As declarações que ele faz são desastrosas. Na discussão do FUNDEB, foi derrotado. A equipe dele, os deputados que o apoiam, foram fragorosamente derrotados pelas ações do presidente Rodrigo Maia. A versão que ficou do FUNDEB foi a função prioritária dada pelo Rodrigo Maia ao exame da matéria. Por que o FUNDEB foi importante? Porque ele mexe com 4.800 municípios brasileiros. Dos 5.500 que nós temos, 4.800 são abrangidos, recebem recursos do FUNDEB. Então, não é algo que se possa desprezar. Ao contrário, nós temos de prestigiar. Eu acho que você tem toda a razão de exigir que o MEC tenha uma ação sobre o ensino fundamental ou a educação básica, para abranger também o ensino médio. Isso seria muito importante, mas só vai ocorrer quando houver uma compreensão geral do processo, a partir, como eu insisto, do próprio presidente da República, que tem de ter uma compreensão maior e melhor do processo.

RPD: Que avaliação se pode ter sobre o presidente da República na área da Educação? Parece que, enquanto estivermos neste governo, com este presidente, o ministro pode até ser esforçado e bem-intencionado, que os resultados serão modestos nessa área. Haveria algum espaço para se fazer algo mais?

AN: A prática tem demonstrado que o tratamento dado pelo presidente à educação é rigorosamente precário. Ele não leva a educação a sério. A gestão do ministro Weintraub, mais de um ano no ministério, foi uma catástrofe. Declarações e ações absurdas. Acho que nossa educação não merece isso. Temos necessidades prementes, que precisam ser supridas, precisam ser atendidas, e se a atitude do presidente fosse outra, é claro que Weintraub não ousaria cometer os absurdos perpetrados durante aquele quase ano e meio. Eu conheço bem o Ricardo Vélez. Coitado, tentou ideologizar sua ação no ministério, e deu tudo errado. Sucedeu-lhe o Weintraub, pior ainda. Aí veio o ministro Decotelli, que cometeu o inexplicável, incluir em seu currículo tanta coisa que não tinha concluído. Era um mau princípio, ele começou com o pé esquerdo e, naturalmente, não sobreviveu. Chega, agora, o vice-reitor da Universidade Mackenzie, onde se formou. São credenciais que muito o habilitam a desempenhar-se bem da nova difícil missão.

RPD: Quando se compara o Brasil inclusive com outros países em desenvolvimento, verifica-se grande diferença, não em nosso favor, quanto à consciência de que a educação e a qualificação da mão de obra são instrumentos imprescindíveis para que logremos índices mais altos de avanços na economia e nas relações sociais. Por que é tão difícil cristalizar essa visão? Será preciso um trabalho de base junto à cidadania para convencer o quanto essas prioridades são inexoráveis?

“Eu acho que você tem toda a razão de exigir que o MEC tenha também uma ação sobre o ensino fundamental ou a educação básica, para abranger também o ensino médio. Isso seria muito importante, mas só vai ocorrer quando houver uma compreensão geral do processo, a partir, como eu insisto, do próprio presidente da República”

AN: Você suscita ponto importante. Anteontem, no canal Futura, apresentei em meu programa habitual “Identidade Brasil”, às19h30, em horário nobre, portanto, uma nova escola, em Helsinki (Finlândia), bem sintonizada com a mentalidade de um país voltado prioritariamente para a educação. Trata-se de uma escola bonita, inaugurada há sete ou oito anos, para 1.100 alunos, em que as aulas demoram 90 minutos, para permitir ao professor avançar, inclusive na parte de aplicação prática dos conhecimentos que são ministrados aos alunos. Nos intervalos, os alunos podem frequentar os laboratórios, as bibliotecas que estão a serviço do alunado dentro da escola. Enfim, são lições admiráveis. Já tinha estado algumas vezes na Finlândia, porque tive a honra de ser durante 13 anos o cônsul da Finlândia no Rio de Janeiro. Um país pequeno, de população pequena, que conseguiu destacar-se com um nível educacional dos mais altos do mundo.

No curso de uma viagem anterior, tive a oportunidade de conversar com o ministro da Educação finlandês, um jovem de cerca de 40 anos, a quem perguntei qual a razão principal do sucesso da Finlândia em matéria de desenvolvimento. E ele me respondeu: “São três razões. A primeira é educação, a segunda é educação, e a terceira é educação.” É o que a gente tem na cabeça também, é a educação que leva um país ao desenvolvimento, leva um povo à sua felicidade, à realização do emprego, da obtenção dos recursos, para que possa sobreviver dignamente. Voltei dessa viagem com a sensação de que tinha ido ao encontro de uma questão extraordinária, que é a prioridade que se deve dar ao trato da coisa pública. Educação em primeiro lugar, em segundo e em terceiro. Infelizmente, estamos longe disso, bem longe disso.

CB: É possível a gente chegar a esse nível numa estratégia de 20, 30 anos? Demora, a Finlândia começou nos anos 1970 a fazer isso, mas a pergunta permanece: é possível fazer isso apenas mexendo nos municípios, a exemplo do que o FUNDEB faz? Só mexendo, a gente vai chegar ao padrão Finlândia? Ou vai-se precisar muito mais do que mexer? Adotar os sistemas municipais com liberdade pedagógica e com descentralização gerencial? Basta mexer com mil reais por ano por criança que o FUNDEB passa, ou vai-se precisar mais do que mexer, como fizeram a Finlândia e a Irlanda, mas intervir, digo, o Brasil intervir? Claro, não vai ser esse governo que está aí. Mas, se o governo passa, volto à pergunta: será suficiente mexer, ou tem-se de intervir, isto é, a nação brasileira, na educação de cada criança?

AN: Tem de intervir, de modo saudável. Você falou na Finlândia. Não podemos concentrar nossa preocupação apenas no modelo finlandês, embora ele seja extraordinário. Conheci também o caso da Coreia do Sul, outro bom exemplo. A Coreia do Sul deu prioridade à educação a partir do Ensino Fundamental, e hoje é também um tigre asiático de primeira ordem. Agora, tivemos, ou estamos tendo, competência para criar o auxílio emergencial. O Brasil lavrou um tento pagando esse auxílio emergencial a mais de 50 milhões de brasileiros; é fantástico, não há como negar. Teve alguns problemas, alguns deslizes, mas isso é natural, o que será corrigido ao longo do processo. Se apareceu o dinheiro para o auxílio emergencial, por que não aparece para ajudar a educação a realizar seus projetos? Como você disse bem, Cristovam, a partir dos municípios. O Brasil, eu insisto, tem 5.500 municípios. Vivem, em sua grande maioria, num estado de absoluta pobreza e precariedade. Se houver uma preocupação saudável de mexer com a educação a partir da base, que ela venha via município, e os municípios que sejam assistidos financeiramente pela União, que é quem detém o cofre público. Acho que é por aí que se pode desenhar uma solução para o futuro do país.

RPD: Professor, o senhor foi um dos pioneiros do ensino a distância.

AN: Eu que criei, no antigo Conselho Federal de Educação, depois, Conselho Nacional de Educação, os elementos que foram cedidos ao senador Darcy Ribeiro, para que ele pudesse fazer a lei 9.394, de 1996, em que, pela primeira vez, se tratou oficialmente, em cinco artigos, do que seria a educação a distância. Tenho essa honra, esse orgulho, e hoje vejo que essas coisas evoluíram muito. Em matéria de educação a distância, em matéria de ensino remoto, ou híbrido, como o futuro se desenha nesse sentido, o Brasil é um modelo que pode – e deve – ser imitado. Ainda há desavenças quanto à qualidade do ensino remoto. Os professores ainda não foram devidamente preparados. Ainda não há internet em todas as escolas. A grande maioria de nossas escolas, de um total de 190 mil escolas em todo o Brasil, ainda não tem condições operacionais legítimas, diante da ausência da internet. E como funcionar sem internet? Não dá. É preciso, pois, que os recursos sejam direcionados para a montagem dessas escolas e a formação adequada de seus professores. Falar em formação adequada dos professores é falar também em remuneração condigna, porque os professores brasileiros estão ganhando muito mal em comparação com outras nações.

RPD: Como tudo no Brasil, as novidades só “pegam” diante de alguma crise. A pandemia criou essa crise, e hoje, as escolas estão sendo obrigadas a dar aulas remotamente, de uma maneira intuitiva, é verdade, com professores ainda não preparados para isso, improvisando metodologias e soluções. A pandemia poderá contribuir para desenvolver e amadurecer o que foi iniciado abruptamente com o ensino à distância?

“A grande maioria de nossas escolas, de um total de 190 mil escolas em todo o Brasil, ainda não tem condições operacionais legítimas, diante da ausência da internet. E como funcionar sem internet? Não dá”

AN: Acho que sim. Mas temos de tratar a pandemia com o devido respeito, e o devido cuidado. Estou há cinco meses em casa, me cuidando, porque estou no grupo de risco, com 85 anos… É preciso, portanto, ter cuidados e, certamente, não vamos ter saudade da pandemia. Em nenhuma hipótese, ela não nos servirá de exemplo, a não ser da resistência do povo brasileiro a esse tipo de sofrimento, porque, no fundo, é um sofrimento. Tantas mortes, tanta gente que foi infectada e que teve de passar por um processo penoso de recuperação. É uma recuperação que não se tem certeza de ser para sempre. Ainda se teme uma segunda onda, ou até uma terceira. Não temos certeza de nada. Agora, existe a notícia de que a Rússia já encontrou a vacina, e que vai começar a vacinar no mês de outubro, antecipando o que outros países vêm tentando. Na verdade, há 26 vacinas em estudos no mundo. A que está mais avançada, parece que é essa russa.

O Brasil tem experiências com a da Universidade de Oxford, tem experiências com a China também, e estamos rezando para que essas coisas se aperfeiçoem o mais breve possível e possam ser utilizadas em tempo hábil pelo povo brasileiro. No meio desse processo, existe a educação. Nossa esperança é a de que possamos sair dessa crise imensa, com tantas mortes sofridas, tantas mortes que lamentamos, com uma nova educação. O novo normal não será igual ao que acontecia antes da pandemia. Teremos um novo normal, com toda a certeza, e a educação pode e deve exercer papel primordial nesse processo, com qualidade. Virá a nova educação.

RPD: É possível esboçar um horizonte otimista para o futuro da educação no Brasil?

AN: Acho que melhor do que eu, o Cristovam, pela qualidade dos serviços já prestados ao país, como reitor da Universidade de Brasília, um reitor admirável; como governador de Brasília; ministro e senador da República, estaria em melhores condições de começar a responder a essa pergunta. Depois poderia fazer um fecho, se vocês concordarem.

CB: Começo cumprimentando Niskier por seu papel no impulso da ideia do ensino a distância. Ele agiu, como alguém que, no começo do século XX, soube entender a mudança do teatro para o cinema. E isso é mais importante ainda do que a própria característica remota. A aula vai tender a deixar de ser teatral, de um professor, e vai ser cinematográfica, feita por uma equipe. E esse produto, essa peça vai ser transmitida. Niskier podia ser mais reconhecido ainda como quem deu os primeiros passos nessa mutação. Mas ele pediu que eu dissesse alguma coisa para ele arredondar.

Quero dizer, então, que acredito que um dia, da mesma maneira que há em cada cidade uma agência do Banco do Brasil, vamos ter uma Escola do Brasil. Hoje, não existe a Escola do Brasil, hoje a escola é municipal, e, enquanto ela for municipal, não vai ter a qualidade que a gente espera, porque os municípios são pobres, e não só em dinheiro. Então, a ideia de que a Escola do Brasil possa replicar-se em cerca de 200 mil, desfrutando cada uma da devida liberdade pedagógica, é um horizonte ambicioso, por enquanto otimista, do que vai acontecer no país. Não dá para falar de marco temporal para tal conquista. Mas gostaria de deixar essa mensagem de que um dia, além do Banco do Brasil, a escola também vai ser do Brasil.

AN: Você tem toda a razão, reforçada por palavras de qualidade e de respeito. De minha parte, tenho lido muito ultimamente sobre esses pontos. E escrevi um livro, Memórias da Quarentena, que espero lançar nas próximas semanas. Fiz uma avaliação do que as coisas representam, coloquei neste livro muito da minha experiência como professor de História e Filosofia da Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, onde militei por mais de 30 anos, uma escola pública de qualidade. Acho sinceramente que nós devemos dar prioridade aos recursos para a educação. Eles existem, não se iludam. Essa ideia de que o Brasil não tem dinheiro é uma ideia falsa. O dinheiro existe e aparece, como apareceu agora, conforme eu fiz referência, na pandemia, com o auxílio emergencial.

Temos também de formar bem os professores, melhorar os cursos de pedagogia, promover o interesse dos alunos pelos cursos de formação de magistério, o que não ocorre em nossos dias. Hoje, de todos os que fazem o ENEM, só 2% têm interesse em seguir a carreira do magistério. Isso é muito pouco, é um absurdo. Em comparação com outros países, é quase uma aberração. Temos de promover o interesse do aluno pelo magistério, e que isso se faça também com a promessa de salários compatíveis com a dignidade humana, como diz a nossa lei de diretrizes e bases da educação nacional.

Em síntese, defendo, entre outras, a adoção das algumas premissas sobre as quais será mais viável pensar no novo normal, numa nova educação: prioridade para as escolas municipais, como ressalta Cristovam; canalização de recursos públicos para aprimorar a educação híbrida – essa que combina o virtual e o presencial; aperfeiçoamento do que se deve fazer nas universidades, que não podem continuar sendo criticadas como foram na gestão de Weintraub; antes, têm de ser respeitadas e utilizadas como formadores de recursos humanos adequados e compatíveis para o desenvolvimento da educação, da ciência, da tecnologia e da inovação em nosso país.